Guru de 7 cidades

1972

Guru de 7 cidades

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salvando

Nascida no final dos anos 70, confesso que a década me hipnotiza e tira do sério. Não só por sua riqueza estética e artística, mas também pelo conflito proximidade x distância absoluta. Afinal, os anos 70 até outro dia, estavam logo ali na esquina do tempo.

Por outro lado, nada parece mais distante hoje do que o universo setentista, debochado até em anúncio de telefone celular como coisa demodé e kitsch (ironicamente, existe coisa mais demodé e kitsch do que anúncio de telefone celular? Veja uma campanha da Claro ou da Vivo e pense nela daqui há vinte anos, como soará velha e datada).

Sendo assim, os 70s não deveriam assustar ninguém. Mas ao assistirmos “Guru das Sete Cidades” (1972), a questão que fica é óbvia: como o mundo podia ser daquele jeito? Como as pessoas não percebiam que – tal como os comerciais de celular no futuro – aquilo um dia acabaria ridiculamente nostálgico e ultrapassado?

Perguntemos a Carlos Bini, diretor do filme, se conseguirmos encontrá-lo. Bini, ao que parece, tinha em mente o firme propósito de inventar filmes sobre o movimento hippie. Inicialmente tentou documentar a vida em uma comunidade, dirigindo o clássico “Geração Bendita” – exibido com o nome de “É isso aí, bicho!” para confundir a censura.

“Geração Bendita” tem um longo percurso que merece ser lembrado. Primeiro longa-metragem nacional sobre o hippismo, foi rodado em Nova Friburgo, pequena cidade ao noroeste do Rio de Janeiro, e conta com uma das mais cultuadas trilhas-sonoras da história, a cargo de uma banda de garotos locais, a Spectrum.

O filme virou disco e os dois – disco e filme – sumiram na poeira da história durante quase trinta anos. Não fosse o esforço de recuperação no final dos anos 90, tudo estaria perdido. Hoje, “Geração Bendita” – o disco -- é acessível como o último da Sandy e Júnior. Experimente no E-Mule. Já o filme, rodado precariamente, não encontra público e sua exibição e resgate vai depender da boa vontade do Canal Brasil ou de algum cineclube bacana.

Depois de “É isso aí, bicho!”, quando o sonho parecia ter acabado, Bini voltou à tona com outro filme, de produção cuidadosa e rodado grande parte no estado do Piauí. Por si só, um filme rodado no Piauí já seria motivo de interesse, mas “Guru das Sete Cidades” tem mais atrativos.

Bini e a banda Spectrum – que faz uma participação especial – reafirmam a parceria e apresentam uma releitura do célebre caso de Charles Manson, ambientada no estado do Nordeste brasileiro por conta de patrocínio. Assim, se sucede uma lisérgica progressão narrativa que envolve as maravilhas piauienses, culto satânico, chinfras de moto e Wilson Grey cinqüentão no papel do desbundado Fininho, membro da gangue de Beto Pilantra, Renato, Negão e Meio-Quilo – este, literalmente, um anão, todos pegos no bas fond hippie-carioca da época.

O Guru – em pessoa, o que dá nome ao filme – pôde ser visto há pouco tempo nos cinemas. Otávio Terceiro protagonizou o último filme de Rogério Sganzerla, “O Signo do Caos” (2005). Em 1972, ele aparece como um Manson patropi, o líder que comanda o assassinato de Rubens (Angelito Mello), marido de Solange (Rejane Medeiros), dono de uma empresa que vende carnaúba em larga escala.

Solange tem um caso com Beto Pilantra (Paulo Ramos), que pretende aplicar o mais antigo dos 171s na “coroa” – estranhamente chamada de “coroa”, pois está no auge da forma. A locação em Sete Cidades – cujo Parque Nacional é mostrado sob narração em over que cita lendas da antiga população fenícia (!) – abre espaço para um escrachado patrocínio da Piauitur, a Empresa de Turismo do Piauí.

A atriz que faz Solange, a desaparecida Rejane Medeiros, era uma cabocla potiguar belíssima, que chegou a tentar carreira na Europa por conta da perfeição de seus traços. É Solange quem mantém o paralelo erótico da história, enquanto o retrato da juventude é mostrado. “Vou dar uma volta de moto”, um dos integrantes da gang diz -- e suas acrobacias são ilustradas pelo som da Spectrum. É ao som da Spectrum que são realizados também os rituais de adoração ao Guru, onde Solange, nua em pêlo, se oferece ao grupo.

Encomendado e realizado o assassinato do marido, o filme perde o gás e Solange possuída, olhos esbugalhados, é alvo de uma dúvida final: terá sido ou não queimada viva, no sacrifício recriado pelos seguidores do demônio? Há quem diga que sim, há quem diga que não. A polícia chega a tempo, mas o corte do diretor para a despedida de Beto na estação de trem frustra os adeptos do cinema extremo, que bem gostariam de assistir à matança derradeira de uma das mulheres mais bonitas que o cinema brasileiro já viu nas telas.

John Ford tinha o Monument Valley, Carlos Bini teve o Parque Nacional das Sete Cidades. A atmosfera é gigantesca e a característica árida e a coloração amarelada das pedras traduzem o antro perfeito para os fiéis amalucados.

Se Bini conseguiu ou não seu objetivo de documentar a “geração bendita” é discutível, mas pelo menos no caso de “Guru das Sete Cidades”, realizou um belo e excêntrico filme. Restaurado, posto para circular em dvd-rs de colecionadores, o Guru anda à toda, precisando agora que “É isso aí, bicho!”, seu irmão gêmeo, também saia da lata, para que possamos apreciar definitivamente o que restou da Era de Aquário – ou do que se imaginava que ela seria, sob o prisma torto dos engraçados e subdesenvolvidos hippies brasileiros.

Fonte: eee.estranhoencontoro.blogspot.com

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