Border (2018)

Título original: Gräns

Países: Suécia, Dinamarca

Duração: 1 h e 50 min

Gêneros: Drama, fantasia, romance, thriller

Elenco Principal: Eva Melander, Eero Milonoff, Jörgen Thorsson

Diretor: Ali Abbasi

IMDB: https://www.imdb.com/title/tt5501104/


Border“: significância monstruosa extraída da alma de “monstros” escandinavos.


“Humanos são parasitas, que usam tudo na terra para sua própria diversão. Mesmo as próprias crias. A raça humana é uma doença.”


Antes de tudo, nota-se que, no rol de gêneros cinematográficos mostrado mais acima, encontra-se a fantasia. Isso decorre da utilização na narrativa do filme em tela de seres da cultura nórdica chamados trols – ou trolls. Para que o leitor os conheça melhor e fique mais familiarizado com os personagens com que se deparará, retirei um fragmento de um texto da Wikipedia que os define: “Troll é uma criatura antropomórfica imaginária do folclore escandinavo. É descrita tanto como um gigante horrendo , como os ogros, ou como uma pequena criatura semelhante aos goblins. Diz-se que vive nas florestas e nas montanhas, em cavernas ou grutas subterrâneas. Tem cauda como os animais. É comumente maldoso e estúpido. Na literatura nórdica, apareceram com várias formas, e uma das mais famosas teria orelhas e nariz enormes. Nesses contos, também lhes foram atribuídas várias características, como a transformação dessas criaturas em pedra quando expostas à luz solar, e ainda a perda do seu poder ao ouvirem o badalar dos sinos das igrejas.”

Eis a sinopse: “Quando uma policial que trabalha na alfândega, Tina, que tem um impressionante sexto sentido para “farejar” o que as pessoas estão sentindo – como vergonha, culpa ou raiva, por exemplo -, encontra a primeira pessoa de quem ela não pode provar a culpa, Vore, a relação que eles estabelecem a obriga a enfrentar revelações terríveis sobre si mesma e sobre a humanidade.”

O que pode, à primeira vista, parecer bizarro – e até asqueroso, nojento ou repulsivo – esconde muitos significados, como resumido na primeira frase deste texto. Há dois vieses em relação à dupla de protagonistas. Tina é um troll que vive em sociedade, sofre com suas diferenças e conhece o passado a partir do que é contado por seu pai – notem que o artigo indefinido UM ficou no masculino pela incapacidade de definir o sexo da personagem. Vore é um troll nômade, que conhece tudo sobre a sua origem e a de Tina. Esse encontro fortuito entre dois semelhantes adquire ares de conto de fadas – ou de ogros – e atrai pela ilustração da cultura escandinava, mas rompe a fronteira (tradução do título do filme) da imaginação ou da fantasia quando a narrativa entra na seara sentimental e grandes segredos começam a ser revelados. A partir daí, temas como a busca da identidade, a diversidade sexual ou de gênero, a relação entre homem e natureza e assuntos que envolvem paternidade e maternidade dão o tom da discussão e levam a boas e duradouras reflexões. Ao passo que o relacionamento entre os trolls encanta e consegue extrema atenção, mesmo exibindo uma hiperbólica estranheza que pode dar um nó na cabeça do espectador, uma incômoda perturbação paira sobre a narrativa pelas visões antagônicas que os protagonistas têm sobre a humanidade e a vida. Esse conflito de concepções versus o controle sobre o âmago selvagem das criaturas é o principal ponto de interesse da narrativa.

Inserida no contexto, há uma subtrama sobre pedofilia que é tratada por Tina de uma maneira que vai de encontro aos pensamentos de Vore, o que exemplifica o final do parágrafo anterior, entretanto, essa temática se perde dentro do enredo pela sua desnecessidade. Há uma predisposição do filme em chocar sua plateia, mesmo ante muitas cenas dotadas de uma singeleza fora do comum, e as imagens já fazem muito bem essa função. Talvez, nem fossem necessários diálogos em determinados momentos. As mensagens que a visão humana envia à mente do público em relação ao desconhecido já são suficientemente completas e incômodas, de modo que o conhecido – o mundo real – perde sua premência. Essa conjuntura também concede a Tina uma “ética humana” que passa a não mais coadunar com o seu interior, pelas revelações que, a essa altura, já aconteceram. Algo como um falso moralismo inserido no processo de busca de compreensão pela personagem, incentivado por Vore. O diretor desperdiça a oportunidade de adentrar mais ainda na alma dos protagonistas ao perder tempo demais com a profissão de Tina através desse caso específico.

Em relação aos aspectos técnicos, a cinematografia e principalmente a maquiagem, categoria na qual “Border” está indicado ao Oscar, destacam-se a olhos vistos. Nada mais esperado, pela natureza selvagem dos protagonistas e pela aparência defeituosa/monstruosa que apresentam. Afirmo sempre que esses detalhes técnicos adicionam pontos a mais na avaliação de uma determinada obra cinematográfica. Em resumo, temos um roteiro bem interessante, que realmente agrada e atrai a atenção, atuações “monstro” dos artistas que personificam os trolls e excelência técnica abundante. Tudo isso resulta em um conjunto harmônico e bem acabado, que adentra na imaginação dos espectadores e proporciona muito mais que uma mera jornada às místicas fábulas do leste europeu. Só para encerrar, “Border” foi ganhador da Mostra Un Certain Regard no Festival de Cannes em 2018 e representante da Suécia na corrida ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2019. Definitivamente, é um drama que exala impressionante pureza dentre a tragédia e tem o condão de emocionar e gerar agonia.

O trailer é bem impactante e segue abaixo com legendas em inglês.

Adriano Zumba


3 comentários Adicione o seu

  1. Giovanna Grossi disse:

    Uma das gratas surpresas de 2018, um dos meus preferidos.

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