Arão Silva

O filme no meu ver tem mérito ao não romantizar uma tragédia. É linda a forma como nos vemos imersos nos pensamentos de cada personagem, e os conhecemos e até gostamos de alguns. O trabalho com os sons é belíssimo nesse sentindo. Por muito tempo nos vemos mergulhados em deliciosos planos sequência e mise en scine's perfeitas, grande parte do filme explora certo clima de calmaria. Ao mesmo tempo em que se sente eletricidade no ar. E aí a aleatoridade psicopata entra em cena, e vemos alguns morrerem outros não, sem que essa decisão passe por nenhum crivo moral de qualquer natureza. O bullyng até tem seu lugar, mas não é a motivação principal. Vejo o filme nos dizendo: 'é impossível justificar a situação ocorrida de forma fácil e rápida com o bullyng', o que é discutível. Dessa forma, o filme é um retrato sincero dessa ecatombe. Não existe romance ou história por trás de um ato de latrocínio como esse, só a completa ignorância, o completo caos. Não existem heróis, nem vilões, nem protagonistas. E talvez seja desrespeitoso e confuso para quem passa por uma experiência horrível como a retratada a dramatização que a industria cinematográfica poderia fazer. Um cinema arriscado, questionável e com um gosto amargo.

Uma história divertidíssima, de fazer rir depois ao lembrar. Direção de Arte impecável e maravilhosa como sempre e aquele universo feminino bem conhecido pela classe média baixa, vulgo pobres, de vários lugares. De um cenário de tragédia emerge certo pragmatismo doméstico extremamente maternal das personagens, e nos pegamos rindo de coisas extremamente absurdas. Um sentimento muito parecido de sentar e ouvir os parentes falando dos casos do passado e mostrando seu verdadeiro eu, totalmente livre de moralismos, preconceitos e credos para o que já passou, mas mantendo os limites do que é correto e digno hoje. Um deleite.

Filme incrível. Desenvolve as intolerâncias dos diversos grupos etnicos norte americanos, tudo em um clima descontraído permeado do melhor da estética negra dos anos 80. Cria personagens que estrapolam as barreiras de sua função na ficção e se tornam símbolos de linhas de pensamento, criando um poderoso debate sobre a situação do afrodescendente nos EUA. Tudo é brincadeira, até que fica sério e logo vira brincadeira denovo, numa crítica forte à postura desleixada na forma de (não) defender pontos de vista de certos indivíduos equivocados. Violência não resolve questões de ódio, só explode rapidamente para logo ser esquecida e abrir espaço para mais ódio.