Mindhunter é uma das melhores séries que a Netflix já fez

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As décadas de 1990 e 2000 foram muito boas para quem gosta de filmes de serial killers. O Silêncio dos Inocentes ganhou o Oscar de melhor filme em 1991 e cimentou esse filão do suspense. Depois disso surgiram muitas produções com resultados variados e, ultimamente, a fórmula tem mostrado cansaço. O diretor David Fincher estreou no gênero com Seven, em 1995, depois fez o meu preferido, Zodíaco, em 2007, e agora leva Mindhunter à Netflix.

A televisão americana tem uma quedinha especial por mistério e por quem-matou-fulano-de-tal e, para tentar combinações diferentes, inventou de tudo (inclusive o serial killer condicionado a só matar quem merece morrer). Por isso é muito legal perceber que Mindhunter consegue trazer muito daquilo que a gente conhece, de um ponto de vista ligeiramente diferente (que é o que todo mundo quer fazer), mas sem enfiar os dois pés na jaca.

A história é, como acontece com frequência, a de um agente do FBI. Até aí não há novidade. Acontece que esse agente não quer necessariamente desvendar um caso especial e intrigante. O que ele faz é estudar o crime como um fenômeno maior. É esse ponto de vista que abre todas as sacadas legais de Mindhunter, e o que permite esse ângulo é o material original. A série foi baseada num livro de John E. Douglas e Mark Olshaker. Douglas é um ex-agente do FBI, a carreira e as descobertas dele são as inspirações para o personagem principal. Ele trabalhava no bureau bem na época em que o grande público e as instituições foram obrigados a tentar entender o que significavam os assassinatos em série – uma coisa talvez tão antiga quanto a roda, mas um conceito relativamente novo àquela altura.

O ano é 1977. Os americanos ainda estão perplexos com os crimes do Filho de Sam, um serial killer que dizia agir sob os comandos de um cachorro falante. A reconstrução de época que Mindhunter faz não serve só para que a gente sinta o clima do final da década de 1970. O próprio conceito de serial killer vai sendo apresentado aos poucos, sempre em confronto com a época e com as pessoas que então tentavam entender e combater o crime. O Filho de Sam não era o único, e as pessoas tinham a sensação de que o mundo ia ficando mais e mais difícil de se compreender.

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Essa recriação é fantástica. Para quem acompanha o noticiário em 2017, para quem viu a penca de suspenses lançados desde O Silêncio dos Inocentes, a importância, por exemplo, de perfilar um criminoso pode parecer óbvia. O trabalho de Mindhunter é demonstrar como é que essa obviedade se estabeleceu. Ao mesmo tempo, não há só a questão de dar nome a um crime antigo, ou de entender a mente dos seres humanos capazes de cometer as maiores e mais assassinas maluquices. A série parece dizer que, com a mudança dos tempos, também mudou o tipo de loucura que se precisa enfrentar.

Nesse sentido, Mindhunter é de apavorar. Há um diálogo constante entre o choque representado pela novidade de cada crime, lá em 1977, e a nossa incapacidade, em 2017, de ver qualquer atrocidade como novidade. A escalada dessa loucura coletiva é o principal tema da série. O personagem central, vivido por Jonathan Groff, parece não se abalar com o que vê. A princípio ele entrevista psicopatas e reflete sobre a natureza do que eles fazem em nome de nada além de sua própria ascensão profissional. Só depois ele vai perceber o verdadeiro peso daquilo com que está lidando. Nessa hora o espectador é convidado a se espantar de novo com a violência e a desumanidade, a sair de um certo estado de torpor.

Eu não tenho nem vergonha de dizer que terminei os 10 episódios dessa primeira temporada de Mindhunter no fim de semana de seu lançamento. Acho que David Fincher e companhia entregaram uma das melhores coisas que a Netflix já fez. Vi algumas pessoas reclamando de lentidão ou falta de objetividade, mas acho que essas críticas não valem quando uma série tenta ver em detalhes um panorama tão grande. Além disso, seria difícil pensar em um elenco melhor do que o que Mindhunter tem, com destaque para Anna Torv (aquela de Fringe) e Holt McCallany (que eu não conhecia de nome).

Não sei se uma segunda temporada já está garantida, mas até me empolgo com o que ela tem a apresentar. Na vida real, John E. Douglas entrevistou Ted Bundy, Charles Manson, O Filho de Sam, John Wayne Gacy, Richard Speck, Edmund Kemper e vários outros. Até agora, dessa lista só apareceram Speck e Kemper. E quem chegou até o final sabe o efeito que esses dois tiveram nas vidas dos personagens principais. Agora é esperar.

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