A Guerra do Amanhã (2021) - Crítica

Até que ponto um filme precisa ser socialmente relevante para ser bom? Isso daria um debate forte entre críticos e sociólogos. Claro que sempre é interessante ver algo engajado, e toda história possui algo em suas subcamadas para contar, espelhando ou não sua própria era - a obra como reflexo de seu tempo. Mas ainda há possibilidade para a objetividade pura? O prazer pelo prazer, ou o gênero como autossuficiente numa trama. É difícil. E o que vale mais? Um filme ruim ou medíocre, mas woke, ou uma obra desvairada e escapista sem comprometimento com o real? É fácil responder isso. Ou deveria ser. Hollywood, entretanto, não parece saber muito bem como se encaixar nesta época, que alguns já cunham como antropoceno, do homem como juiz e carcerário do destino do mundo. 

A Guerra do Amanhã parece exatamente um subproduto deste conflito, e isso por si só o transforma como um filme típico desta geração. Com exceção de uma introdução que tenta criar imediatamente uma atmosfera de urgência, o longa parece mais o começo de um drama melodramático sobre um ex-militar tentando seguir a carreira de cientista e professor, mas sem sucesso pelos estigmas de suas experiências, seja as passadas, seja a falta de prática na profissão de seus sonhos. Os comentários divergem entre a falta de oportunidades da sociedade atual, em como o capitalismo sufoca nossas essências e individualidades, assim como a burocracia interminável do governo, além da falta de apoio deste para a reinserção de ex-combatentes dentro da esfera social cotidiana - um tema implícito também na figura do pai do protagonista. 

a guerra do amanha tomorrow war chris pratt

Ao longo de sua generosa duração de 140 minutos, A Guerra do Amanhã demonstra ter muito a dizer, mas ele parece ser atraído, compelido, a todo instante, para um espírito livre, descomprometido e descerebrado da mais pura ação brucutu e cheia de adrenalina dos anos 80, apenas com uma roupagem sci-fi permitida pelos avanços tecnológicos de hoje, caindo na armadilha contemporânea de tentar parecer mais verossímil e sóbrio do que o tom da história em si clama. Mas isso não parece ser suficiente nos dias de hoje, somente matar aliens para salvar o mundo ou sua filha. E sim jogar contextos representativos e identificáveis sobre o aquecimento global e os traumas da guerra. É uma intenção nobre, claramente, mas que jogada confusamente pela direção de Chris McKay e o roteiro de Zach Dean (um escritor que está por trás de filmes de ação baratos e diretos, vejam só), cai num limbo ambivalente entre ser e querer ser, um dimorfismo que em nada beneficia o produto final. 

A própria figura de Chris Pratt ilustra isso, sendo um exímio exemplar do superstar hodierno, cheio de carisma e charme, mas uma limitação bem canhestra no alcance dramático. Ele está muito mais confortável nas situações de ação e comédia do que nas relações familiares, cujo peso é sentido principalmente pelas atuações de Ryan Kiera Armstrong e Yvonne Strahovski, que interpretam sua filha. Essa dicotomia se ilustra em tela o tempo todo, desconectando frequentemente o texto do visual. Se verbalmente, Tomorrow War defende a ciência e mostra-se antibélico, visualmente ele é completamente apaixonado e devoto aos impactos do combate como excitante e apoteótico. Não há um diálogo uníssono da Mise-en-scène, corrompendo os ideais do filme, o fragilizando nos âmbitos social e cinematográfico.

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Há pouquíssimos longas sci-fi de alto orçamento que incluam viagem no tempo e alienígenas em seu conceito, e um fã do gênero sempre abraça a ideia e torce para curtir a experiência. O que falta a Tomorrow War é se conscientizar e ser mais como o análogo No Limite do Amanhã, qual ele se aproxima visual e conceitualmente, e menos um Richard Jewell, qual tenta emular no discurso. Preso entre este dois mundos, a fita diverte e emociona superficialmente, mas não consegue atingir o êxito tanto na questão social, quanto no puro entretenimento. E o esquecimento é a pior condenação para a arte irrelevante. 

2 comentários:

  1. parabéns dalla por conseguir escrever uma resenha tão generosa pra este filme que definitivamente é um dos filmes feitos esse ano,mas eu fico ainda mais puta com esse filme pq existia potencial.Se ele terminasse no momento que o chris pratt volta todo pertubado e visivilmente incapaz de retornar ao cotidiano,ainda sim seria um filme longe de bom e perto do ruim,mas teria um ponto feito e com se tornaria mediano por isso

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    1. Hahah, esse ano tá bem fraco pra blockbusters. Esse ainda me divertiu "um pouco".

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