Os 7 de Chicago (2020)

Por André Dick

Aaron Sorkin ficou mais conhecido como roteirista de Questão de honra nos anos 90 e de dois ótimos projetos sobre competição, na indústria da informática, em A rede social e Steve Jobs, e do mundo esportivo, em O homem que mudou o jogo, além da própria política, na série de TV The west wing. Criador de diálogos ágeis e, apesar de expositivos, eficazes, ele estreou há alguns anos na direção com A grande jogada, no qual Jessica Chastain desempenhava o papel de uma líder de apostas. Ela e Idris Elba conseguiam sustentar uma narrativa recheada de subtramas e muitos personagens.
Agora, com Os 7 de Chicago, Sorkin volta suas baterias para a cena política, mais exatamente os atos antiguerra ocorridos em Chicago em agosto de 1968 durante a Convenção Nacional Democrata.  Ele tenta se restringir, no entanto, ao julgamento de algumas personalidades envolvidas neste acontecimento

Tom Hayden (Eddie Redmayne) e Rennie Davis (Alex Sharp), integrantes da tudents for a Democratic Society (SDS); David Dellinger (John Carroll Lynch); John Froines (Danny Flaherty) e Lee Weiner (Noah Robbins), que não parecem saber exatamente o que fazem envolvidos no processo; Abbie Hoffman (Sacha Baron Cohen) e Jerry Rubin (Jeremy Strong), membros do Partido Internacional da Juventude (Yippies); e oo líder dos Panteras Negras Bobby Seale (Yahya Abdul-Mateen II)
Julgados por Julius Hoffman (Frank Langella), um homem cujas intenções não estão muito claras, Sorkin desenha a situação como fez em Questão de  honra: o dentro e fora do tribunal se coordenam de modo autêntica e sinceramente atraente, com os personagens nunca chamando atenção para si mesmos e sim para a trama.

Quando as figuras a serem julgadas chegam ao tribunal, já sabemos que o acusador será Richard Schulz, que começa o filme se reunindo com o novo Procurador-Geral John Mitchell (John Doman ), nomeado por Richard Nixon, ao lado de Thomas Foran (JC MacKenzie). Gorodon-Levitt é um ator propício para este tipo de embate, com sua tranquilidade e descompromisso, mas aqui ele funciona menos do que poderia, pelo parco roteiro que recebe. Mais eficiente é Mark Rylance como William Kunstler, o que faz a defesa dos sete acusados, mas se nega a defender Seale, que não pode ser representado pelo advogado que quer como gostaria. Rylance tem aqui uma atuação que seria merecedora de um Oscar, ao contrário daquela pelo qual o recebeu, em Ponte dos espiões
Com ambientação de época notável e alguns registros misturados com cenas documentadas (ou seria um efeito de JFK, de Oliver Stone?), Os 7 de Chicago vai se embrenhando na vida dessas figuras. A principal talvez seja a de Abbie Hoffmann, feito com rara eficácia por Sacha Baron Cohen, em sua melhor participação num filme desde A invenção de Hugo Cabret. No papel de um homem com ideais revolucionários, ele não sucumbe demais ao romantismo de suas reflexões, nem adere e a uma postura autocomplacente. Ele tem certo embate com :Tom, feito com talento por Eddie Redmayne. Alguns personagens são mais assessórios da trama de Sorkin, que vai entre idas e vindas nos mesmos moldes de A rede social.

Mas o filme, de qualquer modo, não parece ser tão profundo quanto o seu material de fundo subentende: ele se dispersa em alguns pontos básicos, não desenvolve outros, nem cria uma tensão necessária para que o terceiro ato se mostre impactante o suficiente. Sorkin ainda tateia uma linguagem como diretor. Ainda assim, ele nunca torna os personagens excessivamente facilitados para o paladar do espectador, como fez Spielberg em seu The Post (e o qual seria o diretor de Os 7 de Chicago) que reúne, de certo modo, uma trama política parecida com esta na sua tentativa de mesclar cinema e política. É muito difícil traçar paralelos entre épocas diferentes, embora o filme force isso, como The Post, pois cada período da história tem suas próprias delimitações e desejos, mesmo que as ideias pareçam semelhantes. Nesse sentido, Os 7 de Chicago não é justamente o lugar mais adequado para se ter uma referência do que ocorre hoje em dia. O mundo se transforma em cada atitude, mas elas não são necessariamente iguais. Algumas atitudes e o final são tão inautênticos que fica difícil avaliar onde começa a cinematografia e onde acaba a exposição dos diálogos fascinantes de Sorkin, É quando, enfim, o discurso se estabelece sobre a pretensão do filme e quando Sorkin parece querer convencer o espectador a adotar uma determinada compreensão. Quando foge disso, é cinema de alta qualidade, com atuações que conseguem fazer a trama funcionar de modo exemplar.

The trial of the Chicago 7, EUA, 2020 Diretor: Aaron Sorkin Roteiro: Aaron Sorkin Elenco: Mark Rylance, Eddie Redmayne,  Yahya Abdul-Mateen II, Sacha Baron Cohen, Daniel Flaherty, Joseph Gordon-Levitt, Michael Keaton, Frank Langella, John Carroll Lynch, Noah Robbins, Alex Sharp, Jeremy Strong Fotografia: Phedon Papamichael Trilha Sonora: Daniel Pemberton Produção: Stuart M. Besser, Matt Jackson, Marc Platt, Tyler Thompson Duração: 130 min. Estúdio: Paramount Pictures,  DreamWorks Pictures, Cross Creek Pictures, Marc Platt Productions Distribuidora: Netflix

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