Pais e filhos (2013)

Título original: Soshite chichi ni naru

Título em inglês: Like father, like son

País: Japão

Duração: 2 h e 00 min

Gênero: Drama

Elenco principal: Masaharu Fukuyama, Lily Franky, Keita Ninomiya, Yoko Maki, Machiko Ono

Diretor: Hirokazu Koreeda

IMDB: https://www.imdb.com/title/tt2331143/


Eis um diretor para se acompanhar, Hirokazu Koreeda, o qual adora abordar, sempre com muita sensibilidade, temas incômodos e delicados – principalmente envolvendo a família. Dentre as principais obras desse diferenciado diretor, que é o atual detentor do prêmio de melhor filme no festival de Cannes, com a película “Shoplifters“, está “Pais e filhos“, um filme memorável, que mostra uma situação deveras desconfortável, na qual haverá sofrimento em qualquer alternativa que se utilize para tentar resolvê-la. Saliento que a forma que o diretor exibe os acontecimentos é magistral, e denota uma habilidade fora do comum em retratar um drama tão penoso de forma tão singela e sem apelar para um sentimentalismo forçado. Koreeda transforma a tragédia em arte e transmite a carga emocional suficiente e necessária para uma excelente experiência cinematográfica.

O filme mostra uma catástrofe que recai sobre duas famílias japonesas: a troca de seus filhos na maternidade, a qual só é descoberta seis anos depois, quando o laço familiar e o amor entre pais e filhos já possui uma magnitude imensurável devido a tanto tempo de convivência e troca de experiências. Apesar de envolver principalmente seis pessoas: dois pais, duas mães e dois filhos, o maior foco recai sobre o personagem Ryota Nomomiya, um bem sucedido arquiteto, que vive basicamente para o trabalho em detrimento de uma maior atenção a sua família. Para uma melhor compreensão, é bom nominar os personagens . Inicialmente, temos uma família composta por Ryota, Midori e Keita e outra composta por Yudai, Yuraki, Ryusei e outros irmãos. Keita e Ryusei são as crianças trocadas.

Belas cenas abundam no começo do filme. Cenas que mostram a família Nomomiya na mais pura sintonia e gozando de uma felicidade plena pela presença de Keita, uma criança encantadora, porém, os ventos mudam de direção – e a trilha sonora, que era alegre, se torna triste e melancólica – com a inesperada notícia vinda do hospital. A partir daí, conhecemos a família Saiki – a de Ryusei – e a narrativa deliberadamente apresenta sub-histórias concomitantes, para que o espectador conheça o íntimo dos pais, Ryota e Yudai. Como visto no parágrafo anterior, Ryota é workaholic, além de ser bastante sério, formal, disciplinador, ou seja, é um japonês à moda antiga, apesar de nutrir amor incondicional por seu filho. Yudai, por sua vez, possui uma condição financeira inferior à de Ryota, mas, em relação a seu jeito de ser, é um japonês com um comportamento mais acalentador, quase latino: amoroso, brincalhão e atencioso no trato com seus filhos. Nesse ínterim, já percebemos que há dois choque de realidades que as crianças terão que enfrentar em uma eventual troca de famílias: a condição financeira e o tipo de tratamento dispensado pelas famílias, além da dependência afetiva com seus pais de criação, que é uma variável que está sempre presente ao longo de todo a história. Nota-se que o processo de adaptação de ambas as crianças em ambientes totalmente diferentes, em diversos aspectos, dos que elas estavam acostumadas a viver e a ausência dos “antigos pais” são uma fonte abundante de dor e angústia, inclusive para os espectadores.

É um filme sem reviravoltas, apenas algumas surpresas. A principal delas é a descoberta da causa da troca das crianças na maternidade, mas esse fato não muda o sentido narrativo, só acrescenta uma pitada a mais de incômodo à fervura. Um argumento importante que devemos nos ater ao assistir ao filme, é o sentimento de remorso de Ryota quando compara a sua vida – e sua relação com Keita – com a vida de Yudai – e sua relação com Ryusei. Há aquele quê de arrependimento, adquirido após muita reflexão e muitas situações que abrem seus olhos, por notar que poderia ter se doado mais a seu filho Keita, o qual está na iminência de ir embora. Prover luxo e conforto para a família nem sempre denota felicidade, pois a presença física, a interação e os pequenos gestos de afeto são fundamentais. Entre tantas reflexões que o filme nos leva a fazer, vem à mente, após digerirmos a situação de Ryota, o papel do trabalho em nossas vidas, como organizarmos nosso tempo de modo a suprir as necessidades financeiras e emocionais de nossas famílias. Além disso, há o principal fio condutor do roteiro: escolher entre o sangue e o coração. Convenhamos que é uma situação que beira a insolubilidade. Como já citado mais acima, qualquer escolha trará sofrimento a todos os envolvidos.

Julgo que a abordagem dada a um determinado tema é fundamental para a excelência de uma obra cinematográfica. A extrema singeleza e o cuidado absoluto utilizados por Koreeda na construção de “Pais e Filhos” passaram, pelo menos para mim, um viés ficcional, ou seja, que não condiz com uma realidade absoluta, que, naturalmente, ninguém gostaria de passar. Achei que as emoções foram muito contidas para uma situação tão dolorosa – até mesmo do personagem Yudai, que é um homem menos frio. Talvez, por conhecer pouco o jeito de ser dos japoneses em relação a seus sentimentos, eu tenha estranhado a compostura dos personagens. Aqui no Brasil, com certeza, tal situação levaria os envolvidos a um tsunami explícito de emoções. Talvez seja realmente a diferença cultural que tenha causado esse comportamento recolhido dos personagens. Não vou colocar isso como um ponto negativo, apenas como uma opinião. Independentemente desse adendo que fiz, “Pais e filhos” mexe com a cabeça do espectador e demora muito para ser “digerido”.  Tudo se resume à angústia.

Termino com um desafio: duvido que, após a audiência desse filme, que você, pai ou mãe de família, não vá beijar e abraçar seus filhos.

O trailer desse dilemático filme, com legendas em português, segue abaixo.

Adriano Zumba


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