A Esposa de Tchaikovsky
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  • Foto do escritorMessias Adriano

A Esposa de Tchaikovsky

Atualizado: 25 de out. de 2023


O compositor e regente russo Pyotr Tchaikovsky possui fama internacional até os dias de hoje pela genialidade nos arranjos de sinfonias para balés e outras músicas clássicas (isso mesmo, as músicas que tocam em Barbie: O Lago dos Cisnes e em Barbie: O Quebra-Nozes foram compostas pelo rapaz aí). A vida amorosa do artista, no entanto, pode ser considerada misteriosa, bagunçada ou triste, dependendo da quantidade de detalhes que se tem conhecimento. O diretor Kirill Serebrennikov decide então mostrar o ponto de vista de Antonina Miliukova (aqui interpretada por Alyona Mikhailova), ou, como o próprio título diz, da esposa de Tchaikovsky (interpretado por Odin Lund Biron).


O filme inicia em um escritório funerário e já nessa sequência inicial há claras demonstrações da idolatria que Antonina nutre pelo homem. Uma pessoa entrar na sala para atrapalhar a conversa tem unicamente o objetivo de dar indícios de como foi conturbada aquela relação que o filme pretende mostrar, o que fica mais evidente nos momentos seguintes. Miliukova nutria por Tchaikovsky um misto de amor louco e admiração cega. Tragicamente, na vida real, a mulher encerrou seus dias em um hospital psiquiátrico, sendo considerada “neurótica e ninfomaníaca”, um diagnóstico no mínimo questionável, se pensarmos nas dificuldades femininas da época.

Por mais que os longos planos de Serebrennikov fiquem um tanto quanto cansativos pela repetição no terço final da obra, os movimentos e decisões envolvendo a fotografia são quase sempre muito elegantes (tal qual um balé), como o rosto iluminado de Antonina nos momentos de juventude, que transbordam algum tipo de esperança no que já sabemos que acabará em desastre, ou o rack focus que vai de um Tchaikovsky preocupado e ansioso para uma Antonina ingênua e feliz em segundo plano, quando o compositor está propondo a moça em “casamento”, em uma conversa que poderia ser facilmente confundida com uma reunião negocial.


Na cerimônia religiosa, o anel e o dedo de Tchaikovsky não encaixam, a vela que ele segura se apaga e o homem treme mais do que Toyota em ponto morto. Quando o casal sai da igreja, um grande número de pedintes os cerca, tudo isso para transparecer o quanto aquela situação vai dar errado, que vai ser desconfortável como uma conversa de quatro pessoas em um corredor apertado (o que realmente acontece na cena seguinte). Esse início e desenvolvimento são avassaladores e essenciais na condução da obra, porque não se limitam a expor somente uma certa crueldade do marido com a esposa, mas também dão elementos que ajudam a pincelar a complexidade daquela relação numa Rússia Imperial conservadora. Muita coisa é deixada no ar e depois esclarecida, num sistema de pista e recompensa que funciona.

As sequências oníricas, no entanto, oscilam entre o exageradamente repetitivo e o simbolicamente curioso, tendo como destaque o trabalho sonoro que envolve pela discrepância entre a tranquilidade das tomadas internas e o caos barulhento e bagunçado das sequências que se passam nas ruas. O turbilhão que se ouve nas passagens conturbadas transparece bem o estado de espírito da protagonista.


Como um drama eficiente, as tragédias e decepções são pungentes, principalmente quando percebemos o significado dolorido da sequência inicial e final: ela seria para sempre a “viúva de um marido vivo”, e, quando de fato ele morrer, somente o “gênio” será lembrado nos escritos, sendo ela relegada ao esquecimento na sarjeta, fruto de um impulso equivocado causado por uma sociedade retrógrada.


 

Nota: 4/5


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