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33 years Cachoeira - (BRA)
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Aspirante a escritor e roteirista, Flamenguista inveterado, estudante do 6ª semestre do curso de Cinema e Audiovisual na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia e apaixonado por todo tipo de mídia audiovisual por onde possa ser contada uma boa história.

Últimas opiniões enviadas

  • Andre Felipe

    Eu gostei bastante do filme porque ele conseguiu trabalhar, na minha opinião, aquilo ao que se propõe (o tema em torno do relacionamento abusivo, masculinidade tóxica e sobretudo, o gaslighting) de várias maneiras dentro da linguagem cinematográfica. Eu imagino que cê saiba o que é gaslighting, mas caso não ligue o termo ao significado (eu não conhecia o termo), vou deixar a definição aqui (da wiki mesmo kk): gaslighting "seria uma forma de abuso psicológico no qual informações são distorcidas, seletivamente omitidas para favorecer o abusador ou simplesmente inventadas com a intenção de fazer a vítima duvidar de sua própria memória, percepção e sanidade", ou seja, uma vítima não consegue ser atendida pois todos costumam achar ou afirmar que ela está louca.

    O filme é mais uma adaptação do livro do H. G. Wells, mas se não é a adaptação mais fiel ao livro é a melhor no quesito "releitura". Eles pegaram um tema atualíssimo e costuraram ao elemento clássico da história original (o homem invisível) usando um monte de alegorias bacanas. O filme não é livre de defeitos: erros de continuidade e até falta de coesão ou "furos" em alguns detalhes podem tirar alguns espectadores do filme, mas eu achei bem pouco relevantes e não acho que estragaram o todo (pelo menos não foram problemas pra mim).

    Aprofundando um pouco mais:

    Comentário contando partes do filme. Mostrar.

    Sobre os temas em si, eu consegui me conectar bastante com a linguagem que o filme oferta, mesmo que não soubesse a correlação entre a temática e alguns símbolos.Pra começar, em quase todas as cenas em que a protagonista aparece existe uma porta atrás ou a frente dela. Eu me perguntava o porquê de tanta insistência, não podia ser por acaso. Então, tentando ligar a temática apresentada aos simbolismos cheguei primeiro a conclusão de que a porta poderia ser uma referência ao que "se esconde atrás da porta".

    Inúmeras práticas de abuso domiciliar, sobretudo contra mulheres vivendo relacionamentos tóxicos onde boa parte delas não conseguem denunciar ou são desacreditadas, fazendo com que tais abusos permaneçam invisíveis. As portas aparecem sempre em segundo plano e quase sempre ela está dentro do cômodo, ou seja, dentro da casa, dentro do estabelecimento, dentro do quarto. A porta pode até estar aberta, mas quando isso ocorre, a sensação que passa é de que a qualquer momento alguém vai invadir o espaço dela, ou mesmo de que alguém está por chegar, alguém que ela sente medo.

    Por falar em medo, todas as vezes que ela consegue sair de um cômodo e cruzar a porta, dos dois um: ou ela entra em contato com o seu medo, ou ela topa com quem a atormenta,forçando-a a se trancar novamente, para se proteger. A porta através do enquadramento e da linguagem cinematográfica também oferta a ideia de aprisionamento quando a protagonista aparece no meio dela (da porta), como se estivesse comprimida entre as duas retas estreitas. É como se dentro daquela "moldura" tivesse sua liberdade restringida, como se a porta a aprisionasse dentro daquele retângulo vertical que vemos em tela.

    Seguindo a ideia do viés feminista que o filme carrega, outra personagem - a filha do policial - em determinado momento, se não me engano, também aparece assim, enquadrada "presa" no centro de uma porta. Se não me engano, neste momento, antes ou depois, ela conversa com o próprio pai pra qual universidade quer ir estudar. No diálogo entre os dois, fica claro que por mais que seja apenas uma preocupação, ao tentar direcionar a filha a seguir uma outra universidade do seu agrado, o pai acaba exercendo também uma forma de controle. Talvez, uma forma de dizer que numa sociedade patriarcal, tal comportamento é parte da nossa estrutura social e é praticamente indissociável sendo que, por vezes, até homens sensatos e conscientes exercem esse tal controle sob os seus ou as suas, em níveis diferentes.

    E se estamos falando sobre controle, o que mais denota controle aqui, do que a insistente aparição de inúmeros corredores? Onde quer que a protagonista vá, ela está rodeada de corredores. Perceba, corredores costumam ser estreitos, mas mais do que isso, corredores só costumam dar duas opções de tráfego: para frente ou para atrás. É quase nula a liberdade de escolha para outro sentido ou direção. Corredores são inflexivelmente planejados a te levar onde quer que eles tenham sido projetados para te levar, e nada você pode fazer para mudar isso. Creio que você tenha percebido a infinidade de momentos em que a câmera trafega de maneira holística pelo cenário, mostrando em segundo plano inúmeros corredores estreitos, sobretudo para dar a impressão de que além do controle e do aprisionamento que a personagem é vítima, existe sempre a sensação de que alguém a vigia.

    Sobre isso, essa ideia de uma presença invisível, o filme trabalha a linguagem em consonância com o roteiro para emular a impressão de um psicológico abalado, uma paranoia ou neurose: não são poucos os momentos em que você se pega perguntando "será que tem alguém ali?" e muito disso se deve a cenografia. Várias vezes você pode ver em segundo plano roupas e acessórios que trazem a impressão de que se existe um homem invisível, ele pode estar ali atrás, as usando. Assim como a protagonista, o público também parece "enlouquecer" pouco a pouco. Cecilia, pode ser sã, mas não consegue provar seu ponto aos que a cercam sem parecer estar fora de si.

    O filme se transforma então num suspense psicológico muito bem dirigido, onde a questão é: ela está louca ou, de fato, existe o homem invisível? Em determinado momento o filme parece que se encaminhará para um final em aberto, onde o público decidirá por si mesmo qual a resposta para esta questão. A frase dita por Frank, o irmão advogado de Adrian, algo como: "ele conseguiu o que queria, morreu, mas permanece vivo dentro de sua mente" só contribui para a ambiguidade. Até o fim do segundo ato, o filme trabalha o suspense através da "sugestão", tudo é bem minimalista e sutil e isso, na minha opinião, só melhora a qualidade do suspense.

    Mas próximo do fim, a sutileza acaba. Meio que pra dar dinâmica e fazer a personagem agir com mais contundência, o filme ganha ação, mas perde o lado sugestivo. Não incomodou tanto pra mim. Mas como disse acima, o filme poderia terminar aos moldes das "minitramas" levantando a discussão sobre a sanidade da protagonista. Deixe-me explicar: deixando o espectador decidir sobre a sanidade da Cecilia, o filme atuaria como um exercício de metalinguagem em que a maior crítica está em medir em nós mesmos (como espectador e indivíduo) se faríamos parte daqueles que endossam o ceticismo a cerca da denúncia feita pela vítima ou se praticamos o ato de dar voz a esta vítima, para que esta sinta-se ouvida e tenha sua denúncia investigada com afinco.

    O filme resolve, no entanto, fechar seu final e responder o que acontecia de fato. Não foi ruim, muito pelo contrario, curti bastante. Mas talvez fosse melhor levantar a discussão. Imagino como seria, enfim. Por outro lado, é interessante como ao final, o tema mais trabalhado aqui seja justamente o gaslighting. Termo criado para a peça teatral Gas Light, que mais tarde devido a suas adaptações cinematográficas, acabou sendo propagado e perpetuado até ser utilizado na literatura clínica que aborda a questão do abuso.

    O filme desde o início levanta suspeita sobre a sanidade da protagonista, mostrando ela levar comprimidos de diazepam e depois perdê-los. A protagonista sofre de gaslighting o filme todo: ela vive constantemente desestabilizada e paranoica, mas todas as vezes que tenta sair desta prisão é vista como louca. Ninguém a entende. A casa tem muitas portas fechadas, outras abertas. Ela está se trancafiando dentro da casa, mas ter as portas abertas a fazem temer uma invasão a sua privacidade. Ela tenta se proteger da invasão, mas não consegue. Pois o perigo já está dentro dela ("Ele conseguiu tornar-se imortal dentro de sua mente"). Em certo momento ela diz: "Isso é o que ele faz, ele me faz sentir como se eu fosse louca".

    No jantar final, se reparar, existem quadros ao redor da mesa, um atrás do Adrian e outro atrás de Cecilia. Os quadros mostram algo como algumas rampas ou passagens, trajetos, caminhos, corredores estreitos. Marca que no filme inteiro perseguiram a protagonista, só que agora, quando ambos - Cecília e Adrian - parecem em pé de igualdade, o símbolo de controle parece estar a sombra dos dois. Ele tenta trazer ela pra perto, mas algo mudou dentro dela, ela está em busca de algo mais libertador. Ambos estão em busca da cartada final. E, bem, no fim, ela finalmente se liberta.

    Outra coisa interessante e alegórica no filme é o cachorro Zeus. Uma alegoria ao Zeus do Olimpo que para além de correlações quanto a animalidade ou sua forma de chamar a atenção e fazer barulho, tem como outro forte exemplo alegórico a ideia de masculinidade tóxica, vide sua relação com Hera, uma de suas esposas e símbolo de uma feminilidade em desvalia, em que por mais que Zeus fosse um escroto, continuava ligada a ele, já que na mitologia grega as mulheres costumavam ser retratadas como rivais entre si, muitas vezes lutando pelo homem amado, ou pela a preservação da unidade familiar, algo bem comum a sociedade patriarcal, cultura essa que com certeza bebeu das influências da sociedade grega e perdura até hoje.

    Para dar exemplos do que menciono acima: no início do filme, o primeiro plano, me veio em mente alguma semelhança entre o Olimpo grego e a casa em que eles moravam, (viagem total ou faz algum sentido? eu achei que lembra, mas posso tá viajando); Zeus costumava se metamorfosear, entre outros fenômenos, de animais quando entrava em contato com os mortais; Zeus podia lançar raios que propagam o barulho de trovões quando quer demonstrar sua insatisfação com os mortais - lembra como o ex marido da protagonista (Adrian) acorda? Sim, com o barulho ocasionado por zeus (o cão).

    Ao fim do filme a protagonista deixa o corredor estreito da casa em que sofreu boa parte de seus traumas e, aparentemente, encontra a paz que tanto procurou sentindo a brisa fria bater em sua face como um carinho conquistado à sangue e dor. Ela sorri. Está enfim, livre. Abriu a porta que a mantinha presa. Uma atuação primorosa de Elisabeth Moss, a maior qualidade do filme, para além de tudo que falei aqui.

    É isso.

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  • Filmow
    Filmow

    O Oscar 2017 está logo aí e teremos o nosso tradicional BOLÃO DO OSCAR FILMOW!

    Serão 3 vencedores no Bolão com prêmios da loja Chico Rei para os três participantes que mais acertarem nas categorias da premiação. (O 1º lugar vai ganhar um kit da Chico Rei com 01 camiseta + 01 caneca + 01 almofada; o 2º lugar 01 camiseta da Chico Rei; e o 3º lugar 01 almofada da Chico Rei.)

    Vem participar da brincadeira com a gente, acesse https://filmow.com/bolao-do-oscar/ para votar.
    Boa sorte! :)

    * Lembrando que faremos uma transmissão ao vivo via Facebook e Youtube da Casa Filmow na noite da cerimônia, dia 26 de fevereiro. Confirme presença no evento https://www.facebook.com/events/250416102068445/

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