Maria Lucia

Achei o filme bastante fiel ao texto de Nelson Rodrigues. Essa peça é uma de minhas favoritas do dramaturgo, pela forma como denuncia a hipocrisia do indivíduo conservador. Não é em vão que as obras do Nelson incomodam tanto. Penso que no fundo, todo mundo encontra um pouco de si, daquilo que prefere não saber sobre si. Nesses tempos sombrios onde discursos totalizantes imperam, cada dia fico mais convicta de que estamos vivendo em uma grande peça de Nelson Rodrigues.

"Let us just say I was deeply unhappy, but I didn't know it, because I was so happy all the time."

Hable con ella não é um filme sobre o amor, no sentido estrito de nossas representações. Na verdade, gira em torno de um dos aspectos de nosso psiquismo que afeta nossas relações que é a repetição. Benigno jamais poderia ter qualquer relação com Alícia se esta não estivesse na situação de invalidez na qual ele se dedicou a ela. Não podemos esquecer, que antes de tudo acontecer, Benigno passou a vida cuidando de sua mãe inválida: dava banho, fazia as unhas, cabelos, falava com ela... Benigno não tinha outra referência de relação além dessa que estabeleceu com a mãe (como um pai, por exemplo) e a única forma de se relacionar (que ele conhecia, podemos dizer) com seu objeto de amor, era nessa posição de cuidador. Outro momento em que isso se faz presente, é na história de vida de Lydia, filha de um toureiro que levou o nome daquilo que já estava predestinada a seguir, já que em espanhol "tourada" se traduz por "lidia con toro" ou simplesmente "lidia". Certamente, o nome e a profissão não foram ao acaso. Além desses aspectos, esse filme tem milhares de outros que podem ser explorados e discutidos. Mas acho que a repetição é o que permeia toda a história e da um norte para pensarmos o desenrolar das cenas. Considero uma obra-prima do cinema espanhol e, sempre que posso, gosto de passar pela experiência de reassisti-lo!