Que nota é essa?????? Esse é de longe um dos melhores documentários da temporada!! E eu só leio aqui gente que deu duas estrelas porque foi parcial, sendo que um documentário não precisa ser imparcial, é um genero cinematográfico e não um artigo jornalístico. Gente dizendo que o documentário é massante, pelo amor de deus!!! O filme fala sobre uma morte impune sem julgamento, sem justiça, do irmão da diretora e produtora em um caso clássico de violencia racial institucional. Quem consegue reclamar de como a história foi contada???? O filme mescla direitinho inumeras camadas e conclui um roteiro muito bem amarrado, com um final perfeito e uma direção impecável. Sinceramente, as vezes me espanto com a avaliação dos usuários do Filmow.
Talvez a execução mais bem sucedida da Disney da sua geração de musicais em live-action. A fluidez do filme é boa, muito do roteiro se preservou da obra original, porém faltou. Faltou aquela magia mais enérgica versão em animação e faltou uma Bela de verdade. Emma Watson entrega uma atuação medíocre, por vezes quase sem expressividade e que não convence o espectador a se apaixonar por uma das mais interessantes princesas da Disney.
O filme é belíssimo em figurino e em direção de arte e uma movimentação de câmera fabulosa. Destaco a serie de referencias que o filme faz a outros clássicos do gênero musical, a mais clara em referencia a canção titulo de The Sound of Music na iconica perfomance de Julie Andrews, quando Bela corre para uma especie de campo. Outra referencia é no número de Be Our Guest, onde o diretor recorre a uma referencia das sombras de Bob Foss, o mesmo número apresenta clara referencia a Busby Berkeley em seu trabalho Footlight Parede (1933).
Além disso, achei algumas falhas no convencimento da dublagem das canções da Fera, os efeitos especais não convencem, e parece existir até certo erro de sincronia no som, algo estranho para um indicado ao Oscar de Melhor Mixagem de Som. Enfim, o filme agrada, encanta, e apesar de seus erros é a joia mais recente da Disney em seus live-actions superando "Malévola", "Into the Woods" e "Cinderela".
Tecnicamente impecável em imagem e som. Roteiro meia boca, se esvazia em um trama com um ritmo legal, com núcleos muito bem elaborados e fechadinhos, mas a sensação que fica no final é que faltou uma conclusão melhor do enredo. O diretor optou pelo final "aberto" tentando abrir possibilidade para uma continuação, mas isso fez o filme ficar pouco conclusivo e com um final ruim. Muito se trabalhou a trama e no ponto de climax a história não se conclui, não tem um encerramento digno.
A direção de arte é outro ponto forte. Atuações medianas, com salve para o tedioso trabalho de Jared Leto. A direção explorou bem o conceito de um dos filmes mais respeitados no meio Sci-fi, mas não entregou seu melhor, acredito. Memorável para o gênero, mas não o suficiente em conteúdo para se tornar um dos grandes nomes do ramo.
Confesso que não estava no meu melhor estado quando vi o filme, e por isso talvez tenha achado-o, por vezes, arrastado demais, mas é inegável que se trata de um bom filme.
Acho interessante como o filme começa construindo o jovem num ato quase messiânico do bom homem branco que se dispõe a viver em meio a comunidades carentes onde faz amigos, dá seu dinheiro para o estudo de crianças e se dispõe a viver um pouco da realidade daqueles homens e mulheres comendo da mesma comida, aprendendo suas musicas, caçando coelhos. O homem branco que se incomoda em ser chamado de branco, porque afinal ele é brasileiro! O turista que não gosta de ser chamado de turista, porque ja se sente parte dali (será?). O filme começa a desconstruir o protagonista com a chegada da namorada, onde é possível se analisar o personagem para além da atmosfera do jovem inteligente e aventureiro. O rapaz questiona o trabalho da namorada em pensamentos conservadores e machistas, em uma discussão estupida (e num belo plano sequencia, onde a naturalidade e sintonia se destacam) sobre faculdade e como ele não se identificava com os seus "amigos da PUC", mas que na verdade ele era simetricamente idêntico ao perfil "reaça" e elitista de seus colegas, independente de suas vontades humanitárias. Para Gabriel seus problemas são não ter sido aprovado em Harvard e o quanto ele sofreu em sua viagem ao Himalaia, e talvez, a recusa de sua namorada quando ele a convida para morar com ele em Los Angeles, porque afinal só ele havia recebido uma bolsa lá, não ela, e ele a pergunta "Eu não sou motivo suficiente?" e ela o responde "Não". Um personagem imaturo, talvez pela idade, e um perfil tradicional daquele que mesmo conhecendo os lugares mais diferentes do mundo, em contato com as mais diferentes realidades, continua preso a sua imaturidade e egoismo, e quem sabe, arrogância. Arrogância de tentar ouvir com mais atenção as pessoas dos países que ele visita, seu guia no trajeto para o Monte Mulanje ou a sua falta de sensibilidade com seu guia do Safari, quando discute com o homem por um transação em seu cartão de crédito, quando talvez lhe bastasse entender que ele não tinha a menor culpa, porque seguia uma percepção de realidade muito diferente que a de Gabriel. O rapaz viu isso, uma transação de cartão de crédito errada, como motivo suficiente para ignorar todo seu carinho de "irmandade" e tratar o homem de forma estúpida. O filme tem um cuidado todo especial com a fotografia e edição, em cenas quase experimentais e cheias de movimento. A direção é inegavelmente um dos melhores trunfos do filme, é incriável a capacidade do diretor em conduzir atuações de pessoas que não são atores e conseguir atuações tão genuínas, por outro lado, o trabalho de João Pedro Zappa deixou a desejar. A fluidez do filme é boa, talvez com exceção das ultimas cenas em que o filme torna-se lento demais, e o espectador, que já sabe que Gabriel está morto, se cansa, porque não há surpresa, não há grande atenção por uma cena que já se sabe o fim e que dura mais do que se espera. Ainda assim, as narrações são bem trabalhadas e compõe uma narrativa não linear que dinamiza o filme, da mesma maneira, acho um acerto colocar o final no começo, porque acomete ao telespectador uma perspectiva diferente sobre a história.
Um bom filme, talvez com alguns pontos soltos, mas uma boa realização do cinema nacional.
Quando a Amy morreu eu tinha 11 anos, e lembro direitinho de quando anunciaram sua morte aos fatídicos 27 anos, naquela época eu conhecia por alto seu trabalho e me chocava quando via sua aparência deteriorada pela bulimia e pelo uso de drogas, inclusive lembro das fotos em sua vinda ao Brasil pouco antes de sua morte e de seu estado e de como aquilo era de alguma maneira triste para mim, embora eu tivesse apenas 11 anos e não tivesse grande noção sobre quem ela ou o que ela fazia.
O documentário traz aquela sensação tão triste de uma pessoa tão doce e com um talento tão absurdo que se perdeu entremeio a fama absurda em uma idade tão prematura, ela, claro, sempre lidou com problemas complexos demais para a sua idade e talvez jamais conseguisse lidar com a fama, aquilo a destruiria como ela disse em um dos áudios revelados pelo documentário anos antes de sua fama explodir.
A tragédia de Amy não é sua tragédia pessoal apenas, é uma tragédia de dezenas de milhares de pessoas envolvidas na psicose absurda de ganhar dinheiro com seu talento e com sua imagem, é uma tragédia cruel e difícil de engolir, porque mais uma vez a mídia e a industria levou para a morte e para o fundo do poço um dos maiores talentos de nosso tempo. Como esperar que uma menina tão frágil pudesse lidar com tanto?
É triste pensar que ela morreu com 27 anos, com uma vida inteira pela frente. É trágico pensar no tanto que ela poderia ter dado para nossa arte, para nossa geração, tudo o que ela poderia ter contribuído para sua paixão, a musica, mas que foi impedida por seu fim tão prematuro. É vergonhoso pensar naqueles que acharam engraçado ou proveitoso zombar de uma pessoa tão doente e esgotada, leva-la ao precipício de si mesma. No final, eu só consigo me perguntar o que eles fizeram com ela?
Helena Solberg disse uma vez que sempre pensava no "quanto se perde quando somos vistos pelos estrangeiros". Confesso que já depositei sobre esse filme uma critica assimétrica e quase irregular, desconsiderando que esse era um filme de 1940, de uma Hollywood viciada em estereótipos na sede absurda de construir ícones. É inegável a artificialidade do filme e os estereótipos sexistas sobre a mulher latina, na personagem de Carmen uma mulher que tem sua vida e roteiro dedicado a vingar seu ciumes por seu namorado jogando sapatos e bolsas em sua cabeça. No entanto, é preciso que se faça uma análise que vá para além disso. O filme começa com o brilhante número "Chica Chica Boom Chic" um dos melhores de Carmen na Fox, quando Don Ameche surge e dispara seu discurso automatizado que parecia ter sido assinado pelo próprio Roosevelt o caráter esdrúxulo do filme aparece, no entanto, era a política da boa vizinhança sera impossível escapar disso. Nesse número quando Carmen e Don Ameche dividem a câmera cantando a cena se divide entre as duas Américas, a América do Sul, representada por Carmen, a América feminina, exótica e deslumbrante, quase cômica, e a América do Norte, representada por Don Ameche, a América masculina do homem elegante, em uniforme bonito e em chegando em um carro cercado de mulheres tão elegantes quanto ele - essa era a imagem do pan-americanismo que Zanuck tentava construir a favor de Roosevelt. No entanto, há nesse filme aspectos que voltariam a se repetir na sequencia de filmes voltados para esse política, o primeiro deles é que o homem de negócios, o protagonista e o homem central da problemática não romântica é o brasileiro e não o americano, numa tentativa de tentar criar um personagem latino que fosse melhor assimilado pelos telespectadores tentando evitar o fiasco de Down Argentine Way, um ano antes. Em segundo lugar, o par romântico da mulher latina é um americano e não um latino com simetrias comportamentais a personagem de Carmen. Em terceiro ponto, Carmen é Carmen e não uma Chiquita, Dorita ou Rosita, a sequencia absurda de nomes ridículos que viriam a se suceder as personagens de Carmen pelos proximos anos na Fox. Além disso, três musicas em português são cantadas, uma inclusive por Don Ameche. Além disso tudo, é incontestável que o roteiro é maravilhoso, a história é criativa e muito bem amarrada, ao contrário do seu sucessor Down Argentine Way, a direção é criteriosa e as cenas de Carmen são muito bem elaboradas, com frases e tiradas muito boas. Alice tem seu potencial musical pouco explorado, apenas uma música é dedicada a ela. A química de Carmen e Don Ameche é um dos trunfos para o filme, uma química que saltava aos olhos, principalmente no último número quando Carmen e Don se abraçam cantando I Like You Very Much. Carnen tem uma seleção impecável de figurinos e seus números musicais são memoráveis, sua personagem, mesmo com uma perspectiva sexista e estereotipada da mulher latina, é uma mulher inteligente e nem um pouco submissa a seu namorado, suas cenas são divertidas e suas frases disparadas repetidas vezes em português são uma das melhores partes de sua atuação. Um filme indispensável para o amadurecimento da persona hollywoodiana de Carmen e uma experiencia quase muito bem sucedida da Política da Boa vizinhança, um dos melhores em termos tecnicos e culturais da leva dedicada a America Latina, uma obra importante para o entendimento desse cenário político e para relembrar o poderio absoluto de Carmen consagrando-se com uma das maiores deusas do tempo de ouro de Hollywood.
As intenções não são grandes, obviamente, é um especial de fim ano da Netflix e não um longa de Coppola, mas o filme entedia. O roteiro é fraco, a história é esparsa, nada brilhante e nada além de "bom". As musicas são boas, e o auge é quando Miley e Clooney aparecem, ainda assim, o ultimo número dessa sequencia é pra lá de sexista. O som e a fotografia estão ótimas, como de esperar da Netflix, e o especial de natal apenas esquecível, algo que não se espera de Sofia Coppola.
Uma analise densa em que as duas maiores ideologias politicas do nosso tempo são questionadas. O casamento com uma ideologia a ponto de beirar uma obsessão desmedida é uma das chaves para se entender o filme. Teriam realmente as coisas mudado profundamente? A impressão, por mais que demonstre a euforia e mudança, é que tirando os desertos de moveis abandonados, o consumo acelerado de produtos importados e a reviravolta cultural vivenciada pelos personagens, sua realidade parecia em profundidade igual. A ideia do filme vai para muito além de vitória ou fracasso de um sistema ou outro, ela mostra quão rápido a ideologia e vida de muitas pessoas se desmancha no ar. O filme questiona a queda do Muro de Berlim como um fracasso do socialismo, pelo contrário é a renovação de falsas ideias, é o expurgo daquilo que parecia ir para muito longe da concepção libertária e isonômica do socialismo, a revolução não seria contida por muros e não seria calada pelo consumo. "O socialismo não significa viver atrás de um muro. O socialismo significa chegar aos outros e viver com os outros”. Uma das questões mais pontuais do filme é a verdade. Ela é relativa e se distorcia dentro do quarto de Kathrin e através de seus olhos. Talvez uma frase de Machado de Assis resuma essa ideia: "Não é a verdade que vence, é a concepção".
O filme só vale por conta de Carmen Miranda. Assisti há alguns anos atrás, e hoje pude notar coisas que antes não havia notado. O figurino, bem como a maravilhosa fotografia em tecnicolor, é um show a parte, e fazem justiça às suas três indicações ao Oscar de Melhor Figurino, Melhor Fotografia e Melhor Direção de Arte. O cenário, bastante artificial (um erro recorrente nos musicais "para a America Latina" da Fox), não convence. O roteiro em si é desajeitado, não deixando realmente claro a história com os Crawford e muito menos como Glenda e Ricardo se acertam depois do conflito que sucede os números musicais de Carmen "Mamãe Eu Quero" e "Bambu". Além dessa falta de coesão no roteiro, ele ainda conta com piadas fracas e, na maioria das vezes, ofensivas ao povo argentino. O filme, que foi um desastre na Argentina, sendo previamente proibido e depois arruinando cinemas pelo país, parece fazer uma confusão com a America Latina e Argentina e reafirma estereótipos: o argentino sujo, burro, desdentado e que fala com os animais, o argentino que não entende o idioma e faz enormes confusões com ele, o argentino motorista que vive dormindo. Isso sem falar da relação de subalternidade dos "nativos" e como são tratados com violência e desprezo pelos americanos. O final é um filme com um roteiro desastroso, com ritmo pouco fluido e que entedia, uma linda fotografia aliada a um figurino poderoso (que peca ao dar a Carmen uma única baiana, erro que a Fox jamais cometeria de novo, visto que cada baiana de Carmen é uma oportunidade absurda de demonstrar a figura exuberante e cheia de cores para o inabalável tecnicolor da Fox) e um cenário pouco glamouroso, conta ainda com belos movimentos de câmera e enquadramentos que junto com uma fotografia maravilhosa faz do filme uma bela experiencia visual. O "cardápio" de músicas foi um dos piores dos musicais da Fox, canções fracas e nada marcantes, se não pelas canções "South American Way" e "Mamãe Eu Quero" que eternizariam a então estrela da Broadway e fenômeno mundial, Carmen Miranda, que salva o filme e torna-o de alguma forma relevante para a posterioridade, com uma participação estonteante e uma presença de cena incrível ela conquista Hollywood com menos de 10 minutos nas telas, explodindo cores e ritmo. Carmen, provavelmente, junto com os Jonas Brothers, é uma das poucas coisas legitimamente latinas em um filme feito para agradar a America Latina, e que falha miseravelmente nessa tentativa politica e cultural.
Um filme leve e interessante, porém, fraco e previsível. As atuações não são tão convincentes e o caminho da história é quase clichê. A fotografia, principalmente nos períodos com luz de sol intensa, é péssima, me lembrava constantemente um comercial de margarina ou um filme de baixo orçamento que comumente é fatiado e postado nas redes sociais.
No entanto, coisas que eu achei importantes e relevantes na narrativa: a recusa do casal em primeiro momento de ficar com um menino mais velho, a homofobia de Patrick que rompe a empatia do publico com o persongaem, a dificuldade e os problemas da adoção por casais homossexuais vista de dentro, a marginalização e o trauma de Patrick em uma analise emocional mais densa, o pai que tira o filho do consultorio de Goran por ele ser um médico homossexual. Pontos equivocados: a volta do casal foi muito abrupta e artificial para emocionar ou convencer, por vezes não ficava claro se Patrick ficaria mesmo com Goran, o alcoolismo de Sven ter sido abordado de forma rasa e curta, a relação de Patrick com a filha de Sven poderia ter sido trabalhada de forma melhor (bem como a própria personagem), o passado de Patrick poderia ter sido trazido mais vezes a tona, e o final ficou confuso, embora acho que teria sido ideal Patrick terminar com Goran, o diálogo foi curto e pobre, apesar de ter sido engraçadinho.
Um filme as vezes bobinho que pode ser entendiante, e que poderia ter usado melhor de sua narrativa, mas ainda sim um filme leve e importante.
Uma narrativa real, personagens densos, a perspectiva feminina. Uma obra prima de Scorsese, que mostra o drama cru de uma das muitas Alices que lutaram e lutam pela dignidade de sua realização pessoal. Um romance nada idealizado, aonde a civilidade masculina é colocada em cheque inumeras vezes a ponto de você sentir em profundidade o drama da personagem e desacreditar na busca por um parceiro. O
final do romance é incerto, parece que mais uma vez a história tinha inúmeras chances de se repetir e dar errado, mas por alguma razão Alice estava lá no caminho de sua realização que foi adiada e esquecida pela vida matrimonial abusiva e infeliz.
Suas chances são poucas, suas certezas são rasas, mas ela continua em sua busca intima de felicidade. E mesmo que tudo dê errado ela está em seu lugar, porque o lugar que você pertence é o lugar aonde você quer ir.
Um bom filme, principalmente ao se tratar dos elementos visuais do filme, o que de qualquer forma não é novidade na filmografia do Wes Anderson, além de uma trilha sonora impecável. O filme começa bem, tem um desenvolvimento morno, e só depois dos 50 minutos volta a tomar ritmo. Senti que faltou em alguns momentos uma maior profundidade na relação pai-filho que o filme traz, algo que Wes conseguiu trazer em The Royal Tenenbaums, mas que só recuperaria uma carga emocional mais sólida com Moonrise Kingdom. O cenário, principalmente o navio em corte, está simplesmente impressionante. A última cena não podia ser melhor. Há algo de muito atraente nesse filme, mas que em alguns momentos não entrega o necessário em roteiro e em carga poética (traço fundamental da obra de Wes Anderson, pelo menos depois de Zissou). Mesmo esperando um pouco mais, The Life Aquatic with Steve Zissou confirma o excelente trabalho, de forma geral, de Wes Anderson, como um dos mais brilhantes diretores de nosso tempo.
Uma surpresa e uma meia decepção. 'Tanna', o concorrente australiano a estatueta de melhor filme na edição 2017 do Oscar, é um filme razoavel, com seus muitos erros, mas com seus inúmeros acertos. E, mais do que isso, um filme inovador.
A história do colonizado e do colonizador sempre foi materia atrativa para a indústria artística, e quase sempre contada da perspectiva nativo x forasteiro e quase sempre de forma irresponsável sem ser coerente com o idioma e a cultura nativa, a velha história da visão da América sobre outros povos. E nisso, Tanna, se diferencia abruptamente. Tendo como idioma os dialetos Nauvhal e Nafe, contando com a atuação dos próprios nativos da ilha e filmada inteiramente em locação em Tanna, o longa nos propicia uma visão mais documental da história.
Os diretores Martin Butler e Bentley Dean, que são essencialmente documentaristas, começam o filme da forma errada. A enfase documentária e insuficiência artística nos primeiros 30 minutos cansa o telespectador. A falta de preocupação com traçar um perfil mais exato da tribo, e simplesmente juntar cenas retratando seu cotidiano e cultura (foco importantíssimo do filme, ainda mais importante que a história em si) formando um mosaico experimental, deixa a desejar e afeta na compreensão do enredo que se segue, ou seja, quem assiste tem de forçosamente entender as designações e nomes usados na tribo.
A fotografia, grande aliada do filme, deixa a desejar em certos momentos adotando enquadramentos que valorizariam a atuação do elenco, o que não acontece, uma vez que o elenco é meramente amador. Em outros momentos a fotografia se torna o ponto alto do filme, exaltando a beleza da paisagem, com grande destaque para as cenas no vulcão, momento com grande enfase na trilha sonora, que se desenha durando o filme de forma minima e discreta. A iluminação simples que outrora se torna um problema, em determinados momentos valoriza o aspecto documental do filme. Por fim, uma fotografia clichê, simples e bastante sensível, mas que no entanto não conquista como deveria.
A baixa dinâmica cenográfica, por incrível que pareça, dá ao filme um toque humano e inocente, propiciando as cenas de amor do casal principal uma leveza impressionante. O roteiro segue um caminho formulado e superficial, mas não menos delicioso. O que se traça como um Romeu e Julieta indígena, tange um aspecto muito mais profundo que isso. A força do amor é em oposição ao conservadorismo, é o amor vencendo aos costumes e a tradição, uma história que comprova a universalização do enredo, que por sinal é baseado em fatos reais, e a alta aplicabilidade desse conceito em situações contemporâneas. A história contata pelos Yakel como símbolo do que chamam de “paixão livre" sai do meio nativo e se projeta da sociedade atual.
'Tanna' é acima de tudo uma experiencia incrível de uma história belíssima, com suas falhas, mas que se erra na superficialidade, acerta no formato inovador e quase experimental. A insipidez no enredo é preenchida pela imensa atemporalidade da história e pela fidelidade documental aos fatos e aos costumes dos povos da pequena ilha de Tanna. Uma história sobre um amor progressista, que muda costumes, que clama por liberdade e une diferenças. Uma mescla, por vezes harmoniosa, por vezes desconfortável, de documentário e drama, que apesar das falhas acerta ao retratar uma experiencia ainda pouco comum no cinema. Com certeza, não chega perto da estatueta de melhor filme, mas que mereceu estar entre os cinco finalistas.
Simples e preciso. "Under Sandet" é um longa que traz a tona uma fato pouco conhecido sobre o evento mais explorado pelo cinema, a Segunda Guerra Mundial, e trabalha com ele de forma limpa e delicada, fazendo do filme uma exceção entre os muitos filmes de guerra.
A violência do filme é moderada, e o cuidado com a tensão de desarmar minas é passado para quem assiste por meio de enquadramentos próximos aos atores e às suas ações.
O grande acerto do filme é também seu grande furo: o roteiro e a direção. Martin Zandvliet desenha a história com precisão, a ponto de em poucos minutos deixar o telespectador ciente do que se passa no filme. As cenas da desmontagem das minas são muito bem escritas e dirigidas, tal como, os momentos do filme que mostram o ódio em relação aos nazistas, e a forma com que isso muda quando o Sargento começa a vê-los como crianças, como seres humanos, independente da noção de inimigo ou não, uma reflexão válida em tempos de extremo radicalismo como o que vivemos, hoje. Cenas como a do inicio do filme, aonde o sargento espanca um soldado nazista, ou como a cena aonde o cachorro é morto ou a cena aonde o primeiro menino é explodido, mostram um cuidado especial no caminhar da história que não se concentra apenas no lado brutal daquela situação, mas também no lado psicológico e emocional que envolvia cada personagem. No entanto todo o cuidado e sensibilidade na condução do filme parecem ir por água baixo quando o ritmo se altera abruptamente, no minuto 60 o Sargento dá um tapa na cara de um de seus soldados, minutos depois ele está jogando futebol com os meninos, algo que realmente me pareceu incoerente e me incomodou um pouco. O final por sua vez é perfeito, sóbrio e coerente com a história.
Outro ponto alto do filme é a perfeita edição de som, os pregos sendo soltos, caindo na areia, as minas explodindo, etc. E a mixagem de som se alia a direção para agravar certos momentos, quando uma mina explode, por exemplo, a trilha sonora (que aliás é magnifica) é interrompida pelo som da explosão que é seguido por um silencio e um plano geral, comovendo quem assiste.
Um filme muito bem trabalhado, com suas falhas, mas com seus muitos acertos. Mas, me parece que faltou alguma coisa, e, também, não sei dizer o que é, mas faltou algum bom clímax. Não acho que seja um grande concorrente a estatueta de Melhor Longa Estrangeiro. A disputa mais acirrada com certeza fica entre Irã (The Salesman) e Suécia (A Man Called Ove). Apesar disso, um bom filme que mereceu estar entre os 5 finalistas.
Taí, um filme que ganhou meu coração desde os primeiros minutos. "En man som heter Ove", o representante sueco no Oscar de Melhor Longa Estrangeiro, é um dos perfeitos exemplos de como o cinema europeu tem tanto para nos oferecer.
O filme conta com uma grande história, retratada cuidadosamente e de forma simples pelo diretor Hannes Holm. Ove é um personagem que de inicio parece não apenas clichê e desagradável, como também previsível, mas aos poucos, com um roteiro muito bem elaborado de Holm e com a atuação brilhante de Rolf Lassgård, o personagem cativa ao se mostrar ao mesmo tempo de forma rabugenta e encantadora. O filme, que vai desdobrando a história aos poucos, mostra a dura história de Ove, e nos faz repensar a primeira impressão que tivemos do senhor de 59 anos.
Um drama muito bem pensado que alia de forma perfeitamente equilibrada o sentimentalismo e a comédia (inclusive, algo inédito nos indicados na categoria estrangeira do Oscar). Os flashbacks não só aparecem de forma bem espaçada, intercalando tempo real com passado, como surgem de forma genial em suas tentativas de suicídio.
A história, apesar de bastante previsível, se constrói de forma cuidadosa e revela uma carga emocional enorme em volta de Ove, um homem que perdeu a mulher, perdeu o filho, o pai, que teve a casa incendiada, e o antigo amigo em estado vegetativo, um homem pela qual a vida não teve a menor piedade. Uma história tão forte, que faz o telespectador compreender o lado ranzinza do protagonista.
Sua vida alterada pelos vizinhos, ganha a razão que lhe faltava, sem emprego, sem a mulher, e repetidas vezes dizendo para si mesmo "você tem que aguentar". E mais do que isso, o filme não é apenas um drama, ele traz consigo uma filosofia de que as coisas precisam da reviravolta necessária para atingirmos melhores momentos. A critica social não passa despercebida, não só pelo retrato da Europa atual (quando Ove, funcionário há 42 anos, perde seu emprego e como reconhecimento recebe uma pá) mas também de uma critica a sociedade contemporânea, ao avanço incoerente do progresso que tira do homem mais humilde tudo o que lhe resta (para Ove, sua casa e seu emprego, para sua vizinha, o minimo de assistencialismo para com seu marido), representado no filme pelos "homens de camisa branca". O filme ainda levanta questões atuais como a homossexualidade e a falta de inclusão das pessoas deficientes.
O filme revira o emocional de quem assiste e refaz o Ove na cabeça do telespectador, ele não era apenas um homem ranzinza, era, na verdade, uma pessoa incrível que mesmo com tudo se mostra uma pessoa indescritivelmente disposta a ajudar os outros. A sua simplicidade durante o primeiro jantar com sua esposa, comove. A sua preocupação pouco antes de morrer para que não deixassem a ambulância entrar dentro do condomínio, desperta risadas. E talvez esse misto carregue o filme de forma estupenda, revelando aos poucos uma história genuinamente grandiosa, contata de uma forma simples e não menos emocionante.
E, como era de se esperar de um bom filme europeu dos ultimos anos, o longa ainda conta com uma fotografia não apenas limpa e cuidadosa nos enquadramentos e movimentos de camera, mas também nas cores. Os flashbacks, apresentam cores mais vivas, representado os melhores anos de Ove, e os tempos atuais mostrar cores mais sóbrias e mornas, representando a vida tediosa do protagonista sem sua esposa. A trilha sonora de Gaute Storaas é outro ponto forte do filme, tal como a maquiagem que rendeu ao longa outra indicação ao Oscar (Melhor Maquiagem e Cabelo).
Um filme grandioso, simples e perfeitamente delicado. Meu favorito na disputa de Melhor Filme Estrangeiro, na edição do Oscar de 2017. <3
Esse filme me deixou confuso do começo ao fim. E por mais bizarro que seja a história ele traz como pano de fundo uma grande teoria sobre relacionamentos na sociedade moderna.
No tempo da liquidez do amor, a humanidade chega ao ponto da proibição de não ter um parceiro ou uma parceira. É proibido ser solteiro ou solitário, e qualquer ato de auto-satisfação seja ela sexual ou não é brutalmente condenada. Caso você descumpra essas leis você deixa de ser humano, ou seja se você não encontrar alguém, você não existe mais.
E o relacionamento, por sua vez, não é mais baseado no amor e nos sentimentos, e, sim, em detalhes ridículos que de pouco em pouco se mostram insuficientes para sustentar qualquer relacionamento, tão insuficientes que por vezes é necessário um filho para que se mantenha certo sentido em estar junto, mais uma vez pela razão errada. Os casais se odeiam, a ponto de terem coragem de matar seus parceiros, como acontece com os donos do hotel. Todos, e absolutamente todos, são plenamente infelizes, por viverem daquela forma, numa sociedade aonde o amor simplesmente não é razão para se estar junto com alguém.
O que de cara parece uma teoria besta, é nada mais do que uma versão irônica e bizarra da forma com que os homens tratam os relacionamentos nos dias de hoje. O chamado 'amor liquido' (de Zygmunt Bauman) talvez fosse o principal ponto de crítica do filme.
Além toda genialidade filosófica por trás do roteiro de Yorgos Lanthimos, o filme conta com uma fotografia belíssima, que me incomodou muitíssimo de não ter sido indicado ao Oscar de Melhor Fotografia (o que vale também para a direção e figurino). Mas, nada além do esperado, uma vez que "The Lobster", sendo um filme irlandês, grego, britânico, frances e belga, adota o estilo particular de fazer cinema na Europa. Algo que incomoda demais a Academia, por alguma razão, talvez, por serem filmes realmente superiores aos pertencentes a Mecca Hollywoodiana.
Quantas lições num filme só. Matt Ross deu um 'up' em sua carreira como diretor e roteirista, depois de sua estreia em "28 Hotel Rooms", entregando um filme como "Captain Fantastic" ao cinema. O filme traz um roteiro muito bem elaborado e uma direção super pensada. Um filme que faz prospecções politicas e sociais que nos fazem repensar totalmente a forma com que vemos a vida.
Regados a ideias hippies e quase anarquistas, a família de Ben é um organismo social muito bem sucedido que mostra como nos limitamos ao submetermos nossas crianças a ideias de educação tão antigas. Um exemplo perfeito que como mesmo imersos em um mundo repleto de informação e possibilidades, sabemos quase sempre tão pouco. Repensa-se a educação dada a nossas crianças, repensa-se o diálogo entre pais e filhos (sustentado por mentiras e tabus que só trazem problemas), repensa-se como consumimos informação e como nos preocupamos tão pouco com os laços familiares.
"Capitain Fantastic" não é só um tapa na cara da ideologia capital-liberalista que promete um mundo de liberdade, cultura e informação, e nos entrega tudo isso de forma tão rasa e simplória. Mas, a crítica do filme não acaba aí, ela vai além. Matt Ross proporciona ao telespectador a segunda visão sobre a forma de vida da família do capitão fantástico. Os filhos de Ben, por mais bem educados e instruídos que sejam, precisam viver um vida, a normalidade é um fator importante para cada ser humano e o extremismo da experiencia vivida pela família só traz malefícios. Bodevan em dado momento não sabe se comportar com uma garota, por mais que já seja considerado um homem. Ele também quer ir para a universidade e ter uma vida longe de sua familia. Rellian quer ter uma vida normal com videogames e Natal. E assim por diante...
A organização social em que Ben tenta criar sua família se corrompe no instante em que ela é especialmente isolada, um meio social aonde seu caráter interno é oposto ao caráter externo do ambiente a sua volta. E nesse ponto, a grandiosidade dessa experiencia social perde parte de seu valor: ela não é possível em sua completa dimensão uma vez que se situa de forma isolada na sociedade. Uma boa reflexão social sobre uma civilização que teria tudo para dar certo, mas não dá, porque não sobrevive sozinha. Essa talvez seja a história de muitas sociedades marxistas que sucumbiram a falência social.
Eu esperava uma indicação a Melhor Roteiro Original e Melhor Desigh de Produção. A fotografia é um ponto alto do filme, mas provavelmente passou longe da categoria no Oscar. Viggo Mortensen conseguiu sua segunda indicação a 'Melhor Ator' e mais uma vez não conta com grandes chances, embora entre os trabalhos que eu consegui assistir (Andrew Garfield ('Hacksaw Ridge') e Ryan Gosling ('La La Land')) Viggo seja o que mais se destaque. E, assim como em 2008 com a sua indicação a Melhor Ator por 'Eastern Promisses', Viggo foi a unica indicação que vingou para o filme.
O tipo de filme que te arrepia do começo ao fim e faz você sair do cinema com aquela sensação de "é para isso que a arte existe". "Hidden Figures" trata o racismo e a questão de gênero de uma forma leve, mas não menos chocante. Mais um dos longas indicados ao Oscar que traz a tona a segregação racial da década de 60, e esse, ao contrário de "Loving", faz uma abordagem muito mais prática e, até mesmo, mais figurativa do racismo.
O grande aliado das atrizes, e do próprio filme, é o roteiro que brilhantemente combina humor, ironia e seriedade em uma crítica social recorrente em tempos de Trump. Três mulheres negras que mudaram a história de seu país, e não tiveram o minimo de notoriedade por isso, mas, claro, não foi a primeira vez que isso aconteceu, e muito menos a última.
Katherine, Dorothy e Mary foram a exceção da exceção, e que só chegaram aonde chegaram porque a política racista da igualitária America teve de reconhecer que inteligencia e capacidade não tem a ver com cor e muito menos com sexo. Porque esse mesmo país teve de reconhecer que se quisessem chegar a Lua precisariam de pessoas como essas mulheres.
Uma questão no minimo pontual sobre a onda fascista que abate o mundo livre, quantas Ketherines iremos perder, iremos sacrificar em nome de ideais totalmente distorcidos. E talvez por isso eu queria tanto ver um elenco um negro e feminino na noite do Oscar recebendo o premio de Melhor Filme, mesmo sabendo que isso não vá acontecer, principalmente tendo concorrentes como "La La Land" e "Moonlight", mas seria lindo uma afronta dessa em tempos tão brancos e tão "republicanos".
Octavia Spencer fez um trabalho brilhante, mas 2017 é o ano de sua amiga e colega Viola Davis, e ainda assim, seria dificílimo vê-la com a estatueta na mão pela segunda vez me menos de 5 anos. E se o filme não tem lá grande chance na categoria principal, em melhor roteiro adaptado não seria uma aposta muito ruim. E acho que o fato de Taraji P. Henson não ter sido indicada ao Oscar de Melhor Atriz foi uma das maiores injustiças da edição.
"Hidden Figures": que filme, que mulheres, que história necessária. <3
Uma direção impecável de Mel Gibson, em, provavelmente, um de seus melhores trabalhos. Ele captura o filme em uma dimensão ampla: ele não simplesmente comove e envolve nas cenas mais leves, como também deixa tenso quem assiste, além dos vários sustos, nas cenas de guerra. Não é apenas um filme de guerra, e seu único trunfo não está nas cenas violentas absurdamente realistas, ele conta com uma ideia baseada em algo do tipo "nunca desista de seus ideais". O jovem Andrew Garfiel fez um trabalho um ótimo trabalho, no entanto nada realmente chamasse a atenção. Outro forte aspecto do filme é sua técnica sonora, com uma edição perfeita e uma mixagem calculada nos mínimos detalhes, os sons tornam-se tão reais que a perturbação na sala de cinema é inevitável. Um forte canditato tecnico nas categorias: melhor edição, melhor edição de som e melhor mixagem de som. Me surpreenderia se Garfield recebesse o Oscar de Melhor Ator. Mel Gibson também não seria a melhor aposta. Um bom filme, e uma das melhores experiências que tive com um filme de ação.
Meu deus, que dor de cabeça esse filme me deu. Levei horas pra digeri-lo e formar uma opinião sobre. A admiração que eu tenho por essa obra tem tamanho semelhante ao desconforto que sinto ao escrever sobre esse filme. A grande questão: pós-feminista ou machista? Talvez uma linha tênue entre esse dois mundos. Uma provocação além de qualquer coisa. O estupro foi historicamente apresentado no cinema como uma cena de sexo e não como a violência que ela realmente é, característica que vem dos enquadramentos e do movimento de câmera que sexualiza a cena, virilizando o homem e sensualizando a mulher. "Elle" não é assim.
As cenas de estupro são não só representadas em um enquadramento fixo, em um movimento imperceptível de câmera e em uma paleta de cores mais sombrias, como também são revividas pela personagem em uma clara forma de repetir o desconforto no publico, porque a cena não acalma, não atrai e muito menos desperta o libido alheio, ela é violenta e paralisa o publico quase como uma cena de tortura em um filme policial. O filme tem uma visão especifica do mundo: todos os homens são corrompíveis e em dado momento se mostram irracionais e brutos (desde o homem que estupra a protagonista, até o filho que a salva do estuprador), e todas as mulheres são devidamente empoderadas de suas vidas e dotadas de um bom senso indescritível (desde a mãe, com uma vida sexual ativa, até a amiga e sócia que ao se ver traída pelo marido e pelo amigo sabe quem realmente deveria sair de sua vida e quem merecia um voto de perdão). Tudo isso faz com que o telespectador pense que o filme seria o estupro partindo da visão da mulher, o que não é verdade. A visão do estupro aqui é colocada diante de UMA mulher especifica, uma personagem densa e complexa, que lida de sua forma com a experiencia. Michèle não é uma personagem e uma mulher qualquer, ela tem uma história que desenha todo seu comportamento social: a história de assassinato cometido por seu pai. Isso faz dela uma mulher que não só conduz sua vida com mãos de ferro, como também se mostra totalmente sem confiança no sistema e nos homens. Mais do que tudo isso, Michèle é de varias formas uma sociopata moderada. E entende-la em sua completa dimensão é o ponto de partida para compreender a visão toda do filme sobre o ato principal: o estupro. Michèle não se abate diante da violência que a acomete, ela lida com o acontecido com uma naturalidade que desde o principio intriga e incomoda quem assiste. Michèle lida com uma naturalidade estranhíssima, similar a forma com que ela assimilou o fato de seu pai assassinar seus vizinhos. O olhar vazio da menina queimando moveis diz muito sobre a forma que ela lida com a violência e com o trauma, de forma silenciosa e comedida. Em momento algum, ao contrário do que é dito, "Elle" retrata o estupro de forma corriqueira ou ignora a tremenda violência que essa ação é. O estuprador não é um aluno que a odeia ou que a ama, é um vizinho cordial e distante, simpático e religioso, e mais, um homem por qual Michèle possui grande atração. Esse é um ponto importante do filme, o estuprador não é colocado como um homem fora dos moldes ou de forma alguma peculiar, ele é colocado como um homem normal, algo que mostra que a visão de "Elle" sobre o estupro é que esse é um mal social e não puramente biológico, um conceito que liga essa violência ao machismo e ao conceito patriarcal que vigora no ocidente. Michèle não gosta de ser estuprada, ela sente raiva e repudia o estuprador, ela odeia a dor que lhe foi causada e em momento algum sente vontade de repeti-la. No entanto, o desejo por aquele homem é anterior a descoberta de que ele era o estuprador, e por vezes ela controla seu desejo por ele, e tem total poder sobre o que lhe abate. Michèle vive então desde o momento da descoberta até os últimos segundos, uma narrativa que traz Patrick para seu ciclo, que faz com que ele se sinta aberto o suficiente para que ele tente violenta-la nas condições anteriores, mesmo sabendo que ela soubesse sua identidade. Ela atrai o estuprador para seu pior fim e consegue sua vingança, vingança essa que nem lhe suja as mãos. Paul Verhoeven apresenta um filme brilhantemente provocador, que parece trazer um certo tipo de telespectador para lados totalmente opostos, e esse telespectador é aquele com uma visão radical das coisas. O filme é mais do que um retrato sobre o estupro, mas um retrato sobre a realidade acerca da dimensão psicológica de uma mulher ímpar, que só poderia ser encarnada pela rainha do cinea frances Isabelle Huppert. Michèle é uma mulher forte, dona de si e de seu desejo, e mais do que tudo isso, é uma mulher especialmente genial em seus objetivos.
Um filme instigante e genial. Um dos melhores que já assisti, em absoluto. Que Isabelle Huppert merece o Oscar de Melhor Atriz isso é fato, e não é a primeira vez que isso é dito e muito menos será a última, seu trabalho é inegavelmente extraórdinário. Tanto que rendeu a uma artista estrangeira uma indicação a maior premiação da Mecca cinematográfica tão cheia de si. O que me pergunto é: aonde ficou "Elle" por Melhor Longa Estrangeiro?
Grande filme! Uma história maravilhosa com atuações brilhantes e uma direção sensibilíssima. O caso de Richard e Mildred Loving é desenhado com todo o cuidado, cálculo, sensibilidade e lentidão na dose certa, algo raríssimo em filmes norte-americanos. A fotografia foi outro aspecto que também me chamou bastante atenção, os enquadramentos e o movimento de camera se sintoniza com uma iluminação cuidadosa, fazendo da fotografia grande aliado dos atores. Jeff Nichols cria um filme que prende, ou ao menos ME prendeu, um filme que faz você se sentir sufocado junto com as personagens, que emociona, que toca e que conduz o espectador para uma reflexão: não estamos tão longe desse cenário. Senti falta uma trilha sonora mais concisa e um roteiro um pouco mais rico, que desse mais voz e oportunidade a Mildred (ou talvez a falta de voz da personagem seja mais um aspecto que dê maior verossimilhança a história, uma visão totalmente diferente do que é dada ao também indicado "Hidden Figures" que dá mais voz a mulher negra, um aspecto que cativa e agrada, mas infelizmente quase sempre bastante irreal). Esse é o quinto dos nove filmes indicados ao Oscar que é baseado em fatos reais, algo totalmente tipico na premiação. E também, é o segundo a tratar da segregação racial da década de 60, algo totalmente Atípico na premiação americana. É uma resposta a falta de negros nas indicações no ano de 2016, talvez estamos para ver a cerimonia da Academy mais multirracial de sua história, felizmente.
Doentes de Amor
3.7 379 Assista Agoranúmero 500
Visages, Villages
4.4 160 Assista AgoraApaixonante!
Strong Island
3.5 49Que nota é essa?????? Esse é de longe um dos melhores documentários da temporada!! E eu só leio aqui gente que deu duas estrelas porque foi parcial, sendo que um documentário não precisa ser imparcial, é um genero cinematográfico e não um artigo jornalístico. Gente dizendo que o documentário é massante, pelo amor de deus!!! O filme fala sobre uma morte impune sem julgamento, sem justiça, do irmão da diretora e produtora em um caso clássico de violencia racial institucional. Quem consegue reclamar de como a história foi contada???? O filme mescla direitinho inumeras camadas e conclui um roteiro muito bem amarrado, com um final perfeito e uma direção impecável. Sinceramente, as vezes me espanto com a avaliação dos usuários do Filmow.
A Bela e a Fera
3.9 1,6K Assista AgoraTalvez a execução mais bem sucedida da Disney da sua geração de musicais em live-action. A fluidez do filme é boa, muito do roteiro se preservou da obra original, porém faltou. Faltou aquela magia mais enérgica versão em animação e faltou uma Bela de verdade. Emma Watson entrega uma atuação medíocre, por vezes quase sem expressividade e que não convence o espectador a se apaixonar por uma das mais interessantes princesas da Disney.
O filme é belíssimo em figurino e em direção de arte e uma movimentação de câmera fabulosa. Destaco a serie de referencias que o filme faz a outros clássicos do gênero musical, a mais clara em referencia a canção titulo de The Sound of Music na iconica perfomance de Julie Andrews, quando Bela corre para uma especie de campo. Outra referencia é no número de Be Our Guest, onde o diretor recorre a uma referencia das sombras de Bob Foss, o mesmo número apresenta clara referencia a Busby Berkeley em seu trabalho Footlight Parede (1933).
Além disso, achei algumas falhas no convencimento da dublagem das canções da Fera, os efeitos especais não convencem, e parece existir até certo erro de sincronia no som, algo estranho para um indicado ao Oscar de Melhor Mixagem de Som. Enfim, o filme agrada, encanta, e apesar de seus erros é a joia mais recente da Disney em seus live-actions superando "Malévola", "Into the Woods" e "Cinderela".
Blade Runner 2049
4.0 1,7K Assista AgoraTecnicamente impecável em imagem e som. Roteiro meia boca, se esvazia em um trama com um ritmo legal, com núcleos muito bem elaborados e fechadinhos, mas a sensação que fica no final é que faltou uma conclusão melhor do enredo. O diretor optou pelo final "aberto" tentando abrir possibilidade para uma continuação, mas isso fez o filme ficar pouco conclusivo e com um final ruim. Muito se trabalhou a trama e no ponto de climax a história não se conclui, não tem um encerramento digno.
A direção de arte é outro ponto forte. Atuações medianas, com salve para o tedioso trabalho de Jared Leto. A direção explorou bem o conceito de um dos filmes mais respeitados no meio Sci-fi, mas não entregou seu melhor, acredito. Memorável para o gênero, mas não o suficiente em conteúdo para se tornar um dos grandes nomes do ramo.
Gabriel e a Montanha
3.7 141 Assista AgoraConfesso que não estava no meu melhor estado quando vi o filme, e por isso talvez tenha achado-o, por vezes, arrastado demais, mas é inegável que se trata de um bom filme.
Acho interessante como o filme começa construindo o jovem num ato quase messiânico do bom homem branco que se dispõe a viver em meio a comunidades carentes onde faz amigos, dá seu dinheiro para o estudo de crianças e se dispõe a viver um pouco da realidade daqueles homens e mulheres comendo da mesma comida, aprendendo suas musicas, caçando coelhos. O homem branco que se incomoda em ser chamado de branco, porque afinal ele é brasileiro! O turista que não gosta de ser chamado de turista, porque ja se sente parte dali (será?).
O filme começa a desconstruir o protagonista com a chegada da namorada, onde é possível se analisar o personagem para além da atmosfera do jovem inteligente e aventureiro. O rapaz questiona o trabalho da namorada em pensamentos conservadores e machistas, em uma discussão estupida (e num belo plano sequencia, onde a naturalidade e sintonia se destacam) sobre faculdade e como ele não se identificava com os seus "amigos da PUC", mas que na verdade ele era simetricamente idêntico ao perfil "reaça" e elitista de seus colegas, independente de suas vontades humanitárias. Para Gabriel seus problemas são não ter sido aprovado em Harvard e o quanto ele sofreu em sua viagem ao Himalaia, e talvez, a recusa de sua namorada quando ele a convida para morar com ele em Los Angeles, porque afinal só ele havia recebido uma bolsa lá, não ela, e ele a pergunta "Eu não sou motivo suficiente?" e ela o responde "Não".
Um personagem imaturo, talvez pela idade, e um perfil tradicional daquele que mesmo conhecendo os lugares mais diferentes do mundo, em contato com as mais diferentes realidades, continua preso a sua imaturidade e egoismo, e quem sabe, arrogância. Arrogância de tentar ouvir com mais atenção as pessoas dos países que ele visita, seu guia no trajeto para o Monte Mulanje ou a sua falta de sensibilidade com seu guia do Safari, quando discute com o homem por um transação em seu cartão de crédito, quando talvez lhe bastasse entender que ele não tinha a menor culpa, porque seguia uma percepção de realidade muito diferente que a de Gabriel. O rapaz viu isso, uma transação de cartão de crédito errada, como motivo suficiente para ignorar todo seu carinho de "irmandade" e tratar o homem de forma estúpida.
O filme tem um cuidado todo especial com a fotografia e edição, em cenas quase experimentais e cheias de movimento. A direção é inegavelmente um dos melhores trunfos do filme, é incriável a capacidade do diretor em conduzir atuações de pessoas que não são atores e conseguir atuações tão genuínas, por outro lado, o trabalho de João Pedro Zappa deixou a desejar. A fluidez do filme é boa, talvez com exceção das ultimas cenas em que o filme torna-se lento demais, e o espectador, que já sabe que Gabriel está morto, se cansa, porque não há surpresa, não há grande atenção por uma cena que já se sabe o fim e que dura mais do que se espera. Ainda assim, as narrações são bem trabalhadas e compõe uma narrativa não linear que dinamiza o filme, da mesma maneira, acho um acerto colocar o final no começo, porque acomete ao telespectador uma perspectiva diferente sobre a história.
Um bom filme, talvez com alguns pontos soltos, mas uma boa realização do cinema nacional.
Amy
4.4 1,0K Assista AgoraQuando a Amy morreu eu tinha 11 anos, e lembro direitinho de quando anunciaram sua morte aos fatídicos 27 anos, naquela época eu conhecia por alto seu trabalho e me chocava quando via sua aparência deteriorada pela bulimia e pelo uso de drogas, inclusive lembro das fotos em sua vinda ao Brasil pouco antes de sua morte e de seu estado e de como aquilo era de alguma maneira triste para mim, embora eu tivesse apenas 11 anos e não tivesse grande noção sobre quem ela ou o que ela fazia.
O documentário traz aquela sensação tão triste de uma pessoa tão doce e com um talento tão absurdo que se perdeu entremeio a fama absurda em uma idade tão prematura, ela, claro, sempre lidou com problemas complexos demais para a sua idade e talvez jamais conseguisse lidar com a fama, aquilo a destruiria como ela disse em um dos áudios revelados pelo documentário anos antes de sua fama explodir.
A tragédia de Amy não é sua tragédia pessoal apenas, é uma tragédia de dezenas de milhares de pessoas envolvidas na psicose absurda de ganhar dinheiro com seu talento e com sua imagem, é uma tragédia cruel e difícil de engolir, porque mais uma vez a mídia e a industria levou para a morte e para o fundo do poço um dos maiores talentos de nosso tempo. Como esperar que uma menina tão frágil pudesse lidar com tanto?
É triste pensar que ela morreu com 27 anos, com uma vida inteira pela frente.
É trágico pensar no tanto que ela poderia ter dado para nossa arte, para nossa geração, tudo o que ela poderia ter contribuído para sua paixão, a musica, mas que foi impedida por seu fim tão prematuro.
É vergonhoso pensar naqueles que acharam engraçado ou proveitoso zombar de uma pessoa tão doente e esgotada, leva-la ao precipício de si mesma.
No final, eu só consigo me perguntar o que eles fizeram com ela?
Uma Noite no Rio
3.4 29Helena Solberg disse uma vez que sempre pensava no "quanto se perde quando somos vistos pelos estrangeiros". Confesso que já depositei sobre esse filme uma critica assimétrica e quase irregular, desconsiderando que esse era um filme de 1940, de uma Hollywood viciada em estereótipos na sede absurda de construir ícones. É inegável a artificialidade do filme e os estereótipos sexistas sobre a mulher latina, na personagem de Carmen uma mulher que tem sua vida e roteiro dedicado a vingar seu ciumes por seu namorado jogando sapatos e bolsas em sua cabeça. No entanto, é preciso que se faça uma análise que vá para além disso.
O filme começa com o brilhante número "Chica Chica Boom Chic" um dos melhores de Carmen na Fox, quando Don Ameche surge e dispara seu discurso automatizado que parecia ter sido assinado pelo próprio Roosevelt o caráter esdrúxulo do filme aparece, no entanto, era a política da boa vizinhança sera impossível escapar disso. Nesse número quando Carmen e Don Ameche dividem a câmera cantando a cena se divide entre as duas Américas, a América do Sul, representada por Carmen, a América feminina, exótica e deslumbrante, quase cômica, e a América do Norte, representada por Don Ameche, a América masculina do homem elegante, em uniforme bonito e em chegando em um carro cercado de mulheres tão elegantes quanto ele - essa era a imagem do pan-americanismo que Zanuck tentava construir a favor de Roosevelt.
No entanto, há nesse filme aspectos que voltariam a se repetir na sequencia de filmes voltados para esse política, o primeiro deles é que o homem de negócios, o protagonista e o homem central da problemática não romântica é o brasileiro e não o americano, numa tentativa de tentar criar um personagem latino que fosse melhor assimilado pelos telespectadores tentando evitar o fiasco de Down Argentine Way, um ano antes. Em segundo lugar, o par romântico da mulher latina é um americano e não um latino com simetrias comportamentais a personagem de Carmen. Em terceiro ponto, Carmen é Carmen e não uma Chiquita, Dorita ou Rosita, a sequencia absurda de nomes ridículos que viriam a se suceder as personagens de Carmen pelos proximos anos na Fox. Além disso, três musicas em português são cantadas, uma inclusive por Don Ameche.
Além disso tudo, é incontestável que o roteiro é maravilhoso, a história é criativa e muito bem amarrada, ao contrário do seu sucessor Down Argentine Way, a direção é criteriosa e as cenas de Carmen são muito bem elaboradas, com frases e tiradas muito boas. Alice tem seu potencial musical pouco explorado, apenas uma música é dedicada a ela. A química de Carmen e Don Ameche é um dos trunfos para o filme, uma química que saltava aos olhos, principalmente no último número quando Carmen e Don se abraçam cantando I Like You Very Much. Carnen tem uma seleção impecável de figurinos e seus números musicais são memoráveis, sua personagem, mesmo com uma perspectiva sexista e estereotipada da mulher latina, é uma mulher inteligente e nem um pouco submissa a seu namorado, suas cenas são divertidas e suas frases disparadas repetidas vezes em português são uma das melhores partes de sua atuação.
Um filme indispensável para o amadurecimento da persona hollywoodiana de Carmen e uma experiencia quase muito bem sucedida da Política da Boa vizinhança, um dos melhores em termos tecnicos e culturais da leva dedicada a America Latina, uma obra importante para o entendimento desse cenário político e para relembrar o poderio absoluto de Carmen consagrando-se com uma das maiores deusas do tempo de ouro de Hollywood.
A Very Murray Christmas
2.9 74 Assista AgoraAs intenções não são grandes, obviamente, é um especial de fim ano da Netflix e não um longa de Coppola, mas o filme entedia. O roteiro é fraco, a história é esparsa, nada brilhante e nada além de "bom". As musicas são boas, e o auge é quando Miley e Clooney aparecem, ainda assim, o ultimo número dessa sequencia é pra lá de sexista. O som e a fotografia estão ótimas, como de esperar da Netflix, e o especial de natal apenas esquecível, algo que não se espera de Sofia Coppola.
A Very Murray Christmas
2.9 74 Assista AgoraAh, Sofia, por que cê fez isso?
Adeus, Lenin!
4.2 1,1K Assista AgoraUma analise densa em que as duas maiores ideologias politicas do nosso tempo são questionadas. O casamento com uma ideologia a ponto de beirar uma obsessão desmedida é uma das chaves para se entender o filme. Teriam realmente as coisas mudado profundamente? A impressão, por mais que demonstre a euforia e mudança, é que tirando os desertos de moveis abandonados, o consumo acelerado de produtos importados e a reviravolta cultural vivenciada pelos personagens, sua realidade parecia em profundidade igual. A ideia do filme vai para muito além de vitória ou fracasso de um sistema ou outro, ela mostra quão rápido a ideologia e vida de muitas pessoas se desmancha no ar. O filme questiona a queda do Muro de Berlim como um fracasso do socialismo, pelo contrário é a renovação de falsas ideias, é o expurgo daquilo que parecia ir para muito longe da concepção libertária e isonômica do socialismo, a revolução não seria contida por muros e não seria calada pelo consumo. "O socialismo não significa viver atrás de um muro. O socialismo significa chegar aos outros e viver com os outros”.
Uma das questões mais pontuais do filme é a verdade. Ela é relativa e se distorcia dentro do quarto de Kathrin e através de seus olhos. Talvez uma frase de Machado de Assis resuma essa ideia: "Não é a verdade que vence, é a concepção".
Serenata Tropical
3.1 25O filme só vale por conta de Carmen Miranda. Assisti há alguns anos atrás, e hoje pude notar coisas que antes não havia notado. O figurino, bem como a maravilhosa fotografia em tecnicolor, é um show a parte, e fazem justiça às suas três indicações ao Oscar de Melhor Figurino, Melhor Fotografia e Melhor Direção de Arte. O cenário, bastante artificial (um erro recorrente nos musicais "para a America Latina" da Fox), não convence. O roteiro em si é desajeitado, não deixando realmente claro a história com os Crawford e muito menos como Glenda e Ricardo se acertam depois do conflito que sucede os números musicais de Carmen "Mamãe Eu Quero" e "Bambu". Além dessa falta de coesão no roteiro, ele ainda conta com piadas fracas e, na maioria das vezes, ofensivas ao povo argentino. O filme, que foi um desastre na Argentina, sendo previamente proibido e depois arruinando cinemas pelo país, parece fazer uma confusão com a America Latina e Argentina e reafirma estereótipos: o argentino sujo, burro, desdentado e que fala com os animais, o argentino que não entende o idioma e faz enormes confusões com ele, o argentino motorista que vive dormindo. Isso sem falar da relação de subalternidade dos "nativos" e como são tratados com violência e desprezo pelos americanos.
O final é um filme com um roteiro desastroso, com ritmo pouco fluido e que entedia, uma linda fotografia aliada a um figurino poderoso (que peca ao dar a Carmen uma única baiana, erro que a Fox jamais cometeria de novo, visto que cada baiana de Carmen é uma oportunidade absurda de demonstrar a figura exuberante e cheia de cores para o inabalável tecnicolor da Fox) e um cenário pouco glamouroso, conta ainda com belos movimentos de câmera e enquadramentos que junto com uma fotografia maravilhosa faz do filme uma bela experiencia visual. O "cardápio" de músicas foi um dos piores dos musicais da Fox, canções fracas e nada marcantes, se não pelas canções "South American Way" e "Mamãe Eu Quero" que eternizariam a então estrela da Broadway e fenômeno mundial, Carmen Miranda, que salva o filme e torna-o de alguma forma relevante para a posterioridade, com uma participação estonteante e uma presença de cena incrível ela conquista Hollywood com menos de 10 minutos nas telas, explodindo cores e ritmo. Carmen, provavelmente, junto com os Jonas Brothers, é uma das poucas coisas legitimamente latinas em um filme feito para agradar a America Latina, e que falha miseravelmente nessa tentativa politica e cultural.
Patrick, Idade 1,5
4.0 492Um filme leve e interessante, porém, fraco e previsível. As atuações não são tão convincentes e o caminho da história é quase clichê. A fotografia, principalmente nos períodos com luz de sol intensa, é péssima, me lembrava constantemente um comercial de margarina ou um filme de baixo orçamento que comumente é fatiado e postado nas redes sociais.
No entanto, coisas que eu achei importantes e relevantes na narrativa: a recusa do casal em primeiro momento de ficar com um menino mais velho, a homofobia de Patrick que rompe a empatia do publico com o persongaem, a dificuldade e os problemas da adoção por casais homossexuais vista de dentro, a marginalização e o trauma de Patrick em uma analise emocional mais densa, o pai que tira o filho do consultorio de Goran por ele ser um médico homossexual.
Pontos equivocados: a volta do casal foi muito abrupta e artificial para emocionar ou convencer, por vezes não ficava claro se Patrick ficaria mesmo com Goran, o alcoolismo de Sven ter sido abordado de forma rasa e curta, a relação de Patrick com a filha de Sven poderia ter sido trabalhada de forma melhor (bem como a própria personagem), o passado de Patrick poderia ter sido trazido mais vezes a tona, e o final ficou confuso, embora acho que teria sido ideal Patrick terminar com Goran, o diálogo foi curto e pobre, apesar de ter sido engraçadinho.
Um filme as vezes bobinho que pode ser entendiante, e que poderia ter usado melhor de sua narrativa, mas ainda sim um filme leve e importante.
Alice Não Mora Mais Aqui
3.8 167 Assista AgoraUma narrativa real, personagens densos, a perspectiva feminina. Uma obra prima de Scorsese, que mostra o drama cru de uma das muitas Alices que lutaram e lutam pela dignidade de sua realização pessoal. Um romance nada idealizado, aonde a civilidade masculina é colocada em cheque inumeras vezes a ponto de você sentir em profundidade o drama da personagem e desacreditar na busca por um parceiro. O
final do romance é incerto, parece que mais uma vez a história tinha inúmeras chances de se repetir e dar errado, mas por alguma razão Alice estava lá no caminho de sua realização que foi adiada e esquecida pela vida matrimonial abusiva e infeliz.
A Vida Marinha com Steve Zissou
3.8 453 Assista AgoraUm bom filme, principalmente ao se tratar dos elementos visuais do filme, o que de qualquer forma não é novidade na filmografia do Wes Anderson, além de uma trilha sonora impecável. O filme começa bem, tem um desenvolvimento morno, e só depois dos 50 minutos volta a tomar ritmo. Senti que faltou em alguns momentos uma maior profundidade na relação pai-filho que o filme traz, algo que Wes conseguiu trazer em The Royal Tenenbaums, mas que só recuperaria uma carga emocional mais sólida com Moonrise Kingdom.
O cenário, principalmente o navio em corte, está simplesmente impressionante. A última cena não podia ser melhor. Há algo de muito atraente nesse filme, mas que em alguns momentos não entrega o necessário em roteiro e em carga poética (traço fundamental da obra de Wes Anderson, pelo menos depois de Zissou). Mesmo esperando um pouco mais, The Life Aquatic with Steve Zissou confirma o excelente trabalho, de forma geral, de Wes Anderson, como um dos mais brilhantes diretores de nosso tempo.
Tanna
3.3 73 Assista AgoraUma surpresa e uma meia decepção. 'Tanna', o concorrente australiano a estatueta de melhor filme na edição 2017 do Oscar, é um filme razoavel, com seus muitos erros, mas com seus inúmeros acertos. E, mais do que isso, um filme inovador.
A história do colonizado e do colonizador sempre foi materia atrativa para a indústria artística, e quase sempre contada da perspectiva nativo x forasteiro e quase sempre de forma irresponsável sem ser coerente com o idioma e a cultura nativa, a velha história da visão da América sobre outros povos. E nisso, Tanna, se diferencia abruptamente. Tendo como idioma os dialetos Nauvhal e Nafe, contando com a atuação dos próprios nativos da ilha e filmada inteiramente em locação em Tanna, o longa nos propicia uma visão mais documental da história.
Os diretores Martin Butler e Bentley Dean, que são essencialmente documentaristas, começam o filme da forma errada. A enfase documentária e insuficiência artística nos primeiros 30 minutos cansa o telespectador. A falta de preocupação com traçar um perfil mais exato da tribo, e simplesmente juntar cenas retratando seu cotidiano e cultura (foco importantíssimo do filme, ainda mais importante que a história em si) formando um mosaico experimental, deixa a desejar e afeta na compreensão do enredo que se segue, ou seja, quem assiste tem de forçosamente entender as designações e nomes usados na tribo.
A fotografia, grande aliada do filme, deixa a desejar em certos momentos adotando enquadramentos que valorizariam a atuação do elenco, o que não acontece, uma vez que o elenco é meramente amador. Em outros momentos a fotografia se torna o ponto alto do filme, exaltando a beleza da paisagem, com grande destaque para as cenas no vulcão, momento com grande enfase na trilha sonora, que se desenha durando o filme de forma minima e discreta. A iluminação simples que outrora se torna um problema, em determinados momentos valoriza o aspecto documental do filme. Por fim, uma fotografia clichê, simples e bastante sensível, mas que no entanto não conquista como deveria.
A baixa dinâmica cenográfica, por incrível que pareça, dá ao filme um toque humano e inocente, propiciando as cenas de amor do casal principal uma leveza impressionante. O roteiro segue um caminho formulado e superficial, mas não menos delicioso. O que se traça como um Romeu e Julieta indígena, tange um aspecto muito mais profundo que isso. A força do amor é em oposição ao conservadorismo, é o amor vencendo aos costumes e a tradição, uma história que comprova a universalização do enredo, que por sinal é baseado em fatos reais, e a alta aplicabilidade desse conceito em situações contemporâneas. A história contata pelos Yakel como símbolo do que chamam de “paixão livre" sai do meio nativo e se projeta da sociedade atual.
'Tanna' é acima de tudo uma experiencia incrível de uma história belíssima, com suas falhas, mas que se erra na superficialidade, acerta no formato inovador e quase experimental. A insipidez no enredo é preenchida pela imensa atemporalidade da história e pela fidelidade documental aos fatos e aos costumes dos povos da pequena ilha de Tanna. Uma história sobre um amor progressista, que muda costumes, que clama por liberdade e une diferenças. Uma mescla, por vezes harmoniosa, por vezes desconfortável, de documentário e drama, que apesar das falhas acerta ao retratar uma experiencia ainda pouco comum no cinema. Com certeza, não chega perto da estatueta de melhor filme, mas que mereceu estar entre os cinco finalistas.
Terra de Minas
4.2 260 Assista AgoraSimples e preciso. "Under Sandet" é um longa que traz a tona uma fato pouco conhecido sobre o evento mais explorado pelo cinema, a Segunda Guerra Mundial, e trabalha com ele de forma limpa e delicada, fazendo do filme uma exceção entre os muitos filmes de guerra.
A violência do filme é moderada, e o cuidado com a tensão de desarmar minas é passado para quem assiste por meio de enquadramentos próximos aos atores e às suas ações.
O grande acerto do filme é também seu grande furo: o roteiro e a direção. Martin Zandvliet desenha a história com precisão, a ponto de em poucos minutos deixar o telespectador ciente do que se passa no filme. As cenas da desmontagem das minas são muito bem escritas e dirigidas, tal como, os momentos do filme que mostram o ódio em relação aos nazistas, e a forma com que isso muda quando o Sargento começa a vê-los como crianças, como seres humanos, independente da noção de inimigo ou não, uma reflexão válida em tempos de extremo radicalismo como o que vivemos, hoje. Cenas como a do inicio do filme, aonde o sargento espanca um soldado nazista, ou como a cena aonde o cachorro é morto ou a cena aonde o primeiro menino é explodido, mostram um cuidado especial no caminhar da história que não se concentra apenas no lado brutal daquela situação, mas também no lado psicológico e emocional que envolvia cada personagem. No entanto todo o cuidado e sensibilidade na condução do filme parecem ir por água baixo quando o ritmo se altera abruptamente, no minuto 60 o Sargento dá um tapa na cara de um de seus soldados, minutos depois ele está jogando futebol com os meninos, algo que realmente me pareceu incoerente e me incomodou um pouco. O final por sua vez é perfeito, sóbrio e coerente com a história.
Outro ponto alto do filme é a perfeita edição de som, os pregos sendo soltos, caindo na areia, as minas explodindo, etc. E a mixagem de som se alia a direção para agravar certos momentos, quando uma mina explode, por exemplo, a trilha sonora (que aliás é magnifica) é interrompida pelo som da explosão que é seguido por um silencio e um plano geral, comovendo quem assiste.
Um filme muito bem trabalhado, com suas falhas, mas com seus muitos acertos. Mas, me parece que faltou alguma coisa, e, também, não sei dizer o que é, mas faltou algum bom clímax. Não acho que seja um grande concorrente a estatueta de Melhor Longa Estrangeiro. A disputa mais acirrada com certeza fica entre Irã (The Salesman) e Suécia (A Man Called Ove). Apesar disso, um bom filme que mereceu estar entre os 5 finalistas.
Um Homem Chamado Ove
4.2 382 Assista AgoraTaí, um filme que ganhou meu coração desde os primeiros minutos. "En man som heter Ove", o representante sueco no Oscar de Melhor Longa Estrangeiro, é um dos perfeitos exemplos de como o cinema europeu tem tanto para nos oferecer.
O filme conta com uma grande história, retratada cuidadosamente e de forma simples pelo diretor Hannes Holm. Ove é um personagem que de inicio parece não apenas clichê e desagradável, como também previsível, mas aos poucos, com um roteiro muito bem elaborado de Holm e com a atuação brilhante de Rolf Lassgård, o personagem cativa ao se mostrar ao mesmo tempo de forma rabugenta e encantadora. O filme, que vai desdobrando a história aos poucos, mostra a dura história de Ove, e nos faz repensar a primeira impressão que tivemos do senhor de 59 anos.
Um drama muito bem pensado que alia de forma perfeitamente equilibrada o sentimentalismo e a comédia (inclusive, algo inédito nos indicados na categoria estrangeira do Oscar). Os flashbacks não só aparecem de forma bem espaçada, intercalando tempo real com passado, como surgem de forma genial em suas tentativas de suicídio.
A história, apesar de bastante previsível, se constrói de forma cuidadosa e revela uma carga emocional enorme em volta de Ove, um homem que perdeu a mulher, perdeu o filho, o pai, que teve a casa incendiada, e o antigo amigo em estado vegetativo, um homem pela qual a vida não teve a menor piedade. Uma história tão forte, que faz o telespectador compreender o lado ranzinza do protagonista.
Sua vida alterada pelos vizinhos, ganha a razão que lhe faltava, sem emprego, sem a mulher, e repetidas vezes dizendo para si mesmo "você tem que aguentar". E mais do que isso, o filme não é apenas um drama, ele traz consigo uma filosofia de que as coisas precisam da reviravolta necessária para atingirmos melhores momentos. A critica social não passa despercebida, não só pelo retrato da Europa atual (quando Ove, funcionário há 42 anos, perde seu emprego e como reconhecimento recebe uma pá) mas também de uma critica a sociedade contemporânea, ao avanço incoerente do progresso que tira do homem mais humilde tudo o que lhe resta (para Ove, sua casa e seu emprego, para sua vizinha, o minimo de assistencialismo para com seu marido), representado no filme pelos "homens de camisa branca". O filme ainda levanta questões atuais como a homossexualidade e a falta de inclusão das pessoas deficientes.
O filme revira o emocional de quem assiste e refaz o Ove na cabeça do telespectador, ele não era apenas um homem ranzinza, era, na verdade, uma pessoa incrível que mesmo com tudo se mostra uma pessoa indescritivelmente disposta a ajudar os outros. A sua simplicidade durante o primeiro jantar com sua esposa, comove. A sua preocupação pouco antes de morrer para que não deixassem a ambulância entrar dentro do condomínio, desperta risadas. E talvez esse misto carregue o filme de forma estupenda, revelando aos poucos uma história genuinamente grandiosa, contata de uma forma simples e não menos emocionante.
E, como era de se esperar de um bom filme europeu dos ultimos anos, o longa ainda conta com uma fotografia não apenas limpa e cuidadosa nos enquadramentos e movimentos de camera, mas também nas cores. Os flashbacks, apresentam cores mais vivas, representado os melhores anos de Ove, e os tempos atuais mostrar cores mais sóbrias e mornas, representando a vida tediosa do protagonista sem sua esposa. A trilha sonora de Gaute Storaas é outro ponto forte do filme, tal como a maquiagem que rendeu ao longa outra indicação ao Oscar (Melhor Maquiagem e Cabelo).
Um filme grandioso, simples e perfeitamente delicado. Meu favorito na disputa de Melhor Filme Estrangeiro, na edição do Oscar de 2017. <3
O Lagosta
3.8 1,4K Assista AgoraEsse filme me deixou confuso do começo ao fim. E por mais bizarro que seja a história ele traz como pano de fundo uma grande teoria sobre relacionamentos na sociedade moderna.
No tempo da liquidez do amor, a humanidade chega ao ponto da proibição de não ter um parceiro ou uma parceira. É proibido ser solteiro ou solitário, e qualquer ato de auto-satisfação seja ela sexual ou não é brutalmente condenada. Caso você descumpra essas leis você deixa de ser humano, ou seja se você não encontrar alguém, você não existe mais.
E o relacionamento, por sua vez, não é mais baseado no amor e nos sentimentos, e, sim, em detalhes ridículos que de pouco em pouco se mostram insuficientes para sustentar qualquer relacionamento, tão insuficientes que por vezes é necessário um filho para que se mantenha certo sentido em estar junto, mais uma vez pela razão errada. Os casais se odeiam, a ponto de terem coragem de matar seus parceiros, como acontece com os donos do hotel. Todos, e absolutamente todos, são plenamente infelizes, por viverem daquela forma, numa sociedade aonde o amor simplesmente não é razão para se estar junto com alguém.
O que de cara parece uma teoria besta, é nada mais do que uma versão irônica e bizarra da forma com que os homens tratam os relacionamentos nos dias de hoje. O chamado 'amor liquido' (de Zygmunt Bauman) talvez fosse o principal ponto de crítica do filme.
Além toda genialidade filosófica por trás do roteiro de Yorgos Lanthimos, o filme conta com uma fotografia belíssima, que me incomodou muitíssimo de não ter sido indicado ao Oscar de Melhor Fotografia (o que vale também para a direção e figurino). Mas, nada além do esperado, uma vez que "The Lobster", sendo um filme irlandês, grego, britânico, frances e belga, adota o estilo particular de fazer cinema na Europa. Algo que incomoda demais a Academia, por alguma razão, talvez, por serem filmes realmente superiores aos pertencentes a Mecca Hollywoodiana.
Capitão Fantástico
4.4 2,7K Assista AgoraQuantas lições num filme só. Matt Ross deu um 'up' em sua carreira como diretor e roteirista, depois de sua estreia em "28 Hotel Rooms", entregando um filme como "Captain Fantastic" ao cinema. O filme traz um roteiro muito bem elaborado e uma direção super pensada. Um filme que faz prospecções politicas e sociais que nos fazem repensar totalmente a forma com que vemos a vida.
Regados a ideias hippies e quase anarquistas, a família de Ben é um organismo social muito bem sucedido que mostra como nos limitamos ao submetermos nossas crianças a ideias de educação tão antigas. Um exemplo perfeito que como mesmo imersos em um mundo repleto de informação e possibilidades, sabemos quase sempre tão pouco. Repensa-se a educação dada a nossas crianças, repensa-se o diálogo entre pais e filhos (sustentado por mentiras e tabus que só trazem problemas), repensa-se como consumimos informação e como nos preocupamos tão pouco com os laços familiares.
"Capitain Fantastic" não é só um tapa na cara da ideologia capital-liberalista que promete um mundo de liberdade, cultura e informação, e nos entrega tudo isso de forma tão rasa e simplória. Mas, a crítica do filme não acaba aí, ela vai além. Matt Ross proporciona ao telespectador a segunda visão sobre a forma de vida da família do capitão fantástico. Os filhos de Ben, por mais bem educados e instruídos que sejam, precisam viver um vida, a normalidade é um fator importante para cada ser humano e o extremismo da experiencia vivida pela família só traz malefícios. Bodevan em dado momento não sabe se comportar com uma garota, por mais que já seja considerado um homem. Ele também quer ir para a universidade e ter uma vida longe de sua familia. Rellian quer ter uma vida normal com videogames e Natal. E assim por diante...
A organização social em que Ben tenta criar sua família se corrompe no instante em que ela é especialmente isolada, um meio social aonde seu caráter interno é oposto ao caráter externo do ambiente a sua volta. E nesse ponto, a grandiosidade dessa experiencia social perde parte de seu valor: ela não é possível em sua completa dimensão uma vez que se situa de forma isolada na sociedade. Uma boa reflexão social sobre uma civilização que teria tudo para dar certo, mas não dá, porque não sobrevive sozinha. Essa talvez seja a história de muitas sociedades marxistas que sucumbiram a falência social.
Eu esperava uma indicação a Melhor Roteiro Original e Melhor Desigh de Produção. A fotografia é um ponto alto do filme, mas provavelmente passou longe da categoria no Oscar. Viggo Mortensen conseguiu sua segunda indicação a 'Melhor Ator' e mais uma vez não conta com grandes chances, embora entre os trabalhos que eu consegui assistir (Andrew Garfield ('Hacksaw Ridge') e Ryan Gosling ('La La Land')) Viggo seja o que mais se destaque. E, assim como em 2008 com a sua indicação a Melhor Ator por 'Eastern Promisses', Viggo foi a unica indicação que vingou para o filme.
Estrelas Além do Tempo
4.3 1,5K Assista AgoraO tipo de filme que te arrepia do começo ao fim e faz você sair do cinema com aquela sensação de "é para isso que a arte existe". "Hidden Figures" trata o racismo e a questão de gênero de uma forma leve, mas não menos chocante. Mais um dos longas indicados ao Oscar que traz a tona a segregação racial da década de 60, e esse, ao contrário de "Loving", faz uma abordagem muito mais prática e, até mesmo, mais figurativa do racismo.
O grande aliado das atrizes, e do próprio filme, é o roteiro que brilhantemente combina humor, ironia e seriedade em uma crítica social recorrente em tempos de Trump. Três mulheres negras que mudaram a história de seu país, e não tiveram o minimo de notoriedade por isso, mas, claro, não foi a primeira vez que isso aconteceu, e muito menos a última.
Katherine, Dorothy e Mary foram a exceção da exceção, e que só chegaram aonde chegaram porque a política racista da igualitária America teve de reconhecer que inteligencia e capacidade não tem a ver com cor e muito menos com sexo. Porque esse mesmo país teve de reconhecer que se quisessem chegar a Lua precisariam de pessoas como essas mulheres.
Uma questão no minimo pontual sobre a onda fascista que abate o mundo livre, quantas Ketherines iremos perder, iremos sacrificar em nome de ideais totalmente distorcidos. E talvez por isso eu queria tanto ver um elenco um negro e feminino na noite do Oscar recebendo o premio de Melhor Filme, mesmo sabendo que isso não vá acontecer, principalmente tendo concorrentes como "La La Land" e "Moonlight", mas seria lindo uma afronta dessa em tempos tão brancos e tão "republicanos".
Octavia Spencer fez um trabalho brilhante, mas 2017 é o ano de sua amiga e colega Viola Davis, e ainda assim, seria dificílimo vê-la com a estatueta na mão pela segunda vez me menos de 5 anos. E se o filme não tem lá grande chance na categoria principal, em melhor roteiro adaptado não seria uma aposta muito ruim. E acho que o fato de Taraji P. Henson não ter sido indicada ao Oscar de Melhor Atriz foi uma das maiores injustiças da edição.
"Hidden Figures": que filme, que mulheres, que história necessária. <3
Até o Último Homem
4.2 2,0K Assista AgoraUma direção impecável de Mel Gibson, em, provavelmente, um de seus melhores trabalhos. Ele captura o filme em uma dimensão ampla: ele não simplesmente comove e envolve nas cenas mais leves, como também deixa tenso quem assiste, além dos vários sustos, nas cenas de guerra. Não é apenas um filme de guerra, e seu único trunfo não está nas cenas violentas absurdamente realistas, ele conta com uma ideia baseada em algo do tipo "nunca desista de seus ideais".
O jovem Andrew Garfiel fez um trabalho um ótimo trabalho, no entanto nada realmente chamasse a atenção. Outro forte aspecto do filme é sua técnica sonora, com uma edição perfeita e uma mixagem calculada nos mínimos detalhes, os sons tornam-se tão reais que a perturbação na sala de cinema é inevitável.
Um forte canditato tecnico nas categorias: melhor edição, melhor edição de som e melhor mixagem de som. Me surpreenderia se Garfield recebesse o Oscar de Melhor Ator. Mel Gibson também não seria a melhor aposta.
Um bom filme, e uma das melhores experiências que tive com um filme de ação.
Elle
3.8 886Meu deus, que dor de cabeça esse filme me deu. Levei horas pra digeri-lo e formar uma opinião sobre. A admiração que eu tenho por essa obra tem tamanho semelhante ao desconforto que sinto ao escrever sobre esse filme. A grande questão: pós-feminista ou machista? Talvez uma linha tênue entre esse dois mundos. Uma provocação além de qualquer coisa.
O estupro foi historicamente apresentado no cinema como uma cena de sexo e não como a violência que ela realmente é, característica que vem dos enquadramentos e do movimento de câmera que sexualiza a cena, virilizando o homem e sensualizando a mulher. "Elle" não é assim.
As cenas de estupro são não só representadas em um enquadramento fixo, em um movimento imperceptível de câmera e em uma paleta de cores mais sombrias, como também são revividas pela personagem em uma clara forma de repetir o desconforto no publico, porque a cena não acalma, não atrai e muito menos desperta o libido alheio, ela é violenta e paralisa o publico quase como uma cena de tortura em um filme policial. O filme tem uma visão especifica do mundo: todos os homens são corrompíveis e em dado momento se mostram irracionais e brutos (desde o homem que estupra a protagonista, até o filho que a salva do estuprador), e todas as mulheres são devidamente empoderadas de suas vidas e dotadas de um bom senso indescritível (desde a mãe, com uma vida sexual ativa, até a amiga e sócia que ao se ver traída pelo marido e pelo amigo sabe quem realmente deveria sair de sua vida e quem merecia um voto de perdão). Tudo isso faz com que o telespectador pense que o filme seria o estupro partindo da visão da mulher, o que não é verdade. A visão do estupro aqui é colocada diante de UMA mulher especifica, uma personagem densa e complexa, que lida de sua forma com a experiencia.
Michèle não é uma personagem e uma mulher qualquer, ela tem uma história que desenha todo seu comportamento social: a história de assassinato cometido por seu pai. Isso faz dela uma mulher que não só conduz sua vida com mãos de ferro, como também se mostra totalmente sem confiança no sistema e nos homens. Mais do que tudo isso, Michèle é de varias formas uma sociopata moderada. E entende-la em sua completa dimensão é o ponto de partida para compreender a visão toda do filme sobre o ato principal: o estupro.
Michèle não se abate diante da violência que a acomete, ela lida com o acontecido com uma naturalidade que desde o principio intriga e incomoda quem assiste. Michèle lida com uma naturalidade estranhíssima, similar a forma com que ela assimilou o fato de seu pai assassinar seus vizinhos. O olhar vazio da menina queimando moveis diz muito sobre a forma que ela lida com a violência e com o trauma, de forma silenciosa e comedida.
Em momento algum, ao contrário do que é dito, "Elle" retrata o estupro de forma corriqueira ou ignora a tremenda violência que essa ação é.
O estuprador não é um aluno que a odeia ou que a ama, é um vizinho cordial e distante, simpático e religioso, e mais, um homem por qual Michèle possui grande atração. Esse é um ponto importante do filme, o estuprador não é colocado como um homem fora dos moldes ou de forma alguma peculiar, ele é colocado como um homem normal, algo que mostra que a visão de "Elle" sobre o estupro é que esse é um mal social e não puramente biológico, um conceito que liga essa violência ao machismo e ao conceito patriarcal que vigora no ocidente.
Michèle não gosta de ser estuprada, ela sente raiva e repudia o estuprador, ela odeia a dor que lhe foi causada e em momento algum sente vontade de repeti-la. No entanto, o desejo por aquele homem é anterior a descoberta de que ele era o estuprador, e por vezes ela controla seu desejo por ele, e tem total poder sobre o que lhe abate. Michèle vive então desde o momento da descoberta até os últimos segundos, uma narrativa que traz Patrick para seu ciclo, que faz com que ele se sinta aberto o suficiente para que ele tente violenta-la nas condições anteriores, mesmo sabendo que ela soubesse sua identidade. Ela atrai o estuprador para seu pior fim e consegue sua vingança, vingança essa que nem lhe suja as mãos.
Paul Verhoeven apresenta um filme brilhantemente provocador, que parece trazer um certo tipo de telespectador para lados totalmente opostos, e esse telespectador é aquele com uma visão radical das coisas. O filme é mais do que um retrato sobre o estupro, mas um retrato sobre a realidade acerca da dimensão psicológica de uma mulher ímpar, que só poderia ser encarnada pela rainha do cinea frances Isabelle Huppert. Michèle é uma mulher forte, dona de si e de seu desejo, e mais do que tudo isso, é uma mulher especialmente genial em seus objetivos.
Um filme instigante e genial. Um dos melhores que já assisti, em absoluto.
Que Isabelle Huppert merece o Oscar de Melhor Atriz isso é fato, e não é a primeira vez que isso é dito e muito menos será a última, seu trabalho é inegavelmente extraórdinário. Tanto que rendeu a uma artista estrangeira uma indicação a maior premiação da Mecca cinematográfica tão cheia de si. O que me pergunto é: aonde ficou "Elle" por Melhor Longa Estrangeiro?
Loving: Uma História de Amor
3.7 292 Assista AgoraGrande filme! Uma história maravilhosa com atuações brilhantes e uma direção sensibilíssima. O caso de Richard e Mildred Loving é desenhado com todo o cuidado, cálculo, sensibilidade e lentidão na dose certa, algo raríssimo em filmes norte-americanos. A fotografia foi outro aspecto que também me chamou bastante atenção, os enquadramentos e o movimento de camera se sintoniza com uma iluminação cuidadosa, fazendo da fotografia grande aliado dos atores. Jeff Nichols cria um filme que prende, ou ao menos ME prendeu, um filme que faz você se sentir sufocado junto com as personagens, que emociona, que toca e que conduz o espectador para uma reflexão: não estamos tão longe desse cenário. Senti falta uma trilha sonora mais concisa e um roteiro um pouco mais rico, que desse mais voz e oportunidade a Mildred (ou talvez a falta de voz da personagem seja mais um aspecto que dê maior verossimilhança a história, uma visão totalmente diferente do que é dada ao também indicado "Hidden Figures" que dá mais voz a mulher negra, um aspecto que cativa e agrada, mas infelizmente quase sempre bastante irreal). Esse é o quinto dos nove filmes indicados ao Oscar que é baseado em fatos reais, algo totalmente tipico na premiação. E também, é o segundo a tratar da segregação racial da década de 60, algo totalmente Atípico na premiação americana. É uma resposta a falta de negros nas indicações no ano de 2016, talvez estamos para ver a cerimonia da Academy mais multirracial de sua história, felizmente.