Assistir esse filme depois de um ano dentro de casa é ao mesmo tempo catártico e ansiógeno. Incrível como a arte absorve o que há de mais humano no humano e o ultrapassa; A narrativa do filme é abstrata, apesar dos elementos e cenário cotidianos, mas retrata perfeitamente os afetos que surgiram do isolamento social. A progressão da história sufoca e faz a adrenalina subir. Tem momentos dignos de grandes tragédias como Medeia. É como se fizessem um filme sobre o que vivemos antes de vivermos. Estou encantado, absorvido pela capacidade representativa de uma obra de arte. Para ver esse filme, o ano é 2021.
Assisti Ventos de Agosto bem depois de ter assistido Boi Neon e isso resignificou a minha primeira experiência.
Ventos de Agosto tem uma narrativa poética e abstrata, em que a sonoplastia muitas vezes é a narradora. O vento é personagem constante do filme, aparece através dos sons, da propagação das músicas e do contraste entre o rock que embala os sonhos de fuga daquela realidade pela personagem feminina e o silêncio que simboliza a tentativa de elaborar o luto do personagem masculino. A fotografia monumental da natureza em uma paleta de cores fria, e os ambientes fechados e íntimos da vila e seus habitantes iluminados por velas constroem um contraste muito forte; É como se Adão e Eva estivessem insatisfeitos no paraíso.
Me pareceu uma pintura e uma sinfonia ao mesmo tempo, uma narrativa muito revigorante de ver no cinema. De fato, quem busca um roteiro linear pode se decepcionar com o filme, assim como eu me decepcionei com Boi Neon, que agora quero rever com outros olhos. É um filme imersivo, tem cenas que nos transportam para dentro do cenário paradisíaco de tão potentes que são. E a construção das personagens também dispensa falas e um roteiro pedagógico, é possível compartilhar os sentimentos das personagens durante todo o filme sem escutá-los. Enfim, um filme que emociona junto.
A figura do pesquisador que grava o vento e aquilo que o vento traz com ele é cativante e metáfora representativa do trabalho do diretor. Foi difícil regular o som para assistir o filme: o contraste entre o rock pesado, os sons da natureza e as falas truncadas e abafadas deixa evidente a capacidade do diretor de contar uma historia de maneira completamente poética sem os artifícios de uma narrativa tradicional.
já que o prato do dia é a discussão de uma "africa idílica" ou não, resolvi ver este que já estava na minha biblioteca faz um tempinho. É desconfortável vir aqui no filmow e deparar-me apenas com comparações com o cinema europeu ou americano quando na verdade eu buscava mais referências regionais e históricas como esta história.
a capacidade poética do diretor é inegável e inquestionável: em seu olhar é possível apreciar as metáforas para temas sociais, religiosos e íntimos como quem aprecia um poema ou uma pintura; ele construiu uma história contada tanto na sonoplastia quanto nos cortes oníricos o que torna a experiência rica e multissensorial. As personagens lidam com o desejo que as move com tanta determinação que a trama é conduzida mais através de suas emoções do que nos eventos descritos no roteiro: uma linguagem muito refrescante de se ver no cinema.
a dualidade entre o selvagem e o civilizado é o pendulo que oscila e dá ritmo a trama. é interessante ver a construção desses elementos através da arquitetura, figurino e objetos de cena. A
é a epítome de um sentimento de hibridismo que permeia as personagens e que suscitou sentimentos desta ordem em mim também. O incomodo com o grafismo do
de certa maneira me fez sintonizar com a revolta das personagens em relação a sua tradição na mesma medida que não conseguem se livrar dela.
não sou capacitado de falar sobre temas de negritude, mas isso não me impediu, de certa maneira, de me ver representado na narrativa que aborda questões contemporâneas de culturas pós-coloniais como a busca por uma vida melhor que sempre está no exterior (e seus ideais importados) e que parece ser impossível de ser obtida em si mesmo, no interior, in loco. Engraçado que o final,
Tive o desprazer de assistir Ata-me e Kika na mesma semana (quarentena, resolvi tapar os buracos da filmografia do diretor). Ambos os filmes ainda conservam o caráter polêmico mesmo depois de tanto tempo, basta ver os comentários aqui no filmow, apesar de terem envelhecido mal, para dizer assim...
É injusto analisar os dois filmes que são abertamente satíricos como um retrato fiel da realidade e acusá-los de qualquer coisa. Também não é possível passar batido o caráter violento e perturbador que a linguagem narrativa do filme da à questão tão importante da violência contra a mulher: Não é possível analisar com os olhos de hoje, tampouco passar batido.
As piadas de estupro retornam no recente Amantes Passageiros, também indigesto, o que me faz pensar que talvez o diretor realmente veja graça nisso. Mas o mesmo tema dá uma carga dramática e sombria em Má Educação e Pele que Habito, o que me faz ficar em dúvida.
Acredito que na época em que foi lançado o exagero de Ata-me e Kika rendia várias capas de revista e muito frisson o que na época valia muito dinheiro e exposição. Sem dúvida grande parte do sucesso do diretor é devido a filmes e narrativas como essas, apesar de seus dramas serem exponencialmente mais sofisticados e relevantes que suas comédias. Nestes dois filmes que menciono, Almodôvar parece retratar as mazelas da sociedade em que estava inserido usando-se da própria linguagem grotesca do folhetim sensacionalista que critica para criar uma narrativa hiper-realista de uma sociedade movida à sexo e violência.
Depois de ter assistido Dor e Glória, o suposto auto-biográfico, passei a ver essas figuras femininas de Almodôvar como alter-egos dele mesmo, representando sua sexualidade que à época deve ter sido uma ferida aberta difícil de cicatrizar. E, se vc se permitir ver assim, é possível ver a qualidade visceral que essas personagens são capazes de nos fazer sentir, inclusive sensações desprazerosas, como medo e incompreensão, afinal arte não é só sobre beleza e prazer, certo? Mas isso são especulações minhas.
achei um filme turning point do diretor; ainda não terminei a sua videografia mas, assistindo esse, tive a impressão que ele se referia aos seus filmes dos anos 1990, como Exotica, ao mesmo tempo que investiga a linguagem dos filmes que sucederiam este.
Egoyan aborda essa linguagem das meias verdades e pavor moral com muito mais ritmo nos seus filmes mais recentes; a construção da narrativa que surpreende, torna a experiência imersiva, e a emoção vibra com cada revelação E que eu acho que faltou neste filme, na minha opinião, as pontas ficaram soltas, e o ritmo do filme ficou meio morno. Também vejo a descrença nas instituições como estado e igreja nos seus filmes mais recentes e que parece germinar aqui. A atuação da Reese também só acelerou e não deu partida.
Comprar Ingressos
Este site usa cookies para oferecer a melhor experiência possível. Ao navegar em nosso site, você concorda com o uso de cookies.
Se você precisar de mais informações e / ou não quiser que os cookies sejam colocados ao usar o site, visite a página da Política de Privacidade.
O Lar
3.9 65Assistir esse filme depois de um ano dentro de casa é ao mesmo tempo catártico e ansiógeno. Incrível como a arte absorve o que há de mais humano no humano e o ultrapassa; A narrativa do filme é abstrata, apesar dos elementos e cenário cotidianos, mas retrata perfeitamente os afetos que surgiram do isolamento social. A progressão da história sufoca e faz a adrenalina subir. Tem momentos dignos de grandes tragédias como Medeia. É como se fizessem um filme sobre o que vivemos antes de vivermos. Estou encantado, absorvido pela capacidade representativa de uma obra de arte. Para ver esse filme, o ano é 2021.
Ventos de Agosto
3.3 73 Assista AgoraAssisti Ventos de Agosto bem depois de ter assistido Boi Neon e isso resignificou a minha primeira experiência.
Ventos de Agosto tem uma narrativa poética e abstrata, em que a sonoplastia muitas vezes é a narradora. O vento é personagem constante do filme, aparece através dos sons, da propagação das músicas e do contraste entre o rock que embala os sonhos de fuga daquela realidade pela personagem feminina e o silêncio que simboliza a tentativa de elaborar o luto do personagem masculino. A fotografia monumental da natureza em uma paleta de cores fria, e os ambientes fechados e íntimos da vila e seus habitantes iluminados por velas constroem um contraste muito forte; É como se Adão e Eva estivessem insatisfeitos no paraíso.
Me pareceu uma pintura e uma sinfonia ao mesmo tempo, uma narrativa muito revigorante de ver no cinema. De fato, quem busca um roteiro linear pode se decepcionar com o filme, assim como eu me decepcionei com Boi Neon, que agora quero rever com outros olhos. É um filme imersivo, tem cenas que nos transportam para dentro do cenário paradisíaco de tão potentes que são. E a construção das personagens também dispensa falas e um roteiro pedagógico, é possível compartilhar os sentimentos das personagens durante todo o filme sem escutá-los. Enfim, um filme que emociona junto.
A figura do pesquisador que grava o vento e aquilo que o vento traz com ele é cativante e metáfora representativa do trabalho do diretor. Foi difícil regular o som para assistir o filme: o contraste entre o rock pesado, os sons da natureza e as falas truncadas e abafadas deixa evidente a capacidade do diretor de contar uma historia de maneira completamente poética sem os artifícios de uma narrativa tradicional.
A Viagem da Hiena
4.0 23já que o prato do dia é a discussão de uma "africa idílica" ou não, resolvi ver este que já estava na minha biblioteca faz um tempinho. É desconfortável vir aqui no filmow e deparar-me apenas com comparações com o cinema europeu ou americano quando na verdade eu buscava mais referências regionais e históricas como esta história.
a capacidade poética do diretor é inegável e inquestionável: em seu olhar é possível apreciar as metáforas para temas sociais, religiosos e íntimos como quem aprecia um poema ou uma pintura; ele construiu uma história contada tanto na sonoplastia quanto nos cortes oníricos o que torna a experiência rica e multissensorial. As personagens lidam com o desejo que as move com tanta determinação que a trama é conduzida mais através de suas emoções do que nos eventos descritos no roteiro: uma linguagem muito refrescante de se ver no cinema.
a dualidade entre o selvagem e o civilizado é o pendulo que oscila e dá ritmo a trama. é interessante ver a construção desses elementos através da arquitetura, figurino e objetos de cena. A
motocicleta com caveira
abate dos animais
não sou capacitado de falar sobre temas de negritude, mas isso não me impediu, de certa maneira, de me ver representado na narrativa que aborda questões contemporâneas de culturas pós-coloniais como a busca por uma vida melhor que sempre está no exterior (e seus ideais importados) e que parece ser impossível de ser obtida em si mesmo, no interior, in loco. Engraçado que o final,
apesar de retratar uma personagem sem fôlego
[/spoiler]
[spoiler]
Ata-me!
3.7 550Tive o desprazer de assistir Ata-me e Kika na mesma semana (quarentena, resolvi tapar os buracos da filmografia do diretor). Ambos os filmes ainda conservam o caráter polêmico mesmo depois de tanto tempo, basta ver os comentários aqui no filmow, apesar de terem envelhecido mal, para dizer assim...
É injusto analisar os dois filmes que são abertamente satíricos como um retrato fiel da realidade e acusá-los de qualquer coisa. Também não é possível passar batido o caráter violento e perturbador que a linguagem narrativa do filme da à questão tão importante da violência contra a mulher: Não é possível analisar com os olhos de hoje, tampouco passar batido.
As piadas de estupro retornam no recente Amantes Passageiros, também indigesto, o que me faz pensar que talvez o diretor realmente veja graça nisso. Mas o mesmo tema dá uma carga dramática e sombria em Má Educação e Pele que Habito, o que me faz ficar em dúvida.
Acredito que na época em que foi lançado o exagero de Ata-me e Kika rendia várias capas de revista e muito frisson o que na época valia muito dinheiro e exposição. Sem dúvida grande parte do sucesso do diretor é devido a filmes e narrativas como essas, apesar de seus dramas serem exponencialmente mais sofisticados e relevantes que suas comédias.
Nestes dois filmes que menciono, Almodôvar parece retratar as mazelas da sociedade em que estava inserido usando-se da própria linguagem grotesca do folhetim sensacionalista que critica para criar uma narrativa hiper-realista de uma sociedade movida à sexo e violência.
Depois de ter assistido Dor e Glória, o suposto auto-biográfico, passei a ver essas figuras femininas de Almodôvar como alter-egos dele mesmo, representando sua sexualidade que à época deve ter sido uma ferida aberta difícil de cicatrizar. E, se vc se permitir ver assim, é possível ver a qualidade visceral que essas personagens são capazes de nos fazer sentir, inclusive sensações desprazerosas, como medo e incompreensão, afinal arte não é só sobre beleza e prazer, certo? Mas isso são especulações minhas.
Sem Evidências
3.3 252 Assista Agoraachei um filme turning point do diretor; ainda não terminei a sua videografia mas, assistindo esse, tive a impressão que ele se referia aos seus filmes dos anos 1990, como Exotica, ao mesmo tempo que investiga a linguagem dos filmes que sucederiam este.
Egoyan aborda essa linguagem das meias verdades e pavor moral com muito mais ritmo nos seus filmes mais recentes; a construção da narrativa que surpreende, torna a experiência imersiva, e a emoção vibra com cada revelação E que eu acho que faltou neste filme, na minha opinião, as pontas ficaram soltas, e o ritmo do filme ficou meio morno. Também vejo a descrença nas instituições como estado e igreja nos seus filmes mais recentes e que parece germinar aqui. A atuação da Reese também só acelerou e não deu partida.