Um dos movimentos cinematográficos mais famosos da história, O Expressionismo Alemão ganha uma mostra inédita no À La Carte, a partir da próxima quinta-feira, 18 de março.
Os longas selecionados são expoentes do movimento e obras-primas de seus diretores. O festival comemora o centenário de “O Gabinete do Dr. Caligari” e “A Morte Cansada”, e dá largada às homenagens pelos 100 anos de “Nosferatu”, que acontece em 2022. Além destes três, também fazem parte da seleção, “As mãos de Orlac”, “A caixa de Pandora”, “Metrópolis”, “M o Vampiro de Dusseldorf" e "A última gargalhada". Além da mostra, chegam ao cardápio do streaming dois novos filmes: “Confissões de um tira", thriller policial francês de Jacques Deray, lançado em 1975, e “Puerto escondido”, comédia de 1992, dirigida por Gabriele Salvatores.
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O Expressionismo floresceu no pós-Primeira Guerra Mundial, e se manifestou em diversas vertentes artísticas, como teatro e arquitetura, mas, provavelmente, sua forma mais famosa foi no cinema, com obras de cineastas como F. W. Murnau, Fritz Lang e Robert Wiene. A ideia do movimento era buscar a representação do mundo por meio da subjetividade do artista, e como o momento histórico era soturno, o objetivo era revelar as angústias do ser humano.
Imagens distorcidas, sombras, contrastes, exageros e ângulos de câmera pouco convencionais são algumas das características recorrentes dos filmes produzidos no período. Isso fica bem claro, por exemplo, em “O Gabinete do Dr Caligari”, de Wiene, um marco do movimento, que é um filme mudo de horror, e que traz um olhar deformado do mundo, com cenários deturpadamente geométricos e repletos de influência do gótico e do cubismo.
A busca pela exploração do subjetivo do ser humano levou o cinema expressionista, dessa forma, às imagens que ficam entre a luz e a escuridão, ou o que a crítica alemã Lotte H. Eisner, autora de “A Tela Assombrada”, preferiu definir como “uma espécie de crepúsculo da alma alemã, expressando-se em sombrios e enigmáticos interiores ou em nebulosas e insubstanciais paisagens”. Para ela e o crítico alemão Siegfried Kracauer, autor de “De Caligari a Hitler”, o expressionismo funcionou como uma espécie de consciência coletiva, e manifestação sintomática.
Prestes a completar um século no próximo ano, “Nosferatu”, de Murnau, é uma das obras mais famosas do movimento, e ajudou a definir o filme de vampiro como um gênero, sendo uma influência até hoje. Inspirado no livro clássico de Bram Stoker, traz como protagonista o Conde Orlok (Max Schreck), um vampiro que se apaixona por uma mulher, e leva o terror para a cidade onde ela mora por não ser correspondido.
Ao contrário da pintura expressionista que exagerava nas cores e expressões – um grande exemplo é o quadro “O Grito”, de Edvard Munch –, o cinema tinha que trabalhar com o preto-e-branco, e, para mostrar a angústia interna de seus personagens, fazia, entre outras coisas, um jogo de luz-e-sombra ressaltando o aspecto tétrico do momento e das pessoas. “M: O Vampiro de Dusseldorf”, de Lang, tem como personagem-título um sujeito acusado de assassinar crianças, caçado e julgado por criminosos, que o acusam de romper com o código de ética do submundo. O filme foi banido pelos nazistas em 1934.
“A Caixa de Pandora”, por sua vez, marca uma parceria inigualável entre o diretor Georg Wilhelm Pabst e a atriz Louise Brooks, cujo rosto emoldurado pelos cabelos curtos e franja se tornou icônico. Sobre a intérprete, Eisner escreveu que “era uma grande atriz agraciada com inteligência incomparável, e não apenas uma criatura deslumbrante.” Charles Silver, curador de filmes do museu MOMA, definiu o longa como uma combinação entre expressionismo e melodrama. “Onde Murnau é um poeta, e Lang um mitólogo, Pabst está mais interessado em assuntos contemporâneos, como psicologia e sexualidade. Pensando nesse sentido, o filme era extremamente moderno, e ainda continua assim, mas o público de 1928 não estavam interessados na ousadia e sinceridade.”
Adam Roberts, historiador de ficção-científica, destaca de “Metrópolis”, também de Lang, a robô Maria, interpretada por Brigitte Helm. “A presença mais poderosa no filme não é de nenhum humano, mas de Maria, cujo visual é inspirado na Art Deco. Sentada, num pódio, enquanto círculos de luz emolduram seu corpo, a própria quietude da robô fazem dela uma presença poderosa na tela.”
Os filmes que completam a mostra do À La Carte, “A morte cansada” e “As mãos de Orlac”, ajudam a ampliar o panorama sobre o movimento expressionista no cinema alemão, que até hoje influenciou e influencia diretores e diretoras por todo o mundo, como Alfred Hitchcock, que chegou a trabalhar num estúdio alemão como assistente, Werner Herzog e até Tim Burton, com seus personagens pouco convencionais e marginalizados por uma sociedade normativa.
Imagem: Belas Artes À La Carte / Divulgação