Eu acabo de assistir essa primeira temporada de novo, e estou começando a me convencer que é uma daquelas fitas em que o meu senso crítico fica meio anestesiado pela afeição. Como eu gosto dessa série!
Praticamente tudo dá certo por aqui, em minha opinião. Se a série fosse apenas um registro das últimas décadas da república, já teria material mais do que suficiente para uma estória e tanto, mas eu acho que os idealizadores acertaram a mão em misturar a parte histórica com material fictício original. Muita gente não concorda comigo nisso. Um professor de história uma vez falou pra mim que parou de assistir logo no primeiro episódio quando viu que dois dos personagens principais seriam fictícios; disse que achou uma inovação ‘pós-pós-moderna’ descabida. (seja lá o que isso queira dizer) Mas eu acho que os personagens complementares servem para deixar o mundo de Roma mais complexo, mais ‘espesso’, por assim dizer. Você sente que pessoas poderiam ter vivido nesse mundo, seja ele fiel ao que realmente ocorreu ou não. (e geralmente, quanto mais vivo e detalhado é o playground, mais divertida é a brincadeira) Ao invés de uma crônica mais direta de guerras e desavenças entre patrícios, temos uma coleção entrecruzada de estorietas sobre gente de quase todo tipo nessa época fascinante.
E muito do que é fictício está entre as melhores partes da série. Voreno e Pullo formam um bromance que é impossível não simpatizar. O drama do ‘núcleo familiar’ de Voreno é fundamental pra série funcionar. (Niobe é ótima) Até os personagens fictícios menores são bacanas; dou destaque especial ao Posca, o escravo grego de César, um dos meus favoritos.
Eu quase chamaria Atia de uma personagem fictícia também, visto que ela provavelmente é a que mais difere (nas ações e na personalidade) da sua contraparte histórica. Ela cumpre muito bem um lugar-comum da ficção histórica sobre Roma, o da matrona maquiavélica ambiciosa que sorrateiramente mexe os pauzinhos e influencia os homens importantes de várias maneiras. Não posso deixar de mencionar que Polly Walker é uma das criaturas mais bonitas que eu já vi diante de uma câmera. Dificilmente tenho a oportunidade de ver uma atriz mais velha cujos charmes são tão bem aproveitados. (ah, e eu achei adorável quando ela comparou a sua cena fazendo o ritual do sacrifício do boi com a famosa cena do baile em Carrie)
Quanto aos personagens (um pouco mais) históricos, a coisa interessante é que, embora poucos se pareçam com as figuras que interpretam (com base nas esculturas que temos), por algum motivo eu acho que todos tem o visual exatamente apropriado para a personalidade das mesmas. (aparências adequadas para a virtú, pode-se dizer; talvez seja por isso que os diretores optaram por tantas cenas em que nós vemos esses rostos bem de perto, sempre com uma iluminação dramática) No momento, não consigo pensar nenhum outro filme ou série que rivalize com essa no sentido de retratar essas figuras específicas; em dois minutos eu consigo acreditar que esse é o Júlio César, aquele o Marco Antônio, o Otaviano, o Cícero, a Cleópatra, &c.
A série ganha muito com a interação entre suas partes histórica e fictícia. Assistindo pela segunda vez, eu percebi como cada movimento na estória é meticulosamente planejado.
(e como cada engrenagem leva inevitavelmente para o final trágico; a morte de César é brutal, e de partir o coração)
A fita também é tecnicamente admirável; sem dúvida tem o pedigree HBO. (de fato, o custo excessivo da produção foi o motivo pelo qual ela não durou muito) Em poucos episódios, nós nos familiarizamos com os ambientes da série, e eu mesmo logo esqueci que eram cenários. Eu me sinto como se conhecesse a fachada da casa de Voreno quase tão bem quanto a vila do Chaves. O senado estilo ‘nave espacial’ (que tem mais a ver com filmes do passado e pinturas do que com o verdadeiro templo de Júpiter da época) também é icônico. Até mesmo as malditas pulseiras que são um sine qua non inexplicável do gênero me fazem sorrir e pensar em Kirk Douglas e em Xena a Princesa Guerreira. Sonoramente, acho essa série uma exceção em relação às trilhas remelentas desse gênero – gosto muito das musiquinhas, especialmente o Tema de Niobe.
Uma das coisas que as pessoas criticam nessa série é que não existem muitas ‘batalhas épicas’. E eu até acho que essas pessoas estão certas, mas não ligo muito pra isso. Se a série já era caríssima sem muitas batalhas, um excesso delas sairia por um absurdo. Também vou dizer que estou entre aqueles que acham que é muito difícil fazer uma 'batalha épica' que preste; as vezes prefiro passar sem do que ver outra cópia malfeita de Coração Valente ou Resgate do Soldado Ryan. Eu gosto que o foco da série esteja mais nas intrigas e no drama dos personagens. (sem esquecer também o humor – talvez eu esteja sozinho nisso, mas achei a série muito engraçada; não só os personagens principais brilham nesse quesito, mas também existem vários detalhes engraçados que ocorrem à margem da ação principal (e.g.: o Sr. ‘telejornal ao vivo’)).
Enfim, falei tanto que acho que deveria ter começado esse comentário com um ‘olá amantes da sétima arte’ (a la Maurílio dos Anjos) pra atrair gente que gosta de textão. Em resumo, é uma ótima série, e acho que quem não conhece (e gosta desse tipo de coisa) deveria dar uma chance.
Eu fiquei sabendo da existência de Hermann ou Arminius pela primeira vez ao ler o romance de Robert Graves, I Claudius. Foi interessante descobrir que fizeram uma série sobre a história dessa figura curiosa da história alemã,
o rapaz criado entre os romanos que depois se rebelou e se tornou um líder da tribo germânica dos Queruscos, então uma província do império. (o artigo da Wikipédia sobre Hermann nos diz que por muito tempo ele foi como um símbolo romântico do nacionalismo alemão, inclusive pelos nazistas)
A série é bem decente, eu acho. Bem feita. Hermann (Laurence Rupp) e Thusnelda (Jeanne Goursaud) são ótimos. O Latim na boca dos personagens romanos certamente foi uma ótima jogada. Não conheço tão bem os detalhes para saber quais foram as ‘liberdades históricas’ tomadas, mas aparentemente foram muitas. Folkwin, um dos personagens principais, nunca existiu. Mas isso, para mim, não é problema. A ideia do triângulo amoroso é boa. Eu diria também que o dilema da ambiguidade de pertencer a dois povos ao mesmo tempo é bem explorado, e ressoa para além de Hermann.
Quanto às cenas de combate, certamente elas são muito bonitas. Mas eu sempre acho que cenas desse tipo exageram um pouquinho na sala de edição e ficam um tiquinho melosas. Prefiro quando essas cenas são mais secas, estilo Barry Lyndon. Talvez seja preconceito meu, acho que nem vou mais comentar esse tipo de coisa.
Imagino que essa série vá continuar, e creio que há potencial aqui. Muitas coisas interessantes acontecem mais adiante na vida de Hermann. É esperar pra ver se esses eventos vão ser bem explorados.
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Roma (1ª Temporada)
4.5 147 Assista AgoraEu acabo de assistir essa primeira temporada de novo, e estou começando a me convencer que é uma daquelas fitas em que o meu senso crítico fica meio anestesiado pela afeição. Como eu gosto dessa série!
Praticamente tudo dá certo por aqui, em minha opinião. Se a série fosse apenas um registro das últimas décadas da república, já teria material mais do que suficiente para uma estória e tanto, mas eu acho que os idealizadores acertaram a mão em misturar a parte histórica com material fictício original. Muita gente não concorda comigo nisso. Um professor de história uma vez falou pra mim que parou de assistir logo no primeiro episódio quando viu que dois dos personagens principais seriam fictícios; disse que achou uma inovação ‘pós-pós-moderna’ descabida. (seja lá o que isso queira dizer) Mas eu acho que os personagens complementares servem para deixar o mundo de Roma mais complexo, mais ‘espesso’, por assim dizer. Você sente que pessoas poderiam ter vivido nesse mundo, seja ele fiel ao que realmente ocorreu ou não. (e geralmente, quanto mais vivo e detalhado é o playground, mais divertida é a brincadeira) Ao invés de uma crônica mais direta de guerras e desavenças entre patrícios, temos uma coleção entrecruzada de estorietas sobre gente de quase todo tipo nessa época fascinante.
E muito do que é fictício está entre as melhores partes da série. Voreno e Pullo formam um bromance que é impossível não simpatizar. O drama do ‘núcleo familiar’ de Voreno é fundamental pra série funcionar. (Niobe é ótima) Até os personagens fictícios menores são bacanas; dou destaque especial ao Posca, o escravo grego de César, um dos meus favoritos.
Eu quase chamaria Atia de uma personagem fictícia também, visto que ela provavelmente é a que mais difere (nas ações e na personalidade) da sua contraparte histórica. Ela cumpre muito bem um lugar-comum da ficção histórica sobre Roma, o da matrona maquiavélica ambiciosa que sorrateiramente mexe os pauzinhos e influencia os homens importantes de várias maneiras. Não posso deixar de mencionar que Polly Walker é uma das criaturas mais bonitas que eu já vi diante de uma câmera. Dificilmente tenho a oportunidade de ver uma atriz mais velha cujos charmes são tão bem aproveitados. (ah, e eu achei adorável quando ela comparou a sua cena fazendo o ritual do sacrifício do boi com a famosa cena do baile em Carrie)
Quanto aos personagens (um pouco mais) históricos, a coisa interessante é que, embora poucos se pareçam com as figuras que interpretam (com base nas esculturas que temos), por algum motivo eu acho que todos tem o visual exatamente apropriado para a personalidade das mesmas. (aparências adequadas para a virtú, pode-se dizer; talvez seja por isso que os diretores optaram por tantas cenas em que nós vemos esses rostos bem de perto, sempre com uma iluminação dramática) No momento, não consigo pensar nenhum outro filme ou série que rivalize com essa no sentido de retratar essas figuras específicas; em dois minutos eu consigo acreditar que esse é o Júlio César, aquele o Marco Antônio, o Otaviano, o Cícero, a Cleópatra, &c.
A série ganha muito com a interação entre suas partes histórica e fictícia. Assistindo pela segunda vez, eu percebi como cada movimento na estória é meticulosamente planejado.
(e como cada engrenagem leva inevitavelmente para o final trágico; a morte de César é brutal, e de partir o coração)
A fita também é tecnicamente admirável; sem dúvida tem o pedigree HBO. (de fato, o custo excessivo da produção foi o motivo pelo qual ela não durou muito) Em poucos episódios, nós nos familiarizamos com os ambientes da série, e eu mesmo logo esqueci que eram cenários. Eu me sinto como se conhecesse a fachada da casa de Voreno quase tão bem quanto a vila do Chaves. O senado estilo ‘nave espacial’ (que tem mais a ver com filmes do passado e pinturas do que com o verdadeiro templo de Júpiter da época) também é icônico. Até mesmo as malditas pulseiras que são um sine qua non inexplicável do gênero me fazem sorrir e pensar em Kirk Douglas e em Xena a Princesa Guerreira. Sonoramente, acho essa série uma exceção em relação às trilhas remelentas desse gênero – gosto muito das musiquinhas, especialmente o Tema de Niobe.
Uma das coisas que as pessoas criticam nessa série é que não existem muitas ‘batalhas épicas’. E eu até acho que essas pessoas estão certas, mas não ligo muito pra isso. Se a série já era caríssima sem muitas batalhas, um excesso delas sairia por um absurdo. Também vou dizer que estou entre aqueles que acham que é muito difícil fazer uma 'batalha épica' que preste; as vezes prefiro passar sem do que ver outra cópia malfeita de Coração Valente ou Resgate do Soldado Ryan. Eu gosto que o foco da série esteja mais nas intrigas e no drama dos personagens. (sem esquecer também o humor – talvez eu esteja sozinho nisso, mas achei a série muito engraçada; não só os personagens principais brilham nesse quesito, mas também existem vários detalhes engraçados que ocorrem à margem da ação principal (e.g.: o Sr. ‘telejornal ao vivo’)).
Enfim, falei tanto que acho que deveria ter começado esse comentário com um ‘olá amantes da sétima arte’ (a la Maurílio dos Anjos) pra atrair gente que gosta de textão. Em resumo, é uma ótima série, e acho que quem não conhece (e gosta desse tipo de coisa) deveria dar uma chance.
Bárbaros (1ª Temporada)
3.7 86 Assista AgoraEu fiquei sabendo da existência de Hermann ou Arminius pela primeira vez ao ler o romance de Robert Graves, I Claudius. Foi interessante descobrir que fizeram uma série sobre a história dessa figura curiosa da história alemã,
o rapaz criado entre os romanos que depois se rebelou e se tornou um líder da tribo germânica dos Queruscos, então uma província do império. (o artigo da Wikipédia sobre Hermann nos diz que por muito tempo ele foi como um símbolo romântico do nacionalismo alemão, inclusive pelos nazistas)
A série é bem decente, eu acho. Bem feita. Hermann (Laurence Rupp) e Thusnelda (Jeanne Goursaud) são ótimos. O Latim na boca dos personagens romanos certamente foi uma ótima jogada. Não conheço tão bem os detalhes para saber quais foram as ‘liberdades históricas’ tomadas, mas aparentemente foram muitas. Folkwin, um dos personagens principais, nunca existiu. Mas isso, para mim, não é problema. A ideia do triângulo amoroso é boa. Eu diria também que o dilema da ambiguidade de pertencer a dois povos ao mesmo tempo é bem explorado, e ressoa para além de Hermann.
Quanto às cenas de combate, certamente elas são muito bonitas. Mas eu sempre acho que cenas desse tipo exageram um pouquinho na sala de edição e ficam um tiquinho melosas. Prefiro quando essas cenas são mais secas, estilo Barry Lyndon. Talvez seja preconceito meu, acho que nem vou mais comentar esse tipo de coisa.
Imagino que essa série vá continuar, e creio que há potencial aqui. Muitas coisas interessantes acontecem mais adiante na vida de Hermann. É esperar pra ver se esses eventos vão ser bem explorados.