Poderia acontecer com qualquer um, mas aconteceu com eles. Há quarenta anos, o estrelato jogou os holofotes sobre quatro garotos os quais fizeram da vida em turnê uma eterna volta pra casa. Abraçando o viral das cinebiografias sobre rock n’ roll, chega ao streaming The Dirt: Confissões do Mötley Crüe, história da banda homônima expoente do Glam Metal, cenário musical popularizado nos Estados Unidos na década de 80. Como um frenesi, o retrato de um período repleto de vícios e glórias segue a mesma fórmula do entretenimento que levou Bohemian Rhapsody a quebrar recordes de bilheteria, além de reunir os melhores momentos de Rock Of Ages, The Runaways, Quase Famosos, Rock Star…
A união entre glamour e metal implodiu em Los Angeles por volta de 1983. Nos primeiros anos, o Punk, movimento até então predominante, passou a dividir a Sunset Boulevard com uma juventude mais influenciada pela androginia de Iggy Pop e David Bowie do que a anarquia dos Sex Pistols e Ramones. Porém quando o recém chegado Van Halen incorporou o estilo extravagante em 1974, filas dobraram quarteirões da Sunset Strip, apelido do trecho de 2.5km da avenida, já conhecida por suas casas noturnas e bares. Assim, uma nova geração de bandas como Warrant, Poison e Ratt foram influenciadas a lotar um dos locais mais boêmios da cidade com laquê, animal print e muita maquiagem.
Naquela época, havia um senso de comunidade. O custo de vida era barato e assim, a nova geração aprimorava o visual durante o dia e ao cair da noite, se deixava seduzir por uma enorme quantidade de panfletos nas ruas. Nesse contexto, Mötley Crüe aderiu um visual andrógeno e técnicas teatrais, conquistando não só a fama de libertina, como também sucesso comercial. Após assinar com uma grande gravadora em 1981, a banda levou a algazarra ao U.S Festival e dessa forma, chamou atenção para a Sunset Strip no mesmo dia em que Rob Halford entrava no palco em cima de uma motocicleta para “Hell Bent for Leather”.
Esse é o recorte cultural escolhido para introduzir The Dirt. Inspirado no livro de memórias de mesmo nome escrito pelos quatro integrantes, a produção passeia pela jornada da banda americana desde sua formação até a volta por cima em 2003. Isso tudo comprimido durante 1h40 de longa metragem. Como num filme de fantasia, aqui o tempo é o principal vilão. De um lado, a necessidade de satisfazer o setor mais Hollywoodiano e popular, compactando acontecimentos de meses em planos rápidos e picotados. Do outro, a opção de realizar uma produção longa, a qual respeite o desenvolvimento das personagens e confira a ilusão da passagem dos anos. Por qual optar?
Se o diretor Jeff Tremaine (da série de comédias Jackass) tivesse escolhido a segunda opção, a narrativa se assemelharia a Boogie Nights, clássico de Paul Tomas Anderson sobre a trajetória de um ator pornô. A estrutura ascensão-ápice-decadência é a mesma, mas um tem quase três horas de destaque às atuações, o outro é um longo videoclipe. A câmera se movimenta rapidamente, datas correm pelos olhos e sequências que se desdobrariam em meia hora ou mais, são apresentadas em alguns minutos. Infelizmente, desde o advento do YouTube, ficou difícil se concentrar em tomadas longas sem antes checar as mensagens, porém a edição frenética nos permite cada vez menos. Menos veracidade, menos arco dramático, menos absorção dos acontecimentos e por aí vai.
A necessidade de reduzir a narrativa também reflete de maneira negativa nas performances musicais e desenvolvimento de personagens. Enquanto Rami Malek reproduz com riqueza de detalhes a performance de Freddie Mercury no Live Aid de 1985, Daniel Webber se limita a imitar alguns trejeitos de Vince Neil. Nenhuma menção ao Festival que trouxe os primeiros holofotes, ou a participação no primeiro show de heavy metal da União Soviética. Bohemian Rhapsody foca nas questões pessoais do frontman, mas a nova aposta do Netflix falha em abordar a história de cada integrante em proporções iguais. Mesmo com as narrações em off, não se sabe o suficiente sobre o ranzinza Mick Mars, entretanto, acompanhamos o nascimento da persona Nikki Sixx desde sua infância conturbada.
Se o tempo é o principal vilão da trama, os clichês são comparsas. Apesar do roteiro ser baseado em relatos e fatos, os esteriótipos e conveniências trazem a confirmação “Eu já vi isso antes” com frequência. A paleta de cores saturada reproduz o frenesi, como em Rock Of Ages. A seleção dos membros ideais gera estranhamento, como em The Runaways. A liderança do processo criativo é debatida, como em Quase Famosos. E como todo início tem um fim, o embate no estúdio está presente, lembram de Rock Star?. Isso sem contar a caricatura dos exageros, permitida por uma classificação de dezoito anos. O rock se reveza em poucas músicas, mas o álcool aparece no café da manhã, almoço e jantar. E as garotas… Um caso a parte. Reduzidas a objetos sexuais desequilibrados, infiéis e facilmente descartáveis.
A falta de sensibilidade quanto a mulher é comum em retratos sobre o rock, isso porque o meio é, de fato, machista. Querendo ou não, Penelope Spheeris denunciou o tópico no documentário The Metal Years. “Se vier bem vestida, sem problema, mas se estiver gostosa, vai entrar no clube mais rápido”, disse um entrevistado em 1988. Na ficção, o mais próximo do contrário aconteceu quando Jennifer Aniston, se viu num dilema entre apoiar o sucesso do namorado vocalista e manter planos ordinários. Claro, fazia parte da cena meninas se desdobrarem por músicos e como declarou Tommy Lee, fazer sexo oral em baixo nas mesas do Rainbow Bar & Grill. No entanto, atualmente é primordial considerar uma abordagem diferente, pois mesmo que houvesse sexismo, cada groupie, namorada ou esposa tinha seus próprios desejos, convicções e sobretudo, individualidade.
Apesar dos pesares, The Dirt atende várias expectativas criadas pela produção de uma cinebiografia. O gênero nem sempre cumpre a função jornalística de se aproximar dos fatos, mas concretiza histórias idealizadas na imaginação, traz o sentimento de nostalgia e de certa forma, compartilha o universo de celebridades, políticos ou até personalidades da internet. Demorou, mas diante do sucesso comercial de Bohemian Rhapsody, a indústria reconheceu que o rock n’ roll não só rende boas histórias, como também muito lucro. Depois de Queen e Mötley Crüe, Sex Pistols, uma banda completamente anti sistema, aparece como próximo trunfo. É, quando as coisas começam dar certo, não significa que antes elas estiveram erradas. Elas apenas não haviam sido descobertas.
Em 2017, cinco pessoas acordam em uma sala com baldes na cabeça e correntes no pescoço. Uma voz no auto falante anuncia as regras do jogo. Quem gostaria de jogar, já que Jigsaw foi declarado morto há 10 anos? Essa é a premissa do oitavo filme da franquia, Jogos Mortais – Jigsaw, lançado sete anos após uma produção em 3D, a qual foi vendida como o capítulo final. Apesar de satisfazer os fãs mais acalourados, o lançamento peca em realizar uma abordagem superficial da premissa e modificar elementos da narrativa a fim de satisfazer o interesse comercial de suas produtoras.
Após o terceiro filme da saga, a trama de Jogos Mortais ficou cada vez mais complexa. A cada momento um personagem era apontado como auxiliar do sociopata, encarregado de dar continuidade a seus trabalhos. Porém, no oitavo filme, a possibilidade de John Kramer continuar vivo é o fio da meada para a condução do espectador, mas os acontecimentos que se sucedem subestimam a capacidade de compreensão do público e não acrescentam novas informações à narrativa. Com isso, o plot twist, elemento presente em todos os filmes da franquia se torna previsível e confuso pela primeira vez.
Na tentativa de inovar e surpreender graficamente, as armadilhas as quais as personagens são submetidos ao longo dos filmes se tornam cada vez mais complexas e engenhosas, fator que leva o espectador a questionar a genialidade da personagem principal. Esse erro permanece no último lançamento. Se no primeiro longa, os objetivos variavam entre atravessar arames farpados ou matar o outro com um revólver, no último, as vítimas são submetidas a roldanas, parafernalhas automáticas e mecanismos de corte a laser. Somado a isso, ao contrário das outras produções, a violência gráfica é banal e exagerada pelo uso do CGI (imagens geradas por computador).
A direção dos irmãos Michael Spierig e Peter Spierig em nada acrescenta à estrutura já conhecida, pelo contrário, diminuem seu estilo ao ser o único a apresentar uma edição simples sem os habituais cortes rápidos, uso estilizado das cores e ágeis movimentos de câmera. A falta desses fatores dificulta a relação entre esse filme e as demais produções da franquia, pois o lançamento está mais próximo de um spin-off, obra derivada de outra já existente, do que de uma sequência. Além disso, as atuações são péssimas e as justificativas das ações de seus personagens são pouco convincentes, já que esses são desenvolvidos brevemente.
Mesmo com as tentativas de apresentar a trama a uma nova geração, nota-se que a franquia já está há tempos desgastada. É lamentável como uma premissa de terror autêntica e transgressora se redefiniu a fim de satisfazer os interesses comerciais e o desejo do público por narrativas de rápida compreensão cada vez mais superficiais. Com isso, Jigsaw caracteriza-se como a pior produção da saga. O sangue derramado ao longo da história não só causa repulsa, como também mancha o legado de uma produção inicialmente promissora.
“A vida é bonita, realmente é. Cheia de beleza e ilusões. Sem ela, você estaria morto”. Essa frase é dita em um dos momentos mais simbólicos de Gummo (Vidas Sem Destino na tradução brasileira), um retrato das condições de vida do chamado white trash americano. A trama aborda a rotina em Xenia, cidade devastada por um tornado na década de 70. Como sugere o título em português, nesse meio pós apocalíptico, os habitantes vagueiam sem nenhuma expectativa para o futuro.
O termo lixo branco surgiu na década de 1830 por aristocratas e escravos negros para caracterizar caucasianos da classe trabalhadora e pequenos agricultores. A ideia perpetuou ao longo dos anos e atualmente é utilizada de maneira pejorativa para referir-se a pessoas brancas de baixo status social. No filme, esse conceito é perceptível por meio da imundice e desilusão de Xenia, a cidade protagonista, palco do niilismo de seus habitantes. De forma não linear, a produção apresenta a subtrama de diversos personagens, as quais golpeiam o público com temas presentes naquele universo: uso de drogas, abuso sexual, pedofilia, racismo, eutanásia, prostituição, homicídio, suicídio e homofobia.
A maneira documental utilizada na produção confere realismo às cenas. Isso se deve a diversos fatores, como por exemplo o fato do filme conter registros de câmeras distintas como VHS e Polaroid. De acordo com o diretor, a intenção foi parecer que aqueles materiais eram os únicos disponíveis e com isso, montar os takes como uma colagem. Além disso, as filmagens contam com movimentos de câmera que fazem alusão ao estilo amador além de indivíduos fazendo declarações diretamente para quem está gravando, como se respondessem perguntas de uma entrevista.
O filme estreou no 24º Festival de Cinema de Telluride, nos Estados Unidos. Durante a exibição, muitos se retiraram do local devido ao caráter ácido, perturbador e nauseante do longa. Com isso, esses convidados deixaram de compreender o viés questionador e crítico do filme, o qual pretende desmistificar o perfeccionismo do estilo de vida americano e chamar a atenção para o caos que caracteriza diversas minorias pelo país, as quais vivem a mercê da péssima qualidade de vida e precisam se contentar com belezas e ilusões para continuar.
Em seu primeiro longa metragem, o cineasta Dan Trachtenberg agrada público e crítica ao assumir a direção de “Rua Cloverfield, 10”. A produção, assinada por JJ. Abrams (Star Wars, Star Trek) reúne boas atuações em um suspense psicológico e intrigante junto a elementos de ficção científica que remetem ao anterior “Cloverfield – Monstro”, lançado em 2008. Porém, mesmo com a ótima receptividade, o filme apresenta diversas falhas em seu ato final, as quais deixaram parte dos espectadores decepcionados.
No longa, Mary Elizabeth Winsted (Scott Pilgrim Contra o Mundo, O Mensageiro) é Michelle, uma garota que sofre um acidente de carro e acorda em um abrigo subterrâneo tempos depois. Lá, ela é avisada por Howard, interpretado por John Goodman (Trumbo, Se beber não case) que o mundo exterior tornou-se inabitável devido a um ataque químico ou nuclear. Além desses personagens, a trama também conta com a presença de John Gallagher Jr. (Hush, Temporário 12) na pele de Emmet, jovem o qual compartilha o local com os demais, contribuindo para a dinâmica entre Howard e Michelle.
Tanto o roteiro como os recursos técnicos escolhidos pelo diretor são utilizados com o objetivo de manter o suspense e com ele, a principal dúvida, levantada pelos espectadores desde o início: Um apocalipse realmente aconteceu ou Haward é apenas um sequestrador mentiroso?. O filme é considerado “de câmara”, pelo fato de sua ação transcorrer praticamente em um único cenário. Com isso, brinca-se com o senso de segurança do público. Há um misto de tédio, terror e incerteza. O ambiente transmite aconchego, um lar dentro de um espaço reduzido, que é ao mesmo tempo, angustiante. Tais sensações são evidenciadas por meio dos planos, movimentos de câmera, trilha sonora e fortes atuações. O cineasta opta pelo uso de planos mais fechados para transmitir claustrofobia e mais abertos a fim de passar a sensação de conforto. Além disso, em vários momentos a câmera é colocada na mão e de maneira trêmula, demonstra a urgência de muitas ações. Já a trilha sonora, possuí canções nas quais as letras complementam o contexto da história.
O comprometimento dos atores para com suas interpretações contribui para o suspense proposto pela narrativa. Durante a trama, o espectador questionar-se, a todo o momento, a veracidade dos fatos e as reais intenções dos personagens. Logo no primeiro ato, é perceptível o vínculo de sobrevivência entre Michelle e seu sequestrador, Howard. Enquanto ele estabelece uma relação paternal com a garota ao acolhê-la em seu bunker, é perceptível que tal hospitalidade é somente um dos elementos de sua personalidade ambígua, pois ao desenrolar da história, são desvendados defeitos e atitudes horrendas do protagonista. A fim de aliviar a tensão entre esses dois personagens, o Emmet de John Gallagher é um alívio cômico, contribuindo também para atitudes decisivas.
As tensões entre os envolvidos na trama permanecem até o último ato da narrativa, quando elementos de ficção científica tornam-se evidentes, respondendo a diversas questões levantadas anteriormente. Tal fator já era esperado devido à relação de “Rua Cloverfield, 10” com “Cloverfield – Monstro”, filme no qual monstros alienígenas destroem a cidade de Nova York. Porém, a resolução da trama da maneira como foi representada, mostrou-se exagerada e prejudicou o andamento do mistério, além de deixar ao espectador pontas soltas no roteiro com diversos itens mal explicados. Apesar disso, a maior decepção de parte do público deve-se ao reconhecimento de que a mudança de tom no desfecho não foi em prol da criatividade, mas sim, do sucesso de marketing e bilheteria.
“Eu sei que há coisas que você não pode dizer às pessoas, mas eu também sei que há uma história aqui, na qual as pessoas escutarão sobre” — Após quarenta anos, Spotlight retoma o ideal do jornalismo investigativo de “Todos os Homens do Presidente” e destaca-se por retratar o Quarto Poder na sociedade
Meses antes da queda das Torres Gêmeas em 2001, uma equipe jornalistas investigativos do veículo Boston Globe apurava em sigilo, diversas denúncias de abusos sexuais cometidos por padres da Arquidiocese de Boston. Depois de publicada, a matéria realizada pelo “Spotlight”, como era nomeado o grupo, obteve repercussão mundial. Desde então, o trabalho de seus profissionais é constantemente associado às descobertas da dupla Bob Woodward e Carl Bernstein durante o caso Watergate em 1974. Apesar de um ter sido escrito em uma máquina de escrever e outro, em teclados de computador, ambas as situações foram adaptadas para as telas de cinema. As produções possuem muitas semelhanças e destacam-se principalmente, por retratar com primor, os objetivos e impactos da imprensa sobre as relações sociais.
Em 2016, ano de lançamento de “Spotlight – Segredos Revelados” completa-se quarenta anos do lançamento do clássico “Todos os Homens do Presidente”. A trama abordou o escândalo político que culminou na renúncia do então presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon além de consagrar os atores Dustin Hoffman e Robert Redford no papel de jornalistas essenciais na denúncia do ocorrido. Anos depois, a produção recém lançada repete a construção da narrativa de seu antecessor ao acompanhar o ofício do jornalista, da apuração à confirmação de evidências. Assim, se no filme de 76 tínhamos Hoffman e Redford batendo em portas, atualmente os métodos são os mesmos, dessa vez, representados por Rachel McAdams e Mark Ruffalo. Sem glamour, os profissionais apropriam-se dos conceitos de objetividade e razão durante a apuração, enquanto preservam as vítimas, personagens que representam a sensibilidade na qual os envolvidos não devem deixar-se influenciar emocionalmente.
Assim como o filme que o precedeu, “Segredos Revelados” conta com um elenco talentoso. Protagonistas ou não, os atores entregarem-se as particularidades e conflitos de seus personagens. Enquanto Ruffalo e Michael Keaton representam a liberdade e independência da profissão, as personalidades de McAdams, Brian d’Arcy James são maduros ao lidar com os impactos do trabalho na vida particular. A fotografia, cenários e ausência de trilha sonora contribuem para a tensão entre os envolvidos e enfatizam a densidade do assunto abordado. Fora da redação do Globe, o tempo é nublado e chuvoso; o desconhecido e incerto é constantemente representado por tons de cinza. Já no ambiente de trabalho do grupo, predomina-se a luz, atrelada a coloração pastel e neutra, representando a verdade e a razão.
Entretanto, a má apresentação dos integrantes secundários do elenco atrelada a longa duração da narrativa faz com que a produção, muitas vezes, se torne maçante e cansativa. Além disso, não há clímax e o final carece de informações visuais a respeito das consequências e repercussões do trabalho jornalístico então publicado (artigo). Mesmo assim, Spotlight é válido pelas excelentes atuações, compromissadas ao debater o papel do jornalista, aqui, sob intensos holofotes, além de sua importância em informar e prover conhecimento em relação a todos os fatores sociais pelos quais passam seu público.
Com baixo orçamento e criatividade, o suspense independente Circle aborda questões humanas como escolhas, decisões e luta pela sobrevivência
Cinquenta anônimos acordam presos em uma câmara sem nenhuma lembrança de como chegaram lá. Organizados em círculos de luzes individuais, os indivíduos descobrem que a cada dois minutos um deles morre eletrocutado por uma máquina ao centro da sala. A princípio, os ataques parecem aleatórios, mas após reflexões, é notado o poder do grupo em escolher as vítimas. Esse é o roteiro de “Circle”, produção independente de Aaron Hann e Mário Miscione. A trama aborda a luta pela sobrevivência e coloca em cheque questões éticas, julgamentos, valores sociais e senso comum.
Apesar de seu lançamento ter ocorrido no segundo semestre de 2015, a temática remete a outros longas alternativos como The Cube (1997) e Exam (2009). No primeiro, seis pessoas se veem dentro de cubos gigantes. Sem alimentos e água, juntos enfrentam armadilhas letais em busca de uma saída. Já no segundo filme, oito candidatos foram escolhidos para um processo seletivo de uma poderosa corporação. Presos em uma sala com suas folhas em branco, eles precisam responder uma única questão em 80 minutos – o problema é descobrir qual é a pergunta.
Assim como essas outras produções, “Círculo” é um filme curto e intenso. Sem introdução e abertura, a trama se desenvolve em apenas um cenário. Além disso, não há trilha sonora e as atuações são medianas. As personagens encurraladas são estereotipadas, compostas por diferentes nacionalidades, idades e crenças. A partir do momento que esses indivíduos se veem obrigados a escolher quem vive, dogmas e preconceitos tornam-se aparentes. Já consciente de suas escolhas, os primeiros a serem eliminados são os idosos, mas logo após, alguns questionam o critério e então excluem-se pessoas de outras etnias, seguidas de negros e homossexuais. O processo também contou com voluntários, mas ao longo do tempo, as opções são afuniladas e o dilema dos participantes torna-se escolher entre a sua vida e a de uma mulher grávida e uma criança de aproximadamente dez anos.
O roteiro crítico evidencia fatores comuns e relevantes em todas as culturas. De acordo com a semiótica, teoria geral das manifestações e representações simbólicas, os seres humanos realizam suas escolhas de maneira binária, polarizada e assimétrica. O primeiro item significa que as pessoas dividem todos os elementos em dois lados, o segundo, remete a ideia de polos, logo, as opções existentes são sempre positivas ou negativas e por último, assimétricas, ou seja, tendem a um lado, na maioria das vezes, negativo. No filme, é possível notar com clareza esses fatores. Desde que os indivíduos ficam cientes de sua capacidade de escolher quem sobrevive, eles se dividem entre duas opções: bem e mal, coragem e medo, morte e vida. Ao fim de cada decisão, prevalecem as negativas e individualistas, pois afinal, todos são carrascos e só é possível um sobrevivente.
“Circle” é uma pérola do cinema independente. Instigante, crítica e criativa, a produção propõe a seus espectadores reflexões acerca de suas intenções em relação ao próximo e a si próprio. Além disso, o filme faz com que seu público se baseie na moral e ideologia para solucionar conflitos muitas vezes camuflados e despercebidos em nosso cotidiano.
Destinado aos amantes de comédias românticas originais que conciliam conflitos a elementos clichês do gênero, o longa dirigido por Edward Norton é adorável. Frequentemente apontado como um dos melhores atores de sua geração, ele não arrisca e conduz a trama de maneira descontraída. Mesmo assim, o filme tem altos e baixos e ao meu ver, os maiores problemas estão nos escritos de Stuart Blumberg.
O destaque do filme é sua ótima premissa: unir assuntos distintos de forma leve e cômica. Alguns são mais sensíveis tais quais religião, problemas familiares e fé, outros temas batidos como triângulo amoroso e sexo sem compromisso. Essa junção é válida no quesito autenticidade, porém peca em saturar informações e não deixar claro o objetivo e centralidade da trama.
A história começa satisfatória. No primeiro ato, somos apresentados aos melhores amigos Jake e Brian e observamos como os dois buscam inovar e quebrar preconceitos relacionados a suas crenças. A partir do momento que a Anna entra em cena (já adulta) a história se perde. O filme abandona a imparcialidade que tinha ao mostrar o cotidiano dos dois amigos e foca no personagem vivido por Ben Stiller: seu cotidiano e conflitos amorosos, atrelados a necessidade de ter uma esposa judia. A partir de então, Brian torna-se secundário, quando na verdade deveria permanecer como protagonista junto aos outros dois integrantes do trio. O padre é sempre visto presente na vida de Jake, enquanto o rabino não retribui o interesse com a mesma avidez. Em relação ao romance, o casal escolhido tem uma relação superficial e forçada. Ao passo que Jake mostra-se impulsivo, Brian é atencioso e carinhoso em relação a Anna.
"Tenha fé" entretém. O cenário nostálgico da cidade de Nova York remete a Woody Allen, além disso, o longa conta com um dos personagens mais cativantes do cinema (Brian). Apesar do roteiro muitas vezes caótico, a história merece ser vista, pois contém boas atuações e rende mensagens reflexivas.
“Não importa em qual cenário os eventos desse drama se desenrolam. A história do embate entre indivíduo e autoridade é universal” dizia uma frase no site do diretor Andrei Zvyagintsev. Leviatã critica não só a política russa, mas também a corrupção e relações de poder em várias partes do mundo.
Ambientado em Teriberka, uma pequena cidade no norte da Rússia, a trama acompanha a trajetória de Kolya, um trabalhador que recorre à justiça para preservar sua propriedade, até então condenada à demolição. Ao longo da história, o protagonista é desafiado pelo prefeito local, corrupto e autoritário, que já tem em mente outros planos para o terreno.
Ao longo de sua duração, o roteiro tem várias reviravoltas e mudanças de foco. Apesar disso, um fator permanece imutável do início ao fim: o antagonista. Desde o princípio, o governante Vadim Shelevyat é mostrado como um homem incontestável e tirano, por isso, é possível estabelecer uma relação entre ele e o título do longa.
O Leviatã de Zvyagintsev é a junção do monstro bíblico com o soberano descrito por Thomas Hobbes. Na Bíblia, Deus questiona Jó sobre uma criatura, descrita como a maior e mais poderosa dos mares. (“Poderias tu pescar o leviatã com linha e anzol?”). Já na obra “Leviatã ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil”, Hobbes defende que em uma situação de caos generalizado, a única solução seria um pacto social; todos abdicariam de suas liberdades individuais a fim de promover o bem comum. Nesse contexto, o poder ficaria concentrado em um indivíduo que, a partir desse contrato, seria o único a ter ampla autonomia para tomar decisões.
Em ambas as concepções, a figura do Leviatã está associada com a detenção de poder, assim como as atitudes do prefeito, aliadas as do representante da Igreja Ortodoxa (“Todo poder vem de Deus”). Essa associação nos permite uma analogia com o Brasil contemporâneo, um país corrupto onde política e religião se misturam. As diversas cenas envolvendo peixes e aquela em especial em que Roman, filho de Koya, reflete ao lado da carcaça de uma baleia são metáforas usadas para representar a presença constante de um monstro, nem sempre de maneira direta, mas sim como uma sombra permeando em várias gerações (vide tiro ao alvo em governantes russos).
Para complementar seu tom crítico, a trama é acompanhada pela melancolia e pessimismo. A trilha sonora reforça essas condições; é marcante no início do primeiro ato e no fim do último, em tomadas que apresentam o cenário pós-apocalíptico e negligente do vilarejo. No desenvolvimento, os cortes abruptos e o realismo quase cruel de algumas cenas remetem a Amour de Michael Haneke. Já a fotografia é composta por cores frias e parece ter saído de um óleo sobre tela de Cézanne.
Leviathan é um filme pretensioso, trágico e sincero que afirma a incapacidade do indivíduo em contestar o sistema e combater injustiças.
“A única forma de deixar de lutar é morrendo”. É da luta de Agu de que se trata Beasts of no Nation, primeiro longa-metragem original do Netflix. Em meio à um cenário de destruição, miséria e tensão, somos envolvidos pela jornada do protagonista, um garoto de aproximadamente dez anos, que após perder seus familiares, se junta a um exército revoltoso e põe em cheque questão suas emoções, além de questões éticas e morais.
Além de nos golpear com cenas de violência e desilusão, a produção nos faz repensar conceitos a respeito de elementos da cultura comuns entre todos os indivíduos como a luta pela sobrevivência e os estados alterados de consciência, como pânico e medo ao extremo, ambos muito recorrentes em situações de conflitos. O primeiro é evidente quando, em um momento chave da trama, Agu é inserido entre os soldados e luta contra o exército inimigo. Já o segundo, acompanha o filme em toda sua trajetória.
A trama é densa, aberta a diversas discussões e reflexões. Com um tema ousado, a produção é atrativa por abordar e criticar conflitos ocorridos com frequência na África. No entanto, muitos momentos são previsíveis e repletos de clichês. Somado a esse fator, várias mensagens são óbvias e facilmente decifradas pelo espectador. Tal fator reduz a possibilidade de interpretação do público e prejudica a subjetividade. Esse fato ocorre por exemplo, em uma cena caótica seguida de relâmpagos e trovões em que se ouve a voz de Agu ao fundo, “Tempestade de um vilarejo”. A interpretação é clara. Trata-se tanto da atual situação do cenário quanto da tempestade em si, um elemento natural caótico.
Em contraponto aos fatores negativos, a produção do diretor Cary Joji Fukunaga, tem uma bela fotografia semelhante a Hotel Ruanda (2005) e algumas sequências de Babel (2006). Além disso, a narrativa, baseada na jornada do herói, conta com bom uso de figuras de linguagem. Esse item pode ser exemplificado em diversos momentos, sendo um deles, a apresentação feita pelo protagonista de seu avô debilitado “As luzes estão acessas, mas não há ninguém em casa”.
Beasts of no Nation é uma produção tocante, sensível e merecedora de sua ótima repercussão mundial. O filme, considerado polêmico quanto a sua distribuição, leva o espectador a questionar não só conceitos polico-sociais, mas também o atual momento do cinema comercial, ainda monopolizado por grandes produtoras e distribuidoras.
Quando se trata de efeitos especiais e fotografia e trilha sonora, Jurassic World cumpre sua missão; o filme recria o universo fantástico com modernidade e surpresas que fazem jus ao desenvolvimento de seu tempo. A comparação com os filmes anteriores é inevitável. Ao assistir a esse longa, senti nostalgia e desejei em vários momentos, que a trama tivesse a mesma qualidade no roteiro e suspense de seus predecessores. O filme é muito previsível e superficial. Mais comercial do que nunca, a história, repleta de clichês, merchandisings e situações surreais, se desenvolve com ansiedade. Alguns personagens são estereotipadas e em alguns casos, caricatas. A tentativa de mostrar mais de suas características e sentimentos não funciona porque as relações são rápidas e ocorrem em meio ao caos. Além disso, os diálogos são vazios, com pitadas de humor, na minha visão, repetitivas e desnecessárias. Jurassic World não tenta ser um ramake. Em vários momentos há referências aos clássicos dos anos 90, como forma de homenageá-los, mas mesmo com a criatividade em adaptar a história para os dias atuais, a impressão deixada é a de um enredo fraco que apela a elementos familiares aos fãs de blockbusters de ação. . Por fim, é decepcionante como atualmente o entretenimento e uso excessivo dos efeitos especiais tem se tornado prioridade para um público cada vez menos exigente em relação ao cinema. Jurassic Park permanece clássico, já seu sucessor, apesar do sucesso de bilheteria, pouco acrescenta a aqueles que o assistem e é facilmente confundido com diversos filmes contemporâneos. Steven Spielberg, que falta o senhor faz!
No geral o filme é bom. Percebi grande influência da Sofia Coppola (tem até um poster de 'As Virgens Suicidas' na parede), principalmente no fato da história girar em torno dos conflitos de uma jovem. Destaques para a sensibilidade e fotografia, que é sutil, alternando entre tons escuros e pastéis. Quanto aos pontos negativos...
No final, senti o roteiro "desfocado", pois a trama passou de um triângulo amoroso para o adolescente problemático Fred. O fim deixou diversas pontas soltas, de modo que o espectador não sabe/tem poucos indícios sobre o destino das personagens.
Esse é o melhor filme que eu já assisti! Acho que minha vida como cinéfila pode ser separada em "Antes" e "Depois" de Donnie Darko. É incrível como o diretor conseguiu unir uma história adolescente a um roteiro bem feito envolvendo física teórica, religião e metáforas. A trama me envolveu do começo ao fim. As primeiras cenas já são inusitadas; Donnie acorda em um lugar desconhecido e ao voltar para casa, somos embalados com a nostalgia dos anos 80 com a música "The Killing Moon". O incomum não tarda; logo surge um coelho gigante, que assim como em Alice no País das Maravilhas, convida o protagonista a aventura e então a jornada começa. Turbinas de avião, viajantes no tempo, dilemas adolescentes, inimigos e é claro, o ato heroico no fim. É um filme muito confuso porém cativante (se é que isso é possível). Cada informação é dada com um propósito, são como peças de um quebra cabeça repleto de simbolismo. Eu o amo porque a trama é nostálgica, surreal e nada previsível. Ao término, seu desejo é buscar mais e mais explicações para os acontecimentos. Quando enfim entende, surgem outras dúvidas, você assiste novamente e das duas uma: Volta a estaca zero ou tem uma epifania. Intrigante, misterioso e genial.
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3.8 284 Assista AgoraPoderia acontecer com qualquer um, mas aconteceu com eles. Há quarenta anos, o estrelato jogou os holofotes sobre quatro garotos os quais fizeram da vida em turnê uma eterna volta pra casa. Abraçando o viral das cinebiografias sobre rock n’ roll, chega ao streaming The Dirt: Confissões do Mötley Crüe, história da banda homônima expoente do Glam Metal, cenário musical popularizado nos Estados Unidos na década de 80. Como um frenesi, o retrato de um período repleto de vícios e glórias segue a mesma fórmula do entretenimento que levou Bohemian Rhapsody a quebrar recordes de bilheteria, além de reunir os melhores momentos de Rock Of Ages, The Runaways, Quase Famosos, Rock Star…
A união entre glamour e metal implodiu em Los Angeles por volta de 1983. Nos primeiros anos, o Punk, movimento até então predominante, passou a dividir a Sunset Boulevard com uma juventude mais influenciada pela androginia de Iggy Pop e David Bowie do que a anarquia dos Sex Pistols e Ramones. Porém quando o recém chegado Van Halen incorporou o estilo extravagante em 1974, filas dobraram quarteirões da Sunset Strip, apelido do trecho de 2.5km da avenida, já conhecida por suas casas noturnas e bares. Assim, uma nova geração de bandas como Warrant, Poison e Ratt foram influenciadas a lotar um dos locais mais boêmios da cidade com laquê, animal print e muita maquiagem.
Naquela época, havia um senso de comunidade. O custo de vida era barato e assim, a nova geração aprimorava o visual durante o dia e ao cair da noite, se deixava seduzir por uma enorme quantidade de panfletos nas ruas. Nesse contexto, Mötley Crüe aderiu um visual andrógeno e técnicas teatrais, conquistando não só a fama de libertina, como também sucesso comercial. Após assinar com uma grande gravadora em 1981, a banda levou a algazarra ao U.S Festival e dessa forma, chamou atenção para a Sunset Strip no mesmo dia em que Rob Halford entrava no palco em cima de uma motocicleta para “Hell Bent for Leather”.
Esse é o recorte cultural escolhido para introduzir The Dirt. Inspirado no livro de memórias de mesmo nome escrito pelos quatro integrantes, a produção passeia pela jornada da banda americana desde sua formação até a volta por cima em 2003. Isso tudo comprimido durante 1h40 de longa metragem. Como num filme de fantasia, aqui o tempo é o principal vilão. De um lado, a necessidade de satisfazer o setor mais Hollywoodiano e popular, compactando acontecimentos de meses em planos rápidos e picotados. Do outro, a opção de realizar uma produção longa, a qual respeite o desenvolvimento das personagens e confira a ilusão da passagem dos anos. Por qual optar?
Se o diretor Jeff Tremaine (da série de comédias Jackass) tivesse escolhido a segunda opção, a narrativa se assemelharia a Boogie Nights, clássico de Paul Tomas Anderson sobre a trajetória de um ator pornô. A estrutura ascensão-ápice-decadência é a mesma, mas um tem quase três horas de destaque às atuações, o outro é um longo videoclipe. A câmera se movimenta rapidamente, datas correm pelos olhos e sequências que se desdobrariam em meia hora ou mais, são apresentadas em alguns minutos. Infelizmente, desde o advento do YouTube, ficou difícil se concentrar em tomadas longas sem antes checar as mensagens, porém a edição frenética nos permite cada vez menos. Menos veracidade, menos arco dramático, menos absorção dos acontecimentos e por aí vai.
A necessidade de reduzir a narrativa também reflete de maneira negativa nas performances musicais e desenvolvimento de personagens. Enquanto Rami Malek reproduz com riqueza de detalhes a performance de Freddie Mercury no Live Aid de 1985, Daniel Webber se limita a imitar alguns trejeitos de Vince Neil. Nenhuma menção ao Festival que trouxe os primeiros holofotes, ou a participação no primeiro show de heavy metal da União Soviética. Bohemian Rhapsody foca nas questões pessoais do frontman, mas a nova aposta do Netflix falha em abordar a história de cada integrante em proporções iguais. Mesmo com as narrações em off, não se sabe o suficiente sobre o ranzinza Mick Mars, entretanto, acompanhamos o nascimento da persona Nikki Sixx desde sua infância conturbada.
Se o tempo é o principal vilão da trama, os clichês são comparsas. Apesar do roteiro ser baseado em relatos e fatos, os esteriótipos e conveniências trazem a confirmação “Eu já vi isso antes” com frequência. A paleta de cores saturada reproduz o frenesi, como em Rock Of Ages. A seleção dos membros ideais gera estranhamento, como em The Runaways. A liderança do processo criativo é debatida, como em Quase Famosos. E como todo início tem um fim, o embate no estúdio está presente, lembram de Rock Star?. Isso sem contar a caricatura dos exageros, permitida por uma classificação de dezoito anos. O rock se reveza em poucas músicas, mas o álcool aparece no café da manhã, almoço e jantar. E as garotas… Um caso a parte. Reduzidas a objetos sexuais desequilibrados, infiéis e facilmente descartáveis.
A falta de sensibilidade quanto a mulher é comum em retratos sobre o rock, isso porque o meio é, de fato, machista. Querendo ou não, Penelope Spheeris denunciou o tópico no documentário The Metal Years. “Se vier bem vestida, sem problema, mas se estiver gostosa, vai entrar no clube mais rápido”, disse um entrevistado em 1988. Na ficção, o mais próximo do contrário aconteceu quando Jennifer Aniston, se viu num dilema entre apoiar o sucesso do namorado vocalista e manter planos ordinários. Claro, fazia parte da cena meninas se desdobrarem por músicos e como declarou Tommy Lee, fazer sexo oral em baixo nas mesas do Rainbow Bar & Grill. No entanto, atualmente é primordial considerar uma abordagem diferente, pois mesmo que houvesse sexismo, cada groupie, namorada ou esposa tinha seus próprios desejos, convicções e sobretudo, individualidade.
Apesar dos pesares, The Dirt atende várias expectativas criadas pela produção de uma cinebiografia. O gênero nem sempre cumpre a função jornalística de se aproximar dos fatos, mas concretiza histórias idealizadas na imaginação, traz o sentimento de nostalgia e de certa forma, compartilha o universo de celebridades, políticos ou até personalidades da internet. Demorou, mas diante do sucesso comercial de Bohemian Rhapsody, a indústria reconheceu que o rock n’ roll não só rende boas histórias, como também muito lucro. Depois de Queen e Mötley Crüe, Sex Pistols, uma banda completamente anti sistema, aparece como próximo trunfo. É, quando as coisas começam dar certo, não significa que antes elas estiveram erradas. Elas apenas não haviam sido descobertas.
Jogos Mortais: Jigsaw
2.8 705 Assista AgoraEm 2017, cinco pessoas acordam em uma sala com baldes na cabeça e correntes no pescoço. Uma voz no auto falante anuncia as regras do jogo. Quem gostaria de jogar, já que Jigsaw foi declarado morto há 10 anos? Essa é a premissa do oitavo filme da franquia, Jogos Mortais – Jigsaw, lançado sete anos após uma produção em 3D, a qual foi vendida como o capítulo final. Apesar de satisfazer os fãs mais acalourados, o lançamento peca em realizar uma abordagem superficial da premissa e modificar
elementos da narrativa a fim de satisfazer o interesse comercial de suas produtoras.
Após o terceiro filme da saga, a trama de Jogos Mortais ficou cada vez mais complexa. A cada momento um personagem era apontado como auxiliar do sociopata, encarregado de dar continuidade a seus trabalhos. Porém, no oitavo filme, a possibilidade de John Kramer continuar vivo é o fio da meada para a condução do espectador, mas os acontecimentos que se sucedem subestimam a capacidade de compreensão do público e não acrescentam novas informações à narrativa. Com isso, o plot twist, elemento presente em todos os filmes da franquia se torna previsível e confuso pela primeira vez.
Na tentativa de inovar e surpreender graficamente, as armadilhas as quais as personagens são submetidos ao longo dos filmes se tornam cada vez mais complexas e engenhosas, fator que leva o espectador a questionar a genialidade da personagem principal. Esse erro permanece no último lançamento. Se no primeiro longa, os objetivos variavam entre atravessar arames farpados ou matar o outro com um revólver, no último, as vítimas são submetidas a roldanas, parafernalhas automáticas e mecanismos de corte a laser. Somado a isso, ao contrário das outras produções, a violência gráfica é banal e exagerada pelo uso do CGI (imagens geradas por computador).
A direção dos irmãos Michael Spierig e Peter Spierig em nada acrescenta à estrutura já conhecida, pelo contrário, diminuem seu estilo ao ser o único a apresentar uma edição simples sem os habituais cortes rápidos, uso estilizado das cores e ágeis movimentos de câmera. A falta desses fatores dificulta a relação entre esse filme e as demais produções da franquia, pois o lançamento está mais próximo de um spin-off, obra derivada de outra já existente, do que de uma sequência. Além disso, as atuações são péssimas e as justificativas das ações de seus personagens são pouco convincentes, já que esses são desenvolvidos brevemente.
Mesmo com as tentativas de apresentar a trama a uma nova geração, nota-se que a franquia já está há tempos desgastada. É lamentável como uma premissa de terror autêntica e transgressora se redefiniu a fim de satisfazer os interesses comerciais e o desejo do público por narrativas de rápida compreensão cada vez mais superficiais. Com isso, Jigsaw caracteriza-se como a pior produção da saga. O sangue derramado ao longo da história não só causa repulsa, como também mancha o legado de uma produção inicialmente promissora.
Vidas sem Destino
3.7 657“A vida é bonita, realmente é. Cheia de beleza e ilusões. Sem ela, você estaria morto”. Essa frase é dita em um dos momentos mais simbólicos de Gummo (Vidas Sem Destino na tradução brasileira), um retrato das condições de vida do chamado white trash americano. A trama aborda a rotina em Xenia, cidade devastada por um tornado na década de 70. Como sugere o título em português, nesse meio pós apocalíptico, os habitantes vagueiam sem nenhuma expectativa para o futuro.
O termo lixo branco surgiu na década de 1830 por aristocratas e escravos negros para caracterizar caucasianos da classe trabalhadora e pequenos agricultores. A ideia perpetuou ao longo dos anos e atualmente é utilizada de maneira pejorativa para referir-se a pessoas brancas de baixo status social. No filme, esse conceito é perceptível por meio da imundice e desilusão de Xenia, a cidade protagonista, palco do niilismo de seus habitantes. De forma não linear, a produção apresenta a subtrama de diversos personagens, as quais golpeiam o público com temas presentes naquele universo: uso de drogas, abuso sexual, pedofilia, racismo, eutanásia, prostituição, homicídio, suicídio e homofobia.
A maneira documental utilizada na produção confere realismo às cenas. Isso se deve a diversos fatores, como por exemplo o fato do filme conter registros de câmeras distintas como VHS e Polaroid. De acordo com o diretor, a intenção foi parecer que aqueles materiais eram os únicos disponíveis e com isso, montar os takes como uma colagem. Além disso, as filmagens contam com movimentos de câmera que fazem alusão ao estilo amador além de indivíduos fazendo declarações diretamente para quem está gravando, como se respondessem perguntas de uma entrevista.
O filme estreou no 24º Festival de Cinema de Telluride, nos Estados Unidos. Durante a exibição, muitos se retiraram do local devido ao caráter ácido, perturbador e nauseante do longa. Com isso, esses convidados deixaram de compreender o viés questionador e crítico do filme, o qual pretende desmistificar o perfeccionismo do estilo de vida americano e chamar a atenção para o caos que caracteriza diversas minorias pelo país, as quais vivem a mercê da péssima qualidade de vida e precisam se contentar com belezas e ilusões para continuar.
Um Contratempo
4.2 2,0KComo a mulher do Garrido conseguiu ser tão boa quanto a verdadeira Virgínia?
Rua Cloverfield, 10
3.5 1,9KRua Cloverfield, 10 surpreende pelo suspense psicológico e atuações marcantes, mas peca por excesso no ato final
Em seu primeiro longa metragem, o cineasta Dan Trachtenberg agrada público e crítica ao assumir a direção de “Rua Cloverfield, 10”. A produção, assinada por JJ. Abrams (Star Wars, Star Trek) reúne boas atuações em um suspense psicológico e intrigante junto a elementos de ficção científica que remetem ao anterior “Cloverfield – Monstro”, lançado em 2008. Porém, mesmo com a ótima receptividade, o filme apresenta diversas falhas em seu ato final, as quais deixaram parte dos espectadores decepcionados.
No longa, Mary Elizabeth Winsted (Scott Pilgrim Contra o Mundo, O Mensageiro) é Michelle, uma garota que sofre um acidente de carro e acorda em um abrigo subterrâneo tempos depois. Lá, ela é avisada por Howard, interpretado por John Goodman (Trumbo, Se beber não case) que o mundo exterior tornou-se inabitável devido a um ataque químico ou nuclear. Além desses personagens, a trama também conta com a presença de John Gallagher Jr. (Hush, Temporário 12) na pele de Emmet, jovem o qual compartilha o local com os demais, contribuindo para a dinâmica entre Howard e Michelle.
Tanto o roteiro como os recursos técnicos escolhidos pelo diretor são utilizados com o objetivo de manter o suspense e com ele, a principal dúvida, levantada pelos espectadores desde o início: Um apocalipse realmente aconteceu ou Haward é apenas um sequestrador mentiroso?. O filme é considerado “de câmara”, pelo fato de sua ação transcorrer praticamente em um único cenário. Com isso, brinca-se com o senso de segurança do público. Há um misto de tédio, terror e incerteza. O ambiente transmite aconchego, um lar dentro de um espaço reduzido, que é ao mesmo tempo, angustiante. Tais sensações são evidenciadas por meio dos planos, movimentos de câmera, trilha sonora e fortes atuações. O cineasta opta pelo uso de planos mais fechados para transmitir claustrofobia e mais abertos a fim de passar a sensação de conforto. Além disso, em vários momentos a câmera é colocada na mão e de maneira trêmula, demonstra a urgência de muitas ações. Já a trilha sonora, possuí canções nas quais as letras complementam o contexto da história.
O comprometimento dos atores para com suas interpretações contribui para o suspense proposto pela narrativa. Durante a trama, o espectador questionar-se, a todo o momento, a veracidade dos fatos e as reais intenções dos personagens. Logo no primeiro ato, é perceptível o vínculo de sobrevivência entre Michelle e seu sequestrador, Howard. Enquanto ele estabelece uma relação paternal com a garota ao acolhê-la em seu bunker, é perceptível que tal hospitalidade é somente um dos elementos de sua personalidade ambígua, pois ao desenrolar da história, são desvendados defeitos e atitudes horrendas do protagonista. A fim de aliviar a tensão entre esses dois personagens, o Emmet de John Gallagher é um alívio cômico, contribuindo também para atitudes decisivas.
As tensões entre os envolvidos na trama permanecem até o último ato da narrativa, quando elementos de ficção científica tornam-se evidentes, respondendo a diversas questões levantadas anteriormente. Tal fator já era esperado devido à relação de “Rua Cloverfield, 10” com “Cloverfield – Monstro”, filme no qual monstros alienígenas destroem a cidade de Nova York. Porém, a resolução da trama da maneira como foi representada, mostrou-se exagerada e prejudicou o andamento do mistério, além de deixar ao espectador pontas soltas no roteiro com diversos itens mal explicados. Apesar disso, a maior decepção de parte do público deve-se ao reconhecimento de que a mudança de tom no desfecho não foi em prol da criatividade, mas sim, do sucesso de marketing e bilheteria.
Spotlight - Segredos Revelados
4.1 1,7K Assista Agora“Eu sei que há coisas que você não pode dizer às pessoas, mas eu também sei que há uma história aqui, na qual as pessoas escutarão sobre” — Após quarenta anos, Spotlight retoma o ideal do jornalismo investigativo de “Todos os Homens do Presidente” e destaca-se por retratar o Quarto Poder na sociedade
Meses antes da queda das Torres Gêmeas em 2001, uma equipe jornalistas investigativos do veículo Boston Globe apurava em sigilo, diversas denúncias de abusos sexuais cometidos por padres da Arquidiocese de Boston. Depois de publicada, a matéria realizada pelo “Spotlight”, como era nomeado o grupo, obteve repercussão mundial. Desde então, o trabalho de seus profissionais é constantemente associado às descobertas da dupla Bob Woodward e Carl Bernstein durante o caso Watergate em 1974. Apesar de um ter sido escrito em uma máquina de escrever e outro, em teclados de computador, ambas as situações foram adaptadas para as telas de cinema. As produções possuem muitas semelhanças e destacam-se principalmente, por retratar com primor, os objetivos e impactos da imprensa sobre as relações sociais.
Em 2016, ano de lançamento de “Spotlight – Segredos Revelados” completa-se quarenta anos do lançamento do clássico “Todos os Homens do Presidente”. A trama abordou o escândalo político que culminou na renúncia do então presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon além de consagrar os atores Dustin Hoffman e Robert Redford no papel de jornalistas essenciais na denúncia do ocorrido. Anos depois, a produção recém lançada repete a construção da narrativa de seu antecessor ao acompanhar o ofício do jornalista, da apuração à confirmação de evidências. Assim, se no filme de 76 tínhamos Hoffman e Redford batendo em portas, atualmente os métodos são os mesmos, dessa vez, representados por Rachel McAdams e Mark Ruffalo. Sem glamour, os profissionais apropriam-se dos conceitos de objetividade e razão durante a apuração, enquanto preservam as vítimas, personagens que representam a sensibilidade na qual os envolvidos não devem deixar-se influenciar emocionalmente.
Assim como o filme que o precedeu, “Segredos Revelados” conta com um elenco talentoso. Protagonistas ou não, os atores entregarem-se as particularidades e conflitos de seus personagens. Enquanto Ruffalo e Michael Keaton representam a liberdade e independência da profissão, as personalidades de McAdams, Brian d’Arcy James são maduros ao lidar com os impactos do trabalho na vida particular. A fotografia, cenários e ausência de trilha sonora contribuem para a tensão entre os envolvidos e enfatizam a densidade do assunto abordado. Fora da redação do Globe, o tempo é nublado e chuvoso; o desconhecido e incerto é constantemente representado por tons de cinza. Já no ambiente de trabalho do grupo, predomina-se a luz, atrelada a coloração pastel e neutra, representando a verdade e a razão.
Entretanto, a má apresentação dos integrantes secundários do elenco atrelada a longa duração da narrativa faz com que a produção, muitas vezes, se torne maçante e cansativa. Além disso, não há clímax e o final carece de informações visuais a respeito das consequências e repercussões do trabalho jornalístico então publicado (artigo). Mesmo assim, Spotlight é válido pelas excelentes atuações, compromissadas ao debater o papel do jornalista, aqui, sob intensos holofotes, além de sua importância em informar e prover conhecimento em relação a todos os fatores sociais pelos quais passam seu público.
Circle
3.0 683 Assista AgoraCom baixo orçamento e criatividade, o suspense independente Circle aborda questões humanas como escolhas, decisões e luta pela sobrevivência
Cinquenta anônimos acordam presos em uma câmara sem nenhuma lembrança de como chegaram lá. Organizados em círculos de luzes individuais, os indivíduos descobrem que a cada dois minutos um deles morre eletrocutado por uma máquina ao centro da sala. A princípio, os ataques parecem aleatórios, mas após reflexões, é notado o poder do grupo em escolher as vítimas. Esse é o roteiro de “Circle”, produção independente de Aaron Hann e Mário Miscione. A trama aborda a luta pela sobrevivência e coloca em cheque questões éticas, julgamentos, valores sociais e senso comum.
Apesar de seu lançamento ter ocorrido no segundo semestre de 2015, a temática remete a outros longas alternativos como The Cube (1997) e Exam (2009). No primeiro, seis pessoas se veem dentro de cubos gigantes. Sem alimentos e água, juntos enfrentam armadilhas letais em busca de uma saída. Já no segundo filme, oito candidatos foram escolhidos para um processo seletivo de uma poderosa corporação. Presos em uma sala com suas folhas em branco, eles precisam responder uma única questão em 80 minutos – o problema é descobrir qual é a pergunta.
Assim como essas outras produções, “Círculo” é um filme curto e intenso. Sem introdução e abertura, a trama se desenvolve em apenas um cenário. Além disso, não há trilha sonora e as atuações são medianas. As personagens encurraladas são estereotipadas, compostas por diferentes nacionalidades, idades e crenças. A partir do momento que esses indivíduos se veem obrigados a escolher quem vive, dogmas e preconceitos tornam-se aparentes. Já consciente de suas escolhas, os primeiros a serem eliminados são os idosos, mas logo após, alguns questionam o critério e então excluem-se pessoas de outras etnias, seguidas de negros e homossexuais. O processo também contou com voluntários, mas ao longo do tempo, as opções são afuniladas e o dilema dos participantes torna-se escolher entre a sua vida e a de uma mulher grávida e uma criança de aproximadamente dez anos.
O roteiro crítico evidencia fatores comuns e relevantes em todas as culturas. De acordo com a semiótica, teoria geral das manifestações e representações simbólicas, os seres humanos realizam suas escolhas de maneira binária, polarizada e assimétrica. O primeiro item significa que as pessoas dividem todos os elementos em dois lados, o segundo, remete a ideia de polos, logo, as opções existentes são sempre positivas ou negativas e por último, assimétricas, ou seja, tendem a um lado, na maioria das vezes, negativo. No filme, é possível notar com clareza esses fatores. Desde que os indivíduos ficam cientes de sua capacidade de escolher quem sobrevive, eles se dividem entre duas opções: bem e mal, coragem e medo, morte e vida. Ao fim de cada decisão, prevalecem as negativas e individualistas, pois afinal, todos são carrascos e só é possível um sobrevivente.
“Circle” é uma pérola do cinema independente. Instigante, crítica e criativa, a produção propõe a seus espectadores reflexões acerca de suas intenções em relação ao próximo e a si próprio. Além disso, o filme faz com que seu público se baseie na moral e ideologia para solucionar conflitos muitas vezes camuflados e despercebidos em nosso cotidiano.
Tenha Fé
3.1 153Destinado aos amantes de comédias românticas originais que conciliam conflitos a elementos clichês do gênero, o longa dirigido por Edward Norton é adorável. Frequentemente apontado como um dos melhores atores de sua geração, ele não arrisca e conduz a trama de maneira descontraída. Mesmo assim, o filme tem altos e baixos e ao meu ver, os maiores problemas estão nos escritos de Stuart Blumberg.
O destaque do filme é sua ótima premissa: unir assuntos distintos de forma leve e cômica. Alguns são mais sensíveis tais quais religião, problemas familiares e fé, outros temas batidos como triângulo amoroso e sexo sem compromisso. Essa junção é válida no quesito autenticidade, porém peca em saturar informações e não deixar claro o objetivo e centralidade da trama.
A história começa satisfatória. No primeiro ato, somos apresentados aos melhores amigos Jake e Brian e observamos como os dois buscam inovar e quebrar preconceitos relacionados a suas crenças. A partir do momento que a Anna entra em cena (já adulta) a história se perde. O filme abandona a imparcialidade que tinha ao mostrar o cotidiano dos dois amigos e foca no personagem vivido por Ben Stiller: seu cotidiano e conflitos amorosos, atrelados a necessidade de ter uma esposa judia. A partir de então, Brian torna-se secundário, quando na verdade deveria permanecer como protagonista junto aos outros dois integrantes do trio. O padre é sempre visto presente na vida de Jake, enquanto o rabino não retribui o interesse com a mesma avidez. Em relação ao romance, o casal escolhido tem uma relação superficial e forçada. Ao passo que Jake mostra-se impulsivo, Brian é atencioso e carinhoso em relação a Anna.
"Tenha fé" entretém. O cenário nostálgico da cidade de Nova York remete a Woody Allen, além disso, o longa conta com um dos personagens mais cativantes do cinema (Brian). Apesar do roteiro muitas vezes caótico, a história merece ser vista, pois contém boas atuações e rende mensagens reflexivas.
Leviatã
3.8 299 Assista Agora“Não importa em qual cenário os eventos desse drama se desenrolam. A história do embate entre indivíduo e autoridade é universal” dizia uma frase no site do diretor Andrei Zvyagintsev. Leviatã critica não só a política russa, mas também a corrupção e relações de poder em várias partes do mundo.
Ambientado em Teriberka, uma pequena cidade no norte da Rússia, a trama acompanha a trajetória de Kolya, um trabalhador que recorre à justiça para preservar sua propriedade, até então condenada à demolição. Ao longo da história, o protagonista é desafiado pelo prefeito local, corrupto e autoritário, que já tem em mente outros planos para o terreno.
Ao longo de sua duração, o roteiro tem várias reviravoltas e mudanças de foco. Apesar disso, um fator permanece imutável do início ao fim: o antagonista. Desde o princípio, o governante Vadim Shelevyat é mostrado como um homem incontestável e tirano, por isso, é possível estabelecer uma relação entre ele e o título do longa.
O Leviatã de Zvyagintsev é a junção do monstro bíblico com o soberano descrito por Thomas Hobbes. Na Bíblia, Deus questiona Jó sobre uma criatura, descrita como a maior e mais poderosa dos mares. (“Poderias tu pescar o leviatã com linha e anzol?”). Já na obra “Leviatã ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil”, Hobbes defende que em uma situação de caos generalizado, a única solução seria um pacto social; todos abdicariam de suas liberdades individuais a fim de promover o bem comum. Nesse contexto, o poder ficaria concentrado em um indivíduo que, a partir desse contrato, seria o único a ter ampla autonomia para tomar decisões.
Em ambas as concepções, a figura do Leviatã está associada com a detenção de poder, assim como as atitudes do prefeito, aliadas as do representante da Igreja Ortodoxa (“Todo poder vem de Deus”). Essa associação nos permite uma analogia com o Brasil contemporâneo, um país corrupto onde política e religião se misturam. As diversas cenas envolvendo peixes e aquela em especial em que Roman, filho de Koya, reflete ao lado da carcaça de uma baleia são metáforas usadas para representar a presença constante de um monstro, nem sempre de maneira direta, mas sim como uma sombra permeando em várias gerações (vide tiro ao alvo em governantes russos).
Para complementar seu tom crítico, a trama é acompanhada pela melancolia e pessimismo. A trilha sonora reforça essas condições; é marcante no início do primeiro ato e no fim do último, em tomadas que apresentam o cenário pós-apocalíptico e negligente do vilarejo. No desenvolvimento, os cortes abruptos e o realismo quase cruel de algumas cenas remetem a Amour de Michael Haneke. Já a fotografia é composta por cores frias e parece ter saído de um óleo sobre tela de Cézanne.
Leviathan é um filme pretensioso, trágico e sincero que afirma a incapacidade do indivíduo em contestar o sistema e combater injustiças.
Beasts of No Nation
4.3 831 Assista Agora“A única forma de deixar de lutar é morrendo”. É da luta de Agu de que se trata Beasts of no Nation, primeiro longa-metragem original do Netflix. Em meio à um cenário de destruição, miséria e tensão, somos envolvidos pela jornada do protagonista, um garoto de aproximadamente dez anos, que após perder seus familiares, se junta a um exército revoltoso e põe em cheque questão suas emoções, além de questões éticas e morais.
Além de nos golpear com cenas de violência e desilusão, a produção nos faz repensar conceitos a respeito de elementos da cultura comuns entre todos os indivíduos como a luta pela sobrevivência e os estados alterados de consciência, como pânico e medo ao extremo, ambos muito recorrentes em situações de conflitos. O primeiro é evidente quando, em um momento chave da trama, Agu é inserido entre os soldados e luta contra o exército inimigo. Já o segundo, acompanha o filme em toda sua trajetória.
A trama é densa, aberta a diversas discussões e reflexões. Com um tema ousado, a produção é atrativa por abordar e criticar conflitos ocorridos com frequência na África. No entanto, muitos momentos são previsíveis e repletos de clichês. Somado a esse fator, várias mensagens são óbvias e facilmente decifradas pelo espectador. Tal fator reduz a possibilidade de interpretação do público e prejudica a subjetividade. Esse fato ocorre por exemplo, em uma cena caótica seguida de relâmpagos e trovões em que se ouve a voz de Agu ao fundo, “Tempestade de um vilarejo”. A interpretação é clara. Trata-se tanto da atual situação do cenário quanto da tempestade em si, um elemento natural caótico.
Em contraponto aos fatores negativos, a produção do diretor Cary Joji Fukunaga, tem uma bela fotografia semelhante a Hotel Ruanda (2005) e algumas sequências de Babel (2006). Além disso, a narrativa, baseada na jornada do herói, conta com bom uso de figuras de linguagem. Esse item pode ser exemplificado em diversos momentos, sendo um deles, a apresentação feita pelo protagonista de seu avô debilitado “As luzes estão acessas, mas não há ninguém em casa”.
Beasts of no Nation é uma produção tocante, sensível e merecedora de sua ótima repercussão mundial. O filme, considerado polêmico quanto a sua distribuição, leva o espectador a questionar não só conceitos polico-sociais, mas também o atual momento do cinema comercial, ainda monopolizado por grandes produtoras e distribuidoras.
Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros
3.6 3,0K Assista AgoraQuando se trata de efeitos especiais e fotografia e trilha sonora, Jurassic World cumpre sua missão; o filme recria o universo fantástico com modernidade e surpresas que fazem jus ao desenvolvimento de seu tempo. A comparação com os filmes
anteriores é inevitável. Ao assistir a esse longa, senti nostalgia e desejei em vários momentos, que a trama tivesse a mesma qualidade no roteiro e suspense de seus predecessores.
O filme é muito previsível e superficial. Mais comercial do que nunca, a história, repleta de clichês, merchandisings e situações surreais, se desenvolve com ansiedade. Alguns personagens são estereotipadas e em alguns casos, caricatas. A tentativa de mostrar mais de suas características e sentimentos não funciona porque as relações são rápidas e ocorrem em meio ao caos. Além disso, os diálogos são vazios, com pitadas de humor, na minha visão, repetitivas e desnecessárias.
Jurassic World não tenta ser um ramake. Em vários momentos há referências aos clássicos dos anos 90, como forma de homenageá-los, mas mesmo com a criatividade em adaptar a história para os dias atuais, a impressão deixada é a de um enredo fraco que apela a elementos familiares aos fãs de blockbusters de ação. .
Por fim, é decepcionante como atualmente o entretenimento e uso excessivo dos efeitos especiais tem se tornado prioridade para um público cada vez menos exigente em relação ao cinema. Jurassic Park permanece clássico, já seu sucessor, apesar do sucesso de bilheteria, pouco acrescenta a aqueles que o assistem e é facilmente confundido com diversos filmes contemporâneos. Steven Spielberg, que falta o senhor faz!
A Outra História Americana
4.4 2,2K Assista AgoraEdward Fucking Norton
Palo Alto
3.2 429No geral o filme é bom. Percebi grande influência da Sofia Coppola (tem até um poster de 'As Virgens Suicidas' na parede), principalmente no fato da história girar em torno dos conflitos de uma jovem. Destaques para a sensibilidade e fotografia, que é sutil, alternando entre tons escuros e pastéis.
Quanto aos pontos negativos...
No final, senti o roteiro "desfocado", pois a trama passou de um triângulo amoroso para o adolescente problemático Fred. O fim deixou diversas pontas soltas, de modo que o espectador não sabe/tem poucos indícios sobre o destino das personagens.
Donnie Darko
4.2 3,8K Assista AgoraEsse é o melhor filme que eu já assisti! Acho que minha vida como cinéfila pode ser separada em "Antes" e "Depois" de Donnie Darko. É incrível como o diretor conseguiu unir uma história adolescente a um roteiro bem feito envolvendo física teórica, religião e metáforas.
A trama me envolveu do começo ao fim. As primeiras cenas já são inusitadas; Donnie acorda em um lugar desconhecido e ao voltar para casa, somos embalados com a nostalgia dos anos 80 com a música "The Killing Moon". O incomum não tarda; logo surge um coelho gigante, que assim como em Alice no País das Maravilhas, convida o protagonista a aventura e então a jornada começa. Turbinas de avião, viajantes no tempo, dilemas adolescentes, inimigos e é claro, o ato heroico no fim.
É um filme muito confuso porém cativante (se é que isso é possível). Cada informação é dada com um propósito, são como peças de um quebra cabeça repleto de simbolismo. Eu o amo porque a trama é nostálgica, surreal e nada previsível. Ao término, seu desejo é buscar mais e mais explicações para os acontecimentos. Quando enfim entende, surgem outras dúvidas, você assiste novamente e das duas uma: Volta a estaca zero ou tem uma epifania. Intrigante, misterioso e genial.