Eggers deixa parcialmente de lado o metafísico em seu novo filme - se comparado aos primeiros filmes -, mas não abandona a constante tensão realista de suas obras construida por um design de som abrupto, grotesco, casando muito bem com a tragédia hamletiana de O Homem do Norte.
Um filme sem heróis e vilões, apenas sobre o destino que acompanha o protagonista e do qual ele não pode fugir.
O mais interessante nesse filme do Kiarostami é como a realização de uma simples tarefa se torna uma jornada épica para o bondoso Ahmed, tendo como causa principal o fato de ninguém ao seu redor conseguir minimamente escutar o que ele tem a dizer.
O intimismo e o melodrama em um filme sobre a força da mulher e os laços que não podem ser quebrados.
Rio de Janeiro, década de 50. Eurídice (Carol Duarte) é uma jovem com muito talento, mas bastante introvertida, Guida (Julia Stockler) é sua irmã mais velha, e totalmente o contrário de Eurídice quanto ao seu temperamento. Vivendo em um regime patriarcal, faz com que trilhem caminhos diferentes, precisando lidar com responsabilidades da vida adulta.
A Vida Invisível é um filme sobre mulheres fortes. Guida e Eurídice são filhas de uma família tradicional portuguesa, ambas se sentem reprimidas pelo patriarcado a qual são submetidas, e cada uma acredita que a outra está vivendo aquilo que sempre sonhou.
É um filme que busca trazer diversas reflexões da nossa vida cotidiana, corações partidos, problemas domésticos, a tão sonhada liberdade e a sensação de que temos todo o tempo do mundo para alcançar o que queremos, o que não é uma verdade.
Impressona como o filme vai dando ritmo aos personagens com o tempo, a priori vemos tudo de fora, mas com o passar dos minutos é impossível não imergir no universo feminino que o diretor Karim Aïnouz construiu, baseado no livro de “A Vida Invisível de Eurídice Gusmão”, de Martha Batalha.
O filme vai ganhando força com tempo pela forma que é contado, o roteiro não trata de apresentar os personagens, eles vão ganhando contexto e forma com o tempo, e vamos entendendo cada um deles. A forte fotografia de Hélène Louvart é um dos pontos altos do filme, buscando sempre contrastar as cores e ambientes.
Por mais que A Vida Invisível seja um filme sobre estar só, sobre a solidão causada pela falta de quem amamos, a maior marca da obra é o sentimentalismo de uma irmã para com a outra. Não é preciso estar perto para estar junto, alguns laços são inquebráveis.
Em sua estreia diretorial aos 28 anos, Sofia Coppola mostra maturidade e sensibilidade em drama ousado.
Em um subúrbio dos Estados Unidos dos anos 70 vivem as cinco irmãs Lisbon, em uma vizinhança rodeada de garotos e com uma criação extremamente conservadora, a vida das irmãs é marcada pela repressão, amor e desejo.
Embora o nome sugestivo, não é na morte/suicídio ou depressão em que o filme se foca, mas sim na juventude e o poder de amplificar todos os sentimentos vividos nessa fase, seja para o bem ou para o mal. As Virgens Suicidas é muito mais uma leitura feita dos jovens vizinhos que as observam do que realmente as suas vidas. O filme pouco explica sobre elas.
Não tentam também achar culpados, nem a mãe controladora ou o pai são colocados como vilões, As Virgens Suicidas trata da sociedade como um todo e o falso moralismo que a rodeia.
Kirsten Durst dá vida a Lux Lisbon, em atuação forte e convincente. O segundo ato do filme passa por ela e por Trip Fontaine (Josh Harnett), o garanhão da escola, e é a partir daqui que o filme perde um pouco o ritmo. A construção do personagem de Trip é praticamente inexistente, e quando o filme tenta voltar ao ritmo inicial restam poucos minutos e o final acaba sendo apressado.
A direção de Sofia Coppola é madura, segura, consegue ser sensível falando de algo tão assustador, consegue impactar ao mostrar o abismo entre pais e filhos, a falta de diálogo e a falsa convivência. Com uma direção de arte e fotografia impecáveis, não há o que se criticar esteticamente no filme, que conta também na produção o seu pai, o eterno Francis Ford Coppola.
E é talvez essa sua maior qualidade, retratar uma sociedade que não sabe dialogar, que trata as imperfeições como sendo coisas do lado de lá. Que acabam acarretando situações que muitas vezes é impossível explicar. O inexplicável é o que prevalece no fim.
Um filme de horror iconoclasta que usou muito bem disso para assustar nos anos 60, mas que ainda funciona atualmente mesmo por seu tom artesanal.
O sádico coveiro Zé do Caixão é odiado por praticamente todos em sua cidade interiorana pelo seu jeito macabro e suas roupas. Obcecado em gerar o filho perfeito para que possa dar continuidade ao seu sangue, vê na esposa do melhor amigo a mulher ideal para gerar seu filho, já que sua esposa não pode engravidar.
Não é possível desassociar o cinema da sociedade, na grande maioria das vezes ele apenas reflete o que pede o mundo naquele momento, por isso é tão importante como arte. Zé do Caixão é visto como bizarro em À Meia-Noite Levarei a sua Alma dentre outros motivos, por debochar de dias santos, simbolismos que obviamente seguem fortes no dia de hoje, mas nada comparado com o que era décadas atrás. A iconoclastia é a base do filme para gerar medo.
É a primeira aparição do clássico personagem em tela, interessante ver que embora seja o mensageiro da morte, Zé do Caixão é pouco supersticioso, sendo no filme um grande contestador da fé alheia.
Usando de métodos pouco usuais, como o contato da feiticeira com o público logo no começo do filme cria uma relação interessante entre o filme e quem assiste, é uma forma de conexão do telespectador. A criatividade para driblar o baixo orçamento é no mínimo interessante, uma atmosfera escura, o contraste entre o bar que Zé visita e sua casa, ou mesmo a cabana na bruxa, que é o mais interessante visualmente na minha opinião.
O Chamado da Floresta prova que nem sempre usar fórmulas adoradas pelo público, contar com ótimos atores e ter uma história suficiente dá certo.
Buck é o cachorro de estimação do Juiz Miller (Bradley Whitford) e sua família na Califórnia, depois de ser roubado têm sua vida virada completamente ao ser levado à selvagem Alasca da corrida do ouro, precisando sobreviver a nova realidade, Buck tenta encontrar seu lugar no mundo. Baseado em no livro de Jack London de 1903, é a terceira vez que o conto vira adaptação nas telonas.
Um dos gêneros de maior sucesso das décadas de 90 e 00 sem dúvidas foram os divertidos filmes de cachorro. Beethoven, Marley & Eu, Sempre ao seu Lado, dentre outros diversos exemplos, foram filmes que marcaram as décadas passadas. O Chamado da Floresta tenta repetir o sucesso dos anteriores.
É impossível não se incomodar com o CGI do filme, a artificialidade salta aos olhos, não funcionou, embora a fotografia seja bonita.
A humanização do animal é a principal premissa do filme, Buck que era um cachorro mimado quando vivia na Califórnia, precisa crescer agora que vive em território hostil, e é ajudado ao conhecer os carteiros Perrault (Osmar Sy) e Françoise (Cara Gee), que colocam ele na matilha que guiam o trenó dos correios, e assim Buck aprende lições importantes sobre trabalho em equipe,
No segundo momento do filme temos Harrison Ford em tela, John Thornton defende o cão quando ele é comprado pelo ganancioso vilão (Dan Stevens), que maltrata o cachorro em todas oportunidades. Ford está no piloto automático aqui, embora o arco do filme passe por ele, não é nenhuma atuação memorável por sua parte.
Embora O Chamado da Floresta tivesse tudo para dar certo, a falta de aprofundamento e o aparente desinteresse em quem produzia a obra faz com que tudo fique pelo caminho, no fim não dá certo.
Com uma animação impecável padrão Studio Ghibli, O Serviço de Entregas da Kiki fala sobre amadurecimento e mudanças na infância e adolescência.
Kiki é uma bruxa que acaba de completar 13 anos de idade, e pela tradição, quando chegam nessa idade as bruxas devem sair de casa para aprender a viver por si só. Ela se muda para a cidade de Konco, na companhia de seu gato falante Jiji.
Dirigido pelo gênio Hayao Miyazaki (Meu Amigo Totoro, Princesa Mononoke, A Viagem de Chihiro), o roteiro trata sobre o amadurecimento precoce em crianças e como elas podem lidar com algumas responsabilidades, é um filme mais simples que os seus clássicos, mas nem por isso chega a ser um filme “bobo”.
O design de produção aqui é bastante notável, desde a criação da cidade quanto as roupas utilizadas pelos personagens, nota-se um trabalho preocupado com a estética, as cenas da Kiki voando são lindas, além das expressões dela por meio do cabelo. A paixão do Miyazaki pelos céus é perceptível, anos depois veio também com sua direção a animação Porco Rosso, sobre um piloto de aviões.
Os personagens são adoráveis num todo, embora a cidade a princípio tenha se espantado com a chegada de uma bruxa, não passou nem perto a tentativa de criar um possível antagonista, quem importa na história gosta da Kiki. Com destaque para o Tombo, que constrói uma amizade bonita com a bruxinha.
A maior falha do filme talvez esteja em sua trilha sonora, há momentos em que as músicas não acompanham o ritmo do filme, e em outras soam desnecessárias, falta coerência em alguns momentos no que toca às canções.
Com um roteiro aparentemente simples, O Serviço de Entregas da Kiki é também capaz de trazer lições e discussões sobre adaptação e mudanças nas diversas fases da vida e em tudo que ela nos pede. E tudo isso com a leveza típica do Studio Ghibli.
Tratando da adolescência como poucos, As Vantagens de ser Invisível é responsável ao falar sobre assuntos polêmicos e importantes. ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ Charlie (Logan Lerman) é um adolescente tímido e impopular que narra o filme e sua vida por meio de cartas. Tudo muda quando ele conhece os irmãos Sam (Emma Watson) e Patrick (Ezra Miller) e seu grupo de amigos do Ensino Médio. ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ Os medos, dilemas, indecisões de Charlie e seus amigos são muito bem representadas. A responsabilidade do filme ao tratar de assuntos como depressão, drogas, sexualidade é exemplar, diferentemente da polêmica série “13 Reasons Why” e outros, aqui é possível notar o cuidado que se teve para tratar de assuntos sérios. É um filme maduro nesse aspecto. ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ As Vantagens de Ser Invisível consolida a carreira da talentosa Emma Watson, deixando qualquer possibilidade de ser marcada para sempre como Hermione Granger para trás. Miller e Lerman também entregam atuações de muita qualidade, principalmente Ezra, que já provou ser um ator versátil. ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ A direção e adaptação ficaram com Stephen Chbosky, escritor do livro. Ter Chbosky dirigindo o filme dá força ao original, até porque ninguém entende mais seus personagens do que o próprio criador. As canções oitentistas escolhidas dão tom ao filme, tendo Heroes, de David Bowie como a trilha principal do longa.
Assisti As Vantagens de ser Invisível em pelo menos 3 momentos diferentes da minha vida. É interessante notar como o filme muda com cada perspectiva que você o vê. Hoje percebo que os medos e incertezas que tinha na época da escola eram bem menores do que pareciam ser, e tudo bem, cada fase é uma fase. ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ Com uma bonita história de amor e amizade, lá estão os três, e embora Charlie, Sam e Patrick jamais possam ser infinitos, poderão sim ser heróis, nem que seja apenas por um dia.
Em 2016 a DC Comics lançou um dos filmes mais esperados do ano, Esquadrão Suicida. É impossível não lembrar do fracasso que foi o filme. O que a mesma empresa faz em 2020? Um filme na mesma fórmula, com uma das personagens principais, a Arlequina. Mas aqui deu muito certo.
Depois de um namoro que não acabou bem com o Coringa, Arlequina (Margot Robbie) se encontra em problemas por ter criado diversos inimigos enquanto namorava o palhaço mais famoso de Gotham. Dentre eles o terrível Roman Sionis (Ewan McGregor) que caça a jovem Cass por estar com algo que ele deseja muito.
O filme que iniciou como um desdobramento da mente desordenada da Arlequina não ficou só aí, embora sua fantabulosa emancipação dê tom ao filme, a construção das outras personagens foi feita de maneira bastante satisfatória. As personagens Caçadora (Mary Elizabetg Winstead), Canário Negro (Jurnee Smollet-Bell) e Reneé Montoya (Rosie Perez) foram bem introduzidas, houve um cuidado interessante para contar a história de cada uma.
O que a princípio é até uma disputa entre as mulheres, com o passar dos minutos percebem que existe um inimigo em comum entre elas, e que aquilo é muito mais importante no momento, cria-se uma sororidade de forma bastante natural ali.
As cenas de ação são muito bem executadas. Tudo é muito colorido, bonito, é uma Gotham diferente, uma Gotham aos olhas da Harley Quinn, que é quem narra tudo aqui. A comparação com Deadpool é inevitável, mas Aves de Rapina passa longe de ser uma cópia.
O que vinha se solidificando nos últimos dois anos parece cada vez mais real, a DC conseguiu se consolidar e apresenta agora filmes com propostas diferentes. Desde Mulher-Maravilha, Shazam!, Aquaman, e agora Aves de Rapina. Que bom e que continue assim.
Usando do poder da sátira, Jojo Rabbit conta a Segunda Guerra Mundial aos olhos infantis.
Jojo (Roman Griffin Davis) é uma criança alemã entusiasta do nazismo, tem como amigo-imaginário Adolf Hitler (Taika Waititi) e descobre que sua mãe (Scarlett Johansson) está escondendo uma jovem judia (Thomasin McKenzie) no sótão.
A sátira talvez seja a técnica literária mais forte e, se bem trabalhada, pode atingir o público de maneira mais efetiva que qualquer outra estratégia. Jojo Rabbit é uma sátira bem trabalhada. Com o senso de humor e a sensibilidade característica de Taika Waititi, o filme que brinca com a alienação do povo alemão à época, também mostra que os perigos são reais ainda hoje. É impossível deixar de comparar com o genial “O Grande Ditador” (1940), de Charles Chaplin.
Waititi cria um protagonista interessante, Jojo flutua entre a inocência infantil e a idealização de ideologias repugnantes, é marcado pela desumanização do inimigo, que mostra como crianças (e até mesmo adultos) eram influenciados, Jojo em certos momentos começa imaginar como seriam os judeus, ajudado pelo seu amigo imaginário Hitler. Scarlett Johansson está inspirada e têm atuação acima da média, tentando desviar seu filho dos princípios nazistas.
Com uma plástica parecida com a de Wes Anderson, esteticamente Jojo Rabbit é ótimo, com destaque para a direção de arte, que consegue suavizar tudo em um cenário de guerra, construindo um filme leve.
E é essa transição o ponto forte do filme, tal qual o seu personagem principal, o longa consegue transitar entre a comédia e o drama com facilidade, é um filme bastante dinâmico e virtuoso nesse sentido.
Em um mundo ocidental cada vez mais estranho politicamente, é sempre importante usar da arte para relembrar um passado não tão distante e como o totalitarismo jamais será resposta. Por mais sátiras como Jojo Rabbit.
Em meio a histórias independentes e absurdas, Relatos Selvagens fala sobre a condição humana e vingança de forma diferente e genial.
Os primeiros minutos de Relatos Selvagens já nos mostra que não estamos diante de um filme comum, um avião que tem nele pessoas que carregam uma coincidência não muito agradável, é só o começo do longa argentino que é dividido em 6 histórias diferentes, que não se ligam em momento algum, mas que possuem a selvageria e uma pergunta em todas elas: qual é o limite do ser humano?
Relatos Selvagens conta com Ricardo Darin em seu elenco, que em uma das melhores histórias tem atuação excepcional em “Bombita”. “La Propuesta”, “El Más Fuerte”, “Las Ratas”, “Pasternak” e, a minha favorita “Hasta que la Muerte nos Separe”são as outras 5 histórias.
O roteiro escrito por Szifron é nada menos que espetacular. Com personagens complexos, diálogos acima da média, o diretor e roteirista argentino constrói histórias coesas, que não se distanciam em momento algum, um hiper-realismo feito de forma impecável. A irregularidade é marca comum em filmes com várias histórias independentes, é difícil construir um universo coerente, objetivo e com um nível de qualidade parecido entre todas as histórias, e Relatos Selvagens consegue. Não há aqui nenhuma história esquecível, todas são importantes, cada uma a seu modo.
Com um humor diferenciado e com momentos que beiram a escatologia, Damián Szifron faz um filme incrivelmente humano, mostra o que pode estar adormecido dentro de cada um, não é fácil tratar da linha tênue entre a civilização e a barbárie como foi tratado aqui.
Sem dúvidas um dos melhores filmes da última década. Relatos Selvagens é uma deliciosa jornada de autodestruição, como situações cotidianas podem desencadear um verdadeiro caos. É como bem diz o seu trailer: “Descubra seu lado selvagem”
Mais em: https://www.instagram.com/conversandocinema/
Frenético. Se me pedissem para que descrevesse Joias Brutas em uma palavra, não tenho dúvidas que essa seria essa. Em um ritmo alucinante, os irmãos Safdie entregam 120 minutos de reviravoltas, mentiras, tensão, enfim, um misto de sensações que deixa incomodada até a pessoa menos ansiosa do mundo.
Howard Ratner (Adam Sandler) é um vendedor de peças de valor para pessoas famosas e donos de grandes lojas de Nova York. Viciado em apostas e agora atolado em dívidas, ele encontra uma grande oportunidade para quitá-las antes que seja tarde demais.
E é o protagonista Adam Sandler quem rouba a cena, em Joias Brutas ele encontra seu papel perfeito, criando um personagem que mente compulsivamente, se coloca e coloca até mesmo sua família em riscos, mas que a gente torce para que consiga se dar bem no final. Sandler já se provou um grande ator diversas vezes, e aqui tem talvez sua melhor atuação de todas, quem sabe as desconfianças em torno dele acabem agora.
As participações especiais de Kevin Garnett e The Weeknd também chamaram a atenção, o primeiro, com mais minutos em tela, é bastante importante para a trama e vai muito bem. A paixão de Ratner pelo basquete passa por ele aqui.
Tudo no filme é feito para causar agonia, desde os cenários, que vão de boates lotadas, centro da cidade, helicópteros e muito mais, o filme constrói um ritmo frenético e não abandona essa premissa por um minuto sequer. O estilo da filmagem e trilha sonora contribuem para isso. A aflição aqui é constante.
Em época de premiações é comum entendermos alguns filmes como injustiçados, muitas vezes é apenas a vontade de legitimar a sua opinião por meio de outras pessoas, que quando frustrada nos causa essa revolta, se for isso, que seja, o grande injustiçado da temporada na minha opinião tem nome: Joias Brutas (Adam Sandler, também).
Em drama contemplativo utilizando do espaço como lugar de ser, Brad Pitt brilha em atuação forte e melancólica.
A ficção científica é o gênero cinematográfico que sobrevive de especulação, como será o futuro? Quais serão as grandes descobertas, evoluções? Qual será o preço de tudo isso? Viagens ao espaço são as mais escolhidas para tentar responder essas perguntas, desde “Viagem a Lua (1902)” de George Melies, a sétima arte apresenta respostas de como será o futuro na Terra e fora daqui.
Em Ad Astra temos um filme contemplativo, o que parecer ser uma aventura espacial é na verdade um drama pessoal, onde muitos dilemas são sentidos por Roy McBride (Brad Pitt), um astronauta exemplar que é mandado ao espaço em busca do desaparecido pai Clifford McBride (Tommy Lee Jones), também astronauta, que pode representar uma ameaça para a Terra.
E é nessa relação pai e filho que Ad Astra se solidifica, as ameaças à Terra pouco importam, no fim tudo está nas relações familiares, ou na falta delas. O espaço é só o pano de fundo para entender essa história.
Os conceitos futuristas são bem explorados no filme, embora tenham ficado aqui em segundo plano. A premissa individualista não permitiria algo muito espetacular, é um filme pessoal, mas temos nesse futuro teremos voos comerciais para a lua, não deixando de lado o gênero que parte.
A atuação de Brad Pitt ganha o filme, saindo da zona de conforto de seus conhecidos personagens carismáticos, aqui interpreta um personagem melancólico, com olheiras a vista, mostrando como é um ator, sim, versátil.
Esteticamente é um filme lindo, as cenas tanto em Terra quanto no espaço são bem produzidas. O filme falha no ritmo que impõe. Embora a história relate uma certa urgência para que tudo seja resolvido, as cenas são muito lentas, não combina com a necessidade que tanto ressaltam durante os 120 minutos.
Mesmo com muitas metáforas, Ad Astra é mais simples do que poderíamos imaginar.
Mais em: https://www.instagram.com/conversandocinema/
Em ficção científica inspirada em clássicos do passado, William Eubank falha ao fazer um filme gameficado que se leva mais a sério do que deveria.
Em Junho de 1979 chegava aos cinemas o clássico “Alien – O Oitavo Passageiro”, filme de Ridley Scott. Alien conta a história de uma nave espacial rebocadora que está voltando à Terra e os tripulantes descobrem uma criatura alienígena extremamente violenta a bordo. De lá pra cá muitos filmes bebem (ou pelo menos tentam beber) da fórmula Alien. É o caso de Ameaça Profunda, que ficou apenas na tentativa.
Aqui não é o espaço onde vão tentar sobreviver a todo custo, o mar é o ambiente da vez. Os minutos iniciais de Underwater são promissores, com a personagem Nora (Kristen Stewart) vamos conhecendo a estação subaquática que ela e a equipe científica estão trabalhando. Estava indo bem, mas partir do acidente que os problemas no filme começam a acontecer.
A tentativa de imersão do filme falha miseravelmente, as cenas são escuras, sendo difícil em alguns momentos até enxergar o que está acontecendo, a construção dos personagens também falha, não conseguem construir uma empatia entre o filme e quem está assistindo, é difícil sentir algo pelos personagens, não causa apreensão, medo.
A premissa inicial de gameficação é interessante, em alguns momentos parece que estamos vendo uma partida de algum jogo de videogame, mas isso esbarra na já comentada falta de imersão. Embora o fundo do oceano seja imenso, aqui se tenta criar momentos claustrofóbicos, mas novamente falha.
O maior defeito de Underwater, entretanto, é se levar mais a sério do que realmente é. O que poderia ser um terror psicológico interessante vira uma grande bobagem exagerada com monstros pouco interessantes e jumpscares excessivos.
No fim, parece que estamos revendo algo que já vimos antes, mas com bem menos qualidade em todos os aspectos.
O mar como protagonista em um drama de obrigações, direitos e sentimentos.
A morte sempre foi personagem importante do cinema, não poderia ser diferente, já que é a única certeza que temos em vida. Enquanto temos na sétima arte – e na vida – exemplos de pessoas que superaram todos obstáculos imagináveis para se manter vivos, em Mar Adentro conhecemos a história de Ramón Sampedro (Javier Bardem) um marinheiro espanhol que ficou tetraplégico aos 26 anos, e desde o trágico momento tem como vontade maior a de morrer, recorrendo até mesmo à Justiça para realizar seu desejo.
Enquanto em Os Outros (2001), do mesmo diretor Alejandro Amenábar, a personagem de Nicole Kidman não suportava a ideia da morte, aqui temos o oposto, alguém que não tem mais prazer na vida.
Apesar do fundo do filme tratar sobre a eutanásia, Mar Adentro não procura em momento nenhum trazer um debate aprofundado sobre o tema, Ramón em certo momento do filme diz que não está falando sobre os outros, está falando apenas de si. E o filme segue esse ritmo, tendo no máximo a cena de Ramon discutindo com o padre, que, também é tetraplégico, mas possui imensa vontade de seguir vivo, mas a discussão ficou extremamente rasa, apenas de acusações de ambos os lados, não havendo um debate de maior seriedade, Amenábar aqui se entregou ao sentimentalismo.
O relacionamento de Ramon com sua advogada Julia e com sua nova amiga Rosa nos faz refletir: até que ponto somos empáticos de verdade, ou na verdade somente projetamos aquilo? Sendo nosso o sentimento, até que ponto, em momento de dificuldade alheia, realmente estamos nos colocando no lugar do outro, sentindo o que o aflito está sentindo?
A cena de Javier Bardem voando é maravilhosa, a fotografia do filme em si é muito bela, sempre relembrando o mar, mar que trouxe para Ramón Sampedro sua vida, uma vida de muitas aventuras, já que ganhava ela como marinheiro, mas, mar este que também tirou a sua vida. Daquelas grandes ironias da vida.
O roteiro é muito bem-feito, a relação da família com toda a situação em volta de Ramón, com advogados indo à Justiça pelo direito de morrer com dignidade trazem momentos interessantes ao filme, importante perceber como cada um da família enxerga a situação de maneira diferente. Enquanto o irmão não aceita em hipótese alguma a ideia da eutanásia, sua cunhada pensa se tratar decisão unicamente de Ramón, já o pai, pouco diz sobre isso tudo, mas, em um dos momentos mais sentimentais do filme resume seu sentimento em: “pior do que um filho morrer, é ele querer morrer”.
A trilha sonora de Mar Adentro é bastante dramática, tal qual o filme, em alguns momentos até exagera em cenas que não se faziam tão necessárias. Javier Bardem está espetacular, uma das atuações mais fortes de sua carreira, chegando a ser, em certo ponto, irreconhecível nos minutos iniciais do filme.
A vida humana, para Heidegger, só se torna um todo depois da morte. Heidegger entende que a morte é a única maneira de atingir a individuação, sendo assim, encontrar a totalidade de sua vida. Também é disso que Ramon, em Mar Adentro, fala, um personagem que entende não ter mais nada a viver, que apesar de todo seu talento para a literatura, aquilo não bastava. De forma diferente do personagem de Daniel Day-Lewis em Meu Pé Esquerdo (1989), seu talento não bastava para se sentir vivo.
A vida, apesar de um direito, não pode ser uma obrigação, porém, é inegável que falando de eutanásia, nenhuma posição é facilmente defendível, qualquer que seja a decisão gerará na angústia de alguém, alguém sairá ferido qualquer que seja a decisão. E, em um tema tão pertinente à sociedade, ainda temos dificuldade de discutir por sua profundidade, profundidade tal qual encarar Mar Adentro.
Em drama eletrizante sobre os bastidores do automobilismo, com Christian Bale e Matt Damon em atuações inspiradas, uma conhecida rivalidade é tema.
Em uma década onde via a rival italiana Ferrari ganhando tudo no esporte, a americana Ford resolve entrar no mundo das corridas, e têm no ex-piloto Carroll Shelby (Matt Damon) a confiança para fazer a equipe chegar ao topo, Shelby conta com Ken Miles (Christian Bale) para atingir esse objetivo, o controverso piloto e engenheiro não é visto com bons olhos pela empresa, que não pensa só no lado esportivo, como também em negócios.
Elogiar Christian Bale é chover no molhado, em Ford vs. Ferrari interpreta um personagem bastante caricato, sendo mais uma boa atuação na sua consolidada carreira.
O filme não esconde a preferência pela Ford, em alguns momentos temos até a impressão que é uma disputa de mocinhos e vilões, e, embora muito provavelmente não seja isso um fato, Ford v. Ferrari conta uma história real sobre essa rivalidade, o famoso grande prêmio “24 horas de Le Mans de 1966”.
E não só a rivalidade é tratada no filme, o duelo entre a criatividade e o corporativismo é talvez o principal ponto do filme. Sendo raros os filmes sérios sobre automobilismo (como o ótimo Rush – No Limite da Emoção (2013)), é interessante conhecer os bastidores do esporte, o trabalho de toda a equipe para que tudo funcione bem. E não só isso, a disputa de egos é bem mostrada, apesar de pouco aprofundamento, até por não ser o foco do filme.
A fotografia do filme é também motivo para elogios, as longas cenas das corridas são incríveis, com todas as perspectivas possíveis, tanto dos pilotos quanto de quem assiste, um trabalho impecável da edição que aposta na imersão do espectador.
Dentro do universo onde ser o mais rápido é basicamente o que importa, Ford vs. Ferrari mostra que muitas vezes na vida é importante desacelerar.
Jake Kasdan repete fórmula que deu certo no filme anterior e cria um entretenimento honesto.
A velha máxima do futebol de que “time que está ganhando não se mexe” talvez seja a melhor forma para definir Jumanji: Próxima Fase. O subtítulo define bem o que é o filme, uma segunda fase.
O recheado elenco já conhecido de Jumanji: Bem-Vindo a Selva agora conta também com os aqui divertidos Danny deVito e Danny Glover, os velhinhos que se odeiam trazem algo a mais ao filme, os momentos com os dois são hilários. A talentosa sul-coreana Awkwafina também é uma grata surpresa, em ano que ela emociona no belíssimo “A Despedida”, tem em Jumanji mais uma atuação de alto nível em sua carreira.
Uma das grandes sacadas do filme é fato dos personagens mudarem aqui. Por um “bug” do jogo os jovens (e velhos) não conseguiram escolher seus personagens e agora precisam se adaptar aos novos pontos fortes e fraquezas de seus personagens. O filme falha na motivação para a nova aventura, não tenho a intenção de contar spoilers por aqui, mas me pareceu pouco verossímil a situação que leva Spencer (Alex Wolff) de volta à Jumanji, beirando a irracionalidade.
Jumanji: The Next Level aposta na comédia e funciona como tal. Tanto é que tem um vilão totalmente esquecível (não tem nem 24 horas que vi o filme e não consigo me lembrar do nome dele sem usar do Google), a aventura aqui ficou em segundo plano. Tal qual o primeiro, a direção de arte funciona muito bem, a cena dos avestruzes correndo é maravilhosa.
Jumanji é sem dúvidas um dos remakes que melhor funcionou entre a infinidade de refilmagens dos últimos anos. Levar os personagens para dentro do jogo (diferente do longa de 1995) garante possibilidades de “novas fases”, e assim se apresena “Next Level”, uma nova visita ao jogo. A impressão que fica é que a continuação ainda está por vir...
Quando menos é mais, a beleza no comum em uma quase autobiografia de Pedro Almodóvar
A vida nem sempre é fácil – diria que a maioria das vezes não é -, nem sempre é bela, e nem sempre se sabe o que quer fazer. Em seu novo filme, Dor e Glória, o espanhol Pedro Almodóvar fala de uma das maiores dificuldades que um ser pode passar. A de se redescobrir. A ressignificação do ser.
Salvador Mallo (em atuação espetacular de Antonio Banderas) é um cineasta em baixa que é obrigado a relembrar e refletir sobre sua vida e suas escolhas, sobre seus primeiros amores, e, sobre sua paixão precoce sobre o cinema. Já mencionada a atuação de Banderas, é impossível não citar o trabalho da incrível Penélope Cruz, de Leonardo Sbaraglia, Asier Etxeandia, dentre outros. Todas atuações são muito boas.
Diferentemente de todas as suas obras, temos aqui um filme mais simples, não espere as conhecidas reviravoltas do diretor, o seu humor um tanto quanto diferente, por assim dizer. Um filme mais humano. Um olhar de Salvador para o passado em busca de algo que dê razão para o futuro, um homem que por nada sente prazeres, mas tem um imenso amor por sua mãe, sendo sem dúvidas as mais belas cenas quando os dois estão juntos, tanto no presente quanto no flashback
É um trabalho sem dúvidas maduro, de alguém que sabe transformar as suas angústias em arte. A silenciosa, mas caótica vida que Salvador leva é justificada no decorrer do longa, uma vida de muitas renúncias e dificuldades – como a vida é.
As duas linhas temporais (passado e presente de Salvador) são muito bem trabalhadas por Almodóvar, são cenas que convergem muito bem, de uma sutileza incrível. A fotografia é bonita, o vermelho é bastante presente em todo filme, que traz consigo um significado.
O talvez mais pessoal filme de Pedro Almodóvar é quase uma biografia, o quanto dali é real e o quanto é fictício? Não sei, e pouco importa. O que é possível saber é que o espanhol segue um diretor encantador, nesta honesta homenagem à sétima arte, de quem sempre por ela foi apaixonado, e mostra, em Dor e Glória, que menos pode ser mais.
Mais maduro e visualmente melhor que seu antecessor, Frozen II se solidifica como filme próprio e não apenas como uma mera continuação.
Encerrando a década em que a Disney apostou em continuações e remakes (muitas vezes desnecessários), temos mais uma continuação, Elsa e Anna estão de volta em um filme amadurecido e com temas mais fortes que o primeiro, embora sem uma canção marcante como “Let it Go” e “Do You Want to Build a Snowman?”, as músicas são boas. Into the Unknow e Show Yourself embalam o filme, que é recheado de outras canções. O filme é um acerto e funciona bem como musical.
Elsa está bastante empoderada nessa continuação, em busca de respostas que expliquem problemas do passado e também a sua magia, é possível entender o filme como de origem, não só da Elsa, mas de tudo que envolve o Reino gelado de Arendelle.
O maior acerto de Frozen II é construir sua própria identidade, é um filme que funciona por si só, embora siga com algumas fórmulas que deram certo no primeiro, como continuar sendo uma história de amor entre duas irmãs e ter no Olaf o alívio cômico do filme, em Frozen II o adorado boneco de neve está vivendo uma crise existencial divertidíssima. Visualmente é um dos melhores filmes da Disney, a experiência em 3D dele é incrível.
Como de costume nas obras Diney, assuntos do momento foram tratados, e parece que a causa ambiental é o grande foco da indústria agora (como já visto em Moana) e com razão. O filme fala sobre preservação da natureza, sobre respeito aos povos nativos, faz um importante papel de conscientização do público-alvo da obra, que é infantil.
Enquanto em Frozen conhecemos uma Elsa que tinha medo de ser quem era e de seus poderes, Frozen II trabalha a sua evolução e termina com ela realizada e descobrindo o seu lugar, bonito de se ver. Esperemos que agora a rainha tenha paz
Com elenco de peso e um mistério envolvente, Rian Johnson entrega pouco mais de duas horas de um suspense bem-humorado que corrompe a expectativa do espectador.
Homenageando a “Dama do Crime” Agatha Christie, Entre Facas e Segredos fala sobre um possível assassinato. Logo após comemorar o aniversário de 85 anos, o escritor Harlan Thrombey (Christopher Plummer) é encontrado morto dentro de sua casa. Enquanto os policiais imaginam se tratar de um suicídio, o detetive Benoit Blanc (Daniel Craig) suspeita que seja na realidade um homicídio, e descobre que muita gente tinha motivo para querer ver o simpático senhor Thrombey morto.
O elenco está afiado e tem com ótimos nomes, além dos já citados, conta também com Jamie Lee Curtis, Toni Collete, Chris Evans, Ana de Armas, e outros, que assumiram com maestria cada papel. A dinâmica e entrosamento entre os personagens foi fundamental para o bom funcionamento de Knives Out.
A forma como o filme é conduzida é bastante interessante, embora ser um filme de mistério, não somos levados pela visão do detetive, muitas vezes estamos até a frente dele na resolução do caso, é verdadeiramente um forma de corromper as expectativas de quem assiste, o que é bastante incomum em filmes de detetive. Aqui, o ponto de ligação entre o crime e o espectador é a empregada Marta Cabrera, que por motivos físicos não pode mentir. Entre Facas e Segredos logo mostra que não procura desvendar nenhum crime, mas sim entendê-lo.
O filme peca por alguns deslizes do roteiro, alguns exageros, em alguns momentos soa um pouco repetitivo, mas nada que comprometa a experiência no final. A trilha sonora está muito boa, tal qual a fotografia.
Reinventando um gênero clássico do cinema, Rian Johnson, ainda que não inspirado diretamente e nenhuma obra de Agatha Christe, faz o filme que mais se parece com ela.
Obra-prima do cinema japonês, Era Uma Vez em Tóquio trata sobre o tempo e a brevidade das relações.
Um casal de idosos deixa a filha mais nova em casa e resolve viajar para Tóquio para visitar seus filhos mais velhos, que não encontram há muito tempo. Entretanto, os filhos estão muito atarefados e não conseguem dar atenção aos pais.
Ambientado em um Japão pós-guerra, Tôkyo Monogatari expõe relações familiares cotidianas a todos tempos e culturas, a dificuldade no relacionamento de pessoas de diferentes gerações, e uma infeliz, mas real situação, o descaso dos filhos para com os pais depois de velhos. O filme também pode ser visto como uma crítica a uma sociedade que vive pelo trabalho e não tem mais tempo para a família. Realidade que passados quase 70 anos não mudou.
O estilo de Ozu é único, uma câmera parada a metros do chão, somente um plano do filme se movimenta, e mesmo assim de maneira lenta. Ozu atrai o espectador com suas estórias, retrata o cotidiano com seu olhar alheio a tudo aquilo, alheio porque não há sentimentalismo em sua obra, embora ser uma história triste, o diretor se coloca em uma posição neutra, não retrata os filhos como sendo vilões, são pessoas ocupadas, como tantas outras, que muitas vezes nem tem tempo para refletir quão efêmera é a vida.
Embora sem a atenção dos filhos, o casal é muito bem recebido por sua nora Noriko (Setsuko Hara). Ex-esposa do falecido filho, ela faz de tudo para sempre dar atenção aos sogros, sendo reconhecido o esforço pelo “pai”.
Era Uma Vez em Tóquio está muito perto de nós. É quase um espelho, é difícil não se ver na obra em vários momentos, seus valores, os dilemas vividos, tudo está próximo. Diferentemente do que faz Ozu, o telespectador não consegue ficar alheio.
O cinema pode (e deve) fazer o papel de instrumento de mudança social. Que amemos mais aqueles que nos amam e fazem de tudo pela nossa felicidade.
A harmônica obra de Rob Reiner é uma verdadeira odisseia. Uma jornada de autoconhecimento em uma das maiores histórias sobre amizade já produzidas pelo cinema.
Quatro amigos (Gordie, Teddy, Vern e Chris) descobrem que um adolescente que desapareceu semanas atrás foi atropelado por um trem, estando ainda desaparecido. Os garotos resolvem ir atrás do corpo com a intenção de serem os mais novos heróis da cidade. Mas conseguiram muito mais que isso.
Embora com a intenção aventureira comum da infância, os garotos logo são confrontados com suas próprias realidades, seja no preconceito sofrido por ser quem é, seja pelo desequilíbrio na figura paterna, ou, no caso do protagonista, por ter se tornado invisível em sua própria casa. Gordie Lachance perdeu o irmão mais velho em um trágico acidente de carro e desde então seus pais não se recuperaram.
E nada melhor para o desenvolvimento humano do que o confronto com o fim, quando vão se dando conta do que realmente estão fazendo, os jovens percebem que não é nenhum motivo de festa.
O tom melancólico do filme é ainda maior pela tragédia com o jovem ator River Phoenix (Chris Chambers), que faleceu poucos anos depois, sendo na época um dos atores mais promissores de Hollywood. Phoenix tem bela atuação, mesmo não sendo o protagonista, criou o personagem mais cativante, que embora com uma aparente casca dura, com o passar do tempo mostra o que sente em relação à sua família e sociedade, e tem em Gordie a confiança para se mostrar, também, sensível.
Com uma trilha sonora e cenários maravilhosos, Rob Reiner tem em Conta Comigo sua maior obra. Poucos filmes conseguem demonstrar com tanta verdade o que é passar pela infância e adolescência como Conta Comigo conseguiu, e hoje, já tendo passado por essa fase posso dizer que eu também nunca tive amigos como os que eu tive quando tinha 12 anos.
Uma abordagem romantizada do encontro entre os dois últimos e diferentes Papas.
Muito embora o novo filme da Netflix falar sobre a figura mais alta da Igreja Católica, Dois Papas não faz o papel de filme religioso. O que encontramos nas 2 horas de filme são pessoas, uma humanização de seres que quase sempre estão apenas no nosso imaginário, muito pelo sigilo que rondam uma das instituições mais antigas do mundo.
O filme parte de um ponto conhecido: a morte do Papa João Paulo II e o conclave que decidiria quem seria o próximo Papa. E então surgem as figuras Ratzinger (Bento XVI) e Mario Bergoglio (Francisco)
As diferentes visões de mundo dão tom ao filme. Bento, em atuação divertida (e imagino que mais simpática que o real) de Anthony Hopkins, é bastante conservador e pouco aberto a mudanças, diferentemente de Francisco (Jonathan Pryce), um cardeal com uma cosmovisão mais progressista e apaixonado por futebol. Os dois atores são o sustentáculo do filme.
O roteiro é bastante simples, os cenários são bonitos (com destaque para a réplica da Capela Sistina construída para a filmagem) mas não o suficiente para manter o ritmo dos minutos iniciais do filme. As escolhas estéticas por parte do Meirelles também não são muito agradáveis, chegando a ser uma verdadeira bagunça em alguns momentos – excesso de flashbacks, mudanças bruscas no foco – que destoa da maior qualidade do filme, os diálogos.
Dois Papas não se esquivou e teve a coragem de tratar dos assuntos mais polêmicos da Igreja, mas também soube descontrair e ser bem-humorado. A contradição dos Papas é tratada de maneira bem honesta. Apesar de alguns momentos o filme demonstrar simpatia maior por Bergoglio, o carisma de Hopkins impede o filme de pender para um lado.
E, em meio a esse “embate”, ambos percebem como existe um pouco de cada um no outro, como não são tão opostos assim.
Avatar: O Caminho da Água
3.9 1,3K Assista AgoraO cinema é a arte da contemplação, do admirar e de - nas grandes obras - do transporte para uma outra dimensão.
Poucos são os cineastas que atendem à terceira característica tão bem quanto James Cameron.
O garotinho apaixonado por cinema que em 2009 ficou em êxtase em uma sala de cinema após assistir AVATAR vai dormir muito feliz hoje.
O Homem do Norte
3.7 949 Assista AgoraEggers deixa parcialmente de lado o metafísico em seu novo filme - se comparado aos primeiros filmes -, mas não abandona a constante tensão realista de suas obras construida por um design de som abrupto, grotesco, casando muito bem com a tragédia hamletiana de O Homem do Norte.
Um filme sem heróis e vilões, apenas sobre o destino que acompanha o protagonista e do qual ele não pode fugir.
Onde Fica a Casa do Meu Amigo?
4.2 145 Assista AgoraO mais interessante nesse filme do Kiarostami é como a realização de uma simples tarefa se torna uma jornada épica para o bondoso Ahmed, tendo como causa principal o fato de ninguém ao seu redor conseguir minimamente escutar o que ele tem a dizer.
A Vida Invisível
4.3 645O intimismo e o melodrama em um filme sobre a força da mulher e os laços que não podem ser quebrados.
Rio de Janeiro, década de 50. Eurídice (Carol Duarte) é uma jovem com muito talento, mas bastante introvertida, Guida (Julia Stockler) é sua irmã mais velha, e totalmente o contrário de Eurídice quanto ao seu temperamento. Vivendo em um regime patriarcal, faz com que trilhem caminhos diferentes, precisando lidar com responsabilidades da vida adulta.
A Vida Invisível é um filme sobre mulheres fortes. Guida e Eurídice são filhas de uma família tradicional portuguesa, ambas se sentem reprimidas pelo patriarcado a qual são submetidas, e cada uma acredita que a outra está vivendo aquilo que sempre sonhou.
É um filme que busca trazer diversas reflexões da nossa vida cotidiana, corações partidos, problemas domésticos, a tão sonhada liberdade e a sensação de que temos todo o tempo do mundo para alcançar o que queremos, o que não é uma verdade.
Impressona como o filme vai dando ritmo aos personagens com o tempo, a priori vemos tudo de fora, mas com o passar dos minutos é impossível não imergir no universo feminino que o diretor Karim Aïnouz construiu, baseado no livro de “A Vida Invisível de Eurídice Gusmão”, de Martha Batalha.
O filme vai ganhando força com tempo pela forma que é contado, o roteiro não trata de apresentar os personagens, eles vão ganhando contexto e forma com o tempo, e vamos entendendo cada um deles. A forte fotografia de Hélène Louvart é um dos pontos altos do filme, buscando sempre contrastar as cores e ambientes.
Por mais que A Vida Invisível seja um filme sobre estar só, sobre a solidão causada pela falta de quem amamos, a maior marca da obra é o sentimentalismo de uma irmã para com a outra. Não é preciso estar perto para estar junto, alguns laços são inquebráveis.
As Virgens Suicidas
3.8 1,4K Assista AgoraEm sua estreia diretorial aos 28 anos, Sofia Coppola mostra maturidade e sensibilidade em drama ousado.
Em um subúrbio dos Estados Unidos dos anos 70 vivem as cinco irmãs Lisbon, em uma vizinhança rodeada de garotos e com uma criação extremamente conservadora, a vida das irmãs é marcada pela repressão, amor e desejo.
Embora o nome sugestivo, não é na morte/suicídio ou depressão em que o filme se foca, mas sim na juventude e o poder de amplificar todos os sentimentos vividos nessa fase, seja para o bem ou para o mal. As Virgens Suicidas é muito mais uma leitura feita dos jovens vizinhos que as observam do que realmente as suas vidas. O filme pouco explica sobre elas.
Não tentam também achar culpados, nem a mãe controladora ou o pai são colocados como vilões, As Virgens Suicidas trata da sociedade como um todo e o falso moralismo que a rodeia.
Kirsten Durst dá vida a Lux Lisbon, em atuação forte e convincente. O segundo ato do filme passa por ela e por Trip Fontaine (Josh Harnett), o garanhão da escola, e é a partir daqui que o filme perde um pouco o ritmo. A construção do personagem de Trip é praticamente inexistente, e quando o filme tenta voltar ao ritmo inicial restam poucos minutos e o final acaba sendo apressado.
A direção de Sofia Coppola é madura, segura, consegue ser sensível falando de algo tão assustador, consegue impactar ao mostrar o abismo entre pais e filhos, a falta de diálogo e a falsa convivência. Com uma direção de arte e fotografia impecáveis, não há o que se criticar esteticamente no filme, que conta também na produção o seu pai, o eterno Francis Ford Coppola.
E é talvez essa sua maior qualidade, retratar uma sociedade que não sabe dialogar, que trata as imperfeições como sendo coisas do lado de lá. Que acabam acarretando situações que muitas vezes é impossível explicar. O inexplicável é o que prevalece no fim.
À Meia-Noite Levarei Sua Alma
3.9 288 Assista AgoraUm filme de horror iconoclasta que usou muito bem disso para assustar nos anos 60, mas que ainda funciona atualmente mesmo por seu tom artesanal.
O sádico coveiro Zé do Caixão é odiado por praticamente todos em sua cidade interiorana pelo seu jeito macabro e suas roupas. Obcecado em gerar o filho perfeito para que possa dar continuidade ao seu sangue, vê na esposa do melhor amigo a mulher ideal para gerar seu filho, já que sua esposa não pode engravidar.
Não é possível desassociar o cinema da sociedade, na grande maioria das vezes ele apenas reflete o que pede o mundo naquele momento, por isso é tão importante como arte. Zé do Caixão é visto como bizarro em À Meia-Noite Levarei a sua Alma dentre outros motivos, por debochar de dias santos, simbolismos que obviamente seguem fortes no dia de hoje, mas nada comparado com o que era décadas atrás. A iconoclastia é a base do filme para gerar medo.
É a primeira aparição do clássico personagem em tela, interessante ver que embora seja o mensageiro da morte, Zé do Caixão é pouco supersticioso, sendo no filme um grande contestador da fé alheia.
Usando de métodos pouco usuais, como o contato da feiticeira com o público logo no começo do filme cria uma relação interessante entre o filme e quem assiste, é uma forma de conexão do telespectador. A criatividade para driblar o baixo orçamento é no mínimo interessante, uma atmosfera escura, o contraste entre o bar que Zé visita e sua casa, ou mesmo a cabana na bruxa, que é o mais interessante visualmente na minha opinião.
O Chamado da Floresta
3.5 183O Chamado da Floresta prova que nem sempre usar fórmulas adoradas pelo público, contar com ótimos atores e ter uma história suficiente dá certo.
Buck é o cachorro de estimação do Juiz Miller (Bradley Whitford) e sua família na Califórnia, depois de ser roubado têm sua vida virada completamente ao ser levado à selvagem Alasca da corrida do ouro, precisando sobreviver a nova realidade, Buck tenta encontrar seu lugar no mundo. Baseado em no livro de Jack London de 1903, é a terceira vez que o conto vira adaptação nas telonas.
Um dos gêneros de maior sucesso das décadas de 90 e 00 sem dúvidas foram os divertidos filmes de cachorro. Beethoven, Marley & Eu, Sempre ao seu Lado, dentre outros diversos exemplos, foram filmes que marcaram as décadas passadas. O Chamado da Floresta tenta repetir o sucesso dos anteriores.
É impossível não se incomodar com o CGI do filme, a artificialidade salta aos olhos, não funcionou, embora a fotografia seja bonita.
A humanização do animal é a principal premissa do filme, Buck que era um cachorro mimado quando vivia na Califórnia, precisa crescer agora que vive em território hostil, e é ajudado ao conhecer os carteiros Perrault (Osmar Sy) e Françoise (Cara Gee), que colocam ele na matilha que guiam o trenó dos correios, e assim Buck aprende lições importantes sobre trabalho em equipe,
No segundo momento do filme temos Harrison Ford em tela, John Thornton defende o cão quando ele é comprado pelo ganancioso vilão (Dan Stevens), que maltrata o cachorro em todas oportunidades. Ford está no piloto automático aqui, embora o arco do filme passe por ele, não é nenhuma atuação memorável por sua parte.
Embora O Chamado da Floresta tivesse tudo para dar certo, a falta de aprofundamento e o aparente desinteresse em quem produzia a obra faz com que tudo fique pelo caminho, no fim não dá certo.
O Serviço de Entregas da Kiki
4.3 776 Assista AgoraCom uma animação impecável padrão Studio Ghibli, O Serviço de Entregas da Kiki fala sobre amadurecimento e mudanças na infância e adolescência.
Kiki é uma bruxa que acaba de completar 13 anos de idade, e pela tradição, quando chegam nessa idade as bruxas devem sair de casa para aprender a viver por si só. Ela se muda para a cidade de Konco, na companhia de seu gato falante Jiji.
Dirigido pelo gênio Hayao Miyazaki (Meu Amigo Totoro, Princesa Mononoke, A Viagem de Chihiro), o roteiro trata sobre o amadurecimento precoce em crianças e como elas podem lidar com algumas responsabilidades, é um filme mais simples que os seus clássicos, mas nem por isso chega a ser um filme “bobo”.
O design de produção aqui é bastante notável, desde a criação da cidade quanto as roupas utilizadas pelos personagens, nota-se um trabalho preocupado com a estética, as cenas da Kiki voando são lindas, além das expressões dela por meio do cabelo. A paixão do Miyazaki pelos céus é perceptível, anos depois veio também com sua direção a animação Porco Rosso, sobre um piloto de aviões.
Os personagens são adoráveis num todo, embora a cidade a princípio tenha se espantado com a chegada de uma bruxa, não passou nem perto a tentativa de criar um possível antagonista, quem importa na história gosta da Kiki. Com destaque para o Tombo, que constrói uma amizade bonita com a bruxinha.
A maior falha do filme talvez esteja em sua trilha sonora, há momentos em que as músicas não acompanham o ritmo do filme, e em outras soam desnecessárias, falta coerência em alguns momentos no que toca às canções.
Com um roteiro aparentemente simples, O Serviço de Entregas da Kiki é também capaz de trazer lições e discussões sobre adaptação e mudanças nas diversas fases da vida e em tudo que ela nos pede. E tudo isso com a leveza típica do Studio Ghibli.
As Vantagens de Ser Invisível
4.2 6,9K Assista AgoraTratando da adolescência como poucos, As Vantagens de ser Invisível é responsável ao falar sobre assuntos polêmicos e importantes.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
Charlie (Logan Lerman) é um adolescente tímido e impopular que narra o filme e sua vida por meio de cartas. Tudo muda quando ele conhece os irmãos Sam (Emma Watson) e Patrick (Ezra Miller) e seu grupo de amigos do Ensino Médio.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
Os medos, dilemas, indecisões de Charlie e seus amigos são muito bem representadas. A responsabilidade do filme ao tratar de assuntos como depressão, drogas, sexualidade é exemplar, diferentemente da polêmica série “13 Reasons Why” e outros, aqui é possível notar o cuidado que se teve para tratar de assuntos sérios. É um filme maduro nesse aspecto.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
As Vantagens de Ser Invisível consolida a carreira da talentosa Emma Watson, deixando qualquer possibilidade de ser marcada para sempre como Hermione Granger para trás. Miller e Lerman também entregam atuações de muita qualidade, principalmente Ezra, que já provou ser um ator versátil.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
A direção e adaptação ficaram com Stephen Chbosky, escritor do livro. Ter Chbosky dirigindo o filme dá força ao original, até porque ninguém entende mais seus personagens do que o próprio criador. As canções oitentistas escolhidas dão tom ao filme, tendo Heroes, de David Bowie como a trilha principal do longa.
Assisti As Vantagens de ser Invisível em pelo menos 3 momentos diferentes da minha vida. É interessante notar como o filme muda com cada perspectiva que você o vê. Hoje percebo que os medos e incertezas que tinha na época da escola eram bem menores do que pareciam ser, e tudo bem, cada fase é uma fase.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
Com uma bonita história de amor e amizade, lá estão os três, e embora Charlie, Sam e Patrick jamais possam ser infinitos, poderão sim ser heróis, nem que seja apenas por um dia.
Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa
3.4 1,4KEm 2016 a DC Comics lançou um dos filmes mais esperados do ano, Esquadrão Suicida. É impossível não lembrar do fracasso que foi o filme. O que a mesma empresa faz em 2020? Um filme na mesma fórmula, com uma das personagens principais, a Arlequina. Mas aqui deu muito certo.
Depois de um namoro que não acabou bem com o Coringa, Arlequina (Margot Robbie) se encontra em problemas por ter criado diversos inimigos enquanto namorava o palhaço mais famoso de Gotham. Dentre eles o terrível Roman Sionis (Ewan McGregor) que caça a jovem Cass por estar com algo que ele deseja muito.
O filme que iniciou como um desdobramento da mente desordenada da Arlequina não ficou só aí, embora sua fantabulosa emancipação dê tom ao filme, a construção das outras personagens foi feita de maneira bastante satisfatória. As personagens Caçadora (Mary Elizabetg Winstead), Canário Negro (Jurnee Smollet-Bell) e Reneé Montoya (Rosie Perez) foram bem introduzidas, houve um cuidado interessante para contar a história de cada uma.
O que a princípio é até uma disputa entre as mulheres, com o passar dos minutos percebem que existe um inimigo em comum entre elas, e que aquilo é muito mais importante no momento, cria-se uma sororidade de forma bastante natural ali.
As cenas de ação são muito bem executadas. Tudo é muito colorido, bonito, é uma Gotham diferente, uma Gotham aos olhas da Harley Quinn, que é quem narra tudo aqui. A comparação com Deadpool é inevitável, mas Aves de Rapina passa longe de ser uma cópia.
O que vinha se solidificando nos últimos dois anos parece cada vez mais real, a DC conseguiu se consolidar e apresenta agora filmes com propostas diferentes. Desde Mulher-Maravilha, Shazam!, Aquaman, e agora Aves de Rapina. Que bom e que continue assim.
Jojo Rabbit
4.2 1,6K Assista AgoraUsando do poder da sátira, Jojo Rabbit conta a Segunda Guerra Mundial aos olhos infantis.
Jojo (Roman Griffin Davis) é uma criança alemã entusiasta do nazismo, tem como amigo-imaginário Adolf Hitler (Taika Waititi) e descobre que sua mãe (Scarlett Johansson) está escondendo uma jovem judia (Thomasin McKenzie) no sótão.
A sátira talvez seja a técnica literária mais forte e, se bem trabalhada, pode atingir o público de maneira mais efetiva que qualquer outra estratégia. Jojo Rabbit é uma sátira bem trabalhada. Com o senso de humor e a sensibilidade característica de Taika Waititi, o filme que brinca com a alienação do povo alemão à época, também mostra que os perigos são reais ainda hoje. É impossível deixar de comparar com o genial “O Grande Ditador” (1940), de Charles Chaplin.
Waititi cria um protagonista interessante, Jojo flutua entre a inocência infantil e a idealização de ideologias repugnantes, é marcado pela desumanização do inimigo, que mostra como crianças (e até mesmo adultos) eram influenciados, Jojo em certos momentos começa imaginar como seriam os judeus, ajudado pelo seu amigo imaginário Hitler. Scarlett Johansson está inspirada e têm atuação acima da média, tentando desviar seu filho dos princípios nazistas.
Com uma plástica parecida com a de Wes Anderson, esteticamente Jojo Rabbit é ótimo, com destaque para a direção de arte, que consegue suavizar tudo em um cenário de guerra, construindo um filme leve.
E é essa transição o ponto forte do filme, tal qual o seu personagem principal, o longa consegue transitar entre a comédia e o drama com facilidade, é um filme bastante dinâmico e virtuoso nesse sentido.
Em um mundo ocidental cada vez mais estranho politicamente, é sempre importante usar da arte para relembrar um passado não tão distante e como o totalitarismo jamais será resposta. Por mais sátiras como Jojo Rabbit.
Relatos Selvagens
4.4 2,9K Assista AgoraEm meio a histórias independentes e absurdas, Relatos Selvagens fala sobre a condição humana e vingança de forma diferente e genial.
Os primeiros minutos de Relatos Selvagens já nos mostra que não estamos diante de um filme comum, um avião que tem nele pessoas que carregam uma coincidência não muito agradável, é só o começo do longa argentino que é dividido em 6 histórias diferentes, que não se ligam em momento algum, mas que possuem a selvageria e uma pergunta em todas elas: qual é o limite do ser humano?
Relatos Selvagens conta com Ricardo Darin em seu elenco, que em uma das melhores histórias tem atuação excepcional em “Bombita”. “La Propuesta”, “El Más Fuerte”, “Las Ratas”, “Pasternak” e, a minha favorita “Hasta que la Muerte nos Separe”são as outras 5 histórias.
O roteiro escrito por Szifron é nada menos que espetacular. Com personagens complexos, diálogos acima da média, o diretor e roteirista argentino constrói histórias coesas, que não se distanciam em momento algum, um hiper-realismo feito de forma impecável. A irregularidade é marca comum em filmes com várias histórias independentes, é difícil construir um universo coerente, objetivo e com um nível de qualidade parecido entre todas as histórias, e Relatos Selvagens consegue. Não há aqui nenhuma história esquecível, todas são importantes, cada uma a seu modo.
Com um humor diferenciado e com momentos que beiram a escatologia, Damián Szifron faz um filme incrivelmente humano, mostra o que pode estar adormecido dentro de cada um, não é fácil tratar da linha tênue entre a civilização e a barbárie como foi tratado aqui.
Sem dúvidas um dos melhores filmes da última década. Relatos Selvagens é uma deliciosa jornada de autodestruição, como situações cotidianas podem desencadear um verdadeiro caos. É como bem diz o seu trailer: “Descubra seu lado selvagem”
Mais em: https://www.instagram.com/conversandocinema/
Joias Brutas
3.7 1,1K Assista AgoraFrenético. Se me pedissem para que descrevesse Joias Brutas em uma palavra, não tenho dúvidas que essa seria essa. Em um ritmo alucinante, os irmãos Safdie entregam 120 minutos de reviravoltas, mentiras, tensão, enfim, um misto de sensações que deixa incomodada até a pessoa menos ansiosa do mundo.
Howard Ratner (Adam Sandler) é um vendedor de peças de valor para pessoas famosas e donos de grandes lojas de Nova York. Viciado em apostas e agora atolado em dívidas, ele encontra uma grande oportunidade para quitá-las antes que seja tarde demais.
E é o protagonista Adam Sandler quem rouba a cena, em Joias Brutas ele encontra seu papel perfeito, criando um personagem que mente compulsivamente, se coloca e coloca até mesmo sua família em riscos, mas que a gente torce para que consiga se dar bem no final. Sandler já se provou um grande ator diversas vezes, e aqui tem talvez sua melhor atuação de todas, quem sabe as desconfianças em torno dele acabem agora.
As participações especiais de Kevin Garnett e The Weeknd também chamaram a atenção, o primeiro, com mais minutos em tela, é bastante importante para a trama e vai muito bem. A paixão de Ratner pelo basquete passa por ele aqui.
Tudo no filme é feito para causar agonia, desde os cenários, que vão de boates lotadas, centro da cidade, helicópteros e muito mais, o filme constrói um ritmo frenético e não abandona essa premissa por um minuto sequer. O estilo da filmagem e trilha sonora contribuem para isso. A aflição aqui é constante.
Em época de premiações é comum entendermos alguns filmes como injustiçados, muitas vezes é apenas a vontade de legitimar a sua opinião por meio de outras pessoas, que quando frustrada nos causa essa revolta, se for isso, que seja, o grande injustiçado da temporada na minha opinião tem nome: Joias Brutas (Adam Sandler, também).
Ad Astra: Rumo às Estrelas
3.3 850 Assista AgoraEm drama contemplativo utilizando do espaço como lugar de ser, Brad Pitt brilha em atuação forte e melancólica.
A ficção científica é o gênero cinematográfico que sobrevive de especulação, como será o futuro? Quais serão as grandes descobertas, evoluções? Qual será o preço de tudo isso? Viagens ao espaço são as mais escolhidas para tentar responder essas perguntas, desde “Viagem a Lua (1902)” de George Melies, a sétima arte apresenta respostas de como será o futuro na Terra e fora daqui.
Em Ad Astra temos um filme contemplativo, o que parecer ser uma aventura espacial é na verdade um drama pessoal, onde muitos dilemas são sentidos por Roy McBride (Brad Pitt), um astronauta exemplar que é mandado ao espaço em busca do desaparecido pai Clifford McBride (Tommy Lee Jones), também astronauta, que pode representar uma ameaça para a Terra.
E é nessa relação pai e filho que Ad Astra se solidifica, as ameaças à Terra pouco importam, no fim tudo está nas relações familiares, ou na falta delas. O espaço é só o pano de fundo para entender essa história.
Os conceitos futuristas são bem explorados no filme, embora tenham ficado aqui em segundo plano. A premissa individualista não permitiria algo muito espetacular, é um filme pessoal, mas temos nesse futuro teremos voos comerciais para a lua, não deixando de lado o gênero que parte.
A atuação de Brad Pitt ganha o filme, saindo da zona de conforto de seus conhecidos personagens carismáticos, aqui interpreta um personagem melancólico, com olheiras a vista, mostrando como é um ator, sim, versátil.
Esteticamente é um filme lindo, as cenas tanto em Terra quanto no espaço são bem produzidas. O filme falha no ritmo que impõe. Embora a história relate uma certa urgência para que tudo seja resolvido, as cenas são muito lentas, não combina com a necessidade que tanto ressaltam durante os 120 minutos.
Mesmo com muitas metáforas, Ad Astra é mais simples do que poderíamos imaginar.
Mais em: https://www.instagram.com/conversandocinema/
Ameaça Profunda
3.0 629 Assista AgoraEm ficção científica inspirada em clássicos do passado, William Eubank falha ao fazer um filme gameficado que se leva mais a sério do que deveria.
Em Junho de 1979 chegava aos cinemas o clássico “Alien – O Oitavo Passageiro”, filme de Ridley Scott. Alien conta a história de uma nave espacial rebocadora que está voltando à Terra e os tripulantes descobrem uma criatura alienígena extremamente violenta a bordo. De lá pra cá muitos filmes bebem (ou pelo menos tentam beber) da fórmula Alien. É o caso de Ameaça Profunda, que ficou apenas na tentativa.
Aqui não é o espaço onde vão tentar sobreviver a todo custo, o mar é o ambiente da vez. Os minutos iniciais de Underwater são promissores, com a personagem Nora (Kristen Stewart) vamos conhecendo a estação subaquática que ela e a equipe científica estão trabalhando. Estava indo bem, mas partir do acidente que os problemas no filme começam a acontecer.
A tentativa de imersão do filme falha miseravelmente, as cenas são escuras, sendo difícil em alguns momentos até enxergar o que está acontecendo, a construção dos personagens também falha, não conseguem construir uma empatia entre o filme e quem está assistindo, é difícil sentir algo pelos personagens, não causa apreensão, medo.
A premissa inicial de gameficação é interessante, em alguns momentos parece que estamos vendo uma partida de algum jogo de videogame, mas isso esbarra na já comentada falta de imersão. Embora o fundo do oceano seja imenso, aqui se tenta criar momentos claustrofóbicos, mas novamente falha.
O maior defeito de Underwater, entretanto, é se levar mais a sério do que realmente é. O que poderia ser um terror psicológico interessante vira uma grande bobagem exagerada com monstros pouco interessantes e jumpscares excessivos.
No fim, parece que estamos revendo algo que já vimos antes, mas com bem menos qualidade em todos os aspectos.
Mar Adentro
4.2 607O mar como protagonista em um drama de obrigações, direitos e sentimentos.
A morte sempre foi personagem importante do cinema, não poderia ser diferente, já que é a única certeza que temos em vida. Enquanto temos na sétima arte – e na vida – exemplos de pessoas que superaram todos obstáculos imagináveis para se manter vivos, em Mar Adentro conhecemos a história de Ramón Sampedro (Javier Bardem) um marinheiro espanhol que ficou tetraplégico aos 26 anos, e desde o trágico momento tem como vontade maior a de morrer, recorrendo até mesmo à Justiça para realizar seu desejo.
Enquanto em Os Outros (2001), do mesmo diretor Alejandro Amenábar, a personagem de Nicole Kidman não suportava a ideia da morte, aqui temos o oposto, alguém que não tem mais prazer na vida.
Apesar do fundo do filme tratar sobre a eutanásia, Mar Adentro não procura em momento nenhum trazer um debate aprofundado sobre o tema, Ramón em certo momento do filme diz que não está falando sobre os outros, está falando apenas de si. E o filme segue esse ritmo, tendo no máximo a cena de Ramon discutindo com o padre, que, também é tetraplégico, mas possui imensa vontade de seguir vivo, mas a discussão ficou extremamente rasa, apenas de acusações de ambos os lados, não havendo um debate de maior seriedade, Amenábar aqui se entregou ao sentimentalismo.
O relacionamento de Ramon com sua advogada Julia e com sua nova amiga Rosa nos faz refletir: até que ponto somos empáticos de verdade, ou na verdade somente projetamos aquilo? Sendo nosso o sentimento, até que ponto, em momento de dificuldade alheia, realmente estamos nos colocando no lugar do outro, sentindo o que o aflito está sentindo?
A cena de Javier Bardem voando é maravilhosa, a fotografia do filme em si é muito bela, sempre relembrando o mar, mar que trouxe para Ramón Sampedro sua vida, uma vida de muitas aventuras, já que ganhava ela como marinheiro, mas, mar este que também tirou a sua vida. Daquelas grandes ironias da vida.
O roteiro é muito bem-feito, a relação da família com toda a situação em volta de Ramón, com advogados indo à Justiça pelo direito de morrer com dignidade trazem momentos interessantes ao filme, importante perceber como cada um da família enxerga a situação de maneira diferente. Enquanto o irmão não aceita em hipótese alguma a ideia da eutanásia, sua cunhada pensa se tratar decisão unicamente de Ramón, já o pai, pouco diz sobre isso tudo, mas, em um dos momentos mais sentimentais do filme resume seu sentimento em: “pior do que um filho morrer, é ele querer morrer”.
A trilha sonora de Mar Adentro é bastante dramática, tal qual o filme, em alguns momentos até exagera em cenas que não se faziam tão necessárias. Javier Bardem está espetacular, uma das atuações mais fortes de sua carreira, chegando a ser, em certo ponto, irreconhecível nos minutos iniciais do filme.
A vida humana, para Heidegger, só se torna um todo depois da morte. Heidegger entende que a morte é a única maneira de atingir a individuação, sendo assim, encontrar a totalidade de sua vida. Também é disso que Ramon, em Mar Adentro, fala, um personagem que entende não ter mais nada a viver, que apesar de todo seu talento para a literatura, aquilo não bastava. De forma diferente do personagem de Daniel Day-Lewis em Meu Pé Esquerdo (1989), seu talento não bastava para se sentir vivo.
A vida, apesar de um direito, não pode ser uma obrigação, porém, é inegável que falando de eutanásia, nenhuma posição é facilmente defendível, qualquer que seja a decisão gerará na angústia de alguém, alguém sairá ferido qualquer que seja a decisão. E, em um tema tão pertinente à sociedade, ainda temos dificuldade de discutir por sua profundidade, profundidade tal qual encarar Mar Adentro.
Ford vs Ferrari
3.9 713 Assista AgoraEm drama eletrizante sobre os bastidores do automobilismo, com Christian Bale e Matt Damon em atuações inspiradas, uma conhecida rivalidade é tema.
Em uma década onde via a rival italiana Ferrari ganhando tudo no esporte, a americana Ford resolve entrar no mundo das corridas, e têm no ex-piloto Carroll Shelby (Matt Damon) a confiança para fazer a equipe chegar ao topo, Shelby conta com Ken Miles (Christian Bale) para atingir esse objetivo, o controverso piloto e engenheiro não é visto com bons olhos pela empresa, que não pensa só no lado esportivo, como também em negócios.
Elogiar Christian Bale é chover no molhado, em Ford vs. Ferrari interpreta um personagem bastante caricato, sendo mais uma boa atuação na sua consolidada carreira.
O filme não esconde a preferência pela Ford, em alguns momentos temos até a impressão que é uma disputa de mocinhos e vilões, e, embora muito provavelmente não seja isso um fato, Ford v. Ferrari conta uma história real sobre essa rivalidade, o famoso grande prêmio “24 horas de Le Mans de 1966”.
E não só a rivalidade é tratada no filme, o duelo entre a criatividade e o corporativismo é talvez o principal ponto do filme. Sendo raros os filmes sérios sobre automobilismo (como o ótimo Rush – No Limite da Emoção (2013)), é interessante conhecer os bastidores do esporte, o trabalho de toda a equipe para que tudo funcione bem. E não só isso, a disputa de egos é bem mostrada, apesar de pouco aprofundamento, até por não ser o foco do filme.
A fotografia do filme é também motivo para elogios, as longas cenas das corridas são incríveis, com todas as perspectivas possíveis, tanto dos pilotos quanto de quem assiste, um trabalho impecável da edição que aposta na imersão do espectador.
Dentro do universo onde ser o mais rápido é basicamente o que importa, Ford vs. Ferrari mostra que muitas vezes na vida é importante desacelerar.
Jumanji: Próxima Fase
3.3 442 Assista AgoraJake Kasdan repete fórmula que deu certo no filme anterior e cria um entretenimento honesto.
A velha máxima do futebol de que “time que está ganhando não se mexe” talvez seja a melhor forma para definir Jumanji: Próxima Fase. O subtítulo define bem o que é o filme, uma segunda fase.
O recheado elenco já conhecido de Jumanji: Bem-Vindo a Selva agora conta também com os aqui divertidos Danny deVito e Danny Glover, os velhinhos que se odeiam trazem algo a mais ao filme, os momentos com os dois são hilários. A talentosa sul-coreana Awkwafina também é uma grata surpresa, em ano que ela emociona no belíssimo “A Despedida”, tem em Jumanji mais uma atuação de alto nível em sua carreira.
Uma das grandes sacadas do filme é fato dos personagens mudarem aqui. Por um “bug” do jogo os jovens (e velhos) não conseguiram escolher seus personagens e agora precisam se adaptar aos novos pontos fortes e fraquezas de seus personagens. O filme falha na motivação para a nova aventura, não tenho a intenção de contar spoilers por aqui, mas me pareceu pouco verossímil a situação que leva Spencer (Alex Wolff) de volta à Jumanji, beirando a irracionalidade.
Jumanji: The Next Level aposta na comédia e funciona como tal. Tanto é que tem um vilão totalmente esquecível (não tem nem 24 horas que vi o filme e não consigo me lembrar do nome dele sem usar do Google), a aventura aqui ficou em segundo plano. Tal qual o primeiro, a direção de arte funciona muito bem, a cena dos avestruzes correndo é maravilhosa.
Jumanji é sem dúvidas um dos remakes que melhor funcionou entre a infinidade de refilmagens dos últimos anos. Levar os personagens para dentro do jogo (diferente do longa de 1995) garante possibilidades de “novas fases”, e assim se apresena “Next Level”, uma nova visita ao jogo. A impressão que fica é que a continuação ainda está por vir...
Dor e Glória
4.2 619 Assista AgoraQuando menos é mais, a beleza no comum em uma quase autobiografia de Pedro Almodóvar
A vida nem sempre é fácil – diria que a maioria das vezes não é -, nem sempre é bela, e nem sempre se sabe o que quer fazer. Em seu novo filme, Dor e Glória, o espanhol Pedro Almodóvar fala de uma das maiores dificuldades que um ser pode passar. A de se redescobrir. A ressignificação do ser.
Salvador Mallo (em atuação espetacular de Antonio Banderas) é um cineasta em baixa que é obrigado a relembrar e refletir sobre sua vida e suas escolhas, sobre seus primeiros amores, e, sobre sua paixão precoce sobre o cinema. Já mencionada a atuação de Banderas, é impossível não citar o trabalho da incrível Penélope Cruz, de Leonardo Sbaraglia, Asier Etxeandia, dentre outros. Todas atuações são muito boas.
Diferentemente de todas as suas obras, temos aqui um filme mais simples, não espere as conhecidas reviravoltas do diretor, o seu humor um tanto quanto diferente, por assim dizer. Um filme mais humano. Um olhar de Salvador para o passado em busca de algo que dê razão para o futuro, um homem que por nada sente prazeres, mas tem um imenso amor por sua mãe, sendo sem dúvidas as mais belas cenas quando os dois estão juntos, tanto no presente quanto no flashback
É um trabalho sem dúvidas maduro, de alguém que sabe transformar as suas angústias em arte. A silenciosa, mas caótica vida que Salvador leva é justificada no decorrer do longa, uma vida de muitas renúncias e dificuldades – como a vida é.
As duas linhas temporais (passado e presente de Salvador) são muito bem trabalhadas por Almodóvar, são cenas que convergem muito bem, de uma sutileza incrível. A fotografia é bonita, o vermelho é bastante presente em todo filme, que traz consigo um significado.
O talvez mais pessoal filme de Pedro Almodóvar é quase uma biografia, o quanto dali é real e o quanto é fictício? Não sei, e pouco importa. O que é possível saber é que o espanhol segue um diretor encantador, nesta honesta homenagem à sétima arte, de quem sempre por ela foi apaixonado, e mostra, em Dor e Glória, que menos pode ser mais.
Frozen II
3.6 785Mais maduro e visualmente melhor que seu antecessor, Frozen II se solidifica como filme próprio e não apenas como uma mera continuação.
Encerrando a década em que a Disney apostou em continuações e remakes (muitas vezes desnecessários), temos mais uma continuação, Elsa e Anna estão de volta em um filme amadurecido e com temas mais fortes que o primeiro, embora sem uma canção marcante como “Let it Go” e “Do You Want to Build a Snowman?”, as músicas são boas. Into the Unknow e Show Yourself embalam o filme, que é recheado de outras canções. O filme é um acerto e funciona bem como musical.
Elsa está bastante empoderada nessa continuação, em busca de respostas que expliquem problemas do passado e também a sua magia, é possível entender o filme como de origem, não só da Elsa, mas de tudo que envolve o Reino gelado de Arendelle.
O maior acerto de Frozen II é construir sua própria identidade, é um filme que funciona por si só, embora siga com algumas fórmulas que deram certo no primeiro, como continuar sendo uma história de amor entre duas irmãs e ter no Olaf o alívio cômico do filme, em Frozen II o adorado boneco de neve está vivendo uma crise existencial divertidíssima. Visualmente é um dos melhores filmes da Disney, a experiência em 3D dele é incrível.
Como de costume nas obras Diney, assuntos do momento foram tratados, e parece que a causa ambiental é o grande foco da indústria agora (como já visto em Moana) e com razão. O filme fala sobre preservação da natureza, sobre respeito aos povos nativos, faz um importante papel de conscientização do público-alvo da obra, que é infantil.
Enquanto em Frozen conhecemos uma Elsa que tinha medo de ser quem era e de seus poderes, Frozen II trabalha a sua evolução e termina com ela realizada e descobrindo o seu lugar, bonito de se ver. Esperemos que agora a rainha tenha paz
Entre Facas e Segredos
4.0 1,5K Assista AgoraCom elenco de peso e um mistério envolvente, Rian Johnson entrega pouco mais de duas horas de um suspense bem-humorado que corrompe a expectativa do espectador.
Homenageando a “Dama do Crime” Agatha Christie, Entre Facas e Segredos fala sobre um possível assassinato. Logo após comemorar o aniversário de 85 anos, o escritor Harlan Thrombey (Christopher Plummer) é encontrado morto dentro de sua casa. Enquanto os policiais imaginam se tratar de um suicídio, o detetive Benoit Blanc (Daniel Craig) suspeita que seja na realidade um homicídio, e descobre que muita gente tinha motivo para querer ver o simpático senhor Thrombey morto.
O elenco está afiado e tem com ótimos nomes, além dos já citados, conta também com Jamie Lee Curtis, Toni Collete, Chris Evans, Ana de Armas, e outros, que assumiram com maestria cada papel. A dinâmica e entrosamento entre os personagens foi fundamental para o bom funcionamento de Knives Out.
A forma como o filme é conduzida é bastante interessante, embora ser um filme de mistério, não somos levados pela visão do detetive, muitas vezes estamos até a frente dele na resolução do caso, é verdadeiramente um forma de corromper as expectativas de quem assiste, o que é bastante incomum em filmes de detetive. Aqui, o ponto de ligação entre o crime e o espectador é a empregada Marta Cabrera, que por motivos físicos não pode mentir. Entre Facas e Segredos logo mostra que não procura desvendar nenhum crime, mas sim entendê-lo.
O filme peca por alguns deslizes do roteiro, alguns exageros, em alguns momentos soa um pouco repetitivo, mas nada que comprometa a experiência no final. A trilha sonora está muito boa, tal qual a fotografia.
Reinventando um gênero clássico do cinema, Rian Johnson, ainda que não inspirado diretamente e nenhuma obra de Agatha Christe, faz o filme que mais se parece com ela.
Era uma Vez em Tóquio
4.4 187 Assista AgoraObra-prima do cinema japonês, Era Uma Vez em Tóquio trata sobre o tempo e a brevidade das relações.
Um casal de idosos deixa a filha mais nova em casa e resolve viajar para Tóquio para visitar seus filhos mais velhos, que não encontram há muito tempo. Entretanto, os filhos estão muito atarefados e não conseguem dar atenção aos pais.
Ambientado em um Japão pós-guerra, Tôkyo Monogatari expõe relações familiares cotidianas a todos tempos e culturas, a dificuldade no relacionamento de pessoas de diferentes gerações, e uma infeliz, mas real situação, o descaso dos filhos para com os pais depois de velhos. O filme também pode ser visto como uma crítica a uma sociedade que vive pelo trabalho e não tem mais tempo para a família. Realidade que passados quase 70 anos não mudou.
O estilo de Ozu é único, uma câmera parada a metros do chão, somente um plano do filme se movimenta, e mesmo assim de maneira lenta. Ozu atrai o espectador com suas estórias, retrata o cotidiano com seu olhar alheio a tudo aquilo, alheio porque não há sentimentalismo em sua obra, embora ser uma história triste, o diretor se coloca em uma posição neutra, não retrata os filhos como sendo vilões, são pessoas ocupadas, como tantas outras, que muitas vezes nem tem tempo para refletir quão efêmera é a vida.
Embora sem a atenção dos filhos, o casal é muito bem recebido por sua nora Noriko (Setsuko Hara). Ex-esposa do falecido filho, ela faz de tudo para sempre dar atenção aos sogros, sendo reconhecido o esforço pelo “pai”.
Era Uma Vez em Tóquio está muito perto de nós. É quase um espelho, é difícil não se ver na obra em vários momentos, seus valores, os dilemas vividos, tudo está próximo. Diferentemente do que faz Ozu, o telespectador não consegue ficar alheio.
O cinema pode (e deve) fazer o papel de instrumento de mudança social. Que amemos mais aqueles que nos amam e fazem de tudo pela nossa felicidade.
Conta Comigo
4.3 1,9K Assista AgoraA harmônica obra de Rob Reiner é uma verdadeira odisseia. Uma jornada de autoconhecimento em uma das maiores histórias sobre amizade já produzidas pelo cinema.
Quatro amigos (Gordie, Teddy, Vern e Chris) descobrem que um adolescente que desapareceu semanas atrás foi atropelado por um trem, estando ainda desaparecido. Os garotos resolvem ir atrás do corpo com a intenção de serem os mais novos heróis da cidade. Mas conseguiram muito mais que isso.
Embora com a intenção aventureira comum da infância, os garotos logo são confrontados com suas próprias realidades, seja no preconceito sofrido por ser quem é, seja pelo desequilíbrio na figura paterna, ou, no caso do protagonista, por ter se tornado invisível em sua própria casa. Gordie Lachance perdeu o irmão mais velho em um trágico acidente de carro e desde então seus pais não se recuperaram.
E nada melhor para o desenvolvimento humano do que o confronto com o fim, quando vão se dando conta do que realmente estão fazendo, os jovens percebem que não é nenhum motivo de festa.
O tom melancólico do filme é ainda maior pela tragédia com o jovem ator River Phoenix (Chris Chambers), que faleceu poucos anos depois, sendo na época um dos atores mais promissores de Hollywood. Phoenix tem bela atuação, mesmo não sendo o protagonista, criou o personagem mais cativante, que embora com uma aparente casca dura, com o passar do tempo mostra o que sente em relação à sua família e sociedade, e tem em Gordie a confiança para se mostrar, também, sensível.
Com uma trilha sonora e cenários maravilhosos, Rob Reiner tem em Conta Comigo sua maior obra. Poucos filmes conseguem demonstrar com tanta verdade o que é passar pela infância e adolescência como Conta Comigo conseguiu, e hoje, já tendo passado por essa fase posso dizer que eu também nunca tive amigos como os que eu tive quando tinha 12 anos.
Dois Papas
4.1 962 Assista AgoraUma abordagem romantizada do encontro entre os dois últimos e diferentes Papas.
Muito embora o novo filme da Netflix falar sobre a figura mais alta da Igreja Católica, Dois Papas não faz o papel de filme religioso. O que encontramos nas 2 horas de filme são pessoas, uma humanização de seres que quase sempre estão apenas no nosso imaginário, muito pelo sigilo que rondam uma das instituições mais antigas do mundo.
O filme parte de um ponto conhecido: a morte do Papa João Paulo II e o conclave que decidiria quem seria o próximo Papa. E então surgem as figuras Ratzinger (Bento XVI) e Mario Bergoglio (Francisco)
As diferentes visões de mundo dão tom ao filme. Bento, em atuação divertida (e imagino que mais simpática que o real) de Anthony Hopkins, é bastante conservador e pouco aberto a mudanças, diferentemente de Francisco (Jonathan Pryce), um cardeal com uma cosmovisão mais progressista e apaixonado por futebol. Os dois atores são o sustentáculo do filme.
O roteiro é bastante simples, os cenários são bonitos (com destaque para a réplica da Capela Sistina construída para a filmagem) mas não o suficiente para manter o ritmo dos minutos iniciais do filme. As escolhas estéticas por parte do Meirelles também não são muito agradáveis, chegando a ser uma verdadeira bagunça em alguns momentos – excesso de flashbacks, mudanças bruscas no foco – que destoa da maior qualidade do filme, os diálogos.
Dois Papas não se esquivou e teve a coragem de tratar dos assuntos mais polêmicos da Igreja, mas também soube descontrair e ser bem-humorado. A contradição dos Papas é tratada de maneira bem honesta. Apesar de alguns momentos o filme demonstrar simpatia maior por Bergoglio, o carisma de Hopkins impede o filme de pender para um lado.
E, em meio a esse “embate”, ambos percebem como existe um pouco de cada um no outro, como não são tão opostos assim.