O cinema que nos leva a lugares distantes e realidades alheias, também promove viagens interiores gratificantes. Adeus, Primeiro Amor, escrito de dirigido com sensibilidade por Mia Hansen-Løve (O Pai de Meus Filhos), estabelece com êxito um diálogo íntimo com o espectador ao narrar a história de Camille (a promissora atriz Lola Créton), jovem parisiense vivendo seu primeiro e, por isso mesmo, arrebatador amor. Um dos pontos fortes do filme Mia Hansen-Love é contar essa história de forma realista, autêntica, escapando inteligentemente dos clichês (o que, convenhamos, não é fácil num filme centrado no amor romântico). A trama também é habilmente pontuada de elementos sutis e imagens capazes de buscar na memória sentimental de cada espectador um ponto de identificação, consciente ou inconsciente, com o que se vê na tela. Em tempos de politicamente correto, em que seria mais “adequado” mostrar a protagonista se afirmando como mulher independente, Mia Hansen-Løve tem a coragem de apresentar uma mulher que evolui, sim, mas que parece sempre sujeita aos caprichos do amor. A sua identidade é sempre consequência da sua submissão aos sentimentos. E, afinal, não é assim com muitas mulheres? A formação em arquitetura, a obra de que se encarrega e o casamento que está em marcha, nenhum desses elementos, que poderiam servir para promover uma espécie de reviravolta feminista na trama, são usados pela autora com esse propósito. Camille evolui, amadurece, mas continua a ser uma mulher que acredita no amor, que se entrega a ele, sem defesas. Como ponto negativo, o longa comete o excesso de se enveredar em demasia pelo discurso da beleza arquitetônica e seus simbolismos estéticos, o que não tem analogia aparente com a personalidade da protagonista ou progresso narrativo que ela enfrenta. Uma extensão da construção visual do filme que soa supérfluo e o estende demais. O deslize narrativo, no entanto, não tira de Adeus, Primeiro Amor o mérito de ser um filme sobre o amor na juventude de rara inteligência. ---------------------------------------------------------------- Para quem ainda não assistiu: Cine Rialto, Área Drama, Índice página 3.
Está aí uma coisa que gostaria de viver, não assim indo e voltando sem nunca seguir avante, mas pergunto: O que faríamos se pudéssemos voltar no tempo e reparar os erros cometidos no passado? O que aconteceria se pudéssemos ter seguido caminhos diferentes? Em Antes que Termine o Dia, segundas chances existem e todas essas perguntas são facilmente respondidas quando é o amor que está em jogo. Por ter uma abordagem completamente diferente dos demais, ele se destaca entre os romances e no mínimo, satisfaz os fãs do gênero.
Não são muitos os filmes que me impressionam. Muito se fala em cinema autoral e pessoal, mas poucos são aqueles cineastas que conseguem gerar uma obra de marca tão indelével e particular quanto o diretor Philippe Garrel logrou em “Já não ouço a guitarra” (1991). Trata-se de uma produção ficcional, mas o próprio Garrel revela que o roteiro é bastante inspirado em fatos de sua vida amorosa com a cantora e modelo alemã Nico, que além de uma expressiva discografia solo também teve participação antológica no fundamental primeiro disco do Velvet Underground. Nesse sentido, é fascinante como um aspecto intimista da vida de Garrel, e que ele aborda de forma bastante visceral, ganha uma dimensão universal no sentido que seu drama amoroso ganha ressonância no imaginário coletivo (afinal, Nico representa um capítulo relevante na história cultural dos últimos 50 anos). Nesse sentido, a habitual estética de Garrel, aqui num de seus momentos de apuro mais elevado, é o veículo mais que ideal para abarcar o seu relato emocional e amargo de um relacionamento que se desintegra. Como entre outras obras do cineasta, sua narrativa não é detalhista . A trama se divide em momentos cujo espaçamento de tempo é aleatório – tanto podem se passar algumas horas entre eles quanto semanas, meses, anos... Em cada um desses trechos, o enfoque é no estado anímico dos personagens e não no contexto histórico deles. Essa sensação de elipses temporais é desconcertante, mas também é muito verdadeiro em termos de construção das situações e personagens. Nessa formatação, não interessa se falar em final feliz ou não para os indivíduos. O que o espectador vê é apenas uma fração das suas vidas, sendo que a conclusão em aberto de “Já não ouça a guitarra” ganha uma conotação de brutal coerência formal e temática.
Logo nas primeiras imagens achei que não valeria perder meu tempo, mas geimei em continuar e não me arrependo. Desde o início, o filme guarda uma estranheza bastante agradável. Aliás, essa sensação agradável de prazer estético, de sentir que estamos vendo algo especial, acontece sempre quando vemos um filme de um diretor de primeira grandeza como Rivette. E no caso de A HISTÓRIA DE MARIE E JULIEN, mesmo quando o filme vai descortinando sua verdadeira face, o encanto e o mistério continua. Engraçado que eu tinha a impressão que o filme seria mais erótico, mas o aspecto carnal do filme é quase nulo, estando mais para o espiritual. Basta notar que na cena em que Marie e Julien estão na cama, um de seus maiores prazeres é ficarem contando fantasias, criando com a ajuda do outro fantasias eróticas, como se mentalização desses pensamentos fosse mais importante que o próprio ato sexual, que é pouco mostrado, omitido pelas elipses à Bresson. Valeu assistir e sei que você também gostará!
Taí um filme que conseguiu mexer com minhas poucas verdades enquanto não surgiu o The End imponente na tela, um filme com uma mensagem muito forte com respeito ao dogmatismo religioso que, mesmo que trate a questão colocando a Igreja Católica ou o Vaticano, sua moral na verdade envolve o dogmatismo que está presente em todas as religiões. Um filme muito interessante que todos deveriam assistir e refletir sobre sua mensagem. Mas porque digo (acima) ter mexido com minhas verdades? Hei de afirmar, também, crer que a discussão que se propões liga-se sobre a preservação da "Verdade" ou "Daquilo que se diz ser a Verdade" porém vislumbro ser esta uma situação que muitas Igrejas tem que lidar em suas lideranças e em vários momentos e, creio ainda, no existir de um conflito entre o que é a verdade e entre o que se diz ser a verdade. Quando estas questões se confrontam o que prevalece? Será que uma religião estaria disposta a abrir mão de seus dogmas ou preceitos caso descubra a luz de evidências que estes estão ou estiveram equivocados por anos ? Ou se o faz, este é feito de forma transparente ou nos bastidores de tal forma que seus membros nem percebem ? Será que nós buscamos realmente a verdade ou buscamos um tipo de verdade que se acomode com nossas convicções ou com aquilo que queremos ter como verdade ? Então não queremos a verdade tal como ela realmente é, e sim uma verdade industrializada e customizada ao gosto do freguês. E, aqui talvez, o ponto crucial de toda essa questão que se desdobra em novos e constantes questionamentos: Será que esta postura é convicção ou apenas um medo interior de descobrir a verdade e de não saber lidar com ela? O que aqueles que estão na dianteira da obra realmente temem, defendem ou acreditam? Será que para eles a verdade é mais importante do que a nossa verdade? Se eles descobrissem o corpo de Cristo e que este não foi ressuscitado o que fariam? Será que sua atitude seria muito diferente da do Vaticano conforme apresentado no filme? E, por fim, a certeza plena de que o crer não se apequena pelo descobrir e sim pelo crer. Mas somente aqueles que assistiram esse filme que intriga hão de poder (e querer) responder todos esses questionamentos...
Não, não posso deixar de falar sobre esse filme e nem sobre um pouco da obra fenomenal que originou esse, que é, verdadeiro guia para o reconhecimento de "mim" enquanto personagem vinculado aos mundos material e espiritual. Com Siddartha podemos perceber os mesmos questionamentos que a obra matriz, lá está a procura de um personagem pelo auto-conhecimento e essência das coisas do mundo. É bom deixar claro não se tratar de uma biografia do fundador do budismo Siddartha Gautama, o "Siddartha" aqui é um personagem fictício criado por Hesse para divulgar suas ideias de mundo. Tanto que o personagem fica um tempo aprendendo com o fundador do budismo mas percebe que ainda não é o que procura, e não irá seguir outros mestres, Siddartha quer seguir seu próprio caminho espiritual. Dois pontos importantes podem se discutidos a partir da filosofia schopenhaueriana e da tradição budista, a questão da vontade e da liberdade. Arthur Schopenhauer nasce em Danzig, 22 de Fevereiro 1788 e morre em Frankfurt, 21 de Setembro 1860, foi um dos maiores filósofos alemães do século XIX. Seu pensamento é caracterizado por não se encaixar em nenhum dos grandes sistemas de sua época. Sua obra principal é O mundo como vontade e representação (1819). Schopenhauer foi o filósofo que introduziu o Budismo e o pensamento indiano na metafísica alemã. Ficou conhecido pela sua filosofia pessimista e entendia o Budismo como uma confirmação dessa visão. Schopenhauer também combateu fortemente a filosofia hegeliana e influenciou fortemente o pensamento de Friedrich Nietzsche. Para Schopenhauer, a vontade era a grande força que fazia o universo mover. Era a essência das coisas e nossas representações de mundo eram construídas a partir da vontade. No filme Siddartha passa a querer conhecer as paixões e, como exemplar de ser humano, transgride em Kamaswami, e Kamala, nos convidando a acompanhá-lo em sua descoberta o que, para o filósofo alemão, o impulso do desejo não acontece em forma consciente (Schopenhauer foi o primeiro a discutir o inconsciente muito antes de Freud), ao contrário, se desdobra desde o inorgânico até o homem, que deseja sua preservação. A consciência humana seria uma mera superfície, tendendo a encobrir, ao conferir causalidade a seus atos e ao próprio mundo, a irracionalidade inerente à vontade. Sendo deste modo compreendida, ela constitui, igualmente, a causa de todo sofrimento, uma vez que lança os entes em uma cadeia perpétua de aspirações sem fim - este período é representado no filme pelo tempo que Siddartha enriquece e esquece de sua busca espiritual - o que provoca a dor de permanecer algo que jamais consegue completar-se. Segundo tal concepção, o prazer consiste apenas na supressão momentânea da dor; esta é a única e verdadeira realidade. Sua busca só parece terminar quando, já um homem velho, decide tornar-se um simples barqueiro. Mas somente assistindo ao filme não se embebe do fruto, por isso (e para isso) é necessário ler o livro para poder entender e vivenciar a busca de um Siddartha homem humano mostrado no filme! ---------------------- Em tempo: No blog Cine Rialto está o filme e o livro para ler ou baixar.
Bem poderão estranhar (até mesmo me crucificar) aqueles que nomearam esse como favorito, mas antes precisamos falar um pouco sobre uma história que viria a ser o tiro desencadeador desse tudo todo. No início dos anos 60, Ben-Hur salva a MGM da falência e arrecada 11 Oscars. Um recorde só superado por Titanic, décadas depois. Como tudo o que faz sucesso é logo copiado, não tardou para o cinema despejar uma enxurrada de produções épicas ambientadas na Roma Antiga ou em qualquer outro império de destaque na História. Quatro produções realizadas nesta época se destacam: Spartacus (1960), El Cid (1961), Cleópatra (1963) e este A Queda do Império Romano (1964). O primeiro é um clássico indiscutível. Seu realizador, Stanley Kubrick - ninguém menos que ele, criou uma obra prima política e violenta. El Cid, de Anthony Mann, se mostrou uma bela aventura. Já os dois últimos... confirmavam que o gênero sofrera desgastes tamanho o número de filmes sobre o tema. "A Queda" foi uma decepção, principalmente porque contava com a mesma equipe do já citado El Cid, que fizera enorme sucesso. Mas esse fracasso se deve mais pelo desempenho pífio de "Cleópatra" nas bilheterias, um ano antes, do que pelos defeitos do filme em si. O principal defeito desta produção de Samuel Bronson é ser excessivamente verborrágico. Os diálogos beiram o didatismo, como se quisessem ensinar História, e isso impede que os atores transpareçam naturalidade em suas falas. Os 172 minutos (no blog Cine Rialto 179 minutos) poderiam muito bem ser mais enxutos e objetivos. Não são. O filme só ganha força mesmo depois de hora de projeção! Até então só vimos um blá blá blá eloquente que nada acrescenta. Claro, neste primeiro terço são estabelecidas as relações entre seus personagens principais, suas motivações e a tal trégua romana. Porém, tais fatos poderiam ser contados em menos de meia hora. Não costumo reclamar de cenas longas mas, do jeito de ficaram, devem ter sido enfadonhas até para o parco público que as conferiram nos cinemas na época. Mesmo com tantos tropeços, "A Queda" ainda é interessante pra que gosta desse tipo de filme. Particularmente acho Christopher Plummer meio canastrão, mas o exagero até o ajuda na hora de encarnar o lunático Cômodo. E Alec Guinness, como já disse, é sempre excelente. Sempre! Outro ponto positivo é a grandiosidade da produção. Os cenários são lindos, as cenas de multidão impressionam e o figurino revelam um esmiuçado trabalho de pesquisa. Já a fotografia é um espetáculo à parte: a paisagem espanhola (onde o filme foi gravado) é estonteante. Além disso, gosto muito do trabalho de Anthony Mann no comando das câmeras: ele sabe aproveitar muito bem os suntuosos sets construídos com ótimos movimentos de câmera que dinamizam a engessada narrativa. Se tivesse um script melhor e não tivesse sido prejudicado pela sombra desastrosa de Cleópatra, "A Queda" tinha tudo para se tornar um clássico: um bom diretor, elenco de astros (que ainda contava com a presença de Omar Sharif e James Mason) e muito dinheiro. Mas afundou em sua própria ambição e quase não é lembrado hoje. Ainda assim, vale a pena. A última cena, a do caos em roma, é de tirar o fôlego. Assista em meu blog.
Assistindo esse filme me dei a imaginar de como os dias de hoje são tão sombrios e sem vida de amor, a modernidade podou as esperanças e nos fez cair em um mesmismo que solidifica os sentimentos. Não que nos tempos de antigamente tudo fosse flores, passarinhos esvoaçantes, rosas perfumadas eclodindo em campos onde havia paz, não... Esse fiklme é uma linda e envolvente clássica história de amor recontada pelo diretor Andy Tennant que, por ser clássica, não se foge a explorar muitíssimo bem o amor entre um príncipe e uma plebeia sem jamais deixar de lado o drama e o romantismo. Drew Barrymore está linda e perfeita como Danielle e todo o elenco coadjuvante dá show, como Anjelica Huston. Grande reconstituição de época, fotografia e trilha sonora, além de uma boa direção de Tennant. Um grande clássico das comédias românticas dos anos 90 que deve ser visto por todos! Mas ainda acredito no amor hoje!
Que já assistiu, por certo, deve ter aplaudido e quem ainda não teve o prazer de ver esse ótimo filme não sabe o que está perdendo. O Cinema costuma ignorar os idosos. Quando surgem em um filme, são coadjuvantes marcados para a morte ou sábios que distribuem conselhos e verdades do alto de sua experiência. Poucos são os longas que os trazem como centro da narrativa ou que os tratam como criaturas tridimensionais que não deixam de falhar apenas porque viveram mais do que aqueles que se lembrariam de seus erros passados. Infelizmente, se por um lado O Exótico Hotel Marigold merece créditos por enfocar o drama e a comédia da terceira idade, por outro não deixa de desapontar ao apostar num roteiro frágil cujos equívocos muitas vezes acabam sendo disfarçados simplesmente graças à qualidade de seu elenco formidável. Baseado em livro de Deborah Moggach, o roteiro de Ol Parker acompanha sete indivíduos às voltas com a tristeza e o desapontamento de um epílogo distante daquele que haviam sonhado na juventude: Evelyn (Dench) é uma viúva recente que é obrigada a se desfazer de sua casa em função das dívidas deixadas pelo marido; Graham (Wilkinson) é um juiz aposentado que carrega a culpa de uma antiga omissão; Douglas e Jean (Nighy e Wilton) formam um casal falido depois de um empréstimo à filha; Muriel (Smith) é uma racista fragilizada por problemas de saúde; Norman (Pickup) é um homem em busca de uma última paixão; e Madge (Imrie) é uma mulher em busca de um último marido rico. Levados por diferentes circunstâncias, eles se mudam para o hotel do título, que, administrado pelo jovem Sonny (Patel), está longe de cumprir a promessa da brochura que os convenceu acerca da mudança – e nunca é um bom sinal quando o responsável pela hospedagem é obrigado a assegurar os hóspedes de que “a porta chegará logo”. É possível, diga-se de passagem, apontar o instante exato em que o filme despenca: assim que transporta sua ação para a Índia, o cineasta John Madden (Shakespeare Apaixonado) escancara um sentimento de superioridade alarmante em relação à cultura que pretende enfocar – algo que surge disfarçado por uma condescendência ofensiva e por piadas que beiram o insulto. Reparem, por exemplo, a elipse “cômica” que justapõe o comentário de Jean, que diz que aquele país parece “mais civilizado do que imaginava”, e o plano que traz os personagens perdidos em meio ao caos de ruas abarrotadas de pessoas, cores e sons: embora o propósito aparente seja o de fazer uma simples piada através do contraste, é impossível não perceber o julgamento do filme acerca daquela imagem, que trata o “exótico” (leia-se: o diferente) simplesmente como algo inferior. Além disso, não é à toa que praticamente todos os personagens indianos surgem como caricaturas, desde a mãe obcecada com honra e dinheiro até o rapaz cartunesco vivido por Dev Patel – que desde sua estreia em Quem Quer Ser um Milionário? viveu exclusivamente tipos unidimensionais. Ao fim, no entanto, O Exótico Hotel Marigold sucumbe justamente por tentar amarrar de maneira bonitinha demais as suas subtramas e seus conflitos, apostando estupidamente em alterações bruscas de comportamento de certos personagens e em ações implausivelmente nobres por parte de criaturas que até então não haviam demonstrado qualquer possibilidade de redenção pessoal. Para piorar, a insistência em resumir as liçõezinhas de moral da história através da narração de Evelyn é uma decisão simplista, preguiçosa e artificial. Ainda assim, há certa doçura inevitável na visão de homens e mulheres que, por baixo de rugas, cabelos grisalhos e manchas senis permanecem dispostos a encontrar mágica e amor no mundo. Muitos são aqueles que desistem depois de uma (ou mais de uma) desilusão, esquecendo-se de que nossos corpos podem envelhecer, mas ainda assim precisam do toque e do carinho do próximo – e abandonar esta busca é um indesculpável desperdício de oportunidades. “Nunca lamentarei envelhecer”, escreveu alguém. “Conheço pessoas demais que não tiveram este privilégio”. Apesar desse tudo esse é um filme para refletir-se sobre o hoje que nos frutificará no amanhã, para onde iremos e porque fomos e porque deixaremos de ir. Mas, a bem da verdade, assistindo as dores, os risos e as incertezas desse grupo de velhos (sem serem senis) não devemos nos esquecer de que é um privilégio envelhecer...
Não somente aos mais velhos, mas não há como não dizer ser realmente um clássico do to tempo em que se trazia boas histórias e loucuras que envolvia famílias de tudo que era jeito. A família Buscapé, era uma exceção, pois trazia bons personagens, e que conseguia alegrar a todos, novos ou velhos. E mesmo hoje o filme vai cumprindo com o papel de divertir. Se você ainda não assistiu não sabe o que está perdendo e, para suprir essa possível falha, dê uma espiada em meu blog:
Lançado em 1983, DEZ MINUTOS PARA MORRER ("Dez para a meia-noite", no original, mas o título não tem nenhuma relação com a história nem em português e nem em inglês!) é um filme sui generis na "filmografia oitentista" de Bronson - que, naquela época já tinha 61 anos. A bem da verdade simplesmente esse em nada se parece aquele típico filme rasteiro de Charles Bronson com o qual o público acabou se acostumando nos anos 80. Pelo contrário, é uma história policial séria e levada a sério, onde cenas de investigação e sangrentos assassinatos - quase como um slasher movie para adultos - ocupam o espaço geralmente reservado para os tiros, socos e frases de efeito do herói grisalho. O filme valeria apenas pela fantástica meia hora final, que recria o violento caso verídico em que Richard Speck invadiu um dormitório de jovens enfermeiras para estuprar e matar várias delas. Não bastasse isso, temos uma daquelas cenas inesquecíveis de tão bizarras: o vilão perseguindo sua vítima pelas ruas da cidade COMPLETAMENTE PELADO!!! (Aliás, o filme tem tanta nudez masculina e feminina que, segundo o IMDB, foram gravadas cenas alternativas para que ele pudesse ser exibido na televisão sem que fosse preciso cortar mais da metade. Nestas cenas mais brandas, Warren ataca usando cueca, e não completamente nu, como na versão "oficial".) E não há o que estranhar Bronson está bem no filme! Os cinéfilos de botequim que ridicularizam o ator por suas participações pífias de fim de carreira deveriam morder a língua e baixar a cabeça diante de cenas tensas como a do interrogatório de Warren por Kessler. O herói sabe que está com o assassino diante dele, mas ainda precisa jogar "conforme as regras". A cena, entretanto, é levada num crescendo de tensão e ódio entre os antagonistas. Primeiro, Kessler bombardeia Warren com perguntas vexatórias, tentando fazer com que se descontrole; depois, mostra um vibrador em formato de vagina que foi encontrado no banheiro da casa do "suspeito". Por fim, atira as fotos das vítimas mutiladas sobre a mesa e depois força a cabeça de Warren sobre elas, gritando "Olhe para estas malditas fotos!", antes de ser contido pelos parceiros. O filme inclusive pode ser visto como uma espécie de releitura de "Perseguidor Implacável", de Don Siegel, a primeira aventura do policial durão Dirty Harry, em que o herói também persegue um serial killer e precisa jogar sujo para escapar das "amarras burocráticas" que permitem que o vilão mate livremente (como aqui em terras tupiniquis onde basta ser engravatado e ter alguns trocados a mais em conta bancária para que o judiciário lhe abra as portas do xilindró). O filme também é interessante pelas várias caras conhecidas no elenco secundário: além de Andrew Stevens, aparecem Wilford Brimley como superior do herói, Geoffrey Lewis como advogado filho da puta (daqueles que dá vontade de esmurrar) e a gracinha Kelly Preston em papel bem pequeno de vítima, ainda no começo da carreira. Não bastasse tantas qualidades, este policial suspense de primeira ainda tem uma curiosidade quase inacreditável: apesar de ter sido produzido nos exagerados anos 80, Charles Bronson interpreta um policial que dispara "um único tiro" durante o filme inteiro! Algo que é ainda mais inacreditável quando lembramos que, nas suas produções posteriores com a Cannon, ele matou gente com todo tipo de arsenal, de metralhadores de grosso calibre a bazucas! Vale lembrar que em 30 de agosto de 2003, com 81 anos, Charles Buchinsky (verdadeiro nome de Charles Bronson) mudou-se para o andar de cima onde deve estar azucrinando o viver de anjos e querubins desvestidos de santas intensões.
Tudo poderia ser diferente nesse filme de Paulo Thiago, uma ótima idéia, mas dirigida com total irregularidade. Assim é Orquestra dos Meninos. O argumento original é um verdadeiro achado, alinhavando fatos acontecidos nos anos 90, no interior de Pernambuco. Embora na trama, provavelmente para evitar processos e/ ou retaliações, alguns nomes foram trocados e a ação foi transferida para Sergipe. Não importa. Interessa sim acompanhar a história real do maestro Mozart Vieira, um sonhador que contra tudo e contra todos embrenhou-se na difícil tarefa de montar uma orquestra sinfônica de crianças e jovens em pleno interior de Pernambuco (na realidade) ou de Sergipe (na ficção). Um grande feito é a ótima interpretação de Murilo Rosa, que dá força e vigor ao personagem visionário, sonhador e otimista, Mozart que veio cometer um pecado quase mortal para ele e para a sua carreira: meteu-se na política, este câncer incurável que destrói tudo o que toca. Também não posso deixar de elogiar Othon Bastos, em mais um momento careteiro de sua carreira que deu vida ao prefeito e, dentre os já conhecidos, restou Priscila Fantin que é outro erro: sua Creuza é apagada e nem a beleza (seu grande cartão de visita) conseguiu emplacar, a vi como uma patricinha de shopping center brincando se ser pobre. Romance, traição, política, música, sonho, dedicação... Enfim, um argumento repleto de elementos perfeitos para um grande filme que, apesar de todos os elementos necessários a um grande filme não rolou. Orquestra do Meninos aos poucos vai incomodando o espectador com uma lamentável série de defeitos e/ ou imperfeições que ora beiram à ingenuidade, ora resvalam na preguiça. Como é possível, por exemplo, a orquestra inteira se espremer num estúdio, cantando e tocando para um único microfone pendurado no teto, para gravar um CD? Quem consegue levar a sério o personagem do delegado histriônico de óculos escuros que bate seu revólver na mesa da coletiva de imprensa, no melhor estilo Zorra Total? E a oficial de Justiça que, de dedo em riste, grita "Podem fechar a Fundação", como quem comanda um exército de 300 espartanos? Isso sem falar no rápido flerte do maestro com a filha do dono da loja de materiais de construção, uma cena gratuita, dirigida com teatralidade, sem continuidade nem função dramatúrgica dentro do roteiro. Há defeitos menores, como estampar na tela um letreiro com a inscrição "meses depois..." ao invés de solucionar tal passagem de tempo cinematograficamente. Detalhes? Talvez. Mas são muitos. Tantos a ponto de minar insistentemente a credibilidade do filme. Graças à força da história, porém, acompanha-se o longa até o seu final com certo interesse. Já nos créditos finais, surge a boa ideia de inserir cenas reais daqueles que de fato protagonizaram a trama. O filme cresce, mas já é tarde. Talvez um documentário sobre o assunto tivesse melhores resultados.
Existem ocasiões onde assisto um filme e termino com a impressão de já tê-lo assistido. Essa é a impressão após o FIM desse primeiro longa-metragem de Bruno Vianna e, incomodado, busquei achar onde havia assistido. CAFUNÉ trata de jovens de origens sociais distintas que estão iniciando a vida adulta na conturbada cidade do Rio de Janeiro. A história coloca lado a lado jovens que, apesar do abismo social que os separa, têm em comum a falta de perspectiva profissional e pessoal, vítimas de uma comunidade cuja decadência econômica é motor da violência física e moral. A desigualdade social é abordada, mas não é o tema central. O filme traça uma interseção entre as camadas baixa e alta, através da observação do cotidiano dessa juventude no que ela tem de mais banal. CAFUNÉ aponta o declínio da classe média como fator que também gera violência, que a torna vítima e agressora. Mostra seu medo diário da cidade e sua visão da favela, que é um misto de fascínio e mistério, ódio e paternalismo. Sim! O filme que me confundiu foi "Era uma vez..." de Breno Silveira (2008)...
Não, não é de minha época esse e milhares de outros filmes, mas conheço um pouco a história do filme e de seu ator principal e, parodiando Drummond, Vicente Celestino é “uma fotografia na parede, mas como dói”. Sempre que penso nele me deprimo com a expectativa do que deveria ter sido sua rentrée triunfal no showbusiness dos anos 60. Velho e representante de um mundo que àquela altura cada vez mais desaparecia, Celestino foi convidado a participar de um programa de tv com Gilberto Gil e Caetano Veloso. Morreu horas antes. Cantar “Coração Materno” com aquele bando de garotos aloprados. Será que ele compreenderia a cena? Imagino-o assustado, mas continuando desenvolto, com aqueles gestuais anacrônicos. Para mim, surtiria o mesmo efeito assistir a uma peça com Procópio Ferreira dirigido por Gerald Thomas. Um dos elementos mais autênticos em filmes como “O Ébrio” é a ausência total de estabilidade na trama. O que parecia felicidade para Gilberto se consome com as novas marmotas que lhe pregam os parentes (dentre eles o humorista Walter D´Ávila, o Baltazar da Rocha da “Escolinha do Professor Raimundo”, caracterizado de idoso). Perde a mulher, perde os amigos, assume a identidade e as roupas de um mendigo que acabara de ser atropelado. Como diz a canção título, “tornei-me um ébrio, na bebida busco esquecer... aquela ingrata que eu amava e que me abandonou... apedrejado pelas ruas vivo a sofrer... não tenho lar e nem parentes... tudo terminou...”. O filme possui curiosidades a mil, basta ao espectador capturar as pepitas. De toda forma, o fascínio que sinto pelos astros da Rádio Nacional facilita este trabalho arqueológico. Lembro-me de, ainda pequena, passar pela rua Barata Ribeiro em Copacabana e a multidão, parada na rua, olhava pra cima. Os mais novos urravam “pula!, pula!”, os mais velhos cochichavam, no misto de pena e prazer sádico: “tadinhas, tão famosas. Ficaram malucas. Tanto ouro, tantas jóias, carros caríssimos.” Eram Dircinha e Lindinha Batista, irmãs, cantoras festejadas no Cassino da Urca e importantíssimas, hoje falecidas. Trancadas no apartamento, davam início a mais uma tentativa de suicídio. Vicente Celestino foi-se embora, em 1968, emocionado com a homenagem dos meninos tropicalistas. Era o término do ostracismo total, que tudo deturpa e transforma o talento em fantasma pitoresco, que vaga pelas ruas, desprovido de sentido. Na certa você não deve sequer ter ouvido falar nesse filme e nem sobre esse cantor, mas é bom saber que esse foi um dos filmes mais populares do Brasil, ficando duas décadas em cartaz e tambem o filme brasileiro do qual mais cópias se tiraram na época (500). À época do lançamento, superou com facilidade a bilheteria em Farrapo Humano, de Billy Wilder, que gerava constantes comparações por tratar do mesmo tema. Um filme que representa uma era inteira...
Mama mia! Não canso de ter que elogiar esse monstro chamado Alfred Hitchcock e esse seu "O homem errado" (The wrong man, 1956) comprova de modo claro essa vocação do cinema hitchcockiano de concentrar sua grandeza na elaboração formal, sondando a condição humana pela ótica católico-cristã. O argumento de O homem errado lembra, em seu núcleo essencial, o de O processo, de Franz Kafka: a imputação de culpa a um inocente, com sugestivas ressonâncias de um paralelismo com o pecado original. O andamento que Hitchcock dá ao tema, porém, o difere de Kafka, pelo relevo que o cineasta dá à fé do protagonista (brilhantemente interpretado por Henry Fonda) na economia da existência humana e na produção de um sentido para esta existência. Entre outras leituras possíveis, O homem errado é um filme sobre a capacidade humana de suportar o sofrimento; não um sofrimento qualquer, mas o padecer da vítima inocente cujo espelho é o sofrimento do Cristo. Apesar disso, o filme de Hitchcock não é uma apologética de um carola. Hitch trabalha num registro sutil, seja na inserção de objetos simbólicos no quadro, seja fazendo a câmera assumir, em alguns momentos, a perspectiva do protagonista. Por exemplo, quando Balestrero é injustamente levado à prisão, a câmera focaliza insistentemente o chão, captando em closes os pés e as algemas, solidarizando-se com o estado de humilhação do protagonista; numa outra cena menos sutil, com Balestrero na cela, a câmera gira rapidamente, simulando a vertigem da personagem e sua indignação perplexa. Porém, uma das cenas mais significativas, e mais interessantes do filme, é a culminância do processo de enlouquecimento (ou um nome mais técnico que se dê) de Rose. Análises à parte mereceriam a econômica e sugestiva música de Bernard Herrmann e a sombria e expressiva fotografia de Robert Burks, decisivas para estabelecer o clima pesadeloso do filme e o dilaceramento interior das personagens. O homem errado foi o único filme de Hitchcock baseado em fatos reais; muita gente levou isso em conta em suas análises, ressaltando, entre outras coisas, que o diretor inglês chegou mesmo a filmar com pessoas que viveram o drama. Particularmente, não acho relevante este fato: Hitch é artifício, forma. Filme o que filmar.
Curiosidades e Informações extras: ● Apesar de ser baseado em uma história real, Hitchcock omitiu deliberadamente algumas informações que apontavam para a inocência de Manny com o intuito de aumentar a tensão no filme. ● A cena em que Manny (Henry Fonda) é levado à prisão foi filmada em uma prisão verdadeira. Enquanto ele é levado para sua cela, um dos internos grita: "Pelo que te prenderam, Henry?". Vários presos riem após isso ● Quando a equipe foi fazer as cenas no hotel, Hitchcock permaneceu em sua limusine devido ao frio e decidiu mover a produção para Hollywood para completar o filme lá. ● Foi em O Homem Errado que, pela primeira e única vez, o diretor Alfred Hitchcock aparece falando em um de seus filmes. ● Alfred Hitchcock chegou a filmar mais uma de suas clássicas aparições em pequenas pontas para O Homem Errado, mas terminou optando por substituir tal cena pela narração do prólogo.
Pode-se dizer ser um filme direto, quase sem meias palavras que escondem uma não pronunciada: mentira! Já na primeira cena é instalado o clima de suspense, olhares dizem tudo. A mocinha (Lila) não se conforma com o inconformável e entra em uma busca de descoberta de si mesma e um clima de tensão no ar que ponteia a angustia que a talentosa Mélaine Laurent ajuda a dar credibilidade ao enredo. Inclusive, ela é a chave de tudo: vai crescendo enquanto personagem e enquanto pessoa durante o filme. Amadurece. A direção de Philippe Lioret (também de Bem-Vindo) fala das complexas relações de família (quem é que não precisa pensar nelas?), das relações de confiança que se estabelecem – ou não – mas principalmente da capacidade subestimada de lidar com as perdas. Ora, perder faz parte da vida, é inevitável. A capacidade de superação, é inerente ao ser humano. É preciso confiar para seguir em frente. Se eu disser algo mais, temo contar o final... Vale a pena!
Escute aqui, vou falar de um filme bastante polêmico onde aquela máxima "sexo, drogas e rock n roll?" é mostrada em seus mínimos detalhes. Um filme sobre sentimentos comuns e vividos por pessoas simples. O filme é ambientado em Londres e conta a história de um jovem casal a partir de seu relacionamento sexual. As cenas que mostram seus encontros, de teor explícito, são alternadas a trechos de apresentações ao vivo de grupos como o Primal Scream, Black Rebel Motorcycle Club e Franz Ferdinand, entre outros. O sexo protagonizado pelo casal é forte e bonito. Eles praticam de todas as formas e fazendo jogos. Todos os movimentos em busca do prazer são mostrados explicitamente. Os mais puritanos podem pensar que se trata de uma desculpa para se mostrar cenas pornográficas. Não é isso. É simplesmente um casal apaixonado derrubando todos os limites. Eles se divertem, transam e até brigam. Logo que acontece essa briga, Matt acaba indo sozinho para o show do Super Fury Animals. A música apresentada é Slow Life. A letra da canção retrata metaforicamente o mix de sentimentos que ele está vivendo. Todas os acontecimentos vem pontuados pelas apresentações das bandas. Não é um filme intelectual, é simplesmente um exercício sobre os relacionamentos. A reflexão de Matt vai levá-lo a comparar sua situação com seu trabalho. Na Antártida, blocos de gelo se separam e depois trafegam em direção aos oceanos. Esses blocos chamados icebergs, ao derreterem acabam fazendo parte do mar. É justamente isso que ele viveu. O jovem inglês se separou de um bloco maior e se uniu a Lisa. Ao término, ele faz o caminho inverso e volta à sua origem. O ciclo se fecha com a apresentação da banda Black Rebel Motorcycle Club, a mesma de quando eles se conheceram. 9 canções é direcionado a um público jovem interessado em curtir a vida onde ela se faz mais comum. Rock e sexo na medida certa como fonte inspiradora da própria realidade.
Algumas vezes tive vontade e oportunidade de assistir esse filme, mas a idiotice em acreditar piamente na crítica acadêmica que tacha como uma burguesa metida a intelectual, a diretora francesa Catherine Breillat que ganhou notoriedade depois de promover o astro pornô Rocco Siffredi a protagonista de Romance (1999), o seu sexto filme. Talvez por medo dos censores - que barraram Romance no mundo todo devido às variadas e ostensivas cenas de sexo - ou por maturidade mesmo, o seu filme seguinte, Para minha irmã! (À ma soeur!, 2001), veio suavizar um pouco a apelação gratuita, para penetrar de forma incisiva na psicologia adolescente. Catherine afirma que teve a ideia do filme quando encontrou, à beira de uma piscina, uma gordinha como Anaïs, que nadava de um lado a outro, e se abraçava nos corrimãos das escadas como se namorasse um homem em um bailar carregado de pureza e inocência. A cena se repete no filme e ilustra de forma inteligente a volúpia represada da personagem. Segundo a diretora, esse é o retrato da própria adolescência, sexualmente afoita, de não querer mais ser uma criança, mas ainda sem poder seguir as regras do mundo adulto. O filme expõe a complexidade do conflito, ao apresentar uma Anaïs sem moralismo, com dignidade. Já o lado crítico da diretora aflora na outra ponta, quando exercita a ironia ao tratar das dúvidas da irmã. O magnetizante diálogo que antecede o sexo entre Fernando e Elena, quando o rapaz gasta longos minutos para convencê-la a se entregar, é emblemático e realístico ao extremo. Ao explicar o relacionamento, Catherine pega mais pesado na questão da virgindade: Existe tanta culpa associada ao fato de querer transar, que a menina exige do parceiro palavras de amor, mesmo que ele esteja mentindo. Na verdade, ela pede que ele minta. Essa necessidade do mito do amor é um estupro psicológico Convenhamos, não há como negar haver muita luz no pensamento da francesa. E se algumas passagens de Para minha irmã! sugerem perversidade - como quando Anaïs se esbalda com um bastão de marshmallow, símbolo fálico proposital -, o discurso geral é de uma polêmica libertária. O grande problema do filme é o final. O caso de Elena é bem resolvido. A diretora, porém, cria uma armadilha ao propor mais questões para Anaïs do que o seu roteiro é capaz de responder. Assim, o impacto derradeiro parece mais uma solução improvisada do que realmente elaborada. Acontece que esse final já havia sido pensado desde o início. Surgiu, inclusive, quando Catherine folheava o caderno policial de um jornal, naquele mesmo momento em que viu a menina na piscina. Talvez seja o momento mais frágil de um filme muito bem controlado. Um filme para pensar, assistir e pensar...
Pensei bem antes de escrever sobre esse filme com um quê de autobiográfico. A diretora Jeanine Meerapfel, que aqui também escreve o roteiro, é de origem alemã e nasceu na Argentina, em 1943. Com 21 anos, depois de ter cursado jornalismo, rumou à Alemanha e cursou Cinema, onde tem dirigido os seus anteriores filmes... É o fim dos anos 50, num bairro rico e respeitável de Buenos Aires. A jovem Sulamit Löwenstein (Celeste Cid), começa uma amizade com o vizinho Friedrich. Ela é filha de imigrantes alemães judeus na Argentina e ele é filho de um oficial superior nazista – um legado politico trágico de que os personagens tentam escapar durante as próximas três décadas e por aí vai tentando misturar o imisturável que resulta em uma salada insossa, sem qualquer profundidade, torcendo para que sua teia de temas mau colocados consigam arregimentar algum incauto. Não a mim. É um filme ruim com toques de uma história obscura urdida pelos argentinos que se beneficiaram com os milhões de marcos que recheou os bolsos dos, então, mandatários dos ermanos. Esqueça!
Um não estranho mundo aos nativos tupiniquins onde o calor, o suor, a miséria e toda uma cadeia de acontecimentos trágicos escravizam os favelados de Osaka. São figuras negativas de um mundo politicamente caótico, produtos de sucessivos desencantos e sufocados pelas contingências sociais, que se entregam ao crime, à força bruta, à lei da selva para sobreviver. A princípio não haveria nada de novo, mas "O Túmulo do Sol" (Tiio no Hakaba) nos revela um grande estilista em Naguisa Oshima, jovem realizador da “nouvelle vague” japonesa. Sua visão do mundo moderno é dantesca, estabelecendo um paralelo da miséria humana de nossos dias com as figuras disformes de Goya, inclusive pela sua observação lírica do inevitável e pela pureza de sua simbologia alegórica: a presença eterna da natureza (o Sol), envolvendo os desatinos da humanidade ou purificando no final de um pesadelo vivido com o fogo apocalíptico. É uma grande realização do cinema japonês, infelizmente distante do nosso sentido de observação, do nosso público. Parece até história contada da Rocinha carioca onde dois bandos de marginais de Osaka procuram viver à sua moda, industrializando o sangue dos operários não com o pó dos morros carioca e sim, já naquela época, na fabricação de cosméticos. Contudo, as dificuldades de manter essa terrível modalidade de exploração forçam-nos a se unirem na prática de chantagem ou no comércio clandestino de identidades. O ambiente em que vivem é opressivo e gera, fatalmente, a facilidade do crime. A princípio explorando a vida humana (lenocínio, drogas, impunidade), eles passam a ser consumidos por ela. É o eterno bumerangue, é o sol que a tudo assiste e que em forma de incêndio purificará a favela e todos os atos nela praticados. E uma nova e terrível etapa se inicia. As imagens de Naguisa Oshima são magistrais. Geralmente avermelhadas, sujas de sangue humano, elas formam um surpreendente painel negro da vida de seus personagens. Quem sabe não tenha sido, o então jovem Naguisa Oshima, o verdadeiro arauto do mundo moderno atual e que, em 1960, apenas um sonho que encantou o mundo com a crueza insana do banditismo que, hoje, domina o Brasil? Assista...
Como encapsular esse hipnotizante e psicodélico filme de animação que ganhou o Grand Prix de Cannes de 1973 e que é um marco na animação europeia. Baseado no livro de ficção científica “Oms Em Serie” de Stefan Wul, a animação tornou-se uma obra-prima original. Lançado na França sob o título “La Planèt Sauvage” e nos EUA como “Fantastic Planet” foi imediatamente comparado com “As Viagens de Gulliver” de Jonathan Swift e “Planeta dos Macacos” (tanto o filme de 1968 quanto o livro de Boulle). Hoje o filme é visto como a prefiguração de animações como “A Viagem de Chihiro” e “A Princesa Mononoke” de Hayao Miyazaki no Studio Ghibli. “Planeta Fantástico” é muito mais que um exemplar dessa fascinante fase Cult dos filmes gnósticos, quando a indústria do entretenimento abria espaço para estranhas e bizarras experimentações, muitas vezes sem o appeal do gnosticismo pop daquela atualidade recheada de heróis de óculos escuros, overcoats pretos brilhantes e realísticos efeitos especiais. É exemplar único e incomparável da genialidade de um realizador que teve coragem de transcender a realidade do próprio autor do original (Stefan Wu) criando, em um espaço meticulosamente pessoal, uma visão de seres fantásticos que eleva a própria visão de mundo a um patamar que mistifica a percepção. Mas somente quem assistiu e embebedou-se com aquela realidade pode saber do que falo, portanto assista!
Não, não queria assistir um filme que me fizesse pensar, queria um que fluísse e me desse alguns momentos para sonhar. Mas não é assim tão simples e singelo... A estreia de Sergei Loznitsa na ficção significa muita coisa para o cinema russo. Um pouco pelo fato de "Minha Felicidade" não ser simplesmente um filme sobre inquietações e necessidades artísticas, mas antes um registro de desejos e preocupações estéticas muito claras e delicadas diante de determinado estabelecimento político e cultural de seu país. É um filme de lá, e, assim como foi feito, só de lá poderia ser. A barbárie não é tanto a virtualização do passado (com aquela história que se passa na iminência do stalinismo, no calor da Segunda Guerra), mas muito mais a corrosão de utopias plenamente angariadas pelos sociais (o povo). A história do caminhoneiro que se perde nas estradas e passa um longo tempo topando com toda sorte de andarilhos é também uma história do horror. No entanto, o grande trunfo de Loznitsa consiste em negar a perplexidade ao espectador tirando-lhe do choque pelo choque e colocando-o num impasse sem amortizar seu olhar: seu filme é uma luta por imagens ou imagens de uma luta? Ora, no final fica claro que esta pergunta oferece uma objeção óbvia, pois o filme pode ser os dois. Os tempos se misturam, o passado se confunde com o presente, a violência, que é aquela das coisas cotidianas, entrelaça as experiências dos personagens com uma crueza hiper-realista (e é assim no sentido de que na própria mentira que é o cinema, aproxima-se das vivências deles, deixa que se exponham sem se revelarem inteiramente; há muito caminho a perscrutar, há a dor e só dela mesma pode nascer uma utopia). "Minha Felicidade" se permite afogar as saídas, as soluções e as respostas. Ele transita entre o real e a possibilidade de transgredi-lo: não existem ambições para além daquelas que as imagens demandam. Há o plano, o enquadramento, o travelling e a panorâmica. A fissura, assim como a ruptura que a história vai fazendo, molda a perspectiva do espectador sem domesticá-lo. O filme, diga-se, opera na autonomia das relações e na prisão delas mesmas. As contradições políticas (algo que não aparece como ordem discursiva, mas antes como reforço estético da própria imagem de uma Rússia desencontrada) transbordam a atualidade do tema, o reflexo de uma guerra francamente aberta transa com as guerrilhas do presente (sem essa de mostrar a perversidade do sistema, como se o problema do mundo fosse algo alheio a ele). Há mais em jogo, coisas melhores e substanciais. Essa vontade de filmar o tempo como o movimento contínuo e inacabado dos corpos está não só na conexão dos períodos históricos, mas na própria expressividade estética do filme. É com frequência que a tela mostra acontecimentos distintos preenchendo o mesmo plano (câmera estática que registra os espaços sendo tomados), numa espécie de split screen invertido, no qual um objeto ou mesmo um corpo divide a tela enquanto duas ações protagonizam coisas distintas, quase como era feito no travelling invertido dos Lumière nos primórdios das imagens em movimento, quando não era a câmera que saia do lugar, mas os objetos e os personagens que invadiam e deixavam o plano. Se o sistema político é corrupto (ou no mínimo corruptível), a polícia e o exército são agentes reprodutores dessa corrupção, pois são poderes do Estado. Mas a sociedade civil é também corrupta, logo temos algumas dificuldades. A violência de Minha Felicidade é mais essa atribulação sistematizada que reproduz um veneno do que o sangue puro que escorre na neve. Pois é, não foram 122 minutos fáceis e eu não sonhei!
Foi na Inglaterra em 1990 que o diretor Alejandro Jodorowsky rodou o considerado, por muitos, o seu filme mais comercial. O longa decepcionou os fãs mais radicais do cineasta por apresentar uma trama mais acessível ao grande público e com muito menos simbolismos religiosos, que são considerados sua marca registrada. Parte dessas diferenças entre este e os trabalhos anteriores de Jodorowsky pode ser atribuída ao roteiro, que, pela primeira vez, não é assinado pelo próprio. No entanto, ainda assim o longa possui muitos elementos de seu cinema, que podem ser facilmente encontrados em outras obras suas como "El Topo" e "A Montanha Sagrada", apesar do uso de uma linguagem bem menos surrealista que estes e quase nenhuma violência, mas ainda com situações absurdas e bem humoradas. No elenco nomes de peso, protagonizado por Peter OToole e Omar Sharif, a mesma dupla da obra-prima "Lawrence da Arábia" (1962), de David Lean, e "A Noite dos Generais" (1967), de Anatole Litvak, contando ainda com uma pequena participação de Christopher Lee, que, numa das melhores sequências, logo no início do filme, nos remete a trabalhos do espanhol Luis Buñuel, como "O Discreto Charme da Burguesia" (1972), onde o diretor satiriza as excentricidades de milionários e burgueses. Jodorowsky não deixa de fazer suas ponderações sobre a vida e o universo se utilizando, dessa vez, de palavras ao invés de imagens. Apesar da linguagem bem mais convencional de O Ladrão do Arco-Íris, o diretor concentrou todo o seu trabalho nos diálogos e nas interpretações dos atores, principalmente de Omar Sharif. Mantendo aí as suas indagações e lições sobre o que nos rodeia e aquilo que se encontra dentro da alma. Foi seu último trabalho. ------------------------------------- Assista em meu blog com informações extras, em tempo, o filme não foi lançado no ano de sua produção e sim em 1994 na França e em 1996 no Brasil.
Talvez o grande público não venha amar esse filme onde a violência do sexo é a razão de viver de uma mulher misteriosa que decidiu deixar de falar. Isolada numa ilha bordel onde conforta os pescadores, vai entrar numa relação de submissão e horror quando salva um suicida. Um dos filmes surpresa de Cannes 2000, muito embora o seu realizador, Kim Ki-Duk, seja uma estrela de primeira grandeza em toda a Ásia e «A Ilha / O Bordel do Lago» seja a sua terceira longa metragem de grande sucesso. Depois de perder a inocência, uma mulher deixa de falar. Como um pássaro numa gaiola, vive numa ilha num sítio remoto onde dá bebidas aos pescadores e os consola, juntamente com outras mulheres, nas horas de aborrecimento. Esta ilha é uma ilha especial. Pequenas casas flutuam no lago que a circunda e permitem aos homens transformar em realidade as suas mais estranhas fantasias sexuais. E como ponto final de relevância é preciso saber que o filme não tem diálogos. O uso da metalinguagem insere-se no âmago do estilo de Kim Ki-Duk mantendo a fala reservada exclusivamente às personagens secundárias, excepto em alguns títulos, como em “A Samaritana”. O cineasta utiliza o silêncio para demonstrar a inocência das personagens, como se estivessem dentro de uma bolha invisível que os protege do mundo exterior, apenas quebrada se as personagens escolherem sair para esse mundo, impuro e caótico. No caso deste filme o silêncio das personagens sugere, também, a simplicidade na forma de comunicar, como se as coisas mais importantes da vida passassem por uma comunicação pura, de movimentos subtis e graciosos, no fundo, simplificando a comunicação a um nível mais emocional e sincero. Uma história profundamente tocante recomendada a todos sem excepção. Uma experiência verdadeiramente única. ------------------------------- O filme está em meu blog.
Adeus, Primeiro Amor
3.3 192O cinema que nos leva a lugares distantes e realidades alheias, também promove viagens interiores gratificantes. Adeus, Primeiro Amor, escrito de dirigido com sensibilidade por Mia Hansen-Løve (O Pai de Meus Filhos), estabelece com êxito um diálogo íntimo com o espectador ao narrar a história de Camille (a promissora atriz Lola Créton), jovem parisiense vivendo seu primeiro e, por isso mesmo, arrebatador amor.
Um dos pontos fortes do filme Mia Hansen-Love é contar essa história de forma realista, autêntica, escapando inteligentemente dos clichês (o que, convenhamos, não é fácil num filme centrado no amor romântico). A trama também é habilmente pontuada de elementos sutis e imagens capazes de buscar na memória sentimental de cada espectador um ponto de identificação, consciente ou inconsciente, com o que se vê na tela.
Em tempos de politicamente correto, em que seria mais “adequado” mostrar a protagonista se afirmando como mulher independente, Mia Hansen-Løve tem a coragem de apresentar uma mulher que evolui, sim, mas que parece sempre sujeita aos caprichos do amor. A sua identidade é sempre consequência da sua submissão aos sentimentos. E, afinal, não é assim com muitas mulheres?
A formação em arquitetura, a obra de que se encarrega e o casamento que está em marcha, nenhum desses elementos, que poderiam servir para promover uma espécie de reviravolta feminista na trama, são usados pela autora com esse propósito. Camille evolui, amadurece, mas continua a ser uma mulher que acredita no amor, que se entrega a ele, sem defesas.
Como ponto negativo, o longa comete o excesso de se enveredar em demasia pelo discurso da beleza arquitetônica e seus simbolismos estéticos, o que não tem analogia aparente com a personalidade da protagonista ou progresso narrativo que ela enfrenta. Uma extensão da construção visual do filme que soa supérfluo e o estende demais.
O deslize narrativo, no entanto, não tira de Adeus, Primeiro Amor o mérito de ser um filme sobre o amor na juventude de rara inteligência.
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Para quem ainda não assistiu:
Cine Rialto, Área Drama, Índice página 3.
Antes que Termine o Dia
3.9 1,6K Assista AgoraEstá aí uma coisa que gostaria de viver, não assim indo e voltando sem nunca seguir avante, mas pergunto: O que faríamos se pudéssemos voltar no tempo e reparar os erros cometidos no passado?
O que aconteceria se pudéssemos ter seguido caminhos diferentes? Em Antes que Termine o Dia, segundas chances existem e todas essas perguntas são facilmente respondidas quando é o amor que está em jogo. Por ter uma abordagem completamente diferente dos demais, ele se destaca entre os romances e no mínimo, satisfaz os fãs do gênero.
Já Não Ouço a Guitarra
3.8 6Não são muitos os filmes que me impressionam.
Muito se fala em cinema autoral e pessoal, mas poucos são aqueles cineastas que conseguem gerar uma obra de marca tão indelével e particular quanto o diretor Philippe Garrel logrou em “Já não ouço a guitarra” (1991). Trata-se de uma produção ficcional, mas o próprio Garrel revela que o roteiro é bastante inspirado em fatos de sua vida amorosa com a cantora e modelo alemã Nico, que além de uma expressiva discografia solo também teve participação antológica no fundamental primeiro disco do Velvet Underground. Nesse sentido, é fascinante como um aspecto intimista da vida de Garrel, e que ele aborda de forma bastante visceral, ganha uma dimensão universal no sentido que seu drama amoroso ganha ressonância no imaginário coletivo (afinal, Nico representa um capítulo relevante na história cultural dos últimos 50 anos). Nesse sentido, a habitual estética de Garrel, aqui num de seus momentos de apuro mais elevado, é o veículo mais que ideal para abarcar o seu relato emocional e amargo de um relacionamento que se desintegra. Como entre outras obras do cineasta, sua narrativa não é detalhista . A trama se divide em momentos cujo espaçamento de tempo é aleatório – tanto podem se passar algumas horas entre eles quanto semanas, meses, anos... Em cada um desses trechos, o enfoque é no estado anímico dos personagens e não no contexto histórico deles. Essa sensação de elipses temporais é desconcertante, mas também é muito verdadeiro em termos de construção das situações e personagens. Nessa formatação, não interessa se falar em final feliz ou não para os indivíduos. O que o espectador vê é apenas uma fração das suas vidas, sendo que a conclusão em aberto de “Já não ouça a guitarra” ganha uma conotação de brutal coerência formal e temática.
A História de Marie e Julien
3.9 9Logo nas primeiras imagens achei que não valeria perder meu tempo, mas geimei em continuar e não me arrependo.
Desde o início, o filme guarda uma estranheza bastante agradável. Aliás, essa sensação agradável de prazer estético, de sentir que estamos vendo algo especial, acontece sempre quando vemos um filme de um diretor de primeira grandeza como Rivette. E no caso de A HISTÓRIA DE MARIE E JULIEN, mesmo quando o filme vai descortinando sua verdadeira face, o encanto e o mistério continua. Engraçado que eu tinha a impressão que o filme seria mais erótico, mas o aspecto carnal do filme é quase nulo, estando mais para o espiritual. Basta notar que na cena em que Marie e Julien estão na cama, um de seus maiores prazeres é ficarem contando fantasias, criando com a ajuda do outro fantasias eróticas, como se mentalização desses pensamentos fosse mais importante que o próprio ato sexual, que é pouco mostrado, omitido pelas elipses à Bresson.
Valeu assistir e sei que você também gostará!
O Corpo
2.9 76Taí um filme que conseguiu mexer com minhas poucas verdades enquanto não surgiu o The End imponente na tela, um filme com uma mensagem muito forte com respeito ao dogmatismo religioso que, mesmo que trate a questão colocando a Igreja Católica ou o Vaticano, sua moral na verdade envolve o dogmatismo que está presente em todas as religiões. Um filme muito interessante que todos deveriam assistir e refletir sobre sua mensagem.
Mas porque digo (acima) ter mexido com minhas verdades? Hei de afirmar, também, crer que a discussão que se propões liga-se sobre a preservação da "Verdade" ou "Daquilo que se diz ser a Verdade" porém vislumbro ser esta uma situação que muitas Igrejas tem que lidar em suas lideranças e em vários momentos e, creio ainda, no existir de um conflito entre o que é a verdade e entre o que se diz ser a verdade. Quando estas questões se confrontam o que prevalece?
Será que uma religião estaria disposta a abrir mão de seus dogmas ou preceitos caso descubra a luz de evidências que estes estão ou estiveram equivocados por anos ? Ou se o faz, este é feito de forma transparente ou nos bastidores de tal forma que seus membros nem percebem ?
Será que nós buscamos realmente a verdade ou buscamos um tipo de verdade que se acomode com nossas convicções ou com aquilo que queremos ter como verdade ? Então não queremos a verdade tal como ela realmente é, e sim uma verdade industrializada e customizada ao gosto do freguês.
E, aqui talvez, o ponto crucial de toda essa questão que se desdobra em novos e constantes questionamentos: Será que esta postura é convicção ou apenas um medo interior de descobrir a verdade e de não saber lidar com ela? O que aqueles que estão na dianteira da obra realmente temem, defendem ou acreditam? Será que para eles a verdade é mais importante do que a nossa verdade? Se eles descobrissem o corpo de Cristo e que este não foi ressuscitado o que fariam? Será que sua atitude seria muito diferente da do Vaticano conforme apresentado no filme?
E, por fim, a certeza plena de que o crer não se apequena pelo descobrir e sim pelo crer. Mas somente aqueles que assistiram esse filme que intriga hão de poder (e querer) responder todos esses questionamentos...
Siddhartha
3.6 18Não, não posso deixar de falar sobre esse filme e nem sobre um pouco da obra fenomenal que originou esse, que é, verdadeiro guia para o reconhecimento de "mim" enquanto personagem vinculado aos mundos material e espiritual.
Com Siddartha podemos perceber os mesmos questionamentos que a obra matriz, lá está a procura de um personagem pelo auto-conhecimento e essência das coisas do mundo.
É bom deixar claro não se tratar de uma biografia do fundador do budismo Siddartha Gautama, o "Siddartha" aqui é um personagem fictício criado por Hesse para divulgar suas ideias de mundo. Tanto que o personagem fica um tempo aprendendo com o fundador do budismo mas percebe que ainda não é o que procura, e não irá seguir outros mestres, Siddartha quer seguir seu próprio caminho espiritual.
Dois pontos importantes podem se discutidos a partir da filosofia schopenhaueriana e da tradição budista, a questão da vontade e da liberdade. Arthur Schopenhauer nasce em Danzig, 22 de Fevereiro 1788 e morre em Frankfurt, 21 de Setembro 1860, foi um dos maiores filósofos alemães do século XIX. Seu pensamento é caracterizado por não se encaixar em nenhum dos grandes sistemas de sua época. Sua obra principal é O mundo como vontade e representação (1819). Schopenhauer foi o filósofo que introduziu o Budismo e o pensamento indiano na metafísica alemã. Ficou conhecido pela sua filosofia pessimista e entendia o Budismo como uma confirmação dessa visão. Schopenhauer também combateu fortemente a filosofia hegeliana e influenciou fortemente o pensamento de Friedrich Nietzsche. Para Schopenhauer, a vontade era a grande força que fazia o universo mover. Era a essência das coisas e nossas representações de mundo eram construídas a partir da vontade.
No filme Siddartha passa a querer conhecer as paixões e, como exemplar de ser humano, transgride em Kamaswami, e Kamala, nos convidando a acompanhá-lo em sua descoberta o que, para o filósofo alemão, o impulso do desejo não acontece em forma consciente (Schopenhauer foi o primeiro a discutir o inconsciente muito antes de Freud), ao contrário, se desdobra desde o inorgânico até o homem, que deseja sua preservação. A consciência humana seria uma mera superfície, tendendo a encobrir, ao conferir causalidade a seus atos e ao próprio mundo, a irracionalidade inerente à vontade. Sendo deste modo compreendida, ela constitui, igualmente, a causa de todo sofrimento, uma vez que lança os entes em uma cadeia perpétua de aspirações sem fim - este período é representado no filme pelo tempo que Siddartha enriquece e esquece de sua busca espiritual - o que provoca a dor de permanecer algo que jamais consegue completar-se. Segundo tal concepção, o prazer consiste apenas na supressão momentânea da dor; esta é a única e verdadeira realidade. Sua busca só parece terminar quando, já um homem velho, decide tornar-se um simples barqueiro.
Mas somente assistindo ao filme não se embebe do fruto, por isso (e para isso) é necessário ler o livro para poder entender e vivenciar a busca de um Siddartha homem humano mostrado no filme!
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Em tempo: No blog Cine Rialto está o filme e o livro para ler ou baixar.
A Queda do Império Romano
3.8 41 Assista AgoraBem poderão estranhar (até mesmo me crucificar) aqueles que nomearam esse como favorito, mas antes precisamos falar um pouco sobre uma história que viria a ser o tiro desencadeador desse tudo todo.
No início dos anos 60, Ben-Hur salva a MGM da falência e arrecada 11 Oscars. Um recorde só superado por Titanic, décadas depois. Como tudo o que faz sucesso é logo copiado, não tardou para o cinema despejar uma enxurrada de produções épicas ambientadas na Roma Antiga ou em qualquer outro império de destaque na História. Quatro produções realizadas nesta época se destacam: Spartacus (1960), El Cid (1961), Cleópatra (1963) e este A Queda do Império Romano (1964). O primeiro é um clássico indiscutível. Seu realizador, Stanley Kubrick - ninguém menos que ele, criou uma obra prima política e violenta. El Cid, de Anthony Mann, se mostrou uma bela aventura. Já os dois últimos... confirmavam que o gênero sofrera desgastes tamanho o número de filmes sobre o tema. "A Queda" foi uma decepção, principalmente porque contava com a mesma equipe do já citado El Cid, que fizera enorme sucesso. Mas esse fracasso se deve mais pelo desempenho pífio de "Cleópatra" nas bilheterias, um ano antes, do que pelos defeitos do filme em si.
O principal defeito desta produção de Samuel Bronson é ser excessivamente verborrágico. Os diálogos beiram o didatismo, como se quisessem ensinar História, e isso impede que os atores transpareçam naturalidade em suas falas. Os 172 minutos (no blog Cine Rialto 179 minutos) poderiam muito bem ser mais enxutos e objetivos. Não são. O filme só ganha força mesmo depois de hora de projeção! Até então só vimos um blá blá blá eloquente que nada acrescenta. Claro, neste primeiro terço são estabelecidas as relações entre seus personagens principais, suas motivações e a tal trégua romana. Porém, tais fatos poderiam ser contados em menos de meia hora. Não costumo reclamar de cenas longas mas, do jeito de ficaram, devem ter sido enfadonhas até para o parco público que as conferiram nos cinemas na época.
Mesmo com tantos tropeços, "A Queda" ainda é interessante pra que gosta desse tipo de filme. Particularmente acho Christopher Plummer meio canastrão, mas o exagero até o ajuda na hora de encarnar o lunático Cômodo. E Alec Guinness, como já disse, é sempre excelente. Sempre!
Outro ponto positivo é a grandiosidade da produção. Os cenários são lindos, as cenas de multidão impressionam e o figurino revelam um esmiuçado trabalho de pesquisa. Já a fotografia é um espetáculo à parte: a paisagem espanhola (onde o filme foi gravado) é estonteante. Além disso, gosto muito do trabalho de Anthony Mann no comando das câmeras: ele sabe aproveitar muito bem os suntuosos sets construídos com ótimos movimentos de câmera que dinamizam a engessada narrativa.
Se tivesse um script melhor e não tivesse sido prejudicado pela sombra desastrosa de Cleópatra, "A Queda" tinha tudo para se tornar um clássico: um bom diretor, elenco de astros (que ainda contava com a presença de Omar Sharif e James Mason) e muito dinheiro. Mas afundou em sua própria ambição e quase não é lembrado hoje. Ainda assim, vale a pena. A última cena, a do caos em roma, é de tirar o fôlego.
Assista em meu blog.
Para Sempre Cinderela
3.5 781 Assista AgoraAssistindo esse filme me dei a imaginar de como os dias de hoje são tão sombrios e sem vida de amor, a modernidade podou as esperanças e nos fez cair em um mesmismo que solidifica os sentimentos.
Não que nos tempos de antigamente tudo fosse flores, passarinhos esvoaçantes, rosas perfumadas eclodindo em campos onde havia paz, não...
Esse fiklme é uma linda e envolvente clássica história de amor recontada pelo diretor Andy Tennant que, por ser clássica, não se foge a explorar muitíssimo bem o amor entre um príncipe e uma plebeia sem jamais deixar de lado o drama e o romantismo. Drew Barrymore está linda e perfeita como Danielle e todo o elenco coadjuvante dá show, como Anjelica Huston. Grande reconstituição de época, fotografia e trilha sonora, além de uma boa direção de Tennant. Um grande clássico das comédias românticas dos anos 90 que deve ser visto por todos!
Mas ainda acredito no amor hoje!
O Exótico Hotel Marigold
3.8 503 Assista AgoraQue já assistiu, por certo, deve ter aplaudido e quem ainda não teve o prazer de ver esse ótimo filme não sabe o que está perdendo.
O Cinema costuma ignorar os idosos. Quando surgem em um filme, são coadjuvantes marcados para a morte ou sábios que distribuem conselhos e verdades do alto de sua experiência. Poucos são os longas que os trazem como centro da narrativa ou que os tratam como criaturas tridimensionais que não deixam de falhar apenas porque viveram mais do que aqueles que se lembrariam de seus erros passados. Infelizmente, se por um lado O Exótico Hotel Marigold merece créditos por enfocar o drama e a comédia da terceira idade, por outro não deixa de desapontar ao apostar num roteiro frágil cujos equívocos muitas vezes acabam sendo disfarçados simplesmente graças à qualidade de seu elenco formidável.
Baseado em livro de Deborah Moggach, o roteiro de Ol Parker acompanha sete indivíduos às voltas com a tristeza e o desapontamento de um epílogo distante daquele que haviam sonhado na juventude: Evelyn (Dench) é uma viúva recente que é obrigada a se desfazer de sua casa em função das dívidas deixadas pelo marido; Graham (Wilkinson) é um juiz aposentado que carrega a culpa de uma antiga omissão; Douglas e Jean (Nighy e Wilton) formam um casal falido depois de um empréstimo à filha; Muriel (Smith) é uma racista fragilizada por problemas de saúde; Norman (Pickup) é um homem em busca de uma última paixão; e Madge (Imrie) é uma mulher em busca de um último marido rico. Levados por diferentes circunstâncias, eles se mudam para o hotel do título, que, administrado pelo jovem Sonny (Patel), está longe de cumprir a promessa da brochura que os convenceu acerca da mudança – e nunca é um bom sinal quando o responsável pela hospedagem é obrigado a assegurar os hóspedes de que “a porta chegará logo”.
É possível, diga-se de passagem, apontar o instante exato em que o filme despenca: assim que transporta sua ação para a Índia, o cineasta John Madden (Shakespeare Apaixonado) escancara um sentimento de superioridade alarmante em relação à cultura que pretende enfocar – algo que surge disfarçado por uma condescendência ofensiva e por piadas que beiram o insulto. Reparem, por exemplo, a elipse “cômica” que justapõe o comentário de Jean, que diz que aquele país parece “mais civilizado do que imaginava”, e o plano que traz os personagens perdidos em meio ao caos de ruas abarrotadas de pessoas, cores e sons: embora o propósito aparente seja o de fazer uma simples piada através do contraste, é impossível não perceber o julgamento do filme acerca daquela imagem, que trata o “exótico” (leia-se: o diferente) simplesmente como algo inferior. Além disso, não é à toa que praticamente todos os personagens indianos surgem como caricaturas, desde a mãe obcecada com honra e dinheiro até o rapaz cartunesco vivido por Dev Patel – que desde sua estreia em Quem Quer Ser um Milionário? viveu exclusivamente tipos unidimensionais.
Ao fim, no entanto, O Exótico Hotel Marigold sucumbe justamente por tentar amarrar de maneira bonitinha demais as suas subtramas e seus conflitos, apostando estupidamente em alterações bruscas de comportamento de certos personagens e em ações implausivelmente nobres por parte de criaturas que até então não haviam demonstrado qualquer possibilidade de redenção pessoal. Para piorar, a insistência em resumir as liçõezinhas de moral da história através da narração de Evelyn é uma decisão simplista, preguiçosa e artificial.
Ainda assim, há certa doçura inevitável na visão de homens e mulheres que, por baixo de rugas, cabelos grisalhos e manchas senis permanecem dispostos a encontrar mágica e amor no mundo. Muitos são aqueles que desistem depois de uma (ou mais de uma) desilusão, esquecendo-se de que nossos corpos podem envelhecer, mas ainda assim precisam do toque e do carinho do próximo – e abandonar esta busca é um indesculpável desperdício de oportunidades. “Nunca lamentarei envelhecer”, escreveu alguém. “Conheço pessoas demais que não tiveram este privilégio”.
Apesar desse tudo esse é um filme para refletir-se sobre o hoje que nos frutificará no amanhã, para onde iremos e porque fomos e porque deixaremos de ir. Mas, a bem da verdade, assistindo as dores, os risos e as incertezas desse grupo de velhos (sem serem senis) não devemos nos esquecer de que é um privilégio envelhecer...
A Família Buscapé
3.2 526Não somente aos mais velhos, mas não há como não dizer ser realmente um clássico do to tempo em que se trazia boas histórias e loucuras que envolvia famílias de tudo que era jeito. A família Buscapé, era uma exceção, pois trazia bons personagens, e que conseguia alegrar a todos, novos ou velhos. E mesmo hoje o filme vai cumprindo com o papel de divertir.
Se você ainda não assistiu não sabe o que está perdendo e, para suprir essa possível falha, dê uma espiada em meu blog:
http://cinerialto.blogspot.com.br/2012/11/001-02d.html
Dez Minutos para Morrer
3.5 58Lançado em 1983, DEZ MINUTOS PARA MORRER ("Dez para a meia-noite", no original, mas o título não tem nenhuma relação com a história nem em português e nem em inglês!) é um filme sui generis na "filmografia oitentista" de Bronson - que, naquela época já tinha 61 anos.
A bem da verdade simplesmente esse em nada se parece aquele típico filme rasteiro de Charles Bronson com o qual o público acabou se acostumando nos anos 80. Pelo contrário, é uma história policial séria e levada a sério, onde cenas de investigação e sangrentos assassinatos - quase como um slasher movie para adultos - ocupam o espaço geralmente reservado para os tiros, socos e frases de efeito do herói grisalho.
O filme valeria apenas pela fantástica meia hora final, que recria o violento caso verídico em que Richard Speck invadiu um dormitório de jovens enfermeiras para estuprar e matar várias delas. Não bastasse isso, temos uma daquelas cenas inesquecíveis de tão bizarras: o vilão perseguindo sua vítima pelas ruas da cidade COMPLETAMENTE PELADO!!!
(Aliás, o filme tem tanta nudez masculina e feminina que, segundo o IMDB, foram gravadas cenas alternativas para que ele pudesse ser exibido na televisão sem que fosse preciso cortar mais da metade. Nestas cenas mais brandas, Warren ataca usando cueca, e não completamente nu, como na versão "oficial".)
E não há o que estranhar Bronson está bem no filme! Os cinéfilos de botequim que ridicularizam o ator por suas participações pífias de fim de carreira deveriam morder a língua e baixar a cabeça diante de cenas tensas como a do interrogatório de Warren por Kessler. O herói sabe que está com o assassino diante dele, mas ainda precisa jogar "conforme as regras". A cena, entretanto, é levada num crescendo de tensão e ódio entre os antagonistas. Primeiro, Kessler bombardeia Warren com perguntas vexatórias, tentando fazer com que se descontrole; depois, mostra um vibrador em formato de vagina que foi encontrado no banheiro da casa do "suspeito". Por fim, atira as fotos das vítimas mutiladas sobre a mesa e depois força a cabeça de Warren sobre elas, gritando "Olhe para estas malditas fotos!", antes de ser contido pelos parceiros.
O filme inclusive pode ser visto como uma espécie de releitura de "Perseguidor Implacável", de Don Siegel, a primeira aventura do policial durão Dirty Harry, em que o herói também persegue um serial killer e precisa jogar sujo para escapar das "amarras burocráticas" que permitem que o vilão mate livremente (como aqui em terras tupiniquis onde basta ser engravatado e ter alguns trocados a mais em conta bancária para que o judiciário lhe abra as portas do xilindró).
O filme também é interessante pelas várias caras conhecidas no elenco secundário: além de Andrew Stevens, aparecem Wilford Brimley como superior do herói, Geoffrey Lewis como advogado filho da puta (daqueles que dá vontade de esmurrar) e a gracinha Kelly Preston em papel bem pequeno de vítima, ainda no começo da carreira.
Não bastasse tantas qualidades, este policial suspense de primeira ainda tem uma curiosidade quase inacreditável: apesar de ter sido produzido nos exagerados anos 80, Charles Bronson interpreta um policial que dispara "um único tiro" durante o filme inteiro! Algo que é ainda mais inacreditável quando lembramos que, nas suas produções posteriores com a Cannon, ele matou gente com todo tipo de arsenal, de metralhadores de grosso calibre a bazucas!
Vale lembrar que em 30 de agosto de 2003, com 81 anos, Charles Buchinsky (verdadeiro nome de Charles Bronson) mudou-se para o andar de cima onde deve estar azucrinando o viver de anjos e querubins desvestidos de santas intensões.
Orquestra dos Meninos
3.0 42Tudo poderia ser diferente nesse filme de Paulo Thiago, uma ótima idéia, mas dirigida com total irregularidade. Assim é Orquestra dos Meninos. O argumento original é um verdadeiro achado, alinhavando fatos acontecidos nos anos 90, no interior de Pernambuco. Embora na trama, provavelmente para evitar processos e/ ou retaliações, alguns nomes foram trocados e a ação foi transferida para Sergipe. Não importa. Interessa sim acompanhar a história real do maestro Mozart Vieira, um sonhador que contra tudo e contra todos embrenhou-se na difícil tarefa de montar uma orquestra sinfônica de crianças e jovens em pleno interior de Pernambuco (na realidade) ou de Sergipe (na ficção).
Um grande feito é a ótima interpretação de Murilo Rosa, que dá força e vigor ao personagem visionário, sonhador e otimista, Mozart que veio cometer um pecado quase mortal para ele e para a sua carreira: meteu-se na política, este câncer incurável que destrói tudo o que toca. Também não posso deixar de elogiar Othon Bastos, em mais um momento careteiro de sua carreira que deu vida ao prefeito e, dentre os já conhecidos, restou Priscila Fantin que é outro erro: sua Creuza é apagada e nem a beleza (seu grande cartão de visita) conseguiu emplacar, a vi como uma patricinha de shopping center brincando se ser pobre.
Romance, traição, política, música, sonho, dedicação... Enfim, um argumento repleto de elementos perfeitos para um grande filme que, apesar de todos os elementos necessários a um grande filme não rolou. Orquestra do Meninos aos poucos vai incomodando o espectador com uma lamentável série de defeitos e/ ou imperfeições que ora beiram à ingenuidade, ora resvalam na preguiça. Como é possível, por exemplo, a orquestra inteira se espremer num estúdio, cantando e tocando para um único microfone pendurado no teto, para gravar um CD? Quem consegue levar a sério o personagem do delegado histriônico de óculos escuros que bate seu revólver na mesa da coletiva de imprensa, no melhor estilo Zorra Total? E a oficial de Justiça que, de dedo em riste, grita "Podem fechar a Fundação", como quem comanda um exército de 300 espartanos? Isso sem falar no rápido flerte do maestro com a filha do dono da loja de materiais de construção, uma cena gratuita, dirigida com teatralidade, sem continuidade nem função dramatúrgica dentro do roteiro. Há defeitos menores, como estampar na tela um letreiro com a inscrição "meses depois..." ao invés de solucionar tal passagem de tempo cinematograficamente.
Detalhes? Talvez. Mas são muitos. Tantos a ponto de minar insistentemente a credibilidade do filme. Graças à força da história, porém, acompanha-se o longa até o seu final com certo interesse. Já nos créditos finais, surge a boa ideia de inserir cenas reais daqueles que de fato protagonizaram a trama. O filme cresce, mas já é tarde. Talvez um documentário sobre o assunto tivesse melhores resultados.
Cafuné
2.6 8Existem ocasiões onde assisto um filme e termino com a impressão de já tê-lo assistido. Essa é a impressão após o FIM desse primeiro longa-metragem de Bruno Vianna e, incomodado, busquei achar onde havia assistido.
CAFUNÉ trata de jovens de origens sociais distintas que estão iniciando a vida adulta na conturbada cidade do Rio de Janeiro.
A história coloca lado a lado jovens que, apesar do abismo social que os separa, têm em comum a falta de perspectiva profissional e pessoal, vítimas de uma comunidade cuja decadência econômica é motor da violência física e moral.
A desigualdade social é abordada, mas não é o tema central. O filme traça uma interseção entre as camadas baixa e alta, através da observação do cotidiano dessa juventude no que ela tem de mais banal.
CAFUNÉ aponta o declínio da classe média como fator que também gera violência, que a torna vítima e agressora. Mostra seu medo diário da cidade e sua visão da favela, que é um misto de fascínio e mistério, ódio e paternalismo.
Sim! O filme que me confundiu foi "Era uma vez..." de Breno Silveira (2008)...
O Ébrio
3.5 28Não, não é de minha época esse e milhares de outros filmes, mas conheço um pouco a história do filme e de seu ator principal e, parodiando Drummond, Vicente Celestino é “uma fotografia na parede, mas como dói”. Sempre que penso nele me deprimo com a expectativa do que deveria ter sido sua rentrée triunfal no showbusiness dos anos 60. Velho e representante de um mundo que àquela altura cada vez mais desaparecia, Celestino foi convidado a participar de um programa de tv com Gilberto Gil e Caetano Veloso. Morreu horas antes.
Cantar “Coração Materno” com aquele bando de garotos aloprados. Será que ele compreenderia a cena? Imagino-o assustado, mas continuando desenvolto, com aqueles gestuais anacrônicos. Para mim, surtiria o mesmo efeito assistir a uma peça com Procópio Ferreira dirigido por Gerald Thomas.
Um dos elementos mais autênticos em filmes como “O Ébrio” é a ausência total de estabilidade na trama. O que parecia felicidade para Gilberto se consome com as novas marmotas que lhe pregam os parentes (dentre eles o humorista Walter D´Ávila, o Baltazar da Rocha da “Escolinha do Professor Raimundo”, caracterizado de idoso).
Perde a mulher, perde os amigos, assume a identidade e as roupas de um mendigo que acabara de ser atropelado. Como diz a canção título, “tornei-me um ébrio, na bebida busco esquecer... aquela ingrata que eu amava e que me abandonou... apedrejado pelas ruas vivo a sofrer... não tenho lar e nem parentes... tudo terminou...”.
O filme possui curiosidades a mil, basta ao espectador capturar as pepitas. De toda forma, o fascínio que sinto pelos astros da Rádio Nacional facilita este trabalho arqueológico. Lembro-me de, ainda pequena, passar pela rua Barata Ribeiro em Copacabana e a multidão, parada na rua, olhava pra cima. Os mais novos urravam “pula!, pula!”, os mais velhos cochichavam, no misto de pena e prazer sádico: “tadinhas, tão famosas. Ficaram malucas. Tanto ouro, tantas jóias, carros caríssimos.” Eram Dircinha e Lindinha Batista, irmãs, cantoras festejadas no Cassino da Urca e importantíssimas, hoje falecidas. Trancadas no apartamento, davam início a mais uma tentativa de suicídio.
Vicente Celestino foi-se embora, em 1968, emocionado com a homenagem dos meninos tropicalistas. Era o término do ostracismo total, que tudo deturpa e transforma o talento em fantasma pitoresco, que vaga pelas ruas, desprovido de sentido.
Na certa você não deve sequer ter ouvido falar nesse filme e nem sobre esse cantor, mas é bom saber que esse foi um dos filmes mais populares do Brasil, ficando duas décadas em cartaz e tambem o filme brasileiro do qual mais cópias se tiraram na época (500). À época do lançamento, superou com facilidade a bilheteria em Farrapo Humano, de Billy Wilder, que gerava constantes comparações por tratar do mesmo tema.
Um filme que representa uma era inteira...
O Homem Errado
3.9 97 Assista AgoraMama mia!
Não canso de ter que elogiar esse monstro chamado Alfred Hitchcock e esse seu "O homem errado" (The wrong man, 1956) comprova de modo claro essa vocação do cinema hitchcockiano de concentrar sua grandeza na elaboração formal, sondando a condição humana pela ótica católico-cristã. O argumento de O homem errado lembra, em seu núcleo essencial, o de O processo, de Franz Kafka: a imputação de culpa a um inocente, com sugestivas ressonâncias de um paralelismo com o pecado original. O andamento que Hitchcock dá ao tema, porém, o difere de Kafka, pelo relevo que o cineasta dá à fé do protagonista (brilhantemente interpretado por Henry Fonda) na economia da existência humana e na produção de um sentido para esta existência.
Entre outras leituras possíveis, O homem errado é um filme sobre a capacidade humana de suportar o sofrimento; não um sofrimento qualquer, mas o padecer da vítima inocente cujo espelho é o sofrimento do Cristo. Apesar disso, o filme de Hitchcock não é uma apologética de um carola. Hitch trabalha num registro sutil, seja na inserção de objetos simbólicos no quadro, seja fazendo a câmera assumir, em alguns momentos, a perspectiva do protagonista. Por exemplo, quando Balestrero é injustamente levado à prisão, a câmera focaliza insistentemente o chão, captando em closes os pés e as algemas, solidarizando-se com o estado de humilhação do protagonista; numa outra cena menos sutil, com Balestrero na cela, a câmera gira rapidamente, simulando a vertigem da personagem e sua indignação perplexa. Porém, uma das cenas mais significativas, e mais interessantes do filme, é a culminância do processo de enlouquecimento (ou um nome mais técnico que se dê) de Rose.
Análises à parte mereceriam a econômica e sugestiva música de Bernard Herrmann e a sombria e expressiva fotografia de Robert Burks, decisivas para estabelecer o clima pesadeloso do filme e o dilaceramento interior das personagens. O homem errado foi o único filme de Hitchcock baseado em fatos reais; muita gente levou isso em conta em suas análises, ressaltando, entre outras coisas, que o diretor inglês chegou mesmo a filmar com pessoas que viveram o drama. Particularmente, não acho relevante este fato: Hitch é artifício, forma. Filme o que filmar.
Curiosidades e Informações extras:
● Apesar de ser baseado em uma história real, Hitchcock omitiu deliberadamente algumas informações que apontavam para a inocência de Manny com o intuito de aumentar a tensão no filme.
● A cena em que Manny (Henry Fonda) é levado à prisão foi filmada em uma prisão verdadeira. Enquanto ele é levado para sua cela, um dos internos grita: "Pelo que te prenderam, Henry?". Vários presos riem após isso
● Quando a equipe foi fazer as cenas no hotel, Hitchcock permaneceu em sua limusine devido ao frio e decidiu mover a produção para Hollywood para completar o filme lá.
● Foi em O Homem Errado que, pela primeira e única vez, o diretor Alfred Hitchcock aparece falando em um de seus filmes.
● Alfred Hitchcock chegou a filmar mais uma de suas clássicas aparições em pequenas pontas para O Homem Errado, mas terminou optando por substituir tal cena pela narração do prólogo.
Só me resta gritar: ASSISTA!
Não se Preocupe, Estou Bem!
3.7 165Pode-se dizer ser um filme direto, quase sem meias palavras que escondem uma não pronunciada: mentira!
Já na primeira cena é instalado o clima de suspense, olhares dizem tudo. A mocinha (Lila) não se conforma com o inconformável e entra em uma busca de descoberta de si mesma e um clima de tensão no ar que ponteia a angustia que a talentosa Mélaine Laurent ajuda a dar credibilidade ao enredo. Inclusive, ela é a chave de tudo: vai crescendo enquanto personagem e enquanto pessoa durante o filme. Amadurece.
A direção de Philippe Lioret (também de Bem-Vindo) fala das complexas relações de família (quem é que não precisa pensar nelas?), das relações de confiança que se estabelecem – ou não – mas principalmente da capacidade subestimada de lidar com as perdas. Ora, perder faz parte da vida, é inevitável. A capacidade de superação, é inerente ao ser humano. É preciso confiar para seguir em frente.
Se eu disser algo mais, temo contar o final... Vale a pena!
Nove Canções
2.6 384Escute aqui, vou falar de um filme bastante polêmico onde aquela máxima "sexo, drogas e rock n roll?" é mostrada em seus mínimos detalhes. Um filme sobre sentimentos comuns e vividos por pessoas simples.
O filme é ambientado em Londres e conta a história de um jovem casal a partir de seu relacionamento sexual. As cenas que mostram seus encontros, de teor explícito, são alternadas a trechos de apresentações ao vivo de grupos como o Primal Scream, Black Rebel Motorcycle Club e Franz Ferdinand, entre outros.
O sexo protagonizado pelo casal é forte e bonito. Eles praticam de todas as formas e fazendo jogos. Todos os movimentos em busca do prazer são mostrados explicitamente. Os mais puritanos podem pensar que se trata de uma desculpa para se mostrar cenas pornográficas. Não é isso. É simplesmente um casal apaixonado derrubando todos os limites. Eles se divertem, transam e até brigam. Logo que acontece essa briga, Matt acaba indo sozinho para o show do Super Fury Animals. A música apresentada é Slow Life. A letra da canção retrata metaforicamente o mix de sentimentos que ele está vivendo.
Todas os acontecimentos vem pontuados pelas apresentações das bandas. Não é um filme intelectual, é simplesmente um exercício sobre os relacionamentos. A reflexão de Matt vai levá-lo a comparar sua situação com seu trabalho. Na Antártida, blocos de gelo se separam e depois trafegam em direção aos oceanos. Esses blocos chamados icebergs, ao derreterem acabam fazendo parte do mar. É justamente isso que ele viveu. O jovem inglês se separou de um bloco maior e se uniu a Lisa. Ao término, ele faz o caminho inverso e volta à sua origem. O ciclo se fecha com a apresentação da banda Black Rebel Motorcycle Club, a mesma de quando eles se conheceram.
9 canções é direcionado a um público jovem interessado em curtir a vida onde ela se faz mais comum. Rock e sexo na medida certa como fonte inspiradora da própria realidade.
Para Minha Irmã
3.3 111Algumas vezes tive vontade e oportunidade de assistir esse filme, mas a idiotice em acreditar piamente na crítica acadêmica que tacha como uma burguesa metida a intelectual, a diretora francesa Catherine Breillat que ganhou notoriedade depois de promover o astro pornô Rocco Siffredi a protagonista de Romance (1999), o seu sexto filme. Talvez por medo dos censores - que barraram Romance no mundo todo devido às variadas e ostensivas cenas de sexo - ou por maturidade mesmo, o seu filme seguinte, Para minha irmã! (À ma soeur!, 2001), veio suavizar um pouco a apelação gratuita, para penetrar de forma incisiva na psicologia adolescente.
Catherine afirma que teve a ideia do filme quando encontrou, à beira de uma piscina, uma gordinha como Anaïs, que nadava de um lado a outro, e se abraçava nos corrimãos das escadas como se namorasse um homem em um bailar carregado de pureza e inocência. A cena se repete no filme e ilustra de forma inteligente a volúpia represada da personagem. Segundo a diretora, esse é o retrato da própria adolescência, sexualmente afoita, de não querer mais ser uma criança, mas ainda sem poder seguir as regras do mundo adulto. O filme expõe a complexidade do conflito, ao apresentar uma Anaïs sem moralismo, com dignidade.
Já o lado crítico da diretora aflora na outra ponta, quando exercita a ironia ao tratar das dúvidas da irmã. O magnetizante diálogo que antecede o sexo entre Fernando e Elena, quando o rapaz gasta longos minutos para convencê-la a se entregar, é emblemático e realístico ao extremo. Ao explicar o relacionamento, Catherine pega mais pesado na questão da virgindade: Existe tanta culpa associada ao fato de querer transar, que a menina exige do parceiro palavras de amor, mesmo que ele esteja mentindo. Na verdade, ela pede que ele minta. Essa necessidade do mito do amor é um estupro psicológico
Convenhamos, não há como negar haver muita luz no pensamento da francesa. E se algumas passagens de Para minha irmã! sugerem perversidade - como quando Anaïs se esbalda com um bastão de marshmallow, símbolo fálico proposital -, o discurso geral é de uma polêmica libertária.
O grande problema do filme é o final. O caso de Elena é bem resolvido. A diretora, porém, cria uma armadilha ao propor mais questões para Anaïs do que o seu roteiro é capaz de responder. Assim, o impacto derradeiro parece mais uma solução improvisada do que realmente elaborada. Acontece que esse final já havia sido pensado desde o início. Surgiu, inclusive, quando Catherine folheava o caderno policial de um jornal, naquele mesmo momento em que viu a menina na piscina. Talvez seja o momento mais frágil de um filme muito bem controlado.
Um filme para pensar, assistir e pensar...
O Amigo Alemão
3.1 12Pensei bem antes de escrever sobre esse filme com um quê de autobiográfico.
A diretora Jeanine Meerapfel, que aqui também escreve o roteiro, é de origem alemã e nasceu na Argentina, em 1943. Com 21 anos, depois de ter cursado jornalismo, rumou à Alemanha e cursou Cinema, onde tem dirigido os seus anteriores filmes... É o fim dos anos 50, num bairro rico e respeitável de Buenos Aires. A jovem Sulamit Löwenstein (Celeste Cid), começa uma amizade com o vizinho Friedrich. Ela é filha de imigrantes alemães judeus na Argentina e ele é filho de um oficial superior nazista – um legado politico trágico de que os personagens tentam escapar durante as próximas três décadas e por aí vai tentando misturar o imisturável que resulta em uma salada insossa, sem qualquer profundidade, torcendo para que sua teia de temas mau colocados consigam arregimentar algum incauto. Não a mim.
É um filme ruim com toques de uma história obscura urdida pelos argentinos que se beneficiaram com os milhões de marcos que recheou os bolsos dos, então, mandatários dos ermanos.
Esqueça!
O Túmulo do Sol
3.7 14Um não estranho mundo aos nativos tupiniquins onde o calor, o suor, a miséria e toda uma cadeia de acontecimentos trágicos escravizam os favelados de Osaka. São figuras negativas de um mundo politicamente caótico, produtos de sucessivos desencantos e sufocados pelas contingências sociais, que se entregam ao crime, à força bruta, à lei da selva para sobreviver.
A princípio não haveria nada de novo, mas "O Túmulo do Sol" (Tiio no Hakaba) nos revela um grande estilista em Naguisa Oshima, jovem realizador da “nouvelle vague” japonesa. Sua visão do mundo moderno é dantesca, estabelecendo um paralelo da miséria humana de nossos dias com as figuras disformes de Goya, inclusive pela sua observação lírica do inevitável e pela pureza de sua simbologia alegórica: a presença eterna da natureza (o Sol), envolvendo os desatinos da humanidade ou purificando no final de um pesadelo vivido com o fogo apocalíptico.
É uma grande realização do cinema japonês, infelizmente distante do nosso sentido de observação, do nosso público.
Parece até história contada da Rocinha carioca onde dois bandos de marginais de Osaka procuram viver à sua moda, industrializando o sangue dos operários não com o pó dos morros carioca e sim, já naquela época, na fabricação de cosméticos. Contudo, as dificuldades de manter essa terrível modalidade de exploração forçam-nos a se unirem na prática de chantagem ou no comércio clandestino de identidades. O ambiente em que vivem é opressivo e gera, fatalmente, a facilidade do crime. A princípio explorando a vida humana (lenocínio, drogas, impunidade), eles passam a ser consumidos por ela. É o eterno bumerangue, é o sol que a tudo assiste e que em forma de incêndio purificará a favela e todos os atos nela praticados. E uma nova e terrível etapa se inicia.
As imagens de Naguisa Oshima são magistrais. Geralmente avermelhadas, sujas de sangue humano, elas formam um surpreendente painel negro da vida de seus personagens.
Quem sabe não tenha sido, o então jovem Naguisa Oshima, o verdadeiro arauto do mundo moderno atual e que, em 1960, apenas um sonho que encantou o mundo com a crueza insana do banditismo que, hoje, domina o Brasil?
Assista...
Planeta Fantástico
4.3 319Como encapsular esse hipnotizante e psicodélico filme de animação que ganhou o Grand Prix de Cannes de 1973 e que é um marco na animação europeia. Baseado no livro de ficção científica “Oms Em Serie” de Stefan Wul, a animação tornou-se uma obra-prima original. Lançado na França sob o título “La Planèt Sauvage” e nos EUA como “Fantastic Planet” foi imediatamente comparado com “As Viagens de Gulliver” de Jonathan Swift e “Planeta dos Macacos” (tanto o filme de 1968 quanto o livro de Boulle). Hoje o filme é visto como a prefiguração de animações como “A Viagem de Chihiro” e “A Princesa Mononoke” de Hayao Miyazaki no Studio Ghibli.
“Planeta Fantástico” é muito mais que um exemplar dessa fascinante fase Cult dos filmes gnósticos, quando a indústria do entretenimento abria espaço para estranhas e bizarras experimentações, muitas vezes sem o appeal do gnosticismo pop daquela atualidade recheada de heróis de óculos escuros, overcoats pretos brilhantes e realísticos efeitos especiais. É exemplar único e incomparável da genialidade de um realizador que teve coragem de transcender a realidade do próprio autor do original (Stefan Wu) criando, em um espaço meticulosamente pessoal, uma visão de seres fantásticos que eleva a própria visão de mundo a um patamar que mistifica a percepção.
Mas somente quem assistiu e embebedou-se com aquela realidade pode saber do que falo, portanto assista!
Minha Felicidade
3.4 45Não, não queria assistir um filme que me fizesse pensar, queria um que fluísse e me desse alguns momentos para sonhar. Mas não é assim tão simples e singelo...
A estreia de Sergei Loznitsa na ficção significa muita coisa para o cinema russo. Um pouco pelo fato de "Minha Felicidade" não ser simplesmente um filme sobre inquietações e necessidades artísticas, mas antes um registro de desejos e preocupações estéticas muito claras e delicadas diante de determinado estabelecimento político e cultural de seu país. É um filme de lá, e, assim como foi feito, só de lá poderia ser. A barbárie não é tanto a virtualização do passado (com aquela história que se passa na iminência do stalinismo, no calor da Segunda Guerra), mas muito mais a corrosão de utopias plenamente angariadas pelos sociais (o povo). A história do caminhoneiro que se perde nas estradas e passa um longo tempo topando com toda sorte de andarilhos é também uma história do horror. No entanto, o grande trunfo de Loznitsa consiste em negar a perplexidade ao espectador tirando-lhe do choque pelo choque e colocando-o num impasse sem amortizar seu olhar: seu filme é uma luta por imagens ou imagens de uma luta?
Ora, no final fica claro que esta pergunta oferece uma objeção óbvia, pois o filme pode ser os dois.
Os tempos se misturam, o passado se confunde com o presente, a violência, que é aquela das coisas cotidianas, entrelaça as experiências dos personagens com uma crueza hiper-realista (e é assim no sentido de que na própria mentira que é o cinema, aproxima-se das vivências deles, deixa que se exponham sem se revelarem inteiramente; há muito caminho a perscrutar, há a dor e só dela mesma pode nascer uma utopia). "Minha Felicidade" se permite afogar as saídas, as soluções e as respostas. Ele transita entre o real e a possibilidade de transgredi-lo: não existem ambições para além daquelas que as imagens demandam. Há o plano, o enquadramento, o travelling e a panorâmica. A fissura, assim como a ruptura que a história vai fazendo, molda a perspectiva do espectador sem domesticá-lo. O filme, diga-se, opera na autonomia das relações e na prisão delas mesmas. As contradições políticas (algo que não aparece como ordem discursiva, mas antes como reforço estético da própria imagem de uma Rússia desencontrada) transbordam a atualidade do tema, o reflexo de uma guerra francamente aberta transa com as guerrilhas do presente (sem essa de mostrar a perversidade do sistema, como se o problema do mundo fosse algo alheio a ele). Há mais em jogo, coisas melhores e substanciais.
Essa vontade de filmar o tempo como o movimento contínuo e inacabado dos corpos está não só na conexão dos períodos históricos, mas na própria expressividade estética do filme. É com frequência que a tela mostra acontecimentos distintos preenchendo o mesmo plano (câmera estática que registra os espaços sendo tomados), numa espécie de split screen invertido, no qual um objeto ou mesmo um corpo divide a tela enquanto duas ações protagonizam coisas distintas, quase como era feito no travelling invertido dos Lumière nos primórdios das imagens em movimento, quando não era a câmera que saia do lugar, mas os objetos e os personagens que invadiam e deixavam o plano. Se o sistema político é corrupto (ou no mínimo corruptível), a polícia e o exército são agentes reprodutores dessa corrupção, pois são poderes do Estado. Mas a sociedade civil é também corrupta, logo temos algumas dificuldades. A violência de Minha Felicidade é mais essa atribulação sistematizada que reproduz um veneno do que o sangue puro que escorre na neve.
Pois é, não foram 122 minutos fáceis e eu não sonhei!
O Ladrão do Arco-Íris
3.1 13Foi na Inglaterra em 1990 que o diretor Alejandro Jodorowsky rodou o considerado, por muitos, o seu filme mais comercial. O longa decepcionou os fãs mais radicais do cineasta por apresentar uma trama mais acessível ao grande público e com muito menos simbolismos religiosos, que são considerados sua marca registrada. Parte dessas diferenças entre este e os trabalhos anteriores de Jodorowsky pode ser atribuída ao roteiro, que, pela primeira vez, não é assinado pelo próprio. No entanto, ainda assim o longa possui muitos elementos de seu cinema, que podem ser facilmente encontrados em outras obras suas como "El Topo" e "A Montanha Sagrada", apesar do uso de uma linguagem bem menos surrealista que estes e quase nenhuma violência, mas ainda com situações absurdas e bem humoradas.
No elenco nomes de peso, protagonizado por Peter OToole e Omar Sharif, a mesma dupla da obra-prima "Lawrence da Arábia" (1962), de David Lean, e "A Noite dos Generais" (1967), de Anatole Litvak, contando ainda com uma pequena participação de Christopher Lee, que, numa das melhores sequências, logo no início do filme, nos remete a trabalhos do espanhol Luis Buñuel, como "O Discreto Charme da Burguesia" (1972), onde o diretor satiriza as excentricidades de milionários e burgueses.
Jodorowsky não deixa de fazer suas ponderações sobre a vida e o universo se utilizando, dessa vez, de palavras ao invés de imagens. Apesar da linguagem bem mais convencional de O Ladrão do Arco-Íris, o diretor concentrou todo o seu trabalho nos diálogos e nas interpretações dos atores, principalmente de Omar Sharif. Mantendo aí as suas indagações e lições sobre o que nos rodeia e aquilo que se encontra dentro da alma.
Foi seu último trabalho.
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Assista em meu blog com informações extras, em tempo, o filme não foi lançado no ano de sua produção e sim em 1994 na França e em 1996 no Brasil.
A Ilha
3.6 42 Assista AgoraTalvez o grande público não venha amar esse filme onde a violência do sexo é a razão de viver de uma mulher misteriosa que decidiu deixar de falar. Isolada numa ilha bordel onde conforta os pescadores, vai entrar numa relação de submissão e horror quando salva um suicida.
Um dos filmes surpresa de Cannes 2000, muito embora o seu realizador, Kim Ki-Duk, seja uma estrela de primeira grandeza em toda a Ásia e «A Ilha / O Bordel do Lago» seja a sua terceira longa metragem de grande sucesso. Depois de perder a inocência, uma mulher deixa de falar. Como um pássaro numa gaiola, vive numa ilha num sítio remoto onde dá bebidas aos pescadores e os consola, juntamente com outras mulheres, nas horas de aborrecimento. Esta ilha é uma ilha especial. Pequenas casas flutuam no lago que a circunda e permitem aos homens transformar em realidade as suas mais estranhas fantasias sexuais.
E como ponto final de relevância é preciso saber que o filme não tem diálogos. O uso da metalinguagem insere-se no âmago do estilo de Kim Ki-Duk mantendo a fala reservada exclusivamente às personagens secundárias, excepto em alguns títulos, como em “A Samaritana”. O cineasta utiliza o silêncio para demonstrar a inocência das personagens, como se estivessem dentro de uma bolha invisível que os protege do mundo exterior, apenas quebrada se as personagens escolherem sair para esse mundo, impuro e caótico. No caso deste filme o silêncio das personagens sugere, também, a simplicidade na forma de comunicar, como se as coisas mais importantes da vida passassem por uma comunicação pura, de movimentos subtis e graciosos, no fundo, simplificando a comunicação a um nível mais emocional e sincero.
Uma história profundamente tocante recomendada a todos sem excepção. Uma experiência verdadeiramente única.
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O filme está em meu blog.