Foi nos anos 90 que Todd Solondz construiu sua reputação de diretor excêntrico e corrosivo com dois filmes, "Bem-vindo à casa de bonecas" e "Felicidade", com personagens completamente desprovidos de qualquer previsibilidade. Passaram-se quase 20 anos para que ele voltasse em grande estilo com este "Wiener-Dog". Este não é um filme para todo espectador, mas, sinceramente, me parece aquele tipo de obra que pode ser, mais do que excêntrica, extraordinária.
Solondz seleciona um cão da raça dachshund (no Brasil, o conhecido "linguicinha") que ajuda a entrelaçar algumas histórias. Na primeira, um pai, Danny (Tracy Letts), traz a seu filho Remi (Keaton Nigel Cooke), que acabou de enfrentar um câncer, um cãozinho fêmea dessa raça. No entanto, ela deve ser castrada, o que rende conversas difíceis de Remi com sua mãe, Dina (Julie Delpy).
Na segunda história, o cão descobre uma segunda dona, a enfermeira veterinária Dawn Wiener (Greta Gerwig), o mesmo nome da personagem de "Bem-vindo à casa de bonecas". Ela, determinado dia, encontra um antigo interesse de escola, Brandon (Kieran Cullkin), com quem sai de viagem para Ohio, onde encontrará Tommy (Connor Long), e April (Bridget Brown). Sempre com o cão a tiracolo.
Na terceira história, Danny DeVito é um roteirista de cinema, Dave Schmerz, que dá aulas numa universidade e circula com seu cão para cima e para baixo, em meio a uma vida de solidão, à espera de notícias de novos trabalhos, para, finalmente, na quarta, vermos Nana (Ellen Burstyn, lembrando imediatamente "Réquiem para um sonho"), uma idosa, receber a visita de sua neta Zoe (Zosia Mamet), acompanhada seu namorado Fantasia (Michael Shaw, engraçado).
Além do roteiro bem desenvolvido por Solondz, com atos que não se diferenciam em demasia, sem recorrer a truques, a não ser um intervalo como se o cão participasse de um videoclipe, "Wiener-Dog" apresenta um elenco multiestelar, todos em grande momento, desde Delpy e Gerwig, passando por Culkin e DeVito, até Burstyn. Todos estão excepcionais, sem exceção. Especialmente Gerwig e DeVito entregam atuações de colocar o espectador em suspensão.
O diretor de fotografia é Edward Lachmann, responsável por imagens de "Carol" e "Longe do paraíso", ambos de Todd Haynes, e "As virgens suicidas", de Sofia Coppola, com o qual guarda semelhanças estéticas. Tudo é multicolorido, mesmo que a realidade seja fora desse tom vibrante. O cão simboliza a aventura dos personagens ou sua solidão ao longo da América. "Clair de Lune" é usada para fazer um contraponto à sua presença incômoda por vezes, em determinado momento.
"Wiener-Dog" é estranho e, ao mesmo tempo, inserido no cotidiano. É sarcástico e pesado e, ainda assim, muito humano. É sensível sem cair na pieguice. É mesmo reflexivo, quase uma aula de como fazer cinema com uma ideia simples e sem soar pretensioso. Trata da vida e da morte, dos laços feitos e desfeitos, de mágoas guardadas ou sonhos a serem atingidos. Dentro de seu humor corrosivo, é também um dos mais engraçados a que assisti nos últimos anos.
Após assistir ao filme mais recente de Gus Van Sant, vaiado no Festival de Cannes, quando exibido no ano passado, tive aquela mesma curiosidade que, às vezes, tenho e não deveria: ver qual seria a média de aprovação dessa obra no Rotten Tomatoes. Obviamente, os 9% de aprovação não me surpreenderam, afinal os críticos reunidos lá são considerados os mais representativos.
O roteiro de Chris Sparling certamente é o alvo da maior parte das críticas, com suas simbologias orientais. Arthur Brennan (Matthew McConaughey) é um professor de ciências que parte para o Japão, a fim de cometer suicídio em Aokigahara, à margem do Monte Fuji. Lá, ele encontra Takumi (Ken Watanabe), que lhe conta ter perdido o emprego. Logo, o desentendimento inicial se transforma numa aproximação de duas culturas diferentes. E, nisso, vêm à tona histórias sobre Joan (Naomi Watts), esposa de Arthur. Tudo é uma grande representação do processo de depressão que atravessa o filme de ponta a ponta, seja nas imagens da floresta, seja em como os personagens vão se machucando, como se buscassem o autoflagelo, e enfrentam uma inundação, como num renascimento. Ele se sente mais perto de "Inquietos", em que Van Sant mostrava a obsessão da juventude pela morte e pelo luto, sendo menos acessível em alguns pontos.
Claro que a crítica representativa enxergou na obra uma maneira de tripudiar sobre seus flashbacks e seu tom dramático (é a mesma que viu em "Old joy", muito parecido com este, espetacular). É muito fácil isso quando o Van Sant mais elogiado é o minimalista (e por vezes tedioso) de "Últimos dias" e "Gerry". Mas "The sea of trees" também é excessivamente fácil para quem deseja um novo "Elefante" ou "Paranoid Park", em que o processo de luto era mais subjetivo. Este, porém, é o diretor que também fez peças entre o indie e o comercial, a exemplo de "Gênio indomável", "Encontrando Forrester" e "Garotos de programa". E a crítica em geral sequer ter visto as grandes atuações de McConaughey, Watts e Watanabe, principalmente do primeiro, em mais uma jornada feliz, parece acima de tudo de grande injustiça. O filme tem momentos realmente sentimentais e revigorantes e mostra como "Livre" poderia ter sido um grande filme não se excedesse nos flashbacks. E temos o acerto na fotografia de Kasper Tuxen, com mínimo de cores e ainda assim atrativa.
O cineasta dinamarquês Nicolas Winding Refn pode ser visto como um dos mais polêmicos hoje em dia. Não que a sua trajetória se inscrevesse com essa qualidade em "Drive", filme com Ryan Gosling posando de dublê de cenas com carros em Hollywood, mas principalmente por causa do filme seguinte, "Apenas Deus perdoa", com sua violência literal nas ruas de Bangkok. Este segue sua filmografia anterior a "Drive", como em "Bronson", filtrado por "Laranja mecânica", porém, sobretudo, os filmes da saga "Pusher", com uma violência ainda mais intensa. "Drive", sob qualquer ponto de vista, ainda é um divisor de águas em sua carreira: com seus sintetizadores emulando os anos 80, nas notas de Cliff Martinez, repercutiria no filme seguinte, e agora em "Demônio de neon", agora desprovido de qualquer romantismo.
Não por acaso, o novo filme de Refn se situa entre o suspense e o terror. A sua principal influência é muito clara: "Suspiria", a obra-prima de Dario Argento, dos anos 70. Se naquele filme uma estudante de dança chegava a uma academia alemã de influências sobrenaturais (que se tornaria mais real em "Cisne negro"), em "Demônio de neon", Elle Fanning interpreta Jesse, uma menina de 16 anos que vem do interior, sem pais, para fazer carreira de modelo em Los Angeles. Ela primeiro faz uma sessão de fotos com o Dean (Karl Glusman, de "Love"), onde conhece a maquiadora Ruby (Jena Malone). Em seguida, ela apresenta o book a uma agência de modelos, tendo à frente Roberta Hoffman (Christina Hendricks). A maquiadora, numa festa, a apresenta a suas duas amigas, Sarah (Abbey Lee) e Gigi (Bella Heathcote). Claramente, Refn posiciona Jesse como uma espécie de Alice no país das perdições, com seu figurino de moça inocente e ingênua. Em seu encontro com Dean, numa colina de Los Angeles, à luz do luar, ela diz não ter outros atributos a não ser a beleza. E é essa lua que antecipa o verdadeiro horror de "Demônio de neon". Hospedada num hotel, clara referência a "Psicose", em seus letreiros, em que o gerente, Hank (Keanu Reeves), age de forma pouco convidativa a conversas e como um cafetão, Jesse é uma espécie de personagem de Naomi Watts em "Cidade dos sonhos". Basta reparar na maneira como Refn retrata as cores de seu quarto. Ela pertence a um universo da fantasia. Nesse universo, oposto ao real, ela se sente em casa. No entanto, quando passa, a partir de um desfile para o designer de moda Robert Sarno (Alessandro Nivola), a ser uma das preferidas do mundo da moda, suas antigas conhecidas passam a vê-la ainda mais como uma ameaça. Elas não têm o que conversar entre si: enquanto as antigas modelos falam em plásticas e sexo, Jesse tenta emular uma vida que nunca teve.
Naturalmente, "Demônio de neon" tem um objetivo muito claro: ser uma crítica ao universo da moda. Parece fazê-lo de modo simples, quando na verdade percebe-se que Refn atinge seus detalhes e nuances de modo mais indireta. Os símbolos, como o da lua ou do gato selvagem, e mesmo de três triângulos em neon (que representam a passagem de Jesse para outro universo, como o cubo de "Cidade dos sonhos"), ou de Hank como uma representação do falo masculino, são uma síntese da personagem. O personagem Dean é uma espécie de príncipe encantado, a figura certamente mais despretensiosa do filme, enquanto os outros personagem observam Jesse como se ela fosse uma vítima a ser perseguida - e Refn constrói essa tensão por meio de olhares, sobretudo da personagem da maquiadora em relação a ela. Ou vejamos a maneira como o fotógrafo Jack (Desmond Harrington) a olha durante a sessão de fotos, em que a configuração visual remete a "THX 1138", de George Lucas. A obsessão pela juventude é tão perturbadora quanto em "Fome de viver", filme dos anos 80 com David Bowie e Catherine Deneuve.
Refn tem um interesse em aproximar o universo da fotografia e da modo de um universo cadavérico. Para ele, as pessoas estão sempre fazendo poses, imóveis ou querendo ser invisíveis, como se fossem, como diz Gigi, em determinada altura, fantasmas. Gigi também pergunta a Jesse como é ser o sol num dia de inverno, e, ao final, sua metáfora parece justamente se mostrar ao contrário. E, mesmo Jesse sendo uma pessoa real, sua fachada sempre lembra uma fina camada de porcelana; é como se, de fato, fosse uma boneca humana. Refn a aproveita aqui, muitas vezes, como Coppola o faz em "Virgínia".
O que se pode dizer é que "Demônio de neon" atravessa uma linha que poucos filmes se arriscam a fazer. Não apenas o roteiro de Refn, em parceria com Mary Laws e Polly Stenham, é enigmático, como ingressa, em seus 20 minutos finais, em situações nas quais o cinema pouco pisou, sob uma perspectiva mesmo histórica. É quando Refn mais se mostra desagradável como em vários momentos de "Apenas Deus perdoa" e, justamente, consegue arrematar sua visão sobre o mundo da moda e do que se considera belo. Seu filme é construído com uma fotografia perfeccionista de Natasha Braier ("The Rover"), com cada tiro lembrando uma pintura, e ainda assim o que ele tem a trazer aqui é que, por baixo de toda a beleza, há doença e uma terrível desesperança. Nesse sentido, é um filme mais melancólico do que "Drive" e "Apenas Deus perdoa", que ainda lida com certos elementos românticos. Em "Demônio de neon", é como se Refn admitisse que não há espaço para nenhuma idealização, representada por Jesse, principalmente num universo em que ela é uma estranha, mesmo parecendo ser bem recebida. É como se ela entrasse num bosque do qual não pode voltar justamente no momento em que se depara com os triângulos de neon.
Como Jesse, Elle Fanning está excepcional, mostrando como a atriz de "Super 8" e "Um lugar qualquer" realmente tinha um talento especial, mas é Malone, Lee e, principalmente, Heathcote que conseguem lidar com papéis difíceis. Karl Glusman é um ótimo ator aqui, também, assim como Keanu Reeves faz uma boa participação especial (lamentando-se que Hendricks tenha apenas uma cena).
Entende-se perfeitamente que o espectador não goste deste filme ou se sinta mesmo revoltado com suas premissas, mas é inegável que Refn consegue avançar num terreno que se mostrava inexplorado talvez desde David Lynch em "Twin Peaks - Os últimos dias de Laura Palmer", também, como ele, vaiado em Cannes. No filme de Lynch, tão surrealista quanto este, a ameaça à personagem central se dava de maneira tão contundente que de uma série bem-humorada o espectador passava a um ambiente bem mais próximo do horror e do assustador. Esta parece ser a mesma trajetória visualizada por Jesse. De qualquer modo, Refn não esclarece direito quem seria essa personagem, assim como o motorista de "Drive". Não há nela um sentido de humanidade exato. Ela está durante toda a história entre a realidade e o sonho, e sua realidade é permeada de comportamentos estranhos. Este não é um filme fácil; pelo contrário, é perturbador, pois entrega algo totalmente diferente do que aparenta por suas imagens belíssimas.
"Duna" sempre vai atrair alguns argumentos: o filme não está à altura da carreira de David Lynch; a adaptação que Jodorowsky teria feito seria melhor; e foi uma má adaptação do romance de Frank Herbert. Tendo sido levado ao livro por causa do filme de Lynch, eu acredito que o cineasta americano o adaptou com esforço. Ele é fiel em muitos aspectos (principalmente na versão estendida de 3 horas não assinada pelo diretor) e ficaria feliz se Lynch entregasse seu corte, o que dificilmente, hoje, irá acontecer. Ele tem muitos elementos que Lynch usaria mais tarde em sua trajetória, em filmes como "Veludo azul", "Twin Peaks", "A estrada perdida" e "Cidade dos sonhos" (sugiro a quem diz o contrário ver que muitas simbologias de "Duna" estão nesses filmes). Em segundo, nunca saberemos se a versão de Jodorowsky seria melhor (fica no "se", o que não funciona no cinema); certamente seria mais surrealista, mas não que seria melhor. O filme é um trinfo de design de produção e figurinos, além da trilha sonora do grupo Toto, e, apesar dos efeitos visuais irregulares, possui uma força especial. Kyle MacLachlan está ótimo no papel principal, assim como o elenco de apoio faz uma boa participação (principalmente McMillan como o vilão). A versão de Lynch possui uma segunda metade muito apressada; a versão estendida, neste caso, é a mais indicada. No entanto, isso não tira do filme o status de ser um dos mais subestimados da história do cinema.
O diretor canadense Atom Egoyan tem tido dificuldades de se afastar dos seus sucessos de crítica dos anos 90, como "O doce amanhã". O resultado é que seus últimos filmes são recepcionados como notórias decepções, mesmo sendo de qualidade às vezes muito acima da média. Nos anos 2000, embora "Ararat" tenha a trama mais conturbada, foi o que melhor foi recebido, quando seus outros filmes, como "Verdade nua" e "Chloe - O preço da traição" são muito interessantes. Mais recentemente, em 2014, ele apresentou o subestimado "À procura".
Como "À procura", "Memórias secretas" teve uma recepção bastante fria em Cannes, sem receber nenhum destaque. Cristopher Plummer vem à frente do elenco, numa atuação extraordinária, que o faz ser cotado para as próximas premiações. Ele interpreta Zev Gutman, um senhor de idade, com quase 90 anos, que mora num asilo, com demência, caracterizada pelos esquecimentos (entre os quais, de que sua esposa faleceu). Lá, ele é amigo de Max Rosenbaum (Martin Landau, quase irreconhecível), que lhe escreve uma carta-guia para que possa procurar o homem que matou sua família em Auschwitz. Zev, então, mesmo com todos os lapsos de memória, vai atrás de sua vingança particular, dele e em nome do amigo que está impossibilitado de sair do asilo - e, para isso, precisa comprar uma arma.
Com uma fotografia muito bela de Paul Sarossy, iluminando os cenários quase naturalmente e com movimentos de câmera claramente inspirados por Emmanuel Lubezki, sobretudo em sua parceria com Malick, "Memórias secretas", como outros filmes de Egoyan, guarda alguns temas em comum: o conflito entre o presente e o passado, a busca por vingança (explicada quase sempre em bases históricas e culturais, como no quase esquecido e belo "Adoração") e a exasperante solidão de um homem. Este é um personagem já visto em outros filmes de Egoyan, com um grito de dor quase sufocado, ainda despreparado para seu presente e em relação a seu futuro. Zev é um personagem que faz o filme andar de ponta a ponta, em razão da competência de Plummer para compor gestos mínimos e profundos. Para ajudar a compor seu drama, é fundamental a trilha sonora de outro habitual colaborador de Egoyan, Mychael Danna. Ele lança as notas a cada passo dado pelo personagem, como se compusesse uma atmosfera de jornada pessoal.
Impressiona como Egoyan consegue partir de um drama pessoal - de um homem de idade sufocado pelas memórias - para uma espécie de road movie de investigação e perseguição. Alguns classificam o filme como thriller, mas talvez não o seja exatamente: ele se sustenta mais na base dramática que evoca o drama da Segunda Guerra que não pode ser esquecido. Há uma passagem do filme que mostra um determinado personagem capaz de remeter o espectador aos conflitos provocados pelo nazismo e cenas capazes de remeter ao melhor Egoyan. Há também comparações feitas da trama com "Amnésia", de Cristopher Nolan, e talvez haja algumas semelhanças, principalmente porque o personagem está sempre preso a hotéis em sua viagem e em embate com sua memória. No entanto, parece que Plummer, nessa viagem para vingar os familiares, parece estar em um drama profundo sobre a busca pela identidade que se perdeu. E, apesar de considerar o final do terceiro ato um tanto apressado e expositivo em excesso, fica difícil negar que Egoyan novamente conseguiu um belo acerto.
Alguns filmes adquirem, de um momento para outro, uma determinada importância que os fazem ser assistidos com mais ou menos expectativa. Alguns correspondem a ela, outros não. Quando o também ator Tom McCarthy (ele está na série Entrando numa fria, como um dos cunhados de Robert De Niro), realizou, por exemplo, O homem da estação, ainda era um cineasta em início de trajetória, e Vencer ou vencer mostrou sua sensibilidade, por meio da bela atuação de Paul Giamatti, enquanto Trocando os pés trouxe mais um Adam Sandler de rotina, mas com Spotlight ele acaba chamando a atenção para si e para o elenco que atrai para esta história baseada em fatos reais.
Às vezes, lembra O lobo de Wall Street pela bateria de diálogos rápidos (Pitt tentou, lembremos, comprar os direitos e fazer esse filme), assim como uma excelente obra dos anos 90, chamado O sucesso a qualquer preço. E é interessante como todos os atores envolvidos no projeto já participaram de filmes com uma sátira ou crítica ao chamado capitalismo (mesmo Gosling fez Lost river, que trata também de pessoas sendo desalojadas e não deixa de ser uma metáfora da bolha financeira de 2008). Mas aqui não há o talento de Martin Scorsese quando, em O lobo de Wall Street, desmontou esse universo com o auxílio da atuação de DiCaprio. Havia mais foco na maneira como se dava esse olhar, e os personagens eram caricaturais, sem nenhum moralismo, quando aqui pelo menos o personagem de Pitt aparece para dizer palavras capazes de mostrar os verdadeiros erros. É interessante como McKay, um diretor de comédias, acaba levando mais a sério e querendo demonstrar com dados e definições de conceitos esse universo. Tudo é entregue para que o espectador possa selecionar as partes capazes de deixar o panorama mais claro; às vezes não fica, mas o elenco se esforça. Mesmo com todas as falhas, ainda há mais virtudes em A grande aposta e uma real vida nas atuações, sem a neutralidade forçada e esforçada, por exemplo, de um Spotlight. Nisso, a fotografia de Barry Ackroyd, apesar de lembrar bastante a da série The Office (com Carell), e outras séries, diga-se de passagem, oferece um movimento ininterrupto e capta melhor os cenários, seja do centro de Nova York, dos escritórios ou de Las Vegas. A grande aposta acaba tendo como referência uma dissolução interessante de gêneros no fim das contas, além de contar com um elenco estelar em grande forma, apesar de alguns não terem o tempo necessário para poderem brilhar, talvez mesmo porque não quisessem, com a consciência de que o roteiro e a visão sobre o colapso financeiro e suas consequências até hoje, inclusive seu reaproveitamento sob outras formas, conta mais para o espectador ter consciência sobre o tema.
Brooklyn é muito mais otimista do que outros filmes de imigração, mesmo contendo uma melancolia em sua superfície – que Crowley não eleva a certo material excessivamente emotivo. Falta, com isso, uma espécie de empuxe dramático ou emocional à direção, principalmente porque conta com uma excelente Ronan e as participações de Emory Cohen e Domhnall Gleeson, como Jim, que mora na Irlanda. Em nenhum momento, a história aponta para algum conflito que pudesse lembrar o de Madame Bovary: os personagens parecem estar apenas à espera do que o roteiro já promete de antemão. Nesses anos 1950 de Crowley, parece que não há conflitos nem a Segunda Guerra Mundial é tão recente; não há interesse por escombros e reconstrução de um passado, apenas a tentativa de uma jovem encontrar seu amor e contrabalançar sua vinda para a América com a culpa de ter deixado seus pais e sua irmã. Há um problema bastante perceptível na estrutura de Brooklyn: sua montagem é muito apressada, não dando espaço à construção dos personagens, como o do padre Flood, embora as motivações da personagem sejam interessantes e bem arquitetadas para o espectador. Eles permanecem apenas figuras dispersas, sem uma real contribuição para a história de Eilis. Tudo parece harmoniosamente clássico, como Carol, minando um pouco as situações nas quais poderia haver mais drama ou humor.
Logo depois de receber o Oscar por "Birdman", Alejandro G. Iñárritu aposta todo o seu talento em "O regresso", baseado num livro de Michael Punke. Leonardo DiCaprio interpreta com grande eficácia o explorador e caçador de peles Hugh Glass, que em 1823, depois de uma fuga a indígenas, é atacado por um urso (esta é uma das cenas, sem exagero, mais impressionantes já feitas) e fica com o corpo completamente ferido. Sua equipe, tendo à frente Andrew Henry (Domhnall Gleeson), hesita em deixá-lo para trás. Henry ordena que dois de seus homens, John Fitzgerald (Tom Hardy) e Jim Bridger (Will Poulter), possam cuidar dele até que se busque ajuda. Além disso, Glass tem um filho de origem também indígena, Hawk (Forrest Goodluck). Este fio de narrativa é explorado até o limite por Iñárritu e o corroteirista Mark L. Smith. Já em "Birdman", o diretor mexicano já conseguia expandir uma ideia a princípio simples para um longa substancialmente potente.
Se às vezes a narrativa diminui de intensidade, Iñárritu mostra uma perícia insuspeita e um traço eclético, com um filme totalmente diferente, no seu tom e metragem, de "Birdman" e mesmo de seus projetos anteriores, como "Babel" e "21 gramas". Com um olho muito poético, ele consegue transformar o sofrimento de um homem na natureza como se ele fosse parte dela, dependente para dormir e comer (significativa a passagem em que ele precisa evocar Han Solo em "O império contra-ataca"). É um filme essencialmente sobre sobreviver e poder refazer a trajetória pessoal e, nesse sentido, "O regresso" é poderoso mesmo quando não consegue aliar as ideias concretas com algumas mais abstratas. Há uma presença religiosa nessa tentativa de Glass confrontar seus próprios limites, e as imagens que remetem a sinos e pirâmides se intensificam em suas lembranças. É visível também a presença, em alguns quadros, de Herzog, sobretudo aquele de "Fitzcarraldo" e "O sobrevivente". Junto a isso, é um filme com um punhado de cenas executadas com perfeição e que cresce na lembrança, principalmente quando alterna os motivos existenciais que perduram na narrativa.
Abrahamson é um grande diretor de atores, como já mostrou em seus projetos anteriores, e aqui não é diferente. Larson, depois de ótimas participações em Anjos da lei, Temporário 12 e O maravilhoso agora, tem a grande oportunidade de sua carreira, trabalhando com nuances já reveladas nesses dois últimos filmes. Por sua vez, Tremblay é não menos do que excepcional com um roteiro bastante difícil, diante da situação. São raros os atores mirins que conseguem proporcionar uma emoção verdadeira como a dele. Num duo com Larson, no papel de uma mãe que teve sua vida desconstruída depois de ser enganada por um homem que tentava ajudar, Tremblay sustenta alguns dos grandes momentos de atuação (e DiCaprio deve ficar tranquilo ao não tê-lo como concorrente ao Oscar).
O mais interessante é como Abrahamson adota o ponto de vista dele a fim de que o espectador tenha o seu sentimento pela mãe. Ele se indaga sobre o que acontece em sua vida, mas a rotina é tão forte que ele parece não perceber o que está passando ao seu redor. O quarto se torna, então, seu universo, no qual imagina cada circunstância do que vier a acontecer em sua vida (e as sequências iniciais, nesse sentido, sintetizam a narrativa).
Abrahamson é um grande diretor de atores, como já mostrou em seus projetos anteriores, e aqui não é diferente. Larson, depois de ótimas participações em Anjos da lei, Temporário 12 e O maravilhoso agora, tem a grande oportunidade de sua carreira, trabalhando com nuances já reveladas nesses dois últimos filmes. Por sua vez, Tremblay é não menos do que excepcional com um roteiro bastante difícil, diante da situação. São raros os atores mirins que conseguem proporcionar uma emoção verdadeira como a dele. Num duo com Larson, no papel de uma mãe que teve sua vida desconstruída depois de ser enganada por um homem que tentava ajudar, Tremblay sustenta alguns dos grandes momentos de atuação (e DiCaprio deve ficar tranquilo ao não tê-lo como concorrente ao Oscar).
O mais interessante é como Abrahamson adota o ponto de vista dele a fim de que o espectador tenha o seu sentimento pela mãe. Ele se indaga sobre o que acontece em sua vida, mas a rotina é tão forte que ele parece não perceber o que está passando ao seu redor. O quarto se torna, então, seu universo, no qual imagina cada circunstância do que vier a acontecer em sua vida (e as sequências iniciais, nesse sentido, sintetizam a narrativa). Sua distância do sequestrador é definidora para esta questão, e Abrahamson, como em Frank, deixa a critério do espectador identificar o modo como seu personagem vai evoluindo, principalmente num nível psicológico (e naquele filme o diretor contava com um ótimo Michael Fassbender escondido por baixo de uma máscara). Antes desse seu filme reconhecido, ele havia mostrado um homem solitário que trabalha num posto de gasolina em Garage, certamente um dos filmes mais incisivos sobre o isolamento de alguém em relação à sociedade e, ao mesmo tempo, muito comovente.
Neste plano de análise sobre uma solidão (esta imposta por outra pessoa), O quarto de Frank dialoga de forma hábil tanto com Frank quanto com Garage, mostrando um estilo pessoal. Danny Cohen, colaborador habitual de Tom Hooper, apresenta um trabalho de imagens menos elaborado se compararmos com A garota dinamarquesa, mas deve-se destacar que ele pode trabalhar com diálogo entre cenário e figurino sempre com as mesmas cores, menos, digamos, pictórico. Ainda assim, sua presença por trás da câmera ajuda a captar de modo delicado o drama de mãe e filho, trabalhando com detalhes e enquadramentos.
Logo depois de receber o Oscar por Birdman, Alejandro G. Iñárritu retoma sua filmografia com O regresso, baseado num livro de Michael Punke. É interessante como o diretor mexicano partiu de Amores brutos, uma espécie de releitura da violência de Tarantino, principalmente de Cães de aluguel e Pulp Fiction, com suas histórias cruzadas, para um messianismo de culpa em 21 gramas e um épico intimista em Babel. Logo em seguida, parece que Iñárritu buscou suas fontes originais e fez Biutiful, uma obra em que Javier Bardem tinha uma grande atuação, mas era prejudicada por certos problemas de narrativa, apesar da bela fotografia.
Nos últimos anos, o diretor David O. Russell se tornou uma aposta praticamente certa para o Oscar. Ele conseguiu que três filmes seguidos seus – O vencedor, O lado bom da vida e Trapaça – fossem indicados ao Oscar de melhor filme e de melhores atuações principais, pouco lembrando o início de sua carreira, quando fez projetos mais independentes – embora com elencos estelares – como Três reis, uma sátira de guerra, e Huckabees – A vida é uma comédia. Tudo indicava que com sua estrela favorita, Jennifer Lawrence, e seu ator favorito, Bradley Cooper, com Robert De Niro de coadjuvante, também presente em seus filmes mais recentes, Joy – O nome do sucesso se tornasse novamente um candidato para a Academia de Hollywood.
Logo depois de receber o Oscar por "Birdman", Alejandro G. Iñárritu aposta todo o seu talento em "O regresso", baseado num livro de Michael Punke. Leonardo DiCaprio interpreta com grande eficácia o explorador e caçador de peles Hugh Glass, que em 1823, depois de uma fuga a indígenas, é atacado por um urso (esta é uma das cenas, sem exagero, mais impressionantes já feitas) e fica com o corpo completamente ferido. Sua equipe, tendo à frente Andrew Henry (Domhnall Gleeson), hesita em deixá-lo para trás. Henry ordena que dois de seus homens, John Fitzgerald (Tom Hardy) e Jim Bridger (Will Poulter), possam cuidar dele até que se busque ajuda. Além disso, Glass tem um filho de origem também indígena, Hawk (Forrest Goodluck). Este fio de narrativa é explorado até o limite por Iñárritu e o corroteirista Mark L. Smith. Já em "Birdman", o diretor mexicano já conseguia expandir uma ideia a princípio simples para um longa substancialmente potente.
Claro que tudo poderia ser diferente se não fosse a fotografia de Emmanuel Lubezki, repetindo a parceria com o diretor que lhe deu o Oscar também da área em "Birdman". Lubezki repete aqui algumas projeções já vistas em "O novo mundo", de outro parceiro seu, Malick, mas desta vez evocando um Oeste selvagem e gelado (as paisagens são do Canadá, da Argentina e dos Estados Unidos), com uma caçada imprevisível e contínua, evocando outros faroestes, como "Quando os homens são homens", de Robert Altman, "Dança com lobos", de Kevin Costner, e principalmente, pela grandiosidade das paisagens e pelo panorama dado a elas, "O portal do paraíso", de Michael Cimino. Impressiona, mais do que tudo (inclusive do que a atuação extremamente física e sofrida de DiCaprio), a maneira como o diretor transporta o espectador para os cenários, uma extensão da realidade. Não apenas as cenas são violentas, como o diretor parece ter construído uma maneira de lançar o espectador em meio a ela (como nas cenas de tiros e flechas dos índios). Todos os movimentos de câmera de Lubezki apanham os personagens em movimento, como se eles estivessem próximos, uma qualidade que já era vislumbrada em "Birdman".
Se às vezes a narrativa diminui de intensidade, Iñárritu mostra uma perícia insuspeita e um traço eclético, com um filme totalmente diferente, no seu tom e metragem, de "Birdman" e mesmo de seus projetos anteriores, como "Babel" e "21 gramas". Com um olho muito poético, ele consegue transformar o sofrimento de um homem na natureza como se ele fosse parte dela, dependente para dormir e comer (significativa a passagem em que ele precisa evocar Han Solo em "O império contra-ataca"). É um filme essencialmente sobre sobreviver e poder refazer a trajetória pessoal e, nesse sentido, "O regresso" é poderoso mesmo quando não consegue aliar as ideias concretas com algumas mais abstratas. Há uma presença religiosa nessa tentativa de Glass confrontar seus próprios limites, e as imagens que remetem a sinos e pirâmides se intensificam em suas lembranças. É visível também a presença, em alguns quadros, de Herzog, sobretudo aquele de "Fitzcarraldo" e "O sobrevivente". Junto a isso, é um filme com um punhado de cenas executadas com perfeição e que cresce na lembrança, principalmente quando alterna os motivos existenciais que perduram na narrativa.
Este novo filme de Adam McKay, diretor de O âncora, Ricky Bobby e Quase irmãos (todos com Will Ferrell) e também presente na direção e roteiros de Saturday Night Live, é baseado num livro escrito por Michael Lewis, sobre a crise financeira de 2007-2008, causada, como todos sabem, por uma bolha no mercado imobiliário. Em 2005, a possibilidade de isso acontecer, especificamente em 2007, é antevista por Michael Burry (Christian Bale).
Sequências e refilmagens têm se proliferado em Hollywood há décadas, e nos últimos anos não é diferente. Enquanto há obras que conseguem trazer acréscimos ou mesmo renovar a versão antiga, há aquelas que se mostram mais pendentes a ter como objetivo uma homenagem ao elenco e ao diretor da franquia. Diante disso, nem toda a expectativa diante do filme poderia indicar o resultado emocional que Creed – Nascido para lutar proporciona, mas, sobretudo, para quem é admirador da série Rocky (mesmo daqueles filmes considerados mais pop, embora o quinto tenha deixado especialmente a desejar).
Logo depois de receber o Oscar por "Birdman", Alejandro G. Iñárritu aposta todo o seu talento em "O regresso", baseado num livro de Michael Punke. Leonardo DiCaprio interpreta com grande eficácia o explorador e caçador de peles Hugh Glass, que em 1823, depois de uma fuga a indígenas, é atacado por um urso (esta é uma das cenas, sem exagero, mais impressionantes já feitas) e fica com o corpo completamente ferido. Sua equipe, tendo à frente Andrew Henry (Domhnall Gleeson), hesita em deixá-lo para trás. Henry ordena que dois de seus homens, John Fitzgerald (Tom Hardy) e Jim Bridger (Will Poulter), possam cuidar dele até que se busque ajuda. Além disso, Glass tem um filho de origem também indígena, Hawk (Forrest Goodluck). Este fio de narrativa é explorado até o limite por Iñárritu e o corroteirista Mark L. Smith. Já em "Birdman", o diretor mexicano já conseguia expandir uma ideia a princípio simples para um longa substancialmente potente.
Claro que tudo poderia ser diferente se não fosse a fotografia de Emmanuel Lubezki, repetindo a parceria com o diretor que lhe deu o Oscar também da área em "Birdman". Lubezki repete aqui algumas projeções já vistas em "O novo mundo", de outro parceiro seu, Malick, mas desta vez evocando um Oeste selvagem e gelado (as paisagens são do Canadá, da Argentina e dos Estados Unidos), com uma caçada imprevisível e contínua, evocando outros faroestes, como "Quando os homens são homens", de Robert Altman, "Dança com lobos", de Kevin Costner, e principalmente, pela grandiosidade das paisagens e pelo panorama dado a elas, "O portal do paraíso", de Michael Cimino. Impressiona, mais do que tudo (inclusive do que a atuação extremamente física e sofrida de DiCaprio), a maneira como o diretor transporta o espectador para os cenários, uma extensão da realidade. Não apenas as cenas são violentas, como o diretor parece ter construído uma maneira de lançar o espectador em meio a ela (como nas cenas de tiros e flechas dos índios). Todos os movimentos de câmera de Lubezki apanham os personagens em movimento, como se eles estivessem próximos, uma qualidade que já era vislumbrada em "Birdman".
Se às vezes a narrativa diminui de intensidade, Iñárritu mostra uma perícia insuspeita e um traço eclético, com um filme totalmente diferente, no seu tom e metragem, de "Birdman" e mesmo de seus projetos anteriores, como "Babel" e "21 gramas". Com um olho muito poético, ele consegue transformar o sofrimento de um homem na natureza como se ele fosse parte dela, dependente para dormir e comer (significativa a passagem em que ele precisa evocar Han Solo em "O império contra-ataca"). É um filme essencialmente sobre sobreviver e poder refazer a trajetória pessoal e, nesse sentido, "O regresso" é poderoso mesmo quando não consegue aliar as ideias concretas com algumas mais abstratas. Há uma presença religiosa nessa tentativa de Glass confrontar seus próprios limites, e as imagens que remetem a sinos e pirâmides se intensificam em suas lembranças. É visível também a presença, em alguns quadros, de Herzog, sobretudo aquele de "Fitzcarraldo" e "O sobrevivente". Junto a isso, é um filme com um punhado de cenas executadas com perfeição e que cresce na lembrança, principalmente quando alterna os motivos existenciais que perduram na narrativa.
O diretor Todd Haynes é um dos nomes mais respeitados em Hollywood, um dos poucos vistos com características autorais, já demonstradas em larga escala, seja em Veneno, seja no estranhíssimo Velvet Goldmine ou na homenagem a Bob Dylan em Não estou lá. No entanto, seu grande filme até agora continua sendo Longe do paraíso, em que Dennis Haysbert interpreta Raymond Deagan, um jardineiro afroamericano que se torna próximo de Cathy Whitaker (Julianne Moore), o que causa um escândalo na sociedade conservadora dos Estados Unidos dos anos 1950. Casada com Frank (Dennis Quaid), o qual considera que precisa tratar sua homossexualidade com um psiquiatra, ela apresenta a Raymond a arte moderna por meio de pinturas. Lançado em 2002, Longe do paraíso possui uma maravilhosa atmosfera com a contribuição da fotografia de Edward Lachman.
Depois de Django livre, Tarantino volta ao gênero do faroeste em que desenhava um panorama da escravidão nos Estados Unidos, ao mesmo tempo que oferecia uma vingança a seu personagem principal, interpretado por Jamie Foxx. Em Os oito odiados, novamente com uma fotografia excepcional de seu habitual parceiro, Robert Richardson, Tarantino volta a mostrar não exatamente surpresas na estrutura do roteiro (dividido em capítulos como os seus melhores filmes, a começar por Bastardos inglórios), mas na maneira de captar a ação. É como se ele tivesse vendo a estrutura de alguns filmes europeus (vide O gebo e a sombra), com uma caracterização quase teatral. Enquanto Django livre era um faroeste inteligente e plástico, sua sustentação se dava principalmente pelas cenas de tiroteio com a característica mais pop de Tarantino.
Para lidar com mitologias cinematográficas, o nome mais acessível nos últimos anos é o de J.J. Abrams. Criador da série Lost, ele fez a terceira parte de Missão impossível e, em seguida, produziu uma espécie de mistura entre Godzilla e Alien em Cloverfield. Mas foi justamente com a retomada de Star Trek, mostrando os personagens em sua juventude, que elevou Abrams ao status de diretor de franquias. Super 8 e a segunda parte de Star Trek apenas antecederam o que ele entrega de melhor: a nostalgia de se reviver um cinema que parecia perdido no tempo. Ver mais em: cinematographecinemafilmes
Alguns filmes adquirem, de um momento para outro, uma determinada importância que os fazem ser assistidos com mais ou menos expectativa. Alguns correspondem a ela, outros não. Quando o também ator Tom McCarthy (ele está na série Entrando numa fria, como um dos cunhados de Robert De Niro), realizou, por exemplo, O homem da estação, ainda era um cineasta em início de trajetória, e Vencer ou vencer mostrou sua sensibilidade, por meio da bela atuação de Paul Giamatti, enquanto Trocando os pés trouxe mais um Adam Sandler de rotina, mas com Spotlight ele acaba chamando a atenção para si e para o elenco que atrai para esta história baseada em fatos reais.
Logo depois de receber o Oscar por "Birdman", Alejandro G. Iñárritu aposta todo o seu talento em "O regresso", baseado num livro de Michael Punke. Leonardo DiCaprio interpreta com grande eficácia o explorador e caçador de peles Hugh Glass, que em 1823, depois de uma fuga a indígenas, é atacado por um urso (esta é uma das cenas, sem exagero, mais impressionantes já feitas) e fica com o corpo completamente ferido. Sua equipe, tendo à frente Andrew Henry (Domhnall Gleeson), hesita em deixá-lo para trás. Henry ordena que dois de seus homens, John Fitzgerald (Tom Hardy) e Jim Bridger (Will Poulter), possam cuidar dele até que se busque ajuda. Além disso, Glass tem um filho de origem também indígena, Hawk (Forrest Goodluck). Este fio de narrativa é explorado até o limite por Iñárritu e o corroteirista Mark L. Smith. Já em "Birdman", o diretor mexicano já conseguia expandir uma ideia a princípio simples para um longa substancialmente potente.
Claro que tudo poderia ser diferente se não fosse a fotografia de Emmanuel Lubezki, repetindo a parceria com o diretor que lhe deu o Oscar também da área em "Birdman". Lubezki repete aqui algumas projeções já vistas em "O novo mundo", de outro parceiro seu, Malick, mas desta vez evocando um Oeste selvagem e gelado (as paisagens são do Canadá, da Argentina e dos Estados Unidos), com uma caçada imprevisível e contínua, evocando outros faroestes, como "Quando os homens são homens", de Robert Altman, "Dança com lobos", de Kevin Costner, e principalmente, pela grandiosidade das paisagens e pelo panorama dado a elas, "O portal do paraíso", de Michael Cimino. Impressiona, mais do que tudo (inclusive do que a atuação extremamente física e sofrida de DiCaprio), a maneira como o diretor transporta o espectador para os cenários, uma extensão da realidade. Não apenas as cenas são violentas, como o diretor parece ter construído uma maneira de lançar o espectador em meio a ela (como nas cenas de tiros e flechas dos índios). Todos os movimentos de câmera de Lubezki apanham os personagens em movimento, como se eles estivessem próximos, uma qualidade que já era vislumbrada em "Birdman".
Se às vezes a narrativa diminui de intensidade, Iñárritu mostra uma perícia insuspeita e um traço eclético, com um filme totalmente diferente, no seu tom e metragem, de "Birdman" e mesmo de seus projetos anteriores, como "Babel" e "21 gramas". Com um olho muito poético, ele consegue transformar o sofrimento de um homem na natureza como se ele fosse parte dela, dependente para dormir e comer (significativa a passagem em que ele precisa evocar Han Solo em "O império contra-ataca"). É um filme essencialmente sobre sobreviver e poder refazer a trajetória pessoal e, nesse sentido, "O regresso" é poderoso mesmo quando não consegue aliar as ideias concretas com algumas mais abstratas. Há uma presença religiosa nessa tentativa de Glass confrontar seus próprios limites, e as imagens que remetem a sinos e pirâmides se intensificam em suas lembranças. É visível também a presença, em alguns quadros, de Herzog, sobretudo aquele de "Fitzcarraldo" e "O sobrevivente". Junto a isso, é um filme com um punhado de cenas executadas com perfeição e que cresce na lembrança, principalmente quando alterna os motivos existenciais que perduram na narrativa.
Wiener-Dog
3.2 57Texto com spoilers:
Foi nos anos 90 que Todd Solondz construiu sua reputação de diretor excêntrico e corrosivo com dois filmes, "Bem-vindo à casa de bonecas" e "Felicidade", com personagens completamente desprovidos de qualquer previsibilidade. Passaram-se quase 20 anos para que ele voltasse em grande estilo com este "Wiener-Dog". Este não é um filme para todo espectador, mas, sinceramente, me parece aquele tipo de obra que pode ser, mais do que excêntrica, extraordinária.
Solondz seleciona um cão da raça dachshund (no Brasil, o conhecido "linguicinha") que ajuda a entrelaçar algumas histórias. Na primeira, um pai, Danny (Tracy Letts), traz a seu filho Remi (Keaton Nigel Cooke), que acabou de enfrentar um câncer, um cãozinho fêmea dessa raça. No entanto, ela deve ser castrada, o que rende conversas difíceis de Remi com sua mãe, Dina (Julie Delpy).
Na segunda história, o cão descobre uma segunda dona, a enfermeira veterinária Dawn Wiener (Greta Gerwig), o mesmo nome da personagem de "Bem-vindo à casa de bonecas". Ela, determinado dia, encontra um antigo interesse de escola, Brandon (Kieran Cullkin), com quem sai de viagem para Ohio, onde encontrará Tommy (Connor Long), e April (Bridget Brown). Sempre com o cão a tiracolo.
Na terceira história, Danny DeVito é um roteirista de cinema, Dave Schmerz, que dá aulas numa universidade e circula com seu cão para cima e para baixo, em meio a uma vida de solidão, à espera de notícias de novos trabalhos, para, finalmente, na quarta, vermos Nana (Ellen Burstyn, lembrando imediatamente "Réquiem para um sonho"), uma idosa, receber a visita de sua neta Zoe (Zosia Mamet), acompanhada seu namorado Fantasia (Michael Shaw, engraçado).
Além do roteiro bem desenvolvido por Solondz, com atos que não se diferenciam em demasia, sem recorrer a truques, a não ser um intervalo como se o cão participasse de um videoclipe, "Wiener-Dog" apresenta um elenco multiestelar, todos em grande momento, desde Delpy e Gerwig, passando por Culkin e DeVito, até Burstyn. Todos estão excepcionais, sem exceção. Especialmente Gerwig e DeVito entregam atuações de colocar o espectador em suspensão.
O diretor de fotografia é Edward Lachmann, responsável por imagens de "Carol" e "Longe do paraíso", ambos de Todd Haynes, e "As virgens suicidas", de Sofia Coppola, com o qual guarda semelhanças estéticas. Tudo é multicolorido, mesmo que a realidade seja fora desse tom vibrante. O cão simboliza a aventura dos personagens ou sua solidão ao longo da América. "Clair de Lune" é usada para fazer um contraponto à sua presença incômoda por vezes, em determinado momento.
"Wiener-Dog" é estranho e, ao mesmo tempo, inserido no cotidiano. É sarcástico e pesado e, ainda assim, muito humano. É sensível sem cair na pieguice. É mesmo reflexivo, quase uma aula de como fazer cinema com uma ideia simples e sem soar pretensioso. Trata da vida e da morte, dos laços feitos e desfeitos, de mágoas guardadas ou sonhos a serem atingidos. Dentro de seu humor corrosivo, é também um dos mais engraçados a que assisti nos últimos anos.
O Mar de Árvores
3.3 92 Assista AgoraApós assistir ao filme mais recente de Gus Van Sant, vaiado no Festival de Cannes, quando exibido no ano passado, tive aquela mesma curiosidade que, às vezes, tenho e não deveria: ver qual seria a média de aprovação dessa obra no Rotten Tomatoes. Obviamente, os 9% de aprovação não me surpreenderam, afinal os críticos reunidos lá são considerados os mais representativos.
O roteiro de Chris Sparling certamente é o alvo da maior parte das críticas, com suas simbologias orientais. Arthur Brennan (Matthew McConaughey) é um professor de ciências que parte para o Japão, a fim de cometer suicídio em Aokigahara, à margem do Monte Fuji. Lá, ele encontra Takumi (Ken Watanabe), que lhe conta ter perdido o emprego. Logo, o desentendimento inicial se transforma numa aproximação de duas culturas diferentes. E, nisso, vêm à tona histórias sobre Joan (Naomi Watts), esposa de Arthur. Tudo é uma grande representação do processo de depressão que atravessa o filme de ponta a ponta, seja nas imagens da floresta, seja em como os personagens vão se machucando, como se buscassem o autoflagelo, e enfrentam uma inundação, como num renascimento. Ele se sente mais perto de "Inquietos", em que Van Sant mostrava a obsessão da juventude pela morte e pelo luto, sendo menos acessível em alguns pontos.
Claro que a crítica representativa enxergou na obra uma maneira de tripudiar sobre seus flashbacks e seu tom dramático (é a mesma que viu em "Old joy", muito parecido com este, espetacular). É muito fácil isso quando o Van Sant mais elogiado é o minimalista (e por vezes tedioso) de "Últimos dias" e "Gerry". Mas "The sea of trees" também é excessivamente fácil para quem deseja um novo "Elefante" ou "Paranoid Park", em que o processo de luto era mais subjetivo. Este, porém, é o diretor que também fez peças entre o indie e o comercial, a exemplo de "Gênio indomável", "Encontrando Forrester" e "Garotos de programa". E a crítica em geral sequer ter visto as grandes atuações de McConaughey, Watts e Watanabe, principalmente do primeiro, em mais uma jornada feliz, parece acima de tudo de grande injustiça. O filme tem momentos realmente sentimentais e revigorantes e mostra como "Livre" poderia ter sido um grande filme não se excedesse nos flashbacks. E temos o acerto na fotografia de Kasper Tuxen, com mínimo de cores e ainda assim atrativa.
Demônio de Neon
3.2 1,2K Assista AgoraTexto com spoilers:
O cineasta dinamarquês Nicolas Winding Refn pode ser visto como um dos mais polêmicos hoje em dia. Não que a sua trajetória se inscrevesse com essa qualidade em "Drive", filme com Ryan Gosling posando de dublê de cenas com carros em Hollywood, mas principalmente por causa do filme seguinte, "Apenas Deus perdoa", com sua violência literal nas ruas de Bangkok. Este segue sua filmografia anterior a "Drive", como em "Bronson", filtrado por "Laranja mecânica", porém, sobretudo, os filmes da saga "Pusher", com uma violência ainda mais intensa. "Drive", sob qualquer ponto de vista, ainda é um divisor de águas em sua carreira: com seus sintetizadores emulando os anos 80, nas notas de Cliff Martinez, repercutiria no filme seguinte, e agora em "Demônio de neon", agora desprovido de qualquer romantismo.
Não por acaso, o novo filme de Refn se situa entre o suspense e o terror. A sua principal influência é muito clara: "Suspiria", a obra-prima de Dario Argento, dos anos 70. Se naquele filme uma estudante de dança chegava a uma academia alemã de influências sobrenaturais (que se tornaria mais real em "Cisne negro"), em "Demônio de neon", Elle Fanning interpreta Jesse, uma menina de 16 anos que vem do interior, sem pais, para fazer carreira de modelo em Los Angeles. Ela primeiro faz uma sessão de fotos com o Dean (Karl Glusman, de "Love"), onde conhece a maquiadora Ruby (Jena Malone). Em seguida, ela apresenta o book a uma agência de modelos, tendo à frente Roberta Hoffman (Christina Hendricks). A maquiadora, numa festa, a apresenta a suas duas amigas, Sarah (Abbey Lee) e Gigi (Bella Heathcote). Claramente, Refn posiciona Jesse como uma espécie de Alice no país das perdições, com seu figurino de moça inocente e ingênua. Em seu encontro com Dean, numa colina de Los Angeles, à luz do luar, ela diz não ter outros atributos a não ser a beleza. E é essa lua que antecipa o verdadeiro horror de "Demônio de neon". Hospedada num hotel, clara referência a "Psicose", em seus letreiros, em que o gerente, Hank (Keanu Reeves), age de forma pouco convidativa a conversas e como um cafetão, Jesse é uma espécie de personagem de Naomi Watts em "Cidade dos sonhos". Basta reparar na maneira como Refn retrata as cores de seu quarto. Ela pertence a um universo da fantasia. Nesse universo, oposto ao real, ela se sente em casa. No entanto, quando passa, a partir de um desfile para o designer de moda Robert Sarno (Alessandro Nivola), a ser uma das preferidas do mundo da moda, suas antigas conhecidas passam a vê-la ainda mais como uma ameaça. Elas não têm o que conversar entre si: enquanto as antigas modelos falam em plásticas e sexo, Jesse tenta emular uma vida que nunca teve.
Naturalmente, "Demônio de neon" tem um objetivo muito claro: ser uma crítica ao universo da moda. Parece fazê-lo de modo simples, quando na verdade percebe-se que Refn atinge seus detalhes e nuances de modo mais indireta. Os símbolos, como o da lua ou do gato selvagem, e mesmo de três triângulos em neon (que representam a passagem de Jesse para outro universo, como o cubo de "Cidade dos sonhos"), ou de Hank como uma representação do falo masculino, são uma síntese da personagem. O personagem Dean é uma espécie de príncipe encantado, a figura certamente mais despretensiosa do filme, enquanto os outros personagem observam Jesse como se ela fosse uma vítima a ser perseguida - e Refn constrói essa tensão por meio de olhares, sobretudo da personagem da maquiadora em relação a ela. Ou vejamos a maneira como o fotógrafo Jack (Desmond Harrington) a olha durante a sessão de fotos, em que a configuração visual remete a "THX 1138", de George Lucas. A obsessão pela juventude é tão perturbadora quanto em "Fome de viver", filme dos anos 80 com David Bowie e Catherine Deneuve.
Refn tem um interesse em aproximar o universo da fotografia e da modo de um universo cadavérico. Para ele, as pessoas estão sempre fazendo poses, imóveis ou querendo ser invisíveis, como se fossem, como diz Gigi, em determinada altura, fantasmas. Gigi também pergunta a Jesse como é ser o sol num dia de inverno, e, ao final, sua metáfora parece justamente se mostrar ao contrário. E, mesmo Jesse sendo uma pessoa real, sua fachada sempre lembra uma fina camada de porcelana; é como se, de fato, fosse uma boneca humana. Refn a aproveita aqui, muitas vezes, como Coppola o faz em "Virgínia".
O que se pode dizer é que "Demônio de neon" atravessa uma linha que poucos filmes se arriscam a fazer. Não apenas o roteiro de Refn, em parceria com Mary Laws e Polly Stenham, é enigmático, como ingressa, em seus 20 minutos finais, em situações nas quais o cinema pouco pisou, sob uma perspectiva mesmo histórica. É quando Refn mais se mostra desagradável como em vários momentos de "Apenas Deus perdoa" e, justamente, consegue arrematar sua visão sobre o mundo da moda e do que se considera belo. Seu filme é construído com uma fotografia perfeccionista de Natasha Braier ("The Rover"), com cada tiro lembrando uma pintura, e ainda assim o que ele tem a trazer aqui é que, por baixo de toda a beleza, há doença e uma terrível desesperança. Nesse sentido, é um filme mais melancólico do que "Drive" e "Apenas Deus perdoa", que ainda lida com certos elementos românticos. Em "Demônio de neon", é como se Refn admitisse que não há espaço para nenhuma idealização, representada por Jesse, principalmente num universo em que ela é uma estranha, mesmo parecendo ser bem recebida. É como se ela entrasse num bosque do qual não pode voltar justamente no momento em que se depara com os triângulos de neon.
Como Jesse, Elle Fanning está excepcional, mostrando como a atriz de "Super 8" e "Um lugar qualquer" realmente tinha um talento especial, mas é Malone, Lee e, principalmente, Heathcote que conseguem lidar com papéis difíceis. Karl Glusman é um ótimo ator aqui, também, assim como Keanu Reeves faz uma boa participação especial (lamentando-se que Hendricks tenha apenas uma cena).
Entende-se perfeitamente que o espectador não goste deste filme ou se sinta mesmo revoltado com suas premissas, mas é inegável que Refn consegue avançar num terreno que se mostrava inexplorado talvez desde David Lynch em "Twin Peaks - Os últimos dias de Laura Palmer", também, como ele, vaiado em Cannes. No filme de Lynch, tão surrealista quanto este, a ameaça à personagem central se dava de maneira tão contundente que de uma série bem-humorada o espectador passava a um ambiente bem mais próximo do horror e do assustador. Esta parece ser a mesma trajetória visualizada por Jesse. De qualquer modo, Refn não esclarece direito quem seria essa personagem, assim como o motorista de "Drive". Não há nela um sentido de humanidade exato. Ela está durante toda a história entre a realidade e o sonho, e sua realidade é permeada de comportamentos estranhos. Este não é um filme fácil; pelo contrário, é perturbador, pois entrega algo totalmente diferente do que aparenta por suas imagens belíssimas.
Duna
2.9 412 Assista Agora"Duna" sempre vai atrair alguns argumentos: o filme não está à altura da carreira de David Lynch; a adaptação que Jodorowsky teria feito seria melhor; e foi uma má adaptação do romance de Frank Herbert. Tendo sido levado ao livro por causa do filme de Lynch, eu acredito que o cineasta americano o adaptou com esforço. Ele é fiel em muitos aspectos (principalmente na versão estendida de 3 horas não assinada pelo diretor) e ficaria feliz se Lynch entregasse seu corte, o que dificilmente, hoje, irá acontecer. Ele tem muitos elementos que Lynch usaria mais tarde em sua trajetória, em filmes como "Veludo azul", "Twin Peaks", "A estrada perdida" e "Cidade dos sonhos" (sugiro a quem diz o contrário ver que muitas simbologias de "Duna" estão nesses filmes). Em segundo, nunca saberemos se a versão de Jodorowsky seria melhor (fica no "se", o que não funciona no cinema); certamente seria mais surrealista, mas não que seria melhor. O filme é um trinfo de design de produção e figurinos, além da trilha sonora do grupo Toto, e, apesar dos efeitos visuais irregulares, possui uma força especial. Kyle MacLachlan está ótimo no papel principal, assim como o elenco de apoio faz uma boa participação (principalmente McMillan como o vilão). A versão de Lynch possui uma segunda metade muito apressada; a versão estendida, neste caso, é a mais indicada. No entanto, isso não tira do filme o status de ser um dos mais subestimados da história do cinema.
Memórias Secretas
4.1 354 Assista AgoraO diretor canadense Atom Egoyan tem tido dificuldades de se afastar dos seus sucessos de crítica dos anos 90, como "O doce amanhã". O resultado é que seus últimos filmes são recepcionados como notórias decepções, mesmo sendo de qualidade às vezes muito acima da média. Nos anos 2000, embora "Ararat" tenha a trama mais conturbada, foi o que melhor foi recebido, quando seus outros filmes, como "Verdade nua" e "Chloe - O preço da traição" são muito interessantes. Mais recentemente, em 2014, ele apresentou o subestimado "À procura".
Como "À procura", "Memórias secretas" teve uma recepção bastante fria em Cannes, sem receber nenhum destaque. Cristopher Plummer vem à frente do elenco, numa atuação extraordinária, que o faz ser cotado para as próximas premiações. Ele interpreta Zev Gutman, um senhor de idade, com quase 90 anos, que mora num asilo, com demência, caracterizada pelos esquecimentos (entre os quais, de que sua esposa faleceu). Lá, ele é amigo de Max Rosenbaum (Martin Landau, quase irreconhecível), que lhe escreve uma carta-guia para que possa procurar o homem que matou sua família em Auschwitz. Zev, então, mesmo com todos os lapsos de memória, vai atrás de sua vingança particular, dele e em nome do amigo que está impossibilitado de sair do asilo - e, para isso, precisa comprar uma arma.
Com uma fotografia muito bela de Paul Sarossy, iluminando os cenários quase naturalmente e com movimentos de câmera claramente inspirados por Emmanuel Lubezki, sobretudo em sua parceria com Malick, "Memórias secretas", como outros filmes de Egoyan, guarda alguns temas em comum: o conflito entre o presente e o passado, a busca por vingança (explicada quase sempre em bases históricas e culturais, como no quase esquecido e belo "Adoração") e a exasperante solidão de um homem. Este é um personagem já visto em outros filmes de Egoyan, com um grito de dor quase sufocado, ainda despreparado para seu presente e em relação a seu futuro. Zev é um personagem que faz o filme andar de ponta a ponta, em razão da competência de Plummer para compor gestos mínimos e profundos. Para ajudar a compor seu drama, é fundamental a trilha sonora de outro habitual colaborador de Egoyan, Mychael Danna. Ele lança as notas a cada passo dado pelo personagem, como se compusesse uma atmosfera de jornada pessoal.
Impressiona como Egoyan consegue partir de um drama pessoal - de um homem de idade sufocado pelas memórias - para uma espécie de road movie de investigação e perseguição. Alguns classificam o filme como thriller, mas talvez não o seja exatamente: ele se sustenta mais na base dramática que evoca o drama da Segunda Guerra que não pode ser esquecido. Há uma passagem do filme que mostra um determinado personagem capaz de remeter o espectador aos conflitos provocados pelo nazismo e cenas capazes de remeter ao melhor Egoyan. Há também comparações feitas da trama com "Amnésia", de Cristopher Nolan, e talvez haja algumas semelhanças, principalmente porque o personagem está sempre preso a hotéis em sua viagem e em embate com sua memória. No entanto, parece que Plummer, nessa viagem para vingar os familiares, parece estar em um drama profundo sobre a busca pela identidade que se perdeu. E, apesar de considerar o final do terceiro ato um tanto apressado e expositivo em excesso, fica difícil negar que Egoyan novamente conseguiu um belo acerto.
Spotlight - Segredos Revelados
4.1 1,7K Assista AgoraAlguns filmes adquirem, de um momento para outro, uma determinada importância que os fazem ser assistidos com mais ou menos expectativa. Alguns correspondem a ela, outros não. Quando o também ator Tom McCarthy (ele está na série Entrando numa fria, como um dos cunhados de Robert De Niro), realizou, por exemplo, O homem da estação, ainda era um cineasta em início de trajetória, e Vencer ou vencer mostrou sua sensibilidade, por meio da bela atuação de Paul Giamatti, enquanto Trocando os pés trouxe mais um Adam Sandler de rotina, mas com Spotlight ele acaba chamando a atenção para si e para o elenco que atrai para esta história baseada em fatos reais.
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A Grande Aposta
3.7 1,3KÀs vezes, lembra O lobo de Wall Street pela bateria de diálogos rápidos (Pitt tentou, lembremos, comprar os direitos e fazer esse filme), assim como uma excelente obra dos anos 90, chamado O sucesso a qualquer preço. E é interessante como todos os atores envolvidos no projeto já participaram de filmes com uma sátira ou crítica ao chamado capitalismo (mesmo Gosling fez Lost river, que trata também de pessoas sendo desalojadas e não deixa de ser uma metáfora da bolha financeira de 2008). Mas aqui não há o talento de Martin Scorsese quando, em O lobo de Wall Street, desmontou esse universo com o auxílio da atuação de DiCaprio. Havia mais foco na maneira como se dava esse olhar, e os personagens eram caricaturais, sem nenhum moralismo, quando aqui pelo menos o personagem de Pitt aparece para dizer palavras capazes de mostrar os verdadeiros erros. É interessante como McKay, um diretor de comédias, acaba levando mais a sério e querendo demonstrar com dados e definições de conceitos esse universo. Tudo é entregue para que o espectador possa selecionar as partes capazes de deixar o panorama mais claro; às vezes não fica, mas o elenco se esforça.
Mesmo com todas as falhas, ainda há mais virtudes em A grande aposta e uma real vida nas atuações, sem a neutralidade forçada e esforçada, por exemplo, de um Spotlight. Nisso, a fotografia de Barry Ackroyd, apesar de lembrar bastante a da série The Office (com Carell), e outras séries, diga-se de passagem, oferece um movimento ininterrupto e capta melhor os cenários, seja do centro de Nova York, dos escritórios ou de Las Vegas. A grande aposta acaba tendo como referência uma dissolução interessante de gêneros no fim das contas, além de contar com um elenco estelar em grande forma, apesar de alguns não terem o tempo necessário para poderem brilhar, talvez mesmo porque não quisessem, com a consciência de que o roteiro e a visão sobre o colapso financeiro e suas consequências até hoje, inclusive seu reaproveitamento sob outras formas, conta mais para o espectador ter consciência sobre o tema.
Brooklin
3.8 1,1KBrooklyn é muito mais otimista do que outros filmes de imigração, mesmo contendo uma melancolia em sua superfície – que Crowley não eleva a certo material excessivamente emotivo. Falta, com isso, uma espécie de empuxe dramático ou emocional à direção, principalmente porque conta com uma excelente Ronan e as participações de Emory Cohen e Domhnall Gleeson, como Jim, que mora na Irlanda. Em nenhum momento, a história aponta para algum conflito que pudesse lembrar o de Madame Bovary: os personagens parecem estar apenas à espera do que o roteiro já promete de antemão. Nesses anos 1950 de Crowley, parece que não há conflitos nem a Segunda Guerra Mundial é tão recente; não há interesse por escombros e reconstrução de um passado, apenas a tentativa de uma jovem encontrar seu amor e contrabalançar sua vinda para a América com a culpa de ter deixado seus pais e sua irmã.
Há um problema bastante perceptível na estrutura de Brooklyn: sua montagem é muito apressada, não dando espaço à construção dos personagens, como o do padre Flood, embora as motivações da personagem sejam interessantes e bem arquitetadas para o espectador. Eles permanecem apenas figuras dispersas, sem uma real contribuição para a história de Eilis. Tudo parece harmoniosamente clássico, como Carol, minando um pouco as situações nas quais poderia haver mais drama ou humor.
O Regresso
4.0 3,5K Assista AgoraLogo depois de receber o Oscar por "Birdman", Alejandro G. Iñárritu aposta todo o seu talento em "O regresso", baseado num livro de Michael Punke. Leonardo DiCaprio interpreta com grande eficácia o explorador e caçador de peles Hugh Glass, que em 1823, depois de uma fuga a indígenas, é atacado por um urso (esta é uma das cenas, sem exagero, mais impressionantes já feitas) e fica com o corpo completamente ferido. Sua equipe, tendo à frente Andrew Henry (Domhnall Gleeson), hesita em deixá-lo para trás. Henry ordena que dois de seus homens, John Fitzgerald (Tom Hardy) e Jim Bridger (Will Poulter), possam cuidar dele até que se busque ajuda. Além disso, Glass tem um filho de origem também indígena, Hawk (Forrest Goodluck). Este fio de narrativa é explorado até o limite por Iñárritu e o corroteirista Mark L. Smith. Já em "Birdman", o diretor mexicano já conseguia expandir uma ideia a princípio simples para um longa substancialmente potente.
Se às vezes a narrativa diminui de intensidade, Iñárritu mostra uma perícia insuspeita e um traço eclético, com um filme totalmente diferente, no seu tom e metragem, de "Birdman" e mesmo de seus projetos anteriores, como "Babel" e "21 gramas". Com um olho muito poético, ele consegue transformar o sofrimento de um homem na natureza como se ele fosse parte dela, dependente para dormir e comer (significativa a passagem em que ele precisa evocar Han Solo em "O império contra-ataca"). É um filme essencialmente sobre sobreviver e poder refazer a trajetória pessoal e, nesse sentido, "O regresso" é poderoso mesmo quando não consegue aliar as ideias concretas com algumas mais abstratas. Há uma presença religiosa nessa tentativa de Glass confrontar seus próprios limites, e as imagens que remetem a sinos e pirâmides se intensificam em suas lembranças. É visível também a presença, em alguns quadros, de Herzog, sobretudo aquele de "Fitzcarraldo" e "O sobrevivente". Junto a isso, é um filme com um punhado de cenas executadas com perfeição e que cresce na lembrança, principalmente quando alterna os motivos existenciais que perduram na narrativa.
O Quarto de Jack
4.4 3,3K Assista AgoraAbrahamson é um grande diretor de atores, como já mostrou em seus projetos anteriores, e aqui não é diferente. Larson, depois de ótimas participações em Anjos da lei, Temporário 12 e O maravilhoso agora, tem a grande oportunidade de sua carreira, trabalhando com nuances já reveladas nesses dois últimos filmes. Por sua vez, Tremblay é não menos do que excepcional com um roteiro bastante difícil, diante da situação. São raros os atores mirins que conseguem proporcionar uma emoção verdadeira como a dele. Num duo com Larson, no papel de uma mãe que teve sua vida desconstruída depois de ser enganada por um homem que tentava ajudar, Tremblay sustenta alguns dos grandes momentos de atuação (e DiCaprio deve ficar tranquilo ao não tê-lo como concorrente ao Oscar).
O mais interessante é como Abrahamson adota o ponto de vista dele a fim de que o espectador tenha o seu sentimento pela mãe. Ele se indaga sobre o que acontece em sua vida, mas a rotina é tão forte que ele parece não perceber o que está passando ao seu redor. O quarto se torna, então, seu universo, no qual imagina cada circunstância do que vier a acontecer em sua vida (e as sequências iniciais, nesse sentido, sintetizam a narrativa).
Um filme de rara beleza.
O Quarto de Jack
4.4 3,3K Assista AgoraAbrahamson é um grande diretor de atores, como já mostrou em seus projetos anteriores, e aqui não é diferente. Larson, depois de ótimas participações em Anjos da lei, Temporário 12 e O maravilhoso agora, tem a grande oportunidade de sua carreira, trabalhando com nuances já reveladas nesses dois últimos filmes. Por sua vez, Tremblay é não menos do que excepcional com um roteiro bastante difícil, diante da situação. São raros os atores mirins que conseguem proporcionar uma emoção verdadeira como a dele. Num duo com Larson, no papel de uma mãe que teve sua vida desconstruída depois de ser enganada por um homem que tentava ajudar, Tremblay sustenta alguns dos grandes momentos de atuação (e DiCaprio deve ficar tranquilo ao não tê-lo como concorrente ao Oscar).
O mais interessante é como Abrahamson adota o ponto de vista dele a fim de que o espectador tenha o seu sentimento pela mãe. Ele se indaga sobre o que acontece em sua vida, mas a rotina é tão forte que ele parece não perceber o que está passando ao seu redor. O quarto se torna, então, seu universo, no qual imagina cada circunstância do que vier a acontecer em sua vida (e as sequências iniciais, nesse sentido, sintetizam a narrativa). Sua distância do sequestrador é definidora para esta questão, e Abrahamson, como em Frank, deixa a critério do espectador identificar o modo como seu personagem vai evoluindo, principalmente num nível psicológico (e naquele filme o diretor contava com um ótimo Michael Fassbender escondido por baixo de uma máscara). Antes desse seu filme reconhecido, ele havia mostrado um homem solitário que trabalha num posto de gasolina em Garage, certamente um dos filmes mais incisivos sobre o isolamento de alguém em relação à sociedade e, ao mesmo tempo, muito comovente.
Neste plano de análise sobre uma solidão (esta imposta por outra pessoa), O quarto de Frank dialoga de forma hábil tanto com Frank quanto com Garage, mostrando um estilo pessoal. Danny Cohen, colaborador habitual de Tom Hooper, apresenta um trabalho de imagens menos elaborado se compararmos com A garota dinamarquesa, mas deve-se destacar que ele pode trabalhar com diálogo entre cenário e figurino sempre com as mesmas cores, menos, digamos, pictórico. Ainda assim, sua presença por trás da câmera ajuda a captar de modo delicado o drama de mãe e filho, trabalhando com detalhes e enquadramentos.
O Regresso
4.0 3,5K Assista AgoraLogo depois de receber o Oscar por Birdman, Alejandro G. Iñárritu retoma sua filmografia com O regresso, baseado num livro de Michael Punke. É interessante como o diretor mexicano partiu de Amores brutos, uma espécie de releitura da violência de Tarantino, principalmente de Cães de aluguel e Pulp Fiction, com suas histórias cruzadas, para um messianismo de culpa em 21 gramas e um épico intimista em Babel. Logo em seguida, parece que Iñárritu buscou suas fontes originais e fez Biutiful, uma obra em que Javier Bardem tinha uma grande atuação, mas era prejudicada por certos problemas de narrativa, apesar da bela fotografia.
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Joy: O Nome do Sucesso
3.4 778 Assista AgoraNos últimos anos, o diretor David O. Russell se tornou uma aposta praticamente certa para o Oscar. Ele conseguiu que três filmes seguidos seus – O vencedor, O lado bom da vida e Trapaça – fossem indicados ao Oscar de melhor filme e de melhores atuações principais, pouco lembrando o início de sua carreira, quando fez projetos mais independentes – embora com elencos estelares – como Três reis, uma sátira de guerra, e Huckabees – A vida é uma comédia. Tudo indicava que com sua estrela favorita, Jennifer Lawrence, e seu ator favorito, Bradley Cooper, com Robert De Niro de coadjuvante, também presente em seus filmes mais recentes, Joy – O nome do sucesso se tornasse novamente um candidato para a Academia de Hollywood.
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O Regresso
4.0 3,5K Assista AgoraLogo depois de receber o Oscar por "Birdman", Alejandro G. Iñárritu aposta todo o seu talento em "O regresso", baseado num livro de Michael Punke. Leonardo DiCaprio interpreta com grande eficácia o explorador e caçador de peles Hugh Glass, que em 1823, depois de uma fuga a indígenas, é atacado por um urso (esta é uma das cenas, sem exagero, mais impressionantes já feitas) e fica com o corpo completamente ferido. Sua equipe, tendo à frente Andrew Henry (Domhnall Gleeson), hesita em deixá-lo para trás. Henry ordena que dois de seus homens, John Fitzgerald (Tom Hardy) e Jim Bridger (Will Poulter), possam cuidar dele até que se busque ajuda. Além disso, Glass tem um filho de origem também indígena, Hawk (Forrest Goodluck). Este fio de narrativa é explorado até o limite por Iñárritu e o corroteirista Mark L. Smith. Já em "Birdman", o diretor mexicano já conseguia expandir uma ideia a princípio simples para um longa substancialmente potente.
Claro que tudo poderia ser diferente se não fosse a fotografia de Emmanuel Lubezki, repetindo a parceria com o diretor que lhe deu o Oscar também da área em "Birdman". Lubezki repete aqui algumas projeções já vistas em "O novo mundo", de outro parceiro seu, Malick, mas desta vez evocando um Oeste selvagem e gelado (as paisagens são do Canadá, da Argentina e dos Estados Unidos), com uma caçada imprevisível e contínua, evocando outros faroestes, como "Quando os homens são homens", de Robert Altman, "Dança com lobos", de Kevin Costner, e principalmente, pela grandiosidade das paisagens e pelo panorama dado a elas, "O portal do paraíso", de Michael Cimino. Impressiona, mais do que tudo (inclusive do que a atuação extremamente física e sofrida de DiCaprio), a maneira como o diretor transporta o espectador para os cenários, uma extensão da realidade. Não apenas as cenas são violentas, como o diretor parece ter construído uma maneira de lançar o espectador em meio a ela (como nas cenas de tiros e flechas dos índios). Todos os movimentos de câmera de Lubezki apanham os personagens em movimento, como se eles estivessem próximos, uma qualidade que já era vislumbrada em "Birdman".
Se às vezes a narrativa diminui de intensidade, Iñárritu mostra uma perícia insuspeita e um traço eclético, com um filme totalmente diferente, no seu tom e metragem, de "Birdman" e mesmo de seus projetos anteriores, como "Babel" e "21 gramas". Com um olho muito poético, ele consegue transformar o sofrimento de um homem na natureza como se ele fosse parte dela, dependente para dormir e comer (significativa a passagem em que ele precisa evocar Han Solo em "O império contra-ataca"). É um filme essencialmente sobre sobreviver e poder refazer a trajetória pessoal e, nesse sentido, "O regresso" é poderoso mesmo quando não consegue aliar as ideias concretas com algumas mais abstratas. Há uma presença religiosa nessa tentativa de Glass confrontar seus próprios limites, e as imagens que remetem a sinos e pirâmides se intensificam em suas lembranças. É visível também a presença, em alguns quadros, de Herzog, sobretudo aquele de "Fitzcarraldo" e "O sobrevivente". Junto a isso, é um filme com um punhado de cenas executadas com perfeição e que cresce na lembrança, principalmente quando alterna os motivos existenciais que perduram na narrativa.
A Grande Aposta
3.7 1,3KEste novo filme de Adam McKay, diretor de O âncora, Ricky Bobby e Quase irmãos (todos com Will Ferrell) e também presente na direção e roteiros de Saturday Night Live, é baseado num livro escrito por Michael Lewis, sobre a crise financeira de 2007-2008, causada, como todos sabem, por uma bolha no mercado imobiliário. Em 2005, a possibilidade de isso acontecer, especificamente em 2007, é antevista por Michael Burry (Christian Bale).
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Creed: Nascido para Lutar
4.0 1,1K Assista AgoraSequências e refilmagens têm se proliferado em Hollywood há décadas, e nos últimos anos não é diferente. Enquanto há obras que conseguem trazer acréscimos ou mesmo renovar a versão antiga, há aquelas que se mostram mais pendentes a ter como objetivo uma homenagem ao elenco e ao diretor da franquia. Diante disso, nem toda a expectativa diante do filme poderia indicar o resultado emocional que Creed – Nascido para lutar proporciona, mas, sobretudo, para quem é admirador da série Rocky (mesmo daqueles filmes considerados mais pop, embora o quinto tenha deixado especialmente a desejar).
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O Regresso
4.0 3,5K Assista AgoraLogo depois de receber o Oscar por "Birdman", Alejandro G. Iñárritu aposta todo o seu talento em "O regresso", baseado num livro de Michael Punke. Leonardo DiCaprio interpreta com grande eficácia o explorador e caçador de peles Hugh Glass, que em 1823, depois de uma fuga a indígenas, é atacado por um urso (esta é uma das cenas, sem exagero, mais impressionantes já feitas) e fica com o corpo completamente ferido. Sua equipe, tendo à frente Andrew Henry (Domhnall Gleeson), hesita em deixá-lo para trás. Henry ordena que dois de seus homens, John Fitzgerald (Tom Hardy) e Jim Bridger (Will Poulter), possam cuidar dele até que se busque ajuda. Além disso, Glass tem um filho de origem também indígena, Hawk (Forrest Goodluck). Este fio de narrativa é explorado até o limite por Iñárritu e o corroteirista Mark L. Smith. Já em "Birdman", o diretor mexicano já conseguia expandir uma ideia a princípio simples para um longa substancialmente potente.
Claro que tudo poderia ser diferente se não fosse a fotografia de Emmanuel Lubezki, repetindo a parceria com o diretor que lhe deu o Oscar também da área em "Birdman". Lubezki repete aqui algumas projeções já vistas em "O novo mundo", de outro parceiro seu, Malick, mas desta vez evocando um Oeste selvagem e gelado (as paisagens são do Canadá, da Argentina e dos Estados Unidos), com uma caçada imprevisível e contínua, evocando outros faroestes, como "Quando os homens são homens", de Robert Altman, "Dança com lobos", de Kevin Costner, e principalmente, pela grandiosidade das paisagens e pelo panorama dado a elas, "O portal do paraíso", de Michael Cimino. Impressiona, mais do que tudo (inclusive do que a atuação extremamente física e sofrida de DiCaprio), a maneira como o diretor transporta o espectador para os cenários, uma extensão da realidade. Não apenas as cenas são violentas, como o diretor parece ter construído uma maneira de lançar o espectador em meio a ela (como nas cenas de tiros e flechas dos índios). Todos os movimentos de câmera de Lubezki apanham os personagens em movimento, como se eles estivessem próximos, uma qualidade que já era vislumbrada em "Birdman".
Se às vezes a narrativa diminui de intensidade, Iñárritu mostra uma perícia insuspeita e um traço eclético, com um filme totalmente diferente, no seu tom e metragem, de "Birdman" e mesmo de seus projetos anteriores, como "Babel" e "21 gramas". Com um olho muito poético, ele consegue transformar o sofrimento de um homem na natureza como se ele fosse parte dela, dependente para dormir e comer (significativa a passagem em que ele precisa evocar Han Solo em "O império contra-ataca"). É um filme essencialmente sobre sobreviver e poder refazer a trajetória pessoal e, nesse sentido, "O regresso" é poderoso mesmo quando não consegue aliar as ideias concretas com algumas mais abstratas. Há uma presença religiosa nessa tentativa de Glass confrontar seus próprios limites, e as imagens que remetem a sinos e pirâmides se intensificam em suas lembranças. É visível também a presença, em alguns quadros, de Herzog, sobretudo aquele de "Fitzcarraldo" e "O sobrevivente". Junto a isso, é um filme com um punhado de cenas executadas com perfeição e que cresce na lembrança, principalmente quando alterna os motivos existenciais que perduram na narrativa.
Carol
3.9 1,5K Assista AgoraO diretor Todd Haynes é um dos nomes mais respeitados em Hollywood, um dos poucos vistos com características autorais, já demonstradas em larga escala, seja em Veneno, seja no estranhíssimo Velvet Goldmine ou na homenagem a Bob Dylan em Não estou lá. No entanto, seu grande filme até agora continua sendo Longe do paraíso, em que Dennis Haysbert interpreta Raymond Deagan, um jardineiro afroamericano que se torna próximo de Cathy Whitaker (Julianne Moore), o que causa um escândalo na sociedade conservadora dos Estados Unidos dos anos 1950. Casada com Frank (Dennis Quaid), o qual considera que precisa tratar sua homossexualidade com um psiquiatra, ela apresenta a Raymond a arte moderna por meio de pinturas. Lançado em 2002, Longe do paraíso possui uma maravilhosa atmosfera com a contribuição da fotografia de Edward Lachman.
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Os Oito Odiados
4.1 2,4K Assista AgoraDepois de Django livre, Tarantino volta ao gênero do faroeste em que desenhava um panorama da escravidão nos Estados Unidos, ao mesmo tempo que oferecia uma vingança a seu personagem principal, interpretado por Jamie Foxx. Em Os oito odiados, novamente com uma fotografia excepcional de seu habitual parceiro, Robert Richardson, Tarantino volta a mostrar não exatamente surpresas na estrutura do roteiro (dividido em capítulos como os seus melhores filmes, a começar por Bastardos inglórios), mas na maneira de captar a ação. É como se ele tivesse vendo a estrutura de alguns filmes europeus (vide O gebo e a sombra), com uma caracterização quase teatral. Enquanto Django livre era um faroeste inteligente e plástico, sua sustentação se dava principalmente pelas cenas de tiroteio com a característica mais pop de Tarantino.
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Star Wars, Episódio VII: O Despertar da Força
4.3 3,1K Assista AgoraPara lidar com mitologias cinematográficas, o nome mais acessível nos últimos anos é o de J.J. Abrams. Criador da série Lost, ele fez a terceira parte de Missão impossível e, em seguida, produziu uma espécie de mistura entre Godzilla e Alien em Cloverfield. Mas foi justamente com a retomada de Star Trek, mostrando os personagens em sua juventude, que elevou Abrams ao status de diretor de franquias. Super 8 e a segunda parte de Star Trek apenas antecederam o que ele entrega de melhor: a nostalgia de se reviver um cinema que parecia perdido no tempo.
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Spotlight - Segredos Revelados
4.1 1,7K Assista AgoraAlguns filmes adquirem, de um momento para outro, uma determinada importância que os fazem ser assistidos com mais ou menos expectativa. Alguns correspondem a ela, outros não. Quando o também ator Tom McCarthy (ele está na série Entrando numa fria, como um dos cunhados de Robert De Niro), realizou, por exemplo, O homem da estação, ainda era um cineasta em início de trajetória, e Vencer ou vencer mostrou sua sensibilidade, por meio da bela atuação de Paul Giamatti, enquanto Trocando os pés trouxe mais um Adam Sandler de rotina, mas com Spotlight ele acaba chamando a atenção para si e para o elenco que atrai para esta história baseada em fatos reais.
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O Regresso
4.0 3,5K Assista AgoraLogo depois de receber o Oscar por "Birdman", Alejandro G. Iñárritu aposta todo o seu talento em "O regresso", baseado num livro de Michael Punke. Leonardo DiCaprio interpreta com grande eficácia o explorador e caçador de peles Hugh Glass, que em 1823, depois de uma fuga a indígenas, é atacado por um urso (esta é uma das cenas, sem exagero, mais impressionantes já feitas) e fica com o corpo completamente ferido. Sua equipe, tendo à frente Andrew Henry (Domhnall Gleeson), hesita em deixá-lo para trás. Henry ordena que dois de seus homens, John Fitzgerald (Tom Hardy) e Jim Bridger (Will Poulter), possam cuidar dele até que se busque ajuda. Além disso, Glass tem um filho de origem também indígena, Hawk (Forrest Goodluck). Este fio de narrativa é explorado até o limite por Iñárritu e o corroteirista Mark L. Smith. Já em "Birdman", o diretor mexicano já conseguia expandir uma ideia a princípio simples para um longa substancialmente potente.
Claro que tudo poderia ser diferente se não fosse a fotografia de Emmanuel Lubezki, repetindo a parceria com o diretor que lhe deu o Oscar também da área em "Birdman". Lubezki repete aqui algumas projeções já vistas em "O novo mundo", de outro parceiro seu, Malick, mas desta vez evocando um Oeste selvagem e gelado (as paisagens são do Canadá, da Argentina e dos Estados Unidos), com uma caçada imprevisível e contínua, evocando outros faroestes, como "Quando os homens são homens", de Robert Altman, "Dança com lobos", de Kevin Costner, e principalmente, pela grandiosidade das paisagens e pelo panorama dado a elas, "O portal do paraíso", de Michael Cimino. Impressiona, mais do que tudo (inclusive do que a atuação extremamente física e sofrida de DiCaprio), a maneira como o diretor transporta o espectador para os cenários, uma extensão da realidade. Não apenas as cenas são violentas, como o diretor parece ter construído uma maneira de lançar o espectador em meio a ela (como nas cenas de tiros e flechas dos índios). Todos os movimentos de câmera de Lubezki apanham os personagens em movimento, como se eles estivessem próximos, uma qualidade que já era vislumbrada em "Birdman".
Se às vezes a narrativa diminui de intensidade, Iñárritu mostra uma perícia insuspeita e um traço eclético, com um filme totalmente diferente, no seu tom e metragem, de "Birdman" e mesmo de seus projetos anteriores, como "Babel" e "21 gramas". Com um olho muito poético, ele consegue transformar o sofrimento de um homem na natureza como se ele fosse parte dela, dependente para dormir e comer (significativa a passagem em que ele precisa evocar Han Solo em "O império contra-ataca"). É um filme essencialmente sobre sobreviver e poder refazer a trajetória pessoal e, nesse sentido, "O regresso" é poderoso mesmo quando não consegue aliar as ideias concretas com algumas mais abstratas. Há uma presença religiosa nessa tentativa de Glass confrontar seus próprios limites, e as imagens que remetem a sinos e pirâmides se intensificam em suas lembranças. É visível também a presença, em alguns quadros, de Herzog, sobretudo aquele de "Fitzcarraldo" e "O sobrevivente". Junto a isso, é um filme com um punhado de cenas executadas com perfeição e que cresce na lembrança, principalmente quando alterna os motivos existenciais que perduram na narrativa.