"– Houve um tempo em que eu culpava a tudo e a todos por toda dor, sofrimento e as coisas desprezíveis que aconteciam comigo e que eu via acontecer com o meu povo. Eu culpava todo mundo. Culpava os brancos, culpava a sociedade, culpava Deus. E eu não tinha resposta porque fazia as perguntas erradas. Você deve fazer a pergunta certa.
– E qual é?
– Alguma coisa do que fez tornou sua vida melhor?"
Para mim, o melhor filme do Tarkovsky. Incrível demais. Claro que também gosto muito de outros filmes clássicos de guerra, como Apocalypse Now e A Lista de Schindler, mas os meus preferidos do gênero, atualmente, com certeza são A Infância de Ivan e Túmulo dos Vagalumes - dois filmes geniais que abordam de maneiras diferentes as consequências horríveis que a guera pode gerar para crianças. É impressionante demais esteticamente - e psicologicamente - como os sonhos felizes do Ivan com seus familiares ao sol contrastam com as cenas muito escuras dele acordado na guerra em uma triste busca por vingança. E talvez eu tenha notado errado ou esteja me lembrando errado mas achei sensacional que todas as vezes em que se dá a transição da realidade da guerra para o contexto dos sonhos do Ivan esse momento de transposição acontece como se fosse sem cortes. Como na transição para o sonho extremamente bonito em que a mãe dele diz:
"Se um poço é realmente profundo, você pode ver uma estrela lá embaixo mesmo no meio de um dia ensolarado."
As cenas de sonho, além de serem impressionantes demais pela técnica, me abalaram psicologicamente demais pelo drama. Tirando um sonho que foi um pesadelo muito aterrorizante, todos os outros sonhos mostrados estão entre as cenas mais bonitas que já vi. E claro que as cenas do Ivan acordado também são excelentes, sendo cenas fortemente angustiantes, tristes e tensas, necessárias para o contraste, a crítica e tudo mais. Eu acho o filme fenomenal em todos os aspectos e no final eu chorei. A atuação do Nikolai Burlyayev (Ivan) é talvez para mim a melhor atuação de uma criança que já vi.
O Sartre escreveu uma análise elogiando muito o filme. Aqui um trecho que ele comenta uma cena extremamente emociante do Ivan acordado:
"[...]Não sei nada mais emocionante do que esta longa seqüência: a jornada do rio, longa, lenta e desgarradora: apesar da angústia e da incerteza (foi só fazer correr uma criança todos esses riscos?), os oficiais que o acompanham são perfurados por esta terrível e desolada suavidade. Mas preso à terra e obcecado com os mortos, a criança nada observa, desaparece: ele está indo para o inimigo. O barco retorna ao outro bank; o silêncio reina no meio do rio: o cânone se desgastou. Um dos militares diz ao outro: 'Este silêncio, isto é a guerra' "
Também é sensacional a forma como o Bergman elogiou o filme: "Minha descoberta do primeiro filme de Tarkovsky foi como um milagre. De repente, encontrei-me parado à porta de uma sala cujas chaves, até então, nunca me tinham sido dadas. Era um quarto que eu sempre quis entrar e onde ele estava se movendo livremente e completamente à vontade."
Na cena do tribunal, que ela canta "In the musicals", é extremamente bem dirigido e triste como a música é cortada abruptamente após o verso "There's always someone to catch me. When you fall"; a Selma em sua fantasia está caindo cantando esse verso imaginando que todos os presentes iriam segura-lá mas aí o filme abruptamente volta para a realidade do tribunal com o juiz gritando:"Todos de pé!"
Esse verso da música também se relaciona de forma extremamente bem dirigida e triste na cena em que próximo ao enforcamento jogam o pano na Selma e ela realmente cai de verdade no chão e ninguém segura... Seguram logo em seguida mas para a amarrem em cintos e executarem o enforcamento. Meu Deus, como isso é triste.
Akira Kurosawa sobre Solaris, no jornal Asahi Shinbun, 13 de maio de 1977: "No que diz respeito a Solaris, eu acho que há muitas pessoas reclamando que é muito longo, mas eu não penso assim. Aquelas camadas de memórias de adeus àquela natureza terrena se submergem profundamente abaixo do fundo da história, depois que o personagem principal é enviado em um foguete para a base da estação de satélites e o universo quase tortura a alma do espectador como uma espécie de nostalgia irresistível para a natureza mãe terra, o que provoca saudosismo. Eu vi esse filme tarde da noite em uma sala de pré-visualização em Moscou pela primeira vez, e logo senti meu coração sofrendo em agonia com um desejo de retornar à terra o mais rápido possível. Maravilhoso progresso na ciência que temos desfrutado, mas onde ele vai levar a humanidade afinal? Emoção pura e terrível este filme consegue conjurar em nossa alma. Sem ele, um filme de ficção científica não seria nada mais do que uma fantasia mesquinha.
Estes pensamentos iam e vinham enquanto eu estava olhando para a tela. Tarkovsky estava junto comigo então. Ele estava na esquina do estúdio. Quando o filme terminou, ele se levantou, olhando para mim como se estivesse tímido. Eu disse a ele, 'Muito bom. Isso me faz sentir medo real'. Tarkovsky sorriu timidamente, mas feliz. E nós brindamos vodka no restaurante do Instituto de Cinema. Tarkovsky, que normalmente não bebia, bebeu vodka e chegou a desligar o alto-falante de onde a música estava tocando no restaurante, e começou a cantar a música tema dos samurais de Os Sete Samurais no topo de sua voz. Como se para rivalizar com ele, eu me juntei. Pois eu estava naquele momento muito feliz em me encontrar vivendo na Terra.
Solaris faz um espectador sentir isso, e até mesmo este único fato nos mostra que Solaris não é um filme de ficção científica comum. Isso de alguma forma provoca puro horror em nossa alma. E está sobre o controle total das profundas ideias de Tarkovsky[...]. Cada imagem de Solaris dá testemunho dos talentos quase deslumbrantes inerentes a Tarkovsky. Muitas pessoas resmungam que os filmes de Tarkovsky são difíceis, mas eu não penso assim. Seus filmes mostram como Tarkovsky é extraordinariamente sensível[...]. Sua atitude própria me faz acreditar que ele tem potenciais maravilhosos em seu futuro. Não pode haver um futuro brilhante para aqueles que estão prontos para explicarem tudo sobre o seu próprio filme."
Quando Tarkovsky morreu, o Kurosawa escreveu em obituário:"[...]Eu nunca esquecerei o olhar em seus olhos amigáveis.Tanto nós concordamos em muitas coisas sobre a vida e filme. Mas somos tão diferentes na disposição que nossos resultados são bastante opostos em caráter. Ele é um poeta, eu não sou. Conversamos um com o outro e concordamos que um filme não deveria tentar explicar nada. O cinema não é um meio adequado de explicação. Aqueles que o vêem devem ser deixados livres para sentir seu conteúdo. Deve estar aberto a uma variedade de interpretações. No entanto, Tarkovsky absolutamente nunca explica, ele não dá nenhuma explicação. Seu rigor é incrível ... Sua incomum sensibilidade é ao mesmo tempo esmagadora e assombrosa, quase atinge uma intensidade patológica, provavelmente não há igual entre os cineastas vivos agora. Por exemplo, muitas vezes vemos água em seus filmes, o que é retratado em uma variedade de expressividade[...]Eu amo todos os filmes de Tarkovsky. Eu amo a sua personalidade e todas as suas obras. Cada cena de seus filmes é uma imagem maravilhosa em si mesma. Mas a imagem acabada nada mais é do que a realização imperfeita de sua ideia. Suas ideias só são realizadas em parte. E ele tinha que se contentar com isso."
“Ah”, disse o rato, “o mundo torna-se a cada dia mais estreito. A princípio era tão vasto que me dava medo, eu continuava correndo e me sentia feliz com o fato de que finalmente via à distância, à direita e à esquerda, as paredes, mas essas longas paredes convergem tão depressa uma para a outra que já estou no último quarto e lá no canto fica a ratoeira para a qual eu corro”. -“Você só precisa mudar de direção”, disse o gato, e devorou-o.
A Outra História Americana
4.4 2,2K Assista Agora"– Houve um tempo em que eu culpava a tudo e a todos por toda dor, sofrimento e as coisas desprezíveis que aconteciam comigo e que eu via acontecer com o meu povo. Eu culpava todo mundo. Culpava os brancos, culpava a sociedade, culpava Deus. E eu não tinha resposta porque fazia as perguntas erradas. Você deve fazer a pergunta certa.
– E qual é?
– Alguma coisa do que fez tornou sua vida melhor?"
A Infância de Ivan
4.3 155 Assista AgoraPara mim, o melhor filme do Tarkovsky. Incrível demais.
Claro que também gosto muito de outros filmes clássicos de guerra, como Apocalypse Now e A Lista de Schindler, mas os meus preferidos do gênero, atualmente, com certeza são A Infância de Ivan e Túmulo dos Vagalumes - dois filmes geniais que abordam de maneiras diferentes as consequências horríveis que a guera pode gerar para crianças.
É impressionante demais esteticamente - e psicologicamente - como os sonhos felizes do Ivan com seus familiares ao sol contrastam com as cenas muito escuras dele acordado na guerra em uma triste busca por vingança.
E talvez eu tenha notado errado ou esteja me lembrando errado mas achei sensacional que todas as vezes em que se dá a transição da realidade da guerra para o contexto dos sonhos do Ivan esse momento de transposição acontece como se fosse sem cortes. Como na transição para o sonho extremamente bonito em que a mãe dele diz:
"Se um poço é realmente profundo, você pode ver uma estrela lá embaixo mesmo no meio de um dia ensolarado."
As cenas de sonho, além de serem impressionantes demais pela técnica, me abalaram psicologicamente demais pelo drama. Tirando um sonho que foi um pesadelo muito aterrorizante, todos os outros sonhos mostrados estão entre as cenas mais bonitas que já vi. E claro que as cenas do Ivan acordado também são excelentes, sendo cenas fortemente angustiantes, tristes e tensas, necessárias para o contraste, a crítica e tudo mais.
Eu acho o filme fenomenal em todos os aspectos e no final eu chorei.
A atuação do Nikolai Burlyayev (Ivan) é talvez para mim a melhor atuação de uma criança que já vi.
O Sartre escreveu uma análise elogiando muito o filme. Aqui um trecho que ele comenta uma cena extremamente emociante do Ivan acordado:
"[...]Não sei nada mais emocionante do que esta longa seqüência: a jornada do rio, longa, lenta e desgarradora: apesar da angústia e da incerteza (foi só fazer correr uma criança todos esses riscos?), os oficiais que o acompanham são perfurados por esta terrível e desolada suavidade. Mas preso à terra e obcecado com os mortos, a criança nada observa, desaparece: ele está indo para o inimigo. O barco retorna ao outro bank; o silêncio reina no meio do rio: o cânone se desgastou. Um dos militares diz ao outro: 'Este silêncio, isto é a guerra' "
Também é sensacional a forma como o Bergman elogiou o filme: "Minha descoberta do primeiro filme de Tarkovsky foi como um milagre. De repente, encontrei-me parado à porta de uma sala cujas chaves, até então, nunca me tinham sido dadas. Era um quarto que eu sempre quis entrar e onde ele estava se movendo livremente e completamente à vontade."
Dançando no Escuro
4.4 2,3K Assista AgoraNa cena do tribunal, que ela canta "In the musicals", é extremamente bem dirigido e triste como a música é cortada abruptamente após o verso "There's always someone to catch me. When you fall"; a Selma em sua fantasia está caindo cantando esse verso imaginando que todos os presentes iriam segura-lá mas aí o filme abruptamente volta para a realidade do tribunal com o juiz gritando:"Todos de pé!"
Esse verso da música também se relaciona de forma extremamente bem dirigida e triste na cena em que próximo ao enforcamento jogam o pano na Selma e ela realmente cai de verdade no chão e ninguém segura... Seguram logo em seguida mas para a amarrem em cintos e executarem o enforcamento. Meu Deus, como isso é triste.
Solaris
4.2 369 Assista AgoraAkira Kurosawa sobre Solaris, no jornal Asahi Shinbun, 13 de maio de 1977: "No que diz respeito a Solaris, eu acho que há muitas pessoas reclamando que é muito longo, mas eu não penso assim. Aquelas camadas de memórias de adeus àquela natureza terrena se submergem profundamente abaixo do fundo da história, depois que o personagem principal é enviado em um foguete para a base da estação de satélites e o universo quase tortura a alma do espectador como uma espécie de nostalgia irresistível para a natureza mãe terra, o que provoca saudosismo.
Eu vi esse filme tarde da noite em uma sala de pré-visualização em Moscou pela primeira vez, e logo senti meu coração sofrendo em agonia com um desejo de retornar à terra o mais rápido possível. Maravilhoso progresso na ciência que temos desfrutado, mas onde ele vai levar a humanidade afinal? Emoção pura e terrível este filme consegue conjurar em nossa alma. Sem ele, um filme de ficção científica não seria nada mais do que uma fantasia mesquinha.
Estes pensamentos iam e vinham enquanto eu estava olhando para a tela. Tarkovsky estava junto comigo então. Ele estava na esquina do estúdio. Quando o filme terminou, ele se levantou, olhando para mim como se estivesse tímido. Eu disse a ele, 'Muito bom. Isso me faz sentir medo real'. Tarkovsky sorriu timidamente, mas feliz. E nós brindamos vodka no restaurante do Instituto de Cinema. Tarkovsky, que normalmente não bebia, bebeu vodka e chegou a desligar o alto-falante de onde a música estava tocando no restaurante, e começou a cantar a música tema dos samurais de Os Sete Samurais no topo de sua voz. Como se para rivalizar com ele, eu me juntei. Pois eu estava naquele momento muito feliz em me encontrar vivendo na Terra.
Solaris faz um espectador sentir isso, e até mesmo este único fato nos mostra que Solaris não é um filme de ficção científica comum. Isso de alguma forma provoca puro horror em nossa alma. E está sobre o controle total das profundas ideias de Tarkovsky[...]. Cada imagem de Solaris dá testemunho dos talentos quase deslumbrantes inerentes a Tarkovsky. Muitas pessoas resmungam que os filmes de Tarkovsky são difíceis, mas eu não penso assim. Seus filmes mostram como Tarkovsky é extraordinariamente sensível[...]. Sua atitude própria me faz acreditar que ele tem potenciais maravilhosos em seu futuro. Não pode haver um futuro brilhante para aqueles que estão prontos para explicarem tudo sobre o seu próprio filme."
Quando Tarkovsky morreu, o Kurosawa escreveu em obituário:"[...]Eu nunca esquecerei o olhar em seus olhos amigáveis.Tanto nós concordamos em muitas coisas sobre a vida e filme. Mas somos tão diferentes na disposição que nossos resultados são bastante opostos em caráter. Ele é um poeta, eu não sou.
Conversamos um com o outro e concordamos que um filme não deveria tentar explicar nada. O cinema não é um meio adequado de explicação. Aqueles que o vêem devem ser deixados livres para sentir seu conteúdo. Deve estar aberto a uma variedade de interpretações. No entanto, Tarkovsky absolutamente nunca explica, ele não dá nenhuma explicação. Seu rigor é incrível ...
Sua incomum sensibilidade é ao mesmo tempo esmagadora e assombrosa, quase atinge uma intensidade patológica, provavelmente não há igual entre os cineastas vivos agora. Por exemplo, muitas vezes vemos água em seus filmes, o que é retratado em uma variedade de expressividade[...]Eu amo todos os filmes de Tarkovsky. Eu amo a sua personalidade e todas as suas obras. Cada cena de seus filmes é uma imagem maravilhosa em si mesma. Mas a imagem acabada nada mais é do que a realização imperfeita de sua ideia. Suas ideias só são realizadas em parte. E ele tinha que se contentar com isso."
Eu, Daniel Blake
4.3 533 Assista AgoraPequena Fábula - Franz Kafka
“Ah”, disse o rato, “o mundo torna-se a cada dia mais estreito. A princípio era tão vasto que me dava medo, eu continuava correndo e me sentia feliz com o fato de que finalmente via à distância, à direita e à esquerda, as paredes, mas essas longas paredes convergem tão depressa uma para a outra que já estou no último quarto e lá no canto fica a ratoeira para a qual eu corro”. -“Você só precisa mudar de direção”, disse o gato, e devorou-o.
Bancando o Águia
4.5 135 Assista Agoragenial é pouco