Mesmo com problemas, "Salve-se Quem Puder" foi a melhor novela de Daniel Ortiz
Daniel Ortiz ainda pode ser considerado um autor 'novato'. Afinal, "Salve-se Quem Puder" foi sua primeira novela autoral, de fato. As duas anteriores foram criadas por outros escritores. A sua estreia como autor solo foi com a despretensiosa "Alto Astral", em 2014, baseada na sinopse da saudosa Andrea Maltarolli, falecida em 2009. Foi um começo bem-sucedido. Já a fraca "Haja Coração", de 2016, era um remake de "Sassaricando" (1988), de Silvio de Abreu, escritor veterano que o lançou. E a produção que chegou ao fim nesta sexta-feira(16/07/2021), uma obra original, já pode ser considerada o melhor trabalho de Ortiz.
A premissa de "Salve-se Quem Puder" tinha tudo para cair no absurdo e no ridículo, mesmo na faixa leve das 19h. E funcionou. Os sonhos das protagonistas Luna (Juliana), Alexia (Deborah) e Kyra (Vitória) são interrompidos quando elas presenciam a execução de um juiz (vivido por Ailton Graça) e são obrigadas a viver sob custódia do Programa de Proteção à Testemunha. Para sobreviver, elas mudam o nome, a aparência, o estilo de vida e vão morar na fictícia Judas do Norte, no interior de São Paulo, depois que são dadas como mortas. Luna assumia o nome de Fiona, Alexia virava Josimara e Kyra era Cleyde, novas pessoas com um padrão de vida bem diferente. E tudo deu errado e o trio acaba voltando para São Paulo.
O início da novela tem um clima de superprodução. Isso porque abusaram dos efeitos especiais para a reprodução de um furacão no México, bem no dia que as protagonistas testemunham o assassinato que transforma suas vidas. E valeu a pena o esforço da produção. Foram 17 dias de filmagem. Os efeitos convenceram e não ficaram devendo aos filmes que utilizam os recursos em enredos com catástrofes naturais.
Uma qualidade do folhetim vista logo no começo foi a habilidade em mesclar sequências de ação com situações cômicas, o que costuma ser uma tarefa complicada. Não demorou para o público comprar a história e se envolver com os conflitos já promovidos diante de tantas situações um tanto quanto inusitadas.
A história teve um humor farsesco e infantil, o que não é um demérito, apenas uma característica. E o elenco conseguiu entender bem a proposta da novela, após um início um pouco inseguro. Os personagens caíram no gosto do público e o sucesso de audiência foi quase imediato. O enredo emplacou e tudo se encaminhava bem. A audiência estava em torno dos 29 pontos, índice excelente para a faixa. (Todavia, a trama sofreu uma interrupção por conta da pandemia do novo coronavírus. As gravações foram paralisadas em março de 2020 e retomadas apenas em setembro, com perdas no elenco, redução do número de capítulos e entrada de novos personagens. Foram gravados durante a pandemia 53 capítulos e a obra perdeu 55 capítulos. A continuação no ar só foi iniciada em maio de 2021, após a reprise de toda a chamada primeira fase. E o risco de se perder por completo, como ocorreu com "Amor de Mãe", era alto.) Felizmente o autor se saiu muito bem e conseguiu deixar seu roteiro mais atrativo. Ainda acertou quando transformou as fugitivas em 'heroínas' atrapalhadas, em um estilo parecido com "As Panteras", e sem inteligência alguma.
A diminuição do número de capítulos evitou a famigerada 'barriga' (o período de enrolação, quando nada de muito relevante acontece durante semanas) e o foco maior no trio protagonista deixou a novela bem mais dinâmica. Vale lembrar que Ortiz deixou um ótimo gancho no término da primeira parte:
a vilã Dominique (Guilhermina Guinle) flagrando Luna viva e tentando matá-la.
A continuação da sequência, muito bem dirigida pela equipe de Fred Mayrink, ficou tão perfeita que foi difícil perceber que era fruto de gravações repletas de protocolos sanitários. E as cenas de ação agradaram. (Aliás, ter ignorado a pandemia foi o maior acerto da retomada. Uma das causas para o naufrágio de "Amor de Mãe" foi a inserção do coronavírus no enredo.)
E a segunda parte apresentou ótimos ganchos em praticamente todos os capítulos, o que virou um bom chamariz para a produção. Fora o atrativo de ter sido a única novela inédita da TV no momento. A equipe disfarçou com habilidade as limitações impostas pela pandemia e o foco quase total em cima dos desdobramentos do núcleo principal, incluindo os dilemas das mocinhas em seus respectivos triângulos amorosos, foi o bastante para prender o telespectador e promover um bom engajamento nas redes sociais. Até a entrada de novos personagens não prejudicou o roteiro e as alternativas para os intérpretes que precisaram se afastar foram satisfatórias
, como Otávio Augusto (Inácio) ---- grupo de risco ---- aparecendo por vídeo-chamada e Sabrina Petraglia (Micaela) --- na época grávida do segundo filho --- protagonizando uma bonita despedida ao lado de Marcos Pitombo (Bruno). Também foi uma boa ideia manter Marianna Armellini na trama, mesmo após a saída repentina de Micaela. A estratégia da criação de uma 'gêmea boa' (a falsa puritana Marlene) funcionou, pois a gêmea má perdeu a função sem o alvo de sua vingança ---- um conflito que nem atraía antes da paralisação, vale ressaltar. Ainda serviu para substituir a querida Marilu Bueno, que é do grupo de risco.
Aliás, a escalação do elenco, em sua grande maioria, foi muito feliz. A sintonia das protagonistas foi imediata e ficou ainda melhor ao longo dos meses. Juliana Paiva emocionou com sua Luna, Deborah Secco divertiu com Alexia e Vitória Strada mostrou uma nova faceta cômica na pele da atrapalhada Kyra, após duas mocinhas dramáticas seguidas na ainda inicial carreira.
Guilhermina Guinle e Leopoldo Pacheco convenceram como os grandes vilões Dominique e Hugo; enquanto Rafael Cardoso esteve ótimo na pele do dúbio Renzo, que teve um bonito arco de redenção.
Bruno Ferrari brilhou como Rafael e mostrou mais uma vez que merece melhores oportunidades na televisão. Thiago Fragoso virou um especialista em heróis românticos e novamente roubou a cena (e uma das mocinhas) na pele do sensível Alan. Felipe Simas se firmou de vez no primeiro time da emissora e fez do sofrido Téo um dos destaques da novela. João Baldasserini e Grace Gianoukas fizeram uma divertida dupla como os caipiras Zezinho e Ermelinda, ao mesmo tempo que Murilo Rosa emocionou na pele de Mário.
Já Flávia Alessandra acabou valorizada pela primeira vez por um autor que não foi Aguinaldo Silva quando fez a novela Duas Caras. Até hoje os melhores papéis da carreira da atriz foram os escritos pelo escritor e amigo pessoal Walcyr Carrasco.
Felizmente, Ortiz a presenteou com Helena, que inicialmente parecia uma vilã camuflada até se revelar uma grande sofredora que nunca superou a 'morte' da filha e ainda caiu em uma armadilha criada pelo marido.
Flávia protagonizou muitas cenas intensas e virou um dos maiores trunfos da história. Por sinal, é dela a cena mais emocionante de "Salve-se Quem Puder":
o reencontro de Helena e Luna. A intérprete deu um show de emoção ao lado da talentosa Juliana Paiva.
Foi a catarse mais aguardada do folhetim. Ainda é necessário elogiar outros nomes, como Otávio Augusto, Carolina Kasting (Agnes) ---- prejudicada com o encurtamento da produção ----, Daniel Rangel (Tarantino), Valentina Bulc (Bia), Ana Carbatti (Consulesa Adriana), Babu Santana (Nanico), Sophia Abrahão (Júlia), Juliana Alves (Renatinha) e Cristina Pereira (Lúcia).
Claro que nem tudo funcionou. O núcleo da ginástica artística foi o maior prejudicado pela interrupção das gravações e corte de capítulos. Ainda assim, nunca despertou interesse.
A trama de Bia, uma mulher linda que sofria com sua aparência por ter uma pequena cicatriz em virtude de um marcapasso, era forçada e todos os personagens ao redor dela não emplacaram. Ao menos o casal com Tarantino deu certo. Outro equívoco foi o enredo de Petra (Bruna Guerin). A vilã não aconteceu e a atriz deixou a desejar. Todas as tentativas de conquistar Alan andavam em círculos e quando a personagem sumiu por vários capítulos nem deu para notar a ausência. Ironicamente, a irmã de Alexia era uma atriz que não emplacava em uma novela e acabou sumindo da história. É necessário criticar também o pouco destaque dos atores negros. Não adianta um elenco diverso se não há conflitos relevantes para valorizar os intérpretes. Juliana Alves, Aline Dias (Úrsula) e Dandara Mariana (Bel) eram as rivais das mocinhas brancas e mal apareceram. Gabriela Moreyra entrou na segunda fase, e Aurora teve ainda menos destaque que as colegas. Cosme dos Santos (Edgar) foi outro subaproveitado.
O autor também não foi feliz no excesso de triângulos amorosos. Daniel sempre gostou do recurso, só que perdeu a mão. O trio formado por Rafael, Kyra e Alan era o único com uma boa construção e valeria para toda a trama.
Não havia necessidade de inserir um amor de infância de Luna e forçar uma dúvida que a mocinha já não tinha em relação a Teo apenas para criar um 'suspense' no final. Rodrigo Simas esteve bem como Alejandro, e com a saída de José Condessa (Juan) bastaria focar nos outros vários dramas da personagem para sustentar a história. E Luna era a que tinha o melhor enredo. Inclusive, ainda no núcleo, o escritor esqueceu que Gabi (Nina Frosi) armou uma falsa traição de Juan, no início da novela, para Luna terminar com ele e fingiu que nada aconteceu na primeira fase. Seria até menos pior se houvesse uma construção amorosa entre ela e Alejandro, pois ficou forçado a junção entre o mexicano e Bel.
Por sinal, um equívoco arrastar os triângulos até os últimos capítulos.
Colocar mocinhas indecisas até o fim enfraquece a narrativa dos romances e cria um suspense desnecessário. Qual a necessidade de deixar as duas bancando as sonsas e fazendo os rapazes de idiotas?
A audiência não diminuiria se tudo tivesse sido resolvido antes e deixado para os momentos derradeiros apenas a conclusão da ótima trama sobre a organização criminosa que perseguia as mocinhas.
Só que as qualidades da produção foram maiores que os defeitos. E não é exagero afirmar que o encurtamento da trama beneficiou muito o conjunto. Até pelas próprias declarações de Ortiz.
Segundo o autor, haveria outro triângulo amoroso entre Helena, Agnes e Mário, com a mãe de Kyra grávida de um filho do pai de Luna. O núcleo da ginástica artística também teria um triângulo com Bia, Tarantino e mais uma personagem.
Ou seja, o risco de se perder com mais de 160 capítulos, como aconteceu em "Haja Coração", era bem alto. A história ficou bem mais agradável e redonda com 107 capítulos.
As melhores cenas da última semana foram em torno do encerramento da saga dos vilões.
A morte de Hugo, assassinado por Helena após ter sequestrado a ex e Luna, e a prisão de Dominique foram resultado de conflitos muito bem dirigidos e interpretados. Destaque para Guilhermina Guinle, Leopoldo Pacheco, Flávia Alessandra, Juliana Paiva, Deborah Secco e Felipe Simas. O único equívoco foi a não participação de Kyra. A terceira protagonista ficou de fora da conclusão de sua própria história porque o autor resolveu priorizar o triângulo com Alan e Rafael. E pelo menos Vitória Strada protagonizou uma bela cena com Carolina Kasting, quando Kyra voltou para casa e fez uma surpresa para sua mãe. Outro lindo momento foi quando Luna reencontrou seu pai e os dois deram um abraço caloroso. Ju Paiva e Murilo Rosa emocionaram.
Uma pena que o autor tenha pecado nos capítulos finais.
Ter resolvido o enredo da organização criminosa na segunda e na terça, deixou os três dias restantes arrastados e baseados apenas em triângulos amorosos. Após todo um desenvolvimento entre Kyra e Alan, o autor resolveu juntar a personagem com Rafael, o seu primeiro amor. Vitória teve química com Bruno e Thiago e o triângulo foi o único consistente. Ou seja, nenhum final ficaria forçado. Mas da forma como o autor fez ficou. Alan pediu Kyra em casamento e teve o pedido negado. Isso depois que Júlia botou Kyra contra a parede porque estava apaixonada pelo Rafael. E Kyra nem se despediu das crianças que tanto a amavam e muito menos do Seu Inácio, que só tomava remédio por causa dela. Pareceu, ainda, que a esterilidade de Alan era um 'defeito'. Custava ter desenvolvido uma relação do Alan com Júlia ao invés de simplesmente juntá-los no final de forma gratuita? Ou então ter escrito uma cena em que Alan conhece a personagem de Mariana Ximenes. Isso porque a atriz foi chamada para uma participação no final, em meio a uma pandemia, e nem teve a cena exibida ---- ela faria par com Teo, caso Luna escolhesse Alejandro. Um total descaso com a intérprete.
O final de Luna com Teo foi coerente com toda a narrativa, mas Ortiz também errou ao estender até o final uma dúvida que a mocinha nunca teve. Sempre foi óbvio o seu amor pelo enteado da mãe e essa tentativa de criar um suspense bobo prejudica o próprio roteiro. Daria tempo para ter um desenvolvimento entre Alejandro e Bel, de uma forma que valorizaria Dandara Mariana, tão deslocada no enredo. Mas o escritor preferiu apenas empurrá-la para Alejandro nos momentos finais e sem construção. Isso é péssimo para qualquer novela. Daniel também falhou ao não exibir o final de Bruno e Micaela (os atores gravaram durante a pandemia a última cena e a atriz estava grávida). A reconciliação entre Rafael e Renzo também fez falta. Decepcionante. O ponto alto do desfecho foi Petra sendo expulsa do elenco da novela. Alexia ganhando a fama e o reconhecimento que tanto almejou também foi um acerto, assim como a cena final com as três em Cancún e brindando a amizade que acabou criada em meio a um furacão que estava prestes a retornar.
"Salve-se Quem Puder" se mostrou um folhetim leve, agradável e que se tornou uma boa alternativa para aliviar um pouco a cabeça do brasileiro em tempos tão difíceis. Aquele típico entretenimento bobinho e despretensioso, mas não menos necessário. Entre erros e acertos, o saldo ficou positivo. O sucesso é uma resposta justa do público diante do que foi apresentado.
Elenco negro não foi valorizado em "Salve-se Quem Puder"
A novela das sete se encaminha para o final e a trama de Daniel Ortiz merece elogios. O autor conseguiu criar uma trama com traços bastante infantis que conquistou o público e acertou na escalação de grande parte do elenco. Todavia, "Salve-se Quem Puder" também teve problemas visíveis e um deles foi a pouca valorização do elenco negro.
Inicialmente, causou a melhor das impressões a escolha de vários intérpretes negros que não estavam na condição de empregados ou pobres ---- estereótipo corriqueiro nas novelas. Todos tinham uma boa condição e pareciam ter boas tramas. Mas só parecia. Ao longo dos meses foi ficando visível a função de quase todos eles: serem 'escada' ou antagonistas dos brancos. Caso tivessem um bom destaque, até valeria a intenção. Só que não foi o caso.
Renatinha (Juliana Alves) e Úrsula (Aline Dias) são os maiores exemplos. As duas agiram como vilãs em quase toda a história e só apresentaram uma 'redenção' na reta final. A primeira é ex-namorada e secretária de Rafael (Bruno Ferrari), por quem nutria uma paixão obsessiva.
Passou o tempo todo se rebaixando por ele. Já a segunda era namorada de Teo (Felipe Simas) e sempre foi viciada em antidepressivos. Nunca superou o término do relacionamento. As duas eram 'rivais' de Kyra (Vitória Strada) e Luna (Juliana Paiva), respectivamente. E não tiveram um bom destaque. Bel (Dandara Mariana) é uma dançarina que se interessou por Zezinho (João Baldasserini). Não demorou para virar a 'adversária' de Alexia (Deborah Secco) na disputa pelo caipira. Se a situação ao menos rendesse boas cenas para a atriz, daria para relevar. Mas a personagem interpretada pela talentosa Dandara teve ainda menos destaque que Renatinha e Úrsula. O autor resolveu criar de última hora um interesse de Bel em Alejandro (Rodrigo Simas), novo perfil que entrou após a interrupção da novela, apenas para não deixá-la mais avulsa do que já estava.
Outro papel que não teve qualquer relevância foi Dionice, melhor amiga de Bia (Valentina Bulc). Interpretada por Bárbara Sut, a personagem teve poucas cenas. No caso, ainda é possível justificar em virtude do encurtamento do folhetim. Como as gravações foram paralisadas com a pandemia do novo coronavírus e só retornaram meses depois, com um encurtamento de 55 capítulos, o núcleo da ginástica artística acabou bem prejudicado. Mas os outros casos citados nada tiveram a ver com o enxugamento da história. Vale citar também a ótima Ana Carbatti, que vive a Consulesa Adriana, que oferece proteção para o trio protagonista. Dá para contar nos dedos as sequências que contaram com a presença da atriz. E o que comentar sobre Cosme dos Santos, o Edgar? Pior ainda o que houve com Vicky, vivida por Mila Carmo. A funcionária do Empório era amiga de Luna, tinha poucas cenas, e do nada virou uma mau-caráter.
É de se lamentar ainda a pouca relevância da ótima Gabriela Moreyra, que entrou na chamada 'segunda parte' para viver Aurora, prima de Renzo (Rafael Cardoso). A personagem só foi criada para substituir Cristina Pereira (Lúcia), intérprete da avó do rapaz, porque a veterana é do grupo de risco. Mas o autor não criou nenhum novo conflito para o perfil. A menina serve apenas para ouvir os desabafos de Renzo e aparece raras vezes. A única exceção do elenco negro da trama é Babu Santana. O ator também entrou na 'segunda fase' e tem um bom destaque como Nanico, policial que passou a proteger as protagonistas e acabou se envolvendo com Ermelinda (Grace Gianoukas). Pena que seja um caso isolado.
"Salve-se Quem Puder" pecou no desenvolvimento dos personagens negros. Não adianta escalar um elenco mais diverso se nenhuma história relevante se mostra presente nos núcleos onde os atores foram colocados. Esse fato sempre gerou um incômodo e vale a reflexão. Até para Daniel Ortiz.
"Salve-se Quem Puder" provou que é necessário um cuidado na escalação do elenco infantil
Não é fácil escalar um elenco e essa dificuldade duplica quando se trata de atores mirins. Embora exista muita procura, em virtude da necessidade dos personagens terem filhos, a oferta nem sempre condiz com a expectativa. Muitas vezes a profissão nem é o sonho da criança, mas uma ambição dos pais. Acaba sendo mais complicado achar pequenos que tenham desenvoltura diante das câmeras. Todavia, há muitos talentos revelados e exemplos não faltam. Mas o problema da seleção salta aos olhos em "Salve-se Quem Puder".
Alice Palmar e Ygor Marçal interpretam Queen e Mosquito, filhos adotivos de Alan (Thiago Fragoso). As crianças têm uma grande importância para o núcleo protagonizado pelo advogado. Afinal, é por causa da indisciplina dos pequenos que o personagem acaba contratando Kyra (Vitória Strada), chamada de Cleide, como babá. É o caso do patrão que se apaixona pela cuidadora de seus herdeiros, típico clichê visto inúmeras vezes em outras novelas, livros, peças teatrais e filmes. Ou seja, um cuidado maior na escalação era fundamental.
As crianças ainda não estavam prontas para tamanho desafio. O autor Daniel Ortiz escreve muitas falas para os personagens e os dois falam tudo decoradinho, parecendo um jogral. Não há emoção ou verdade em praticamente nada do que é dito. Parece muito uma peça infantil produzida em escolas, onde todos os pequenos participam mesmo sem experiência alguma em atuação. Para culminar, há uma clara dificuldade de dicção. Muitas vezes fica difícil entender o que os filhos de Alan estão falando. E é normal porque ambos têm apenas seis anos.
A culpa, claro, não é dos atores mirins. São apenas crianças. Mas quem fez a escolha merece críticas. O próprio autor também se equivocou quando colocou uma grande quantidade de texto na boca dos pequenos. Se o intuito era colocar os perfis com tantas falas, por qual razão não escalaram ao menos crianças mais velhas? Com um pouco mais de experiência? Aliás, não falta exemplo visto na própria Globo nos últimos anos. Maria Luiza Galhano deu um show como Florzinha em "Espelho da Vida" (2019) e Maju Lima emocionou na pele da Isabel na primeira fase de "Éramos Seis" (2019).
Até a reprise de "A Vida da Gente" (2011) mostra o acerto na escalação das crianças. Jesuela Moro esteve impecável na pele da provocativa Júlia e honrava o texto que Lícia Manzo escrevia para a pequena. Victor Navega Motta foi outro bom nome e o garoto emocionou como o tímido Francisco. Já Kaic Crescente também convenceu como o carente Tiago. A produção da impecável novela das seis expôs um cuidado na escolha de cada ator mirim e fez toda diferença.
Inevitável, ainda, não comparar o caso de "Salve-se Quem Puder" com a produção que a antecedeu. Valentina Vieira e João Bravo divertiram e emocionaram o público em "Bom Sucesso", quando interpretaram com brilhantismo Sofia e Peter. Mas tem a questão da idade. Ele tinha dez anos e ela onze. Isso conta muito. Ou seja, se a criança não for pelo menos um pouquinho mais velha, a lição é clara: não a escale para um personagem que exija muito. Dificilmente haverá um bom retorno por razões óbvias. O menino e a menina ainda estão no processo do desenvolvimento da dicção. Como querem que ainda atuem com maior precisão? Difícil. Nada contra intérpretes muito pequenos, mas caso sejam, que vivam na trama personagens com poucas falas ou não muito importantes. Não é o caso da novela das sete que está perto do fim.
A retomada da novela, quase sete meses depois da interrupção das gravações por conta da pandemia, ao menos expôs uma leve melhora no desempenho de Alice Palmar. E as crianças têm o carisma como elemento de apoio. Mas "Salve-se Quem Puder", mesmo sem a intenção, deixou claro que é necessário um cuidado redobrado na escolha do elenco infantil. Para o bem dos pequenos e da novela.
"Malhação Sonhos" abordou câncer de mama de forma corajosa e responsável, enquanto que na reprise censurou cena mais importante
A temporada de "Malhação" exibida em 2014 foi um grande acerto e a reprise tem sido muito bem-vinda. Aliás, vem marcando mais audiência que a exibição original. Além dos ótimos pares românticos, da trama verossímil, dos bons conflitos, da atrativa história, do texto de qualidade e do elenco de gratas revelações, a história de Rosane Svartman e Paulo Halm foi muito feliz na abordagem de temas importantes para a sociedade.
O câncer de mama, por exemplo, foi explorado de forma marcante. A maneira de prevenir o câncer foi realizada através de uma cena sensível e de muito bom gosto. A doença foi inserida na trama com Lucrécia, mãe rígida de Jade (Anajú Dorigon) e professora da Ribalta. A cena onde ela apalpa os seios diante do espelho e chora foi muito bonita, além de importante. Helena Fernandes emocionou.
Os autores foram muito felizes na inserção deste útil tema na temporada, ainda mais no mês que foi exibida na época (outubro), onde há a campanha 'Outubro Rosa', responsável pela conscientização da importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de mama.
E o interessante da sequência é que não foi preciso uma só palavra para deixar a história da personagem clara, assim como a utilidade pública do autoexame das mamas. Não precisou de didatismo. Todo o conjunto de extremo bom gosto durou menos de um minuto, mas deixou seu recado.
A teledramaturgia não tem obrigação de ser informativa e muito menos educativa. É um mero e saudável entretenimento, sempre é bom enfatizar. Entretanto, quando uma produção se propõe a informar em prol de uma causa, é preciso fazer com competência. E "Malhação" conseguiu atingir este objetivo com louvor.
É preciso citar ainda a ousadia de Rosane Svartman e Paulo Halm, que conseguiram driblar todas as limitações do horário, marcado pelas constantes intervenções do Ministério da Justiça. Tanto que era impensável, até hoje, ter em "Malhação" uma cena com uma mulher de seios à mostra, ainda que seja por algo de utilidade pública.
Vale destacar também um outro tema muito importante que foi abordado na temporada: o preconceito. Através de Jeff (Cadu Libonati) e Lincoln (Edmilson Barros), a homofobia foi tratada de uma forma concreta e apropriada para o público adolescente. Ironicamente, um cozinheiro não admite que seu filho dance com a turma da Ribalta por não considerar isso 'coisa de homem'. Jeff ainda se vê 'obrigado' a assumir a paternidade do filho de sua amiga ---- agora namorada (Mari - Maria Luiza) ---- para ajudá-la e também com o intuito de não duvidarem mais de sua sexualidade. Outro tema bem explorado.
"Malhação Sonhos" merece elogios pelo conjunto da obra, enquanto que Rosane Svartman e Paulo Halm merecem o reconhecimento pelo bom trabalho que apresentam. Os autores conseguiram mesclar ficção e temas de utilidade pública com muita competência. Uma pena que a reprise tenha cortado a cena em que o seio da atriz aparece. Se trata de uma censura incompreensível. Há sete anos foi uma atitude elogiosa. Agora, com o corte da emissora, parece que retrocedemos.
O autor tinha conseguido encerrar a chamada "primeira parte" com um gancho de tirar o fôlego: Luna (Juliana Paiva) sendo descoberta por Dominique (Guilhermina Guinle). O público demorou longos meses para ver a continuação da cena, mas a espera valeu a pena. A novela teve um retorno com o pé direito e o lado positivo de tanto contratempo foi a aceleração do enredo central. Isso porque Daniel contou que esse flagra da vilã só aconteceria depois do capítulo 90 e acabou obrigado a antecipar para deixar os telespectadores ansiosos pela "segunda parte".
Pois a estratégia funcionou. A sequência em que Luna sofreu um sequestro e depois conseguiu escapar da vilã, roubando até a arma de Dominique, se mostrou muito bem realizada pela equipe de Fred Mayrink e o diretor disfarçou muito bem todas as limitações impostas pelos novos protocolos sanitários nas gravações.
Tanto que era plausível qualquer dúvida sobre os trabalhos terem sido feitos antes ou depois da pandemia. Juliana Paiva e Guilhermina Guinle brilharam e os momentos de ação lembraram bons filmes de aventura. Parecia até reta final. E a nova fase também marcou uma virada interessante no trio protagonista. Luna, Kyra (Vitória Strada) e Aléxia (Deborah Secco) eram as fugitivas. As três passaram os 54 capítulos passados se escondendo e disfarçadas, com o apoio do Serviço de Proteção a Testemunhas, ganhando até identidades falsas. Agora, com a quase morte de Luna, as personagens decidem se vingar de Dominique e, para isso, começam uma saga de investigação em uma clara alusão ao clássico "As Panteras" ---- série de sucesso da década de 70 que resultou no filme de 2003. As mocinhas, no entanto, são medrosas e atrapalhadas, o que deixa o contexto com um tom te comédia e leveza propício para 'esquecer' um pouco o atual momento do país, onde tudo está cada vez mais pesado.
O autor também tem conseguido se virar com as mudanças no elenco. Como a saída de José Condessa, que deixou a novela por conta de compromissos já agendados em Portugal; a gravidez de Sabrina Petraglia (Micaela) e o inevitável afastamento dos atores mais velhos por serem grupo de risco. Juan (Condessa) é mencionado ao telefone, enquanto Micaela já prepara sua viagem para um curso no exterior. Já Marilu Bueno ensaia a despedida da fofoqueira Dulce e passa o bastão para Marianna Armellinni, que passa a viver a fogosa Marlene, a gêmea boa de Verônica, inserida por Daniel no enredo porque a vilã perderá a função sem a presença de Micaela para se vingar. Otávio Augusto (Ignácio) ainda aparece em chamadas de vídeo, pois interpreta o avô de Aléxia, uma das protagonistas. Grace Gianoukas segue presencialmente, pois Ermelinda é uma das figuras que está sempre ao lado do trio principal. Ou seja, ao menos até o momento, o enredo vai se ajustando aos poucos, sem prejudicar o todo.
"Salve-se Quem Puder" teve uma boa volta e o maior acerto foi o esquecimento da pandemia no roteiro. A trama seria prejudicada com a inserção do coronavírus, vide o equívoco do retorno de "Amor de Mãe". A produção tem disfarçado as limitações e só não consegue em algumas cenas de beijo, como o de Luna e Teo (Felipe Simas), onde o telespectador notou o truque de câmeras em um beijo um tanto estranho. Mas é uma situação que faz parte do atual momento. Ao menos a história ganhou um ritmo dos mais interessantes, em virtude do encurtamento da trama, sem perder a essência do que foi visto anteriormente. Resta torcer para o nível se manter assim até o final.
Passagem de tempo enaltece as qualidades de "A Vida da Gente"
A reprise de "A Vida da Gente" tem servido para ampliar o público de uma das melhores novelas já produzidas pela TV brasileira. Lícia Manzo estreou como novelista em grande estilo e criou uma história que arrebata quem assiste através de dramas reais e de fácil identificação. Ainda ousou com um folhetim cujo protagonismo não é um par romântico e, sim, o amor de duas irmãs. A direção de Jayme Monjardim também capta toda a essência da autora, servindo como uma bela complementação. As qualidades da trama ficam ainda mais evidentes quando ocorre a passagem de tempo e Ana (Fernanda Vasconcellos) acorda do coma.
A história tem a sua tão esperada passagem dos anos após 45 capítulos. Antes do fato acontecer, a novela apresenta uma clara diminuição de ritmo. Mesmo assim, ao contrário do que acontece com as fatídicas 'barrigas' (enrolações) da maioria das produções, não há diálogos avulsos ou cenas desnecessárias. Tudo que é mostrado tem um objetivo específico: estruturar o enredo. Tanto para mostrar o início da linda relação de amor entre Manuela (Marjorie Estiano) e Rodrigo (Rafael Cardoso); quanto pelos demais acontecimentos envolvendo Vitória (Gisele Fróes), Marcos (Ângelo Antônio), Dora (Malu Galli), o estado de coma de Ana; o início do próspero negócio de Manu e Maria (Neusa Borges); o estreitamento das relações familiares; o cada vez maior distanciamento de Eva (Ana Beatriz Nogueira), enfim.
Lícia Manzo criou uma história tão linda e tocante que conquista facilmente o telespectador, e o 'mergulha' naquela gama de sentimentos em que os personagens estão envolvidos. Os atores também são grandes responsáveis por isso. Não há um só capítulo que não tenha ao menos uma cena que emocione. Na semana passada, houve a formação do casal Manu e Rodrigo. Marjorie Estiano e Rafael Cardoso foram impecáveis e protagonizaram sequências lindíssimas. O fato do casal ter sido unido aos poucos, com muita sutileza e cuidado da autora, fez com que houvesse uma grande divisão de torcidas há dez anos e as discussões seguem as mesmas durante a reprise. Ana acorda do coma, após quatro anos, e vê a irmã e melhor amiga praticamente vivendo a sua vida. Claro que Eva envenena a filha contra a irmã, o que rende grandes conflitos. E Júlia (Jesuela Moro) sabe que tem duas mães, mas só considera Manuela como tal.
Outro núcleo que desperta a compaixão do público é o de Jonas (Paulo Betti). Seu filho com Cris (Regiane Alves) é ignorado e só tem a atenção de Lorena (Júlia Almeida), enfermeira contratada para cuidar do menino. A futura influência de Nanda (Maria Eduarda, ótima) na situação também é outro ponto positivo do enredo. Vale citar até o núcleo mais desinteressante da primeira fase, que ganha bons contornos com a passagem de tempo: o de Marcos e Dora. O ex-marido de Vitória (Gisele Fróes) é um acomodado e finalmente inicia uma relação com Dora, após anos de separação. O personagem, no entanto, começa a enfrentar a cobrança de Sofia (Alice Wegmann), a filha mais velha, que não se conforma com a vida estagnada do pai. São conflitos que provocam interesse e acabam mostrando que Vitória sempre teve razão em relação ao ex.
O enredo ainda tem uma dose de leveza com os conflitos em torno de Iná e o baile da terceira idade que sempre organiza. A personagem foi o último grande papel de Nicette Bruno na televisão. A saudosa atriz protagoniza cenas dramáticas grandiosas com Ana Beatriz Nogueira e Marjorie Estiano, ao mesmo tempo que diverte ao lado do ótimo Stênio Garcia (Laudelino) e dos talentosos Luiz Serra (Seu Wilson) e Cláudia Mello (Moema), que interpretam um hilário casal de hipocondríacos. O folhetim se mostra agradável também nos núcleos secundários.
Em meio a tantas reexibições por conta da interrupção de novelas inéditas em virtude da pandemia do novo coronavírus, "A Vida da Gente" é a melhor reprise atual. Tem sido um prazer rever uma história tão envolvente e bem escrita, cujas qualidades sobressaem com a delicada passagem de tempo.
Parte final desnudou todos os problemas que sempre estiveram presentes em "Amor de Mãe"
A primeira novela de Manuela Dias estreou logo no horário nobre. Uma responsabilidade e tanto. Normalmente, todos os escritores da emissora estreiam na faixa das seis ou sete e somente depois migram para a cobiçada faixa das 21h. Mas os ótimos trabalhos da autora nas minisséries "Ligações Perigosas" e "Justiça" (ambas em 2016) a credenciaram ao posto. No entanto, não teve sorte. A produção estreou em 25 de novembro de 2019 repleta de louvores da crítica especializada, mas parte do público não comprou a história, que apresentava problemas em vários núcleos. E quando o enredo central parecia engrenar, houve a interrupção das gravações em 21 de março de 2020 por conta da pandemia do novo coronavírus.
Voltou ao ar praticamente um ano depois, no dia 15 de março de 2021, com apenas 23 capítulos restantes. A produção já estava entrando na reta final, mas mesmo assim sofreu um corte. Porém, não parece ter afetado o roteiro, pois a verdade é que muitas tramas já estavam sem rumo antes da interrupção das gravações.
O grande interesse ficou em torno do enredo de Lurdes (Regina Casé) à procura do filho Domênico (Chay Suede). E sempre foi a única parte do folhetim que caiu nas graças do público. O maior clichê dramatúrgico raramente falha.
Já os demais conflitos, que já estavam se perdendo, tiveram desfechos decepcionantes. A constante troca de casais era um dos problemas do roteiro e seguiu assim até o final. Nunca houve uma construção sólida que despertasse alguma torcida do público. O menos pior foi o par formado por Camila (Jéssica Ellen) e Danilo/Domênico.
Mas ainda assim a relação se esgotou em virtude da quantidade de desgraças que Camila encarou ----- foi abandonada pela mãe biológica e quando a encontrou mal teve tempo de iniciar uma aproximação porque a mulher acabou assassinada por Thelma; levou um tiro na escola em que lecionava; não podia ter filhos e por isso precisou de uma barriga de aluguel da sogra; foi atropelada em uma tentativa de assassinato; precisou levar o filho recém-nascido para uma cirurgia e no penúltimo capítulo viu seu filho ser sequestrado pela avó. Difícil.
Já Nanda Costa e Vladimir Brichta foram os atores que mais 'sofreram' com a saída fácil da autora da troca de casais. Érica chegou a ficar noiva de Raul (Murilo Benício). Depois, acabou se apaixonando por Sandro (Humberto Carrão) e na segunda parte da trama se encantou por Davi, vivido por Brichta. Já o ativista ambiental se envolveu com Amanda (Camila Márdila), Vitória (Taís Araújo) ---- com quem teve uma filha ---- e Betina (Isis Valverde). Na fase final, se apaixonou subitamente por Érica. E a relação se mostrou tão rasa quanto as outras. Foi até complicado de entender a necessidade de explorar essa narrativa. O beijo dos personagens no acrílico da mesa do bar que os separava foi constrangedor. Se tivessem se beijado mesmo, o risco de infecção seria menor.
Aliás, outro grave erro da autora: abordar a pandemia do novo coronavírus na trama. Não havia a necessidade restando apenas 23 capítulos para o encerramento e o resultado foi catastrófico. O principal equívoco foi exibir personagens falando que não precisavam usar máscara porque já tinham contraído a doença. Manuela se justificou nas redes sociais alegando que as gravações foram feitas no final de 2020 e ainda não era sabido que a reinfecção ocorria. Porém, nunca foi confirmado que o risco não existia. Em nenhum jornal, por nenhum médico ou pela OMS (Organização Mundial da Saúde). Nem ano passado. Ou seja, foi uma falha inaceitável. Após uma avalanche de críticas, a Globo passou a exibir no final de cada capítulo um aviso sobre o risco da reinfecção. E a pandemia não acrescentou nada ao roteiro, só prejudicou. Além das falas questionáveis, a trama da Betina ficou ainda mais perdida. A enfermeira, antes da interrupção da trama, tinha descoberto que era irmã de Álvaro (Irandhir Santos), o grande vilão, e iria se vingar dele. O empresário até tentou assassinar a personagem para não dividir a fortuna. Mas tudo foi jogado fora para colocar Betina ajudando pacientes internados com covid-19 e quase morrendo por conta da doença.
Por sinal, a trama da enfermeira era uma das mais promissoras e virou a mais decepcionante antes mesmo da interrupção das gravações. A questão da violência doméstica promovia grandes cenas para Isis brilhar e a personagem era uma das mais dramáticas do enredo. Um sopro na carreira da atriz, tão estigmatizada por perfis mais sensuais ou debochados. Mas a autora assassinou Vicente (Rodrigo Garcia) logo no início e a personagem perdeu a importância. Começou a protagonizar cenas repetitivas de sexo com Magno (Juliano Cazarré) e o casal nunca teve química. Entrou em cena, então, Leila (Arieta Correa), ex do filho mais velho de Lurdes que estava em coma e era cuidada pela enfermeira. A vilã se mudou para casa do pai de sua filha e fez da vida do casal um inferno até conseguir separá-los através de uma denúncia anônima ---- a personagem descobriu que Magno tinha matado acidentalmente o irmão de Betina. Novamente o perfil de Isis acabou deslocado até se envolver com Davi. Depois se envolveu com Sandro e se casaram na 'segunda parte' da novela. Tudo superficial demais.
Várias outras tramas não empolgaram e muitos personagens sem carisma não despertaram qualquer interesse. O núcleo focado no meio ambiente, por exemplo, foi um dos casos mais explícitos. Todos os ativistas foram mostrados como egoístas e mimados. Amanda (ótima Camila Márdila) tinha como mote a vingança contra o malvado Álvaro (Irandhir Santos) porque seu pai acabou infectado pela substância que a empresa do vilão produz, fruto da época em que trabalhava na PWA. Porém, a menina era insuportável, radical e não se importava com mais ninguém. Vinicius (Antônio Benício) demorou a entrar no enredo e quando chegou já se voltou contra o pai, Raul (Murilo Benício), e estabeleceu um caso com a colega ativista. Mimado, o garoto achou um absurdo o pai compactuar com Álvaro, mas sempre aproveitou muito bem as regalias que teve. Para culminar, acabou assassinado poucas semanas depois. Nem função teve. E Amanda também morreu sem ter realizado vingança alguma. Já Davi era para ser um ativista mais centrado e responsável, mas abandonou a filha recém-nascida para se intoxicar em uma área poluída pela PWA com o intuito de "denunciar" a fábrica. Na retomada da novela, vale lembrar, a sua filha com Vitória nem foi mencionada.
E todo folhetim abusa das coincidências que resultam em clichês. Inevitável e comum. A autora soube fazer isso com brilhantismo na série "Justiça", de 2015. Mas ligar uns 10 personagens em uma série de 20 capítulos é uma coisa, ligar mais de 40 perfis em uma novela é outra. No início, as ligações empolgavam e provocavam várias teorias em quem assistia. Mas depois virou uma bobagem. Todo mundo tinha alguma ligação afetiva ou sanguínea e todos viviam próximos. Se ao menos essa preocupação da escritora servisse para valorizar todo o elenco ainda valia uma ressalva, mas nem foi o caso. Foram vários profissionais que mal apareceram ou tiveram seus conflitos esquecidos. Érika Januza ganhou um papel ingrato, após seu ótimo desempenho como a juíza Raquel em "O Outro Lado do Paraíso" (2017). Marina foi uma tenista que teve um sério problema no joelho, abandonou a carreira para ficar com o amor de sua vida e acabou traída assim que Ryan (Thiago Martins) conquistou a fama. O casal se separou, mas a personagem o perdoou na volta de "Amor de Mãe" e ficaram juntos. Um enredo sobre 'cancelamento' nas redes sociais foi criado para o casal. Frustrante. Por falar em frustração, Letícia Lima protagonizava as mesmas cenas desde a estreia: Estela era uma neurótica que se apossava de todo homem com quem se envolvia e transformava a vida da pessoa em um inferno. Fez com Raul e depois com Álvaro. Não teve nem chance na retomada da produção: foi assassinada por Belizário (Tuca Andrada). Um claro descarte de personagem.
E o que dizer de Clara Galinari, uma das gratas revelações de "Espelho da Vida" (2019)? Brenda mal abria a boca. A menina foi apresentada inicialmente com uma saúde frágil, mas ao longo dos meses nada mais foi falado e a criança praticamente desapareceu. O núcleo protagonizado por Milhem Cortaz e Débora Lamm foi outro desperdício. O casal perfeito que entra em crise e se separa nunca rendeu cenas atrativas e quando o tema "vale-night" entrou em discussão tudo naufragou de vez. Malu Galli é uma atriz extraordinária e deu show no início da novela e nas cenas da morte do filho Vinícius; porém, Lídia perdeu a relevância quando começou um caso com Tales (Alejandro Claveaux) e depois com Magno ---- já na volta das gravações. Ainda sobre o desperdício de atores, vários acabam descartados, vide Dan Ferreira (Wesley). O raro policial honesto da novela estava crescendo com a investigação sobre o verdadeiro assassino do irmão de Betina, mas acabou morto por Belizário. E nem tinha descoberto nada. Sua morte também não provocou virada alguma no roteiro.
A derrocada da poderosa advogada foi outro ponto de difícil aceitação. A controvérsia envolvendo a caminhada de Vitória sempre atraiu. Afinal, era uma mulher íntegra que ganhava a vida defendendo um criminoso. O seu rompimento com Álvaro foi um esperado momento, mas não fez sentido ficar pobre por conta da milionária multa contratual. O único bem que a mulher adquiriu em toda a carreira foi um apartamento de luxo na zona sul do Rio de Janeiro? E precisou se mudar para São Cristóvão e andar de ônibus? Parece que vida simples e humildade eram requisitos vitais para ser íntegro na história, pois Raul teve seus momentos nada louváveis ----- vide a demissão da empregada para acabar com a amizade de sua então namorada Érica.
Mais um ponto que merece citação foi a propaganda enganosa. Autora e diretor deram várias entrevistas antes da estreia garantindo que a novela não teria vilões. A vida seria a vilã. Porém, isso nunca existiu. Álvaro sempre se mostrou um tipo maniqueísta e nada sutil: empresário corrupto, poluía o meio ambiente, tinha amantes, era aliado de um miliciano e matava inimigos. Ainda usava um estiloso cachimbo. Só faltava um corvo no ombro. Nada contra maniqueísmo, sempre bom lembrar. Mas havia vilão, sim. E Irandhir Santos esteve impecável no papel. Que ator extraordinário. Além do poderoso dono da PWA, havia o sanguinário Belizário e a mau-caráter Leila. Vale até mencionar os que foram mortos logo no começo, como o irmão chantagista de Thelma, vivido por Júlio Andrade, e o já mencionado Vicente. O que não faltou foi malvado.
A impressão é que a novela contou várias histórias que perderam o fôlego no meio do caminho ---- alguém ainda se interessava pelo aneurisma que nunca estourava de Thelma (Adriana Esteves)? ---- e teve como único trunfo a trajetória de Lurdes. Porque a mais carismática e querida personagem da trama foi a única que teve uma saga exposta. Tanto que foi o enredo que a autora quis enrolar na retomada. Assim que Lurdes descobriu o paradeiro de Domênico, acabou sequestrada por Thelma. Tudo para deixar o aguardado encontro de mãe e filho somente para o final. Aliás, a transformação de Thelma foi difícil de engolir. A personagem sempre teve um claro desequilíbrio emocional, mas virar uma assassina fria e calculista foi uma apelação da autora. A forma como matou sua melhor amiga, Jane (Isabel Teixeira), foi risível e ainda retirou uma grande atriz da trama. Tirar a personagem para deixá-la como foto para Thelma conversar? Ao menos Adriana Esteves brilhou.
O sequestro de Lurdes teve a função de postergar o encontro de mãe e filho ao máximo. E o melhor perfil da novela chegou a ficar sumido por dois capítulos. O desaparecimento apenas expôs que a história nunca se sustentou sem ela. Lurdes ainda era o alívio cômico do folhetim. Sem a matriarca tudo ficou ainda mais sombrio e pesado. Mas é importante ressaltar que a obrigatoriedade de núcleo cômico é algo ridículo. Uma produção não é boa ou ruim pela presença ou ausência de comicidade. Os problemas de "Amor de Mãe" passaram longe disso. A quantidade de desgraças da retomada provocou uma avalanche de críticas merecidas. No entanto, se todas as cenas violentas ou fortes tivessem um contexto valeria a pena. O telespectador se envolveria. O fato é que todos os acontecimentos criados pela autora se mostraram rasos e gratuitos. Vale citar até algumas cenas constrangedoras: Davi saindo do carro, pedindo calma para Belizário, e sendo baleado pelo miliciano; Vitória deixando o agressor de sua empregada doméstica entrar em seu carro e depois ameaçá-lo com uma faquinha de cortar pão; e Thelma levando Lurdes até uma casa completamente isolada sem Lurdes perceber nada de anormal.
A única cena realmente boa da parte final foi o aguardado encontro de Lurdes e Domênico. Regina Casé e Chay Suede se entregaram no momento mais emocionante do único drama que funcionou no enredo. Deixando todo o contexto sem sentido de lado (a fuga do cativeiro, por exemplo), foi lindo aquele instante de felicidade da mãe achando o filho que tanto procurou. Ao som de "Onde Estará o Meu Amor", de Maria Bethânia. Todavia, as demais sequências deixaram a desejar, fazendo jus ao conjunto equivocado do folhetim. O drama de Vitória inserido no penúltimo capítulo ---- a mãe biológica que surgiu do nada para recuperar a criança que a advogada adotou ---- foi raso, além de causar a falsa sensação de que todo menino ou menina adotada pode ser reivindicado pela família a qualquer momento. Penha (Clarisse Pinheiro) e Leila (Ariêta Correa) formaram um casal inusitado na reta final e tiveram boas cenas. Mas a fuga das bandidas com perucas chamativas soou ridículo. A morte de Álvaro, atingido por um tiro disparado por Raul em uma briga, repetiu o que a autora já tinha usado na briga de Lurdes e Thelma no cativeiro e não teve emoção alguma.
Já uma cena merecedora de elogios do último capítulo foi a despedida de Thelma e Danilo. Embora curto, o momento foi emocionante e defendido com brilhantismo por Adriana Esteves e Chay Suede. O desfecho de Penha e Leila, administrando um bar 'sertanejo', foi criativo. O final feliz de Lurdes com sua família reunida, encerrando a trama, fechou o ciclo de forma bonita. Uma pena que o restante dos momentos tenha sido tão descartável e sonolento. Embora Enrique Diaz seja ótimo, houve um destaque desnecessário ao enredo do "unicórnio". O drama de Vitória nem teve condições de ser desenvolvido de fato, enquanto a participação de Eliane Giardini não teve função alguma. Uma pena.
"Amor de Mãe" nunca foi o novelão revolucionário que grande parte da crítica especializada tentou mostrar. E a pandemia não pode ser a culpada pela quantidade de equívocos vistos na retomada da produção. O desfecho da história de Manuela Dias apenas desnudou todos os problemas que o enredo sempre teve e eram colocados para debaixo do tapete por vários jornalistas. A Globo sabia do risco quando resolveu colocar uma escritora que nunca tinha criado uma novela sozinha para estrear no horário nobre. Todos os autores do canal estreiam na faixa das seis, das sete ou em "Malhação". Manu quebrou essa regra e o resultado não foi bom.
Segundo a própria, seu próximo trabalho será "Justiça 2" --- uma minissérie com o mesmo formato da bem-sucedida "Justiça". Que tenha mais êxito no novo desafio.
"Império": o que esperar da próxima novela das nove?
Autor de sucessos como "Tieta", "Pedra sobre Pedra" e "Senhora do Destino", Aguinaldo Silva terá a chance de voltar aos bons tempos com "Império", a nova trama terá que aumentar o baixíssimo Ibope do horário nobre e, por tudo o que tem sido visto nas chamadas, a chance de elevar os índices é bastante alta.
Aguinaldo parece disposto a escrever um novelão. Ele mesmo chegou a dar esta declaração várias vezes. O autor tem um grande currículo, "Duas Caras" foi uma trama com muitos desafios e não deixou a desejar; mesmo tem errado em algumas de produções: a série "Lara com Z" (derivada da boa "Cinquentinha" ---- seu último acerto até então) foi uma bobagem e a novela "Fina Estampa" foi um festival de situações constrangedoras, culminando em um deboche final, que riu da cara do telespectador.
Agora, com "Império", após algumas desconfianças iniciais, Aguinaldo parece inspirado. As chamadas estão bem atrativas e a história terá duas fases (a primeira com três capítulos). Os primeiros capítulos, ambientados em 1989, acompanharão a chegada de José Alfredo (Chay Suede/Alexandre Nero), vindo do nordeste, à casa do irmão, Evaldo (Thiago Martins), em Santa Tereza, no Rio de Janeiro. O protagonista acabará se apaixonando pela cunhada Eliane (Vanessa Giácomo/Malu Galli) e os dois decidirão fugir. Mas tudo muda quando a mulher descobre que está grávida e acaba sendo aconselhada pela sua irmã Cora (Marjorie Estiano/Dirca Moraes) a desistir de tudo.
Na rodoviária, sem dinheiro e sem Eliane, José Alfredo acaba aceitando uma vaga em um garimpo, oferecida por Sebastião (Reginaldo Faria). A partir desta oportunidade, a vida do controverso personagem central muda completamente. Sebastião o leva para Suíça, e no avião ele conhece Maria Marta (Adriana Birolli), de uma família tradicional decadente, e casa-se com ela para ter seu nome reconhecido na alta sociedade. Acaba se envolvendo no contrabando de pedras preciosas ---- graças a Maria Joaquina (Regina Duarte), que o insere neste meio ---- e consegue construir um império, ficando rico.
Cristina (Leandra Leal) será a mocinha e, como é filha de Eliane, irá descobrir que faz parte da poderosa família Alfredo, graças ao plano de sua Tia Cora, que quer aproveitar a fortuna dos ricaços. Aliás, o grande atrativo desta novela até o momento é justamente esta víbora, que tem tudo para ser uma vilã antológica. Vivida por Marjorie Estiano na primeira fase e Drica Moraes na segunda, a personagem estará muito bem representada e o desempenho das duas já impressiona apenas em rápidas passagens de cena.
E esta é apenas a trama central de "Império", há muitas outras, que surgem na segunda fase. Incluindo um núcleo cômico, que contará com Viviane Araújo (Naná, uma manicure) e Aílton Graça interpretando uma travesti (Xana Summer), que mantém um salão de beleza. Ao que tudo indica, o personagem será um Crô (papel de Marcelo Serrado em "Fina Estampa") ainda mais exagerado. O ator tem tudo para se destacar. E outro tipo que parece inspirado no mordomo homossexual é o jornalista fofoqueiro interpretado por Paulo Betti.
Ainda haverá outra grande desafiante, a Maria Marta, vivida pela grande Lilia Cabral (e Adriana Birolli na primeira fase). A esposa de José Alfredo, segundo o autor, será tão dura quanto um diamante. Haverá, inclusive, embate entre a peste interpretada por Drica e a esposa do José Alfredo. Com certeza, serão cenas muito bem interpretadas.
A polêmica envolvendo um romance homoafetivo também estará presente. No caso, os atores envolvidos serão José Mayer e Klebber Toledo. Cláudio será um homem muito bem casado, com uma família sólida, e terá um amante, com quem se relaciona há anos: Leonardo, vivido por Klebber. Ou seja, será um homossexual enrustido. E vale aqui elogiar a atitude de Aguinaldo, que sempre presenteia Zé Mayer (marcado pelos galãs conquistadores) com papéis diferenciados.
No elenco ainda há, além dos nomes já citados, Andreia Horta, Elizângela, José Mayer, Flávio Galvão, Marina Ruy Barbosa, Othon Bastos, Rafael Cardoso, Tato Gabus Mendes, Klebber Toledo, Suzy Rêgo, Zezé Polessa, Karen Junqueira, Joaquim Lopes, Maria Ribeiro, Caio Blat, entre outros.
Ainda é difícil traçar algum caminho para "Império", até porque a trama terá duas fases e somente os personagens principais têm aparecido nas chamadas. E de acordo com o clipe apresentado e a história escrita, Aguinaldo Silva parece inspirado. Será que a TVterá motivos para sorrir com esta nova produção? Resta aguardar o dia da estréia.
Evolução da sociedade expõe o péssimo envelhecimento de Pedro em "Laços de Família".
A evolução do comportamento do público já deixou bem claro que o galã de uma novela da década de 80 pode se tornar quase um vilão em 2021. Por isso a teledramaturgia é tão estudada e apreciada por vários historiadores, além dos tradicionais noveleiros. Há até ótimas monografias de faculdade sobre o tema. A atual reprise de "Laços de Família", em plena reta final, por exemplo, expõe uma completa mudança do olhar do público diante do personagem Pedro, interpretado por José Mayer.
O sucesso de Manoel Carlos vem repetindo o êxito no "Vale a Pena Ver de Novo". A audiência está elevada. E com todo mérito. É um dos melhores trabalhos do autor, além de ser um dos mais lembrados com carinho pelo telespectador. Agora, Pedro é o tipo que pior 'envelheceu' no enredo. A expressão 'envelheceu mal' virou uma espécie de 'meme' na internet justamente por mostrar como determinadas situações, antes vistas como naturais, soam problemáticas hoje em dia. E pouco se salva deste perfil criado por Maneco.
O administrador do Haras de Alma (Marieta Severo) é um sujeito solitário e rabugento. Transborda grosseria com todos ao seu redor, principalmente com as mulheres. Chegou a ter um casamento relativamente duradouro, e acabou se divorciando. Os cavalos são sua única paixão.
Nem mesmo quando tem sentimentos por alguma mulher consegue evitar que seu lado agressivo seja exposto. O intuito do autor era mostrar uma pessoa que era movida pelo instinto, quase tão irracional quanto os animais. Porém, o resultado foi catastrófico aos olhos de hoje.
O contexto mais inacreditável é a relação entre Pedro e Cintia (Helena Ranaldi). O administrador e a veterinária têm uma temperatura sexual elevada e há um claro jogo de gato e rato que costuma funcionar na ficção. Agora há uma pequena linha que é ultrapassada em vários instantes do enredo, resultando em situações
de abuso sexual e até estupro. A própria Cintia chega a admitir que foi forçada em uma relação flagrada por Iris (Deborah Secco). E em uma discussão com Pedro, o sujeito não só admite que a estuprou como diz que tem o direito de estuprá-la quantas vezes quiser ----- a parte da cena foi cortada na reprise por razões óbvias.
O relacionamento do personagem com Íris, sua prima de segundo grau, também desperta ojeriza.
Pedro a trata como uma criança, ignorando o desejo que a garota de mais de 18 anos sente por ele. Ainda a agride diversas vezes, como se fosse uma espécie de 'pai educando a filha'. Em uma das sequências mais chocantes, o empregado de Alma se choca ao vê-la de maquiagem e lava seu rosto à força, ainda puxando seus cabelos para dar um banho. Depois bate na bunda de Íris várias vezes como se estivesse 'dando palmadas educativas'.
E o contexto fica ainda pior quando se lembra do último capítulo:
Sua insistência em reconquistar Helena (Vera Fisher), um ex-amor do passado com quem tem uma filha (Camila - Carolina Dieckmann), remete a de um perseguidor (o chamado 'stalker').
É verdade que a protagonista fica balançada com o ex, e na época todos os passos do personagem eram enaltecidos pelo público, principalmente o feminino. Era praticamente um 'galã' da novela. Até pela figura de seu intérprete. Aliás, é impossível não lembrar do escândalo envolvendo José Mayer em 2017, quando seu assédio a uma figurinista veio à tona e acabou demitido da televisão. Parece até que o ator incorporou o comportamento de Pedro na sua vida, talvez pela 'normalização' deste tipo de atitude durante tantas décadas. E nem se trata de uma defesa a ele, e de uma dupla crítica.
"Laços de Família" é um novelão da melhor qualidade e são vários os acertos do clássico de Manoel Carlos. E há muitas situações que se transformaram em problemas graves com o passar dos anos e o desenvolvimento do Pedro é um deles. Ao menos serve para uma boa análise comportamental da sociedade.
Fracasso da reprise de "Haja Coração" corrigiu uma injustiça do passado
Resolveram repetir a estratégia que funcionou em 2016: duas novelas das sete de sucesso em sequência. Há quase cinco anos, "Totalmente Demais" era um fenômeno de repercussão. Foi substituída por "Haja Coração", uma produção tão popular quanto a anterior, e de qualidade bastante inferior. A trama de Daniel Ortiz acabou com um décimo a mais na média de audiência que o produto de Rosane Svartman e Paulo Halm (27,5 pontos, enquanto a antecessora marcou 27,4). Como era de se esperar, a estratégia da Globo não deu certo com as reprises. A primeira conseguiu fazer ainda mais sucesso que em 2016 (obteve 29 pontos de média). Já a segunda conseguiu apenas 25 pontos.
Após seu bom trabalho como estreante em "Alto Astral" (2014), Daniel Ortiz apresentou um início promissor de seu segundo folhetim. Havia ali todos os ingredientes de uma deliciosa novela das sete. E o primeiro mês foi animador, onde a dupla formada por Fedora e Teodora logo se destacou, assim como o trio impagável de amigas interesseiras formado por Rebeca, Penélope e Leonora (Ellen Roche). A composição de Mariana Ximenes como Tancinha também agradou e parecia uma ótima protagonista, tendo ainda a rivalidade com Fedora como um dos atrativos. Os erros observados em alguns núcleos paralelos deslocados e na história cansativa do mocinho Apolo pareciam pequenos diante dos acertos.
E, ao longo dos meses, Ortiz começou a dar claros sinais de falta de domínio de seu enredo. Os problemas começaram a crescer e até mesmo os pontos positivos começaram a ficar negativos.
foi um dos mais graves equívocos do autor, que preferiu seguir o roteiro original de "Sassaricando", ignorando a diferença do contexto. O resultado foi catastrófico para o núcleo Abdala, que era o melhor da novela. Com a saída da melhor personagem da família, todos os perfis ficaram sem função e perdidos na história.
O romance de Fedora e Leozinho ficou repetitivo, Lucrécia passou a protagonizar situações cansativas indo atrás do seu marido, que a rejeitava, e até mesmo a vilania de Gigi se esvaziou depois que fez seu discípulo Leozinho se casar com Fedora. Já Aparício começou a protagonizar cenas de armações bobocas para conquistar Rebeca se fingindo de faxineiro.
A trama de Tancinha se mostrou rasa para protagonizar a novela.
A personagem começou a história investigando o desaparecimento do seu pai e até invadiu a festa de aniversário de Fedora para cobrar satisfações. E, pouco depois de um mês, não tocou mais no assunto. A situação parece ter sido esquecida pelo autor. Ela passou a ficar 'divididinha' entre Apolo e Beto e seguiu assim até o final.
Uma protagonista cujo único conflito é ter que se decidir com quem ficar não condiz com a atualidade. Vale lembrar que esse era o enredo de "Sassaricando" porque o triângulo fazia parte do núcleo secundário do folhetim. No remake, virando o principal, novas situações e dramas precisavam ter sido criados para a dita mocinha.
Até mesmo as aulas de balé que passou a ter por volta da metade de trama não era fruto de seu sonho, ou objetivo de vida, e sim de sua mãe. E a rivalidade inicial com Fedora foi desprezada ao longo dos meses. Elas mal contracenaram, mesmo tendo rendido cenas ótimas juntas. A inimizade da patricinha rica com a feirante pobre tinha tudo para render bastante, o que não ocorreu
O roteiro do trio de amigas, juntamente com a empregada Dinalda, se mostrou limitado para tantos meses no ar.
O resultado foi a perda de destaque delas, incluindo a inserção de Rebeca em repetitivas idas e vindas com Aparício, a separando sutilmente das demais. A única que conseguiu manter situações atrativas foi Leonora, que passou a formar uma dupla com Dinalda, protagonizando divertidas cenas em busca da fama. A participação da ex-bbb Ana Paula acabou dando um gás para o contexto que cercava a fictícia ex-Casa de Vidro. Já Penélope formou um lindo casal com Henrique, e o autor não criou bons conflitos para o par, que acabou deixado de lado, lamentavelmente. Só nas semanas finais houve a entrada da mãe esnobe do rapaz (vivida pela ótima Sônia Lima), proporcionando boas cenas com a futura nora. Mas era tarde e a falta de aproveitamento de um casal que havia funcionado ficou claro.
O triângulo envolvendo Camila (Agatha Moreira), Giovanni e Bruna (Fernanda Vasconcellos) foi outro ponto que Ortiz desperdiçou.
O casal "Gimila" emplacou logo no início, só que a demora no desenvolvimento de todo o contexto da explosão do Gran Bazar, o mal aproveitamento da psicopatia de Bruna e as constantes perdas de memória de Camila deixaram a situação cansativa.
O que era visto como um dos trunfos da novela acabou virando uma das muitas falhas de desenvolvimento. Até mesmo a cena mais aguardada, quando
Bruna tentou matar Camila, foi frustrante em virtude da equivocada direção de Fred Mayrink, que tirou todo o impacto do embate das rivais com um trilha não condizente. A cegueira de Giovanni em cima dos surtos de Bruna também pecou pela falta de verossimilhança, assim como os apagões de memória que Camila sempre tinha
---- conveniente para a enrolação do enredo.
Já o núcleo do Apolo desde o início foi fraco e se manteve assim ao longo da trama.
A paixão do personagem pelas corridas implicava em cenas desinteressantes e o conflito entre Nair e Adônis ---- o filho que sentia vergonha da mãe ---- era exatamente o mesmo vivido pela mesma atriz em "Alto Astral". Para culminar, só no penúltimo capítulo a mãe soube que o rapaz não usou o seu dinheiro para pagar a faculdade e sim curtir a vida ---- uma situação forçada, por sinal, foi Adônis descobrir que, ao contrário dos irmãos, não era adotado e sim o filho renegado pela mãe (isso só serviu para inverter os papéis, o transformando em vítima, sendo que sempre foi um filho racista e ingrato). Outro equívoco que merece ser citado foi o péssimo personagem dado a Conrado Caputo, depois do sucesso do Pepito em "Alto Astral". O ator ficou avulso o tempo todo na pele de Renan (inicialmente um vlogger fracassado e depois ajudante da cantina de Tancinha), assim como Marcella Valente, intérprete da Larissa, irmã de Apolo e Adônis./spoiler]
Ainda citando perfis avulsos, vale mencionar o drama dos irmãos Carol (Bruna Griphao), Nicolas (Henry Fiuka) e Bia (Melissa Nóbrega). O núcleo sempre ficou deslocado na história e parecia pertencer a uma novela paralela. O absurdo da situação também abusava da inteligência do telespectador, afinal, não tinha como acreditar [spoiler]que os três conseguiram esconder dos vizinhos por meses a morte do pai. Já na reta final, a adoção do trio serviu para mexer no triângulo formado por Tancinha, Beto e Apolo, uma vez que todos quiseram adotá-los.
Mesmo tarde, essa movimentação acabou sendo benéfica. O trio amoroso virou quadrado com meses de atraso. A entrada de Tamara nessa situação deveria ter ocorrido desde o começo, e o autor preferiu enrolar bastante, deixando Cleo Pires apagada e sem função boa parte do tempo. A prova foi que a personagem cresceu assim que seu romance com Apolo engrenou, valorizando a química dos atores, vista no filme "Qualquer Gato Vira Lata".
E, em meio a tantos problemas de desenvolvimento, Daniel Ortiz acertou em cheio na condução do romance de Shirlei (Sabrina Petraglia) e Felipe (Marcos Pitombo), virando o melhor casal da história. A personagem caiu no gosto popular e se transformou no maior sucesso da novela. Curiosamente, foi o único perfil que não veio de "Sassaricando" e sim de outra novela de Silvio de Abreu: "Torre de Babel". A menina que tinha uma deficiência na perna foi a Cinderela da trama das sete e formou o melhor casal da história junto de Felipe, praticamente a reencarnação do príncipe encantado. O par era tão bom que teve três vilãs para separá-lo: a patricinha Jéssica (Karen Junqueira), a invejosa Carmela (Chandelly Braz) e a arrogante Vitória (Betty Gofman). A ex-namorada e a mãe de Felipe, juntamente com a irmã de Shirlei, atrapalharam muito o romance, movimentando o núcleo, que virou o melhor do enredo de longe, ofuscando o triângulo central. Foi a única parte da produção que se manteve atrativa ao longo dos meses, no melhor estilo conto de fadas. Sabrina deu um show em cena e viveu um grande momento na carreira. Foi o maior destaque do folhetim, esbanjando química com Marcos Pitombo. Os verdadeiros mocinhos.
O elenco teve bons nomes e alguns sobressaíram, embora nem todos tenham tido o destaque merecido.
Marisa Orth pôde exercer uma faceta dramática pouco explorada através da batalhadora Francesca; Grace Gianoukas foi a grata surpresa da novela e deu um show na pele da arrogante Teodora (até um spin-off na streaming ganhou); Chandelly Braz brilhou vivendo a complexa Carmela (cuja vilania teve explicação na hora que sua culpa pelo problema na perna de Shirlei foi revelada); Agatha Moreira se destacou vivendo a Camila "boa" e a Camila "má"; Karen Junqueira fez uma Jéssica odiável; Bruna Griphao emocionou com o drama de Carol; Malu Mader, Carolina Ferraz, Ellen Roche e Renata Augusto formaram um ótimo quarteto; Tatá Werneck e Gabriel Godoy tiveram uma evidente sintonia; João Baldasserini se destacou vivendo o seu primeiro perfil cômico na carreira; e a participação de Cristina Pereira interpretando a tia Safira engrandeceu o núcleo Abdala. Já Mariana Ximenes, apesar do enredo fraco, conseguiu compor uma Tancinha carismática. Pena que Cláudia Jimenez, Conrado Caputo e Marcelo Médici não foram valorizados como mereciam.
A reta final da novela expôs com maior nitidez a barriga da produção. O autor quis guardar tudo para o fim, resultando em uma correria que comprometeu todo o conjunto, deixando vários desfechos superficiais e decepcionantes.
A entrada de Guido no último mês foi um erro grave, implicando em resoluções forçadas. O público não teve tempo de acompanhar os possíveis embates entre ele e Francesca, muito menos a reaproximação do pai com os filhos. Para piorar, uma das revelações mais aguardadas não teve impacto algum: a cena em que Guido conta para Shirlei que é seu pai verdadeiro não chocou ninguém, nem Felipe, que é enteado do sogro. A situação foi resolvida em poucos minutos, ficando nisso. E nem deu para ver a reação de Carmela porque foi a única filha que nem soube da volta dele.
Ao menos Chandelly Braz e Sabrina Petraglia protagonizaram boas cenas nos últimos momentos,
O último embate entre a filha de Gigi e a psicopata foi muito mal dirigido, implicando em cenas sem qualquer impacto. Após ter mantido Giovanni preso, a víbora levou um golpe de Camila e acabou morrendo queimada em uma explosão.
Cenas que poderiam ter sido empolgantes, e decepcionaram. O mesmo vale para o corrido desfecho de Jéssica e Vitória
, que sofreram um acidente de carro depois que sequestraram Carmela em um tempo recorde ---- Carmela ligou para avisar que contaria tudo para a polícia (sobre a armação contra Shirlei) e em menos de 30 segundos foi pega pela vilã.
As cenas pareceram simplesmente jogadas na cara do telespectador, sem cuidado algum. Um atropelo de acontecimentos que poderia ter sido facilmente evitado se Ortiz não tivesse enrolado tanto, se preocupando em fechar os núcleos aos poucos --- como fez em "Alto Astral", inclusive.
O ponto positivo do final foi a sequência do casamento de Shirlei e Felipe, repleta de clichês, fazendo jus ao que o casal representou. A delicadeza esteve presente e os atores emocionaram.
A reconciliação de Shirlei e Carmela também merece menção, comprovando que o enredo da menina com um problema na perna foi realmente o mais rico da trama ---- e claramente copiado de "Torre de Babel". Já a dúvida de Tancinha se arrastou até o final, dominando todo o último capítulo. Como já estava claro no roteiro, ela ficou com Apolo, dispensando Beto. O atrapalhado filho de Penélope,
por sinal, acabou se apaixonando por uma ativista interpretada por Paolla Oliveira.
E Teodora abriu mão de sua fortuna, indo morar com Tarzan na ilha onde se conheceram. A melhor cena do desfecho foi a reconciliação de Tancinha e Fedora, sendo necessário destacar Tatá Werneck e Mariana Ximenes.
E o pior de tudo foi o autor ter exposto Mari Ximenes e João Baldasserini para gravações em setembro do ano passado, no meio da pandemia, para uma cena extra que nem foi ao ar. O objetivo era apenas forçar uma expectativa para a reprise. Deprimente.
"Haja Coração" foi um sucesso de audiência em 2016, agora os números altos não refletiram a qualidade da mesma. Não foi uma novela ruim. O saldo geral é mediano, levando em consideração os erros e os acertos. E, tinha tudo para ter sido um folhetim excelente, pois apresentou todos os ingredientes necessários de uma deliciosa trama das sete. Só que o desenvolvimento equivocado de vários personagens e núcleos prejudicou muito o conjunto. O fracasso da reprise, no caso, acabou corrigindo a injustiça de quase cinco anos atrás. Afinal, essa produção jamais mereceu uma audiência maior que o fenômeno "Totalmente Demais", mesmo que por apenas um décimo.
Paralelo entre Ivan e Nonato foi um dos trunfos de "A Força do Querer" A reprise da trama de "A Força do Querer" está em plena reta final e todas as qualidades da melhor novela de Glória Perez puderam ser constatadas mais uma vez. A maior ousadia da autora foi o drama de Ivana (Carol Duarte), uma menina que não se identificava com seu corpo e sofria diante da pressão da mãe e da sociedade. A situação foi um dos principais trunfos do folhetim, ganhando novos contornos através de um interessante paralelo criado com um outro personagem que cresceu: o Nonato (Silvero Pereira).
A questão do transgênero ser explorada em uma novela foi um bom avanço e a escritora se mostrou muito corajosa. O método escolhido expôs a sua criatividade, além de ter servido como uma explicação objetiva, sem parecer didático ou piegas. Isso porque a dualidade que focalizada no enredo funcionou para destacar os dois perfis, ao mesmo tempo que expôs as diferenças que os separam, embora enfrentem o mesmo tipo de preconceito. O que o público via era um homem muito bem resolvido com seu corpo e uma mulher que não se identificava com o seu reflexo no espelho.
Ivana sempre sofreu pressão da mãe, a fútil Joyce (Maria Fernanda Cândido), para que fosse quase um clone seu. Na breve primeira fase da novela, que durou apenas o primeiro bloco do primeiro capítulo, ficou explícita a intenção da perua para com sua filha, transformando a criança em uma cópia mirim de si mesma.
A menina já demonstrava desconforto na época. O tempo passou, mas nada mudou, a não ser a vontade da garota, que cresceu e deixou de seguir as ordens da mãe. A personagem sempre teve mais compreensão do pai, Eugênio (Dan Stulbach). O que se via era uma mulher linda, mas sem qualquer vaidade, deixando de lado maquiagem acessórios, sapatos, enfim.
Já Nonato começou timidamente na história. Parecia uma mero figurante inicialmente. Mas não era. Pelo contrário, serviria para engrandecer o convidativo drama de Ivana. O rapaz deixou o nordeste para tentar a vida no Rio de Janeiro e começou a trabalhar como motorista do preconceituoso Eurico (Humberto Martins). Aos poucos, a autora foi revelando para o público a vida desse homem aparentemente muito tímido e retraído. Transformista e homossexual, ele precisou se portar como 'homem' para conseguir um emprego digno, pois declarou que no Brasil não dão emprego para pessoas como ele, que acaba entrando na prostituição. Mas Nonato faz questão de dizer que é muito bem resolvido e não quer se transformar em mulher. Gosta do seu corpo e adora interpretar a Elis Miranda, perfil que criou para se apresentar em shows. Não é transexual, é transformista.
Desde que se revelou para o telespectador, as cenas do motorista eram exibidas intercaladas com as da Ivana, que a cada dia tinha sua autoestima piorada em virtude da não identificação com seu corpo. O seu drama é o melhor enredo da novela e a condução de Glória foi de forma cautelosa, sem atropelos. A autora criou uma história que impossibilitou o telespectador de não se envolver com a angústia daquela garota. A situação virou uma poderosa arma para a reflexão até dos preconceituosos. Ela é um homem que nasceu no corpo de uma mulher. Tudo o que envolve os transgêneros ainda era muito 'novo' para o grande público em 2017, inclusive o fato de existir mulher que se 'transforma' em homem, mas segue se interessando pelo sexo masculino, como é o caso de Ivana.
E essa mescla com a vida de Nonato deixou o contexto ainda mais convidativo, expondo as diferenças entre transexualidade e transformismo. As cenas eram ótimas e destacaram o talento dos intérpretes. Silvero Pereira e Carol Duarte eram dois estreantes na televisão e não poderiam ter começado de forma melhor. Ele, na época, estrelava o espetáculo BR-Trans pelo Brasil e aproveitou o momento. Foi por causa deste trabalho do ator cearense que Glória o chamou para seu folhetim. Nonato foi defendido com competência e o perfil misturou humor e drama com maestria. Já Carol brilhou em todos os momentos, tanto como Ivana quanto como Ivan, já realizado com sua nova condição. Foi a grande revelação de 2017.
Glória Perez acertou em cheio na abordagem dos trans em "A Força do Querer" e valeu rever a apresentação simultânea de dois tipos tão parecidos e tão distintos.
Aviso: Spoilers Nada que já não souramos. Hollywood na verdadeira moda hollywoodiana hi-jacks a causa social da moda do dia e dedica um de seus shows anuais pat-ourselves-on-the-back para ele. Uma lista de pessoas lançam uma linha sobre como diretoras femininas são sub-representadas em Hollywood, sem nomear nenhuma mulher que esteja em par com Steven Spielberg, Clint Eastwood ou Ridley Scott. FYI, você não precisa de um pênis para ser nomeado para um prêmio,
você só tem que ser bom no que você faz. Esta indústria foi construída sobre a objetificação de mulheres (e homens), e tem empurrado os limites do conteúdo sexual aceitável desde o início. No entanto, seus representantes querem se virar e perguntar por que tantas mulheres estão sendo agredidas e assediadas? Isso seria como Sylvester Stallone fazendo Rambo e depois falando pelo controle de armas. Além disso, alguém está realmente convencido de que essas pessoas estão alheias à má conduta sexual que vem acontecendo há décadas? Quer dizer que mulheres como Oprah, Meryl Streep e Jennifer Anniston não são populares e/ou poderosas o suficiente para falar sobre esse tipo de coisa sem repercussões? Que tal todos aqueles homens hipócritas na plateia que nunca defenderam as mulheres em Hollywood? Claro, esta é a indústria que saudou Hugh Hefner como um grande homem e revolucionário após sua morte no meio de todo esse movimento, apesar de passar a vida construindo uma empresa dedicada à objetificação das mulheres. Houve um tempo em que poderíamos dizer: "Eu não tenho que concordar com a política dos atores para desfrutar de seus filmes." Bem, considerando que a maioria dos filmes lançados no ano passado tem algum tipo de mensagem PC/SJW em oposição ao bom cinema, está se tornando difícil desenhar essa distinção.
No globo de ouro de 2020... Era bastante comum um filme dominar a cerimônia de premiação varrendo inúmeras categorias (e muitas vezes fazendo da cerimônia um verdadeiro furo no processo). Agora, nos últimos 15 anos, as varreduras têm sido cada vez mais raras, como podemos ver nesse
Nomadland é o filme a ser batido para o Oscar de melhor filme e melhor diretor. Melhor atriz e melhor atriz coadjuvante estão completamente e sem precedentes no ar. Melhor ator e melhor ator coadjuvante parecem estar tomando forma. Foi uma noite ruim para Mank, Promising Young Woman, The Father, e The Trial of the Chicago 7 The Crown é a série dramática a ser batida nos Emmys. Ted Lasso é um provável candidato para preencher o buraco deixado por Schitt's Creek. A vitória do Queen's Gambit pode ser um Emmy, mas não necessariamente.
OBS: Apenas uma vez na última década um show marcou uma vitória repetida nesta categoria (Homeland ganhou um segundo troféu em 2012) e é muito raro para um show ganhar três Globos de atuação (a última vez foi em 2017, quando Tom Hiddleston, Hugh Laurie e Olivia Colman ganharam prêmios pela série limitada The Night Manager).
Reprise comprova que Shirlei e Felipe foram os verdadeiros mocinhos de "Haja Coração"
"Haja Coração" teve um ótimo início em 2016, mas foi perdendo o rumo ao longo das semanas e a reprise comprova. Essa queda de qualidade pôde ser observada principalmente através do desenvolvimento de vários casais da história ---- muitos deles começaram promissores e tiveram o enredo estagnado. Já o par protagonista, composto por Tancinha (Mariana Ximenes) e Apolo (Malvino Salvador), cansa pela repetição desde o começo do folhetim. Porém, em contraponto a tudo o que foi mencionado, Daniel Ortiz criou um casal que caiu nas graças do público assim que surgiu e roubou o protagonismo: Shirlei e Felipe.
Os personagens interpretados com competência por Sabrina Petraglia e Marcos Pitombo protagonizam um dos enredos mais clássicos dos contos de fadas: o da gata borralheira em busca do seu príncipe encantado. É uma situação que transborda clichê, mas sempre funciona quando bem construída. E foi o caso da novela. Aliás, embora seja um remake de "Sassaricando" (1987), Shirlei não pertencia ao folhetim das sete de Silvio de Abreu. Mas fazia parte de outra novela do autor, do horário das nove: "Torre de Babel" (1998). A menina ingênua que tinha um problema na perna foi vivida na época por Karina Barum, fazendo um grande sucesso ---- a música "Corazón Patío", de Alejandro Sanz (tema da personagem), estourou.
Ao inserir Shirlei no contexto de "Haja Coração", o autor se viu obrigado a criar uma trama e não simplesmente seguir com a obra original. E foi algo bem positivo, ainda mais levando em consideração os erros que Daniel Ortiz cometeu com vários perfis e enredos da sua história, muitas vezes tentando repetir situações de 1987 que não funcionaram ---- vide o sumiço de Teodora (Grace Gianoukas) e toda a trajetória de Aparício (Alexandre Borges). E todo o contexto que cerca a personagem é, propositalmente ou não, digno de uma mocinha de novela. Portanto, não demorou para a menina assumir esse posto com louvor. Ela e Felipe, que se comporta como o verdadeiro mocinho do enredo.
O rapaz está sempre com um sorriso no rosto, é solícito, transborda integridade e trabalha na empresa de Beto (João Baldasserini). Vale mencionar que o personagem demorou para entrar na novela, juntamente com a sua até então namorada, a patricinha Jéssica (Karen Junqueira). Foi só com a chegada dele que a trama da Shirlei deslanchou, pois a situação em torno da paixão platônica por Adônis (José Loreto) já estava cansativa. E o primeiro encontro do casal representou o clássico "Cinderela", da Disney. Isso porque o bom moço quase atropelou a menina, que acabou perdendo sua bota ortopédica em um bueiro, durante uma forte chuva. Felipe pegou o sapato e passou a procurar a moça para devolvê-lo.
Após muita procura e vários desentendimentos (a garota chegou a achar que estava debochando de sua deficiência), os dois finalmente se 'entenderam' e o rapaz devolveu a famigerada bota. O encontro se deu por uma 'coincidência' digna de folhetins: ela passou a trabalhar na casa dele como empregada. E não demorou para o interesse mútuo se manifestar, despertando o ciúme de Jéssica. Foi a partir de então que começou o calvário da mocinha, encarnando de vez a gata borralheira. A patricinha fazia de tudo para diminuir a funcionária e até a obrigou a subir vários andares de escada, carregando compras pesadas, ignorando seu problema na perna. A vilã encarnou de vez a madrasta da Cinderela, fazendo jus ao contexto da trama de Shirlei.
Para culminar, a filha de Francesca (Marisa Orth) é constantemente alvo da irmã Carmela (Chandelly Braz), que sempre faz questão de humilhar a caçula. Ainda há a presença do já citado Adônis, sujeito aproveitador que nunca retribuiu os sentimentos de Shirlei ---- mas depois passou a enxergá-la com outros olhos, virando mais um obstáculo para o casal. Outro ponto é a chegada da mãe de Felipe, interpretada por Betty Gofman. A nova personagem não admite o romance, pois sabe que a menina é filha de seu marido, Guido (Wernner Schunemann) ---- o desaparecimento dele é um dos mistérios da história. Portanto, fica claro que Shirlei tem um enredo próprio muito mais atrativo do que todo o restante da novela, que se mostrou bastante equivocada.
E uma ironia do 'destino' é ver o casal Shirlipe ofuscando o par protagonista, exatamente como ocorreu em "Sassaricando", reprisada atualmente pelo Canal Viva. Porém, curiosamente, na época, era o triângulo formado por Tancinha, Apolo e Beto que apagou o protagonismo de Aparício. Agora, o trio amoroso virou protagonista, mas de nada adiantou, pois foi ofuscado pelo casal de coadjuvantes. Ou seja, os personagens cresceram na obra original e no remake (por razões óbvias) entraram para o núcleo principal. O imponderável novamente se fez presente.
Os atores são ótimos juntos e a sintonia da dupla se evidencia em todos os momentos. A troca de olhares é outro ponto que enriquece o relacionamento que demorou bastante para finalmente acontecer. Ainda assim, valeu a espera. O aguardado beijo foi bonito e valeu ter visto atores não tão 'conhecidos' em destaque. Afinal, a atriz estreou no SBT em 2010, quando viveu a Terezinha em "Uma Rosa com Amor". Foi para a Globo no mesmo ano, onde teve uma pequena participação em "Passione". Também fez uma ponta em "Flor do Caribe" (2013), também atualmente reprisada, até ganhar a Itália em "Alto Astral" (2014), estreia de Daniel Ortiz como autor solo. Ela brilhou e acabou conquistando a ótima personagem posteriormente.
Já Marcos Pitombo é mais experiente, pois é revelação da temporada de 2006 da "Malhação". Depois do sucesso no seriado adolescente, foi para a Record, onde esteve em seis novelas: "Os Mutantes" (2008), "Os Mutantes: promessas de amor" (2009), "A História de Ester" (2010), "Vidas em Jogo" (2011), "Pecado Mortal" (2013) e "Vitória" (2014). Porém, é inegável que atuar fora da líder não dá a mesma visibilidade. O ator voltou para a Globo em 2015, onde fez uma breve participação na fracassada "Babilônia", e aproveitou a chance como o carismático Felipe. Não é por acaso que o personagem, mesmo não aparecendo tanto, ofuscou a figura de 'galã' de Apolo. Aliás, o casal se sobressaiu com grande facilidade, virando o melhor par do enredo com larga vantagem. Tanto no quesito química, quando na questão do desenvolvimento do romance.
Shirlei e Felipe (Shirlipe para os 'shippers') representam o amor puro dos contos de fadas e o imenso sucesso do casal apenas comprova que o clássico, quando bem feito, funciona sempre. Os dois viraram os verdadeiros mocinhos de "Haja Coração", protagonizando a melhor história da novela, com direito a cenas românticas, maldades de vilões e questões envolvendo a baixa autoestima de uma menina com deficiência. Sabrina Petraglia e Marcos pitombo fizeram por merecer todo o êxito do par, que é o único drama da novela que tem valido a pena rever.
‘Big Brother Brasil 21’: um reality show sem realidade? Excesso de interferências da produção no 'Big Brother Brasil 21' traz desconfianças sobre a veracidade da narrativa configurada pelo programa.
Quando imaginávamos que não havia mais o que acontecer no BBB21 além do que já transcorreu nessas três semanas, lá vem o programa e nos joga na cara: nada mais imponderável que um reality show de convivência que se fundamenta em isolar um grupo de sujeitos do mundo externo. Presos nesse grande aquário com transmissão em cadeia nacional, tais indivíduos negociam um bem valioso – sua privacidade – em troca de uma sonhada visibilidade. Se vai ser bom ou não para eles, é sempre uma incógnita (quase nunca é).
Em pouquíssimo tempo, BBB21 tematizou uma quantidade absurda de assuntos: falou de relacionamentos abusivos, tortura psicológica, “sequestro” de pautas identitárias, homofobia, bifobia e xenofobia, dentre tantos outros tópicos de conversa. No entanto, aqui nesse texto pretendo olhar menos para a questão mais controversa de todas (falo da situação enfrentada por Lucas Penteado na casa, culminando em sua desistência), já abordada com qualidade por muitos especialistas, para falar de outro tópico: o fato de que a “cozinha” do BBB esteja aparecendo o tempo todo para os espectadores.
Em outras palavras: BBB 21 tem sido tão caótico que temos tido relances o tempo todo de “sobras” que normalmente ficam restritas apenas ao âmbito da produção. Para ilustrar, cito aqui dois exemplos. O primeiro é a conversa mantida entre o apresentador Tiago Leifert com o cantor Projota, após o último ter “aconselhado” Lucas Penteado num discurso algo acolhedor. Em um momento isolado no confessionário (mas exibido em tempo real e ao vivo pela Globo), Leifert elogiou a “força” que Projota – que caiu no choro – deu ao jovem ator em um momento de crise.
O segundo momento é o áudio “vazado” (as aspas se dão apenas por não ter confirmação de que se trata, de fato, de um “vazamento”, ou seja, não-intencional) da conversa entre Projota e uma voz que, pelo que sabemos, é de Boninho – o sujeito que poderia ser definido como o big brother onisciente que dá o nome ao programa. Neste episódio, Boninho chama Projota no mesmo confessionário e, vindo de lá, ouvimos um diálogo em que ele dá explicações ao cantor sobre a saída de Lucas Penteado e tenta convencê-lo a não desistir do programa. Dentre essas explicações, está de que a produção não sabia que Lucas tinha problema com bebidas e que, quando consome álcool, vira um “monstro”.
É ruim que ambos (diretor e apresentador) interfiram nos rumos da casa? Não necessariamente. A produção tem sim um importante papel nos direcionamentos da casa, tal qual um titereiro, mas que nunca consegue controlar totalmente seus marionetes. Os problemas vistos no BBB21 estão na forma que as intervenções têm sido feitas e no fato de elas privilegiarem apenas alguns participantes.
No primeiro caso, Leifert claramente mexe na estrutura do programa pois dá uma pista a Projota – que, paradoxalmente, saiu prejudicado, pois dali com uma sensação de aprovação coletiva que ele não tinha. Não por acaso, Projota passou a emitir cada vez mais discursos de tom evangelizador nas interações com as pessoas da casa, sugerindo acreditar ser um líder ali dentro. Já a conversa com Boninho dá a entender o esforço da Globo de mantê-lo ali dentro. No diálogo, Projota dá a impressão de que precisou de uma longa negociação (o que provavelmente envolve promessas) para levá-lo ao BBB.
Uma das principais acusações para se desmerecer reality shows é de que eles forjariam um discurso de realidade a partir de muita manipulação (obtida no trato com os participantes) e edição (a produção cria uma narrativa de realidade conforme seus interesses). Há, inclusive, uma série, Unreal, que mostraria justamente o que seriam esses meandros – baseados tanto na falta de ética com os competidores quanto com o público.
Ao sinalizar indícios muito claros de interferência no jogo (importante destacar, aliás, que ambos os exemplos citados aqui envolvem o mesmo participante, Projota), Big Brother Brasil dá certos sinais de descontrole no programa, que provavelmente rumou a um caminho imprevisto aos desejos da produção. Tudo ali parece muito errado: um casting que se amalgamou em uma dinâmica extremamente tóxica, participantes abusivos e abusados, ameaças de desistência a todo instante. Talvez fosse interessante à produção do BBB tomar uma atitude mais transparente com o público sobre todas essas questões.
Por outro lado, vale lembrar: é justamente esse descontrole (o fato de que, mesmo escolhendo minuciosamente cada elemento deste reality show, nunca há como garantir que o script será cumprido conforme se espera) que traz a graça e a essência de um programa deste tipo. Nada poderia ser mais real que isso.
Sempre vale a pena rever a cena mais emblemática de "Laços de Família" A televisão reprisou a cena mais emblemática de "Laços de Família" nesta segunda-feira (08/02/2021), no "Vale a Pena Ver de Novo": a raspagem dos cabelos de Camila (Carolina Dieckmann). Um dos maiores sucessos de Manoel Carlos que vem repetindo o êxito nas tardes da emissora. A média fica em torno de 18/19 pontos, índices excelentes para a faixa. É a prova do carinho do público pelo novelão que marcou tantas gerações.
A aguardada sequência entrou para a história da teledramaturgia e marcou a carreira de Carolina. Foi um momento de total entrega. Ao som de "Love By Grace", música cantada por Lara Fabian que passa a embalar o drama da personagem, a cena não tem texto e mostra apenas a raspagem dos cabelos de Camila, que decide retirá-los após o desespero com as constantes quedas em virtude da quimioterapia. É evidente que a emoção da intérprete se misturou com a da personagem. Afinal, é uma mudança de visual brusca.
E Carolina merece todos os elogios pelo seu profissionalismo. O grande público sabe que não é toda atriz que aceita um pedido assim. Mas valeu a pena o risco. Ninguém esquece da cena e até hoje há uma forte comoção. Embora não seja a função da teledramaturgia, também serviu como um grande estímulo a todos que enfrentam a leucemia. Vale lembrar que a novela fez aumentar significativamente a doação de medula óssea na época graças ao desenvolvimento competente do drama de Camila.
Aliás, Maneco foi de uma habilidade invejável. A filha de Helena (Vera Fisher) era a personagem mais detestável de "Laços de Família" e já havia páginas na internet destilando ódio pela garota, mesmo em uma época onde a internet ainda engatinhava. E nada mais natural. Camila deu em cima do namorado da mãe descaradamente e foi correspondida. Helena abriu mão de seu amor pela felicidade da filha. Difícil encarar todo o contexto com naturalidade e por isso a acidez de Íris (Deborah Secco) era tão adorada. Representava quem assistia.
Mas o autor conseguiu promover uma virada no sentimento do telespectador. E vale ressaltar que a doença estava planejada desde a sinopse. Muitos veículos chegaram a noticiar que o câncer foi criado de improviso como uma estratégia de Maneco para diminuir a rejeição de Camila. Mas sempre foi tudo bem colocado. Até nos primeiros meses de novela alguns personagens destacavam a palidez da personagem e como vivia abatida. Tudo piora quando engravida de Edu (Reynaldo Gianecchini) e vários sintomas da leucemia surgem. O fato do marido médico ignorar a gravidade é um tanto absurdo, mas não prejudica a narrativa. E quando a leucemia é descoberta aquele ódio do público vai cedendo lugar para uma comoção difícil de segurar. Aliás, o elenco se entrega junto com Carolina. Vale destacar os momentos emocionantes de Luigi Barricelli (Fred), Vera Fisher, Gianecchini e Júlia Almeida (Estela).
A marcante sequência da raspagem dos cabelos é uma catarse dilacerante e coroa a competente condução de Manoel Carlos na abordagem do tratamento contra a leucemia. Nenhuma outra novela conseguiu chegar nem perto neste quesito. Uma curiosidade: a cena não foi escrita pelo autor. Foi gravada apenas para uma campanha de doação de medula óssea. Mas ficou tão impactante que acabou inserida no enredo. E valeu muito a pena rever um momento tão importante para a teledramaturgia nacional. A reprise de "Laços de Família" merece todo o sucesso.
"Gênesis" apresenta bom início e conhecida história bíblica desperta a atenção do público
A 'nova superprodução da Record', "Gênesis" estreou na terça-feira (19/01/21), na faixa antes ocupada por "Amor sem Igual", até então a única novela inédita no ar atualmente. A nova produção bíblica da emissora agora é o segundo folhetim inédito. Após ter fugido um pouco da mesmice com a boa trama de Cristianne Fridman, o canal volta a apostar nas histórias bíblicas para atrair o público.
A nova novela tem um alto investimento da emissora. É o maior elenco da teledramaturgia nacional até hoje, com mais de 250 atores, e dividida em sete fases: "Criação" (Adão e Eva); "Dilúvio" (Arca de Noé); "Torre de Babel"; "Ur dos Caldeus", "Abraão"; "Jacó" e "José do Egito". Serão 150 capítulos. Ou seja, a bem da verdade, há uma boa estratégia de marketing. Afinal, analisando friamente, não se trata de um folhetim e, sim, de várias minisséries interligadas por poucos atores. Apenas dois estão em todas as fases: Flávio Galvão, intérprete de Deus (apenas por voz), e Igor Rickli, que vive Lúcifer.
A produção é escrita por Camilo Pelegrini, Raphaela Castro e Stephanie Ribeiro, dirigida por Edgard Miranda. A trama aborda os primeiros 2.300 anos da humanidade a partir da história contada no primeiro livro da Bíblia. Há uma boa frente de capítulos já prontos. O início das gravações foi em janeiro de 2020, dois meses antes do início da pandemia de COVID-19 no Brasil.
A primeira fase teve locações no Rio Grande do Sul e no Paraná. A fase do "Dilúvio" foi feita em estúdio no Rio de Janeiro e parte da equipe também filmou em Marrocos pouco antes da pandemia interromper os trabalhos. Como há muito dinheiro investido pela Record, o intuito é repetir o sucesso de "Os Dez Mandamentos" (2015), nunca mais alcançado.
A estreia teve uma ótima audiência (16 pontos) e o chamariz do enredo de "Adão e Eva" foi um dos responsáveis pelo interesse do público. Afinal, todo mundo conhece a história e a curiosidade em vê-la produzida como 'novela' atrai. Carlo Porto e Juliana Boller não fazem feio em cena, embora o excesso de maquiagem nos atores deixe o resultado artificial. Já os efeitos especiais merecem elogios. A primeira parte (envolvendo uma clara licença poética até da Bíblia) impressionou pelo bom trabalho da equipe em cima da representação dos dinossauros sendo extintos ---- Lúcifer e todos os anjos rebelados foram expulsos por Deus do reino do céu e todos se transformaram em meteoros pela força da 'queda', destruindo o mundo jurássico. Foi uma ideia criativa juntar a teoria criacionista com a evolucionista.
A agilidade é outro fator que tem contribuído para a atenção do espectador. Adão e Eva comeram o fruto proibido logo na estreia e no segundo capítulo já houve uma passagem de tempo com a chegada de vários filhos e filhas do casal, incluindo Caim (Eduardo Speroni) e Abel (Caio Manhente), que protagonizaram a conhecida passagem da Bíblia no terceiro capítulo: um irmão matando o outro por inveja. O trágico momento ainda destacou o talento de Juliana Boller, que transmitiu lindamente a dor da Eva com a perda do filho. Na sexta-feira (22/01/21), no quarto capítulo, a fase de Noé (Bruno Guedes) foi iniciada. E já na próxima semana vai ao ar toda a sequência da Arca de Noé (Oscar Magrini). Ou seja, são muitos acontecimentos de forte apelo indo ao ar em apenas duas semanas. Tem sido interessante acompanhar a trama, que provavelmente terá uma queda de ritmo na fase "Torre de Babel", algo já esperado.
"Gênesis" vem apresentando um promissor começo e o sucesso nos números de audiência serve para ligar o sinal de alerta da Globo. A Record nunca escondeu que pretende repetir o êxito do fenômeno "Os Dez Mandamentos" (2015), até hoje nunca mais alcançado. Se o conjunto se mantiver atrativo ao longo das fases, a chance de acontecer é real.
Angélica ficou quase três anos fora do ar. O "Estrelas", programa comandado por ela entre 2006 e 2018, chegou ao fim desgastado e sem atrativos. A Globo encerrou a atração sem ter um novo projeto para a apresentadora. Muitas especulações foram feitas durante a ausência da loira, incluindo o desligamento da emissora. E todos os "projetos" de um novo formato eram adiados. Até surgir o "Simples Assim", em outubro deste ano.
Antes da estreia, no dia 20, pouco se falava sobre o novo programa. A falta de informações implicou em uma expectativa elevada. Afinal, era o retorno de Angélica após um longo hiato. Mas o resultado ficou abaixo da média. As explicações sobre a proposta do formato são ótimas: "uma reflexão sobre algo que nos une como seres humanos. A busca pela felicidade. Um propósito comum a todos e, ao mesmo tempo, único e individual, que cada um percorre a seu modo. Trilhar o caminho não é simples e chegar à simplicidade, ao estado de espírito que permite encarar a vida com mais leveza, pode custar uma vida inteira".
A cada episódio, um tema ---- como felicidade, fé, trabalho, família, solidariedade, diversidade, vaidade e amor ---- foi abordado. E, para cada assunto, diferentes percepções e maneiras de contar essas histórias, que vieram das ruas, das casas dos personagens (sempre anônimos), através de esquetes de humor ---- que marcaram a volta de Angélica como atriz ---- ou das dinâmicas com alguns convidados em um palco. O intuito do programa é exibir momentos felizes e na primeira temporada a missão foi bem cumprida. O formato é leve e despretensioso. Mas, no ar, provocou tédio.
Angélica é uma ótima apresentadora, mas os longos papos com os convidados, tanto anônimos quanto famosos, sobre amenidades não flui e nem as dinâmicas no palco entretêm. Muitas vezes há a sensação de acompanhar uma espécie de grupo de autoajuda, onde a apresentadora é a 'coach'. É mais legal para quem participa do que para quem assiste. Nem mesmo as curtas cenas protagonizadas por Angélica com participações especiais (Marcos Caruso, Paulo Gustavo, Camila Queiroz, Mariana Santos, Marisa Orth e Ingrid Guimarães foram alguns que contracenaram com a loira) divertiram. Na realidade, se mostraram bem artificiais ou até bobinhas. Nada pior para uma cena do que parecer uma cena.
E o programa também teve o azar de ser lançado em plena pandemia do novo coronavírus. A primeira temporada já tinha sido toda gravada antes da covid-19 aterrorizar o mundo. O quadro "Dilemas da Vida Real", por exemplo, soa risível hoje em dia com tantas mortes diárias. Um homem e uma mulher moravam em cidades diferentes e os dois tiveram que decidir no palco quem iria abdicar de sua casa para se mudar e ir morar com o outro. Vale destacar mais um "dilema" apresentado: o marido queria mais filhos e a mulher não. A missão do programa foi conciliá-los. Na realidade, houve um claro "convencimento" para a mulher ceder e ter filho. Soou até machista nos tempos atuais. Enfim, problemas que ficaram ainda mais bestas em 2020.
Com direção-geral de Geninho Simonetti e supervisão de direção de LP Simonetti, "Simples assim" não é um programa ruim. Longe disso. Mas Angélica merecia algo um pouquinho mais empolgante após tanto tempo longe do ar. O título faz jus ao que é apresentado. São propostas simples em um formato sem novidades. Mas o conjunto, infelizmente, resulta em um programa esquecível e chato.
Comportamento Típico da Rede Globo em não investir em qualidade.
Há 20 anos no ar, "Altas Horas" foi o programa que melhor se adaptou ao momento de pandemia
A pandemia do novo coronavírus afetou toda a programação televisiva. Do Brasil e do mundo. Os produtos mais afetados foram o do entretenimento, vide o agravamento da crise do setor cultural. E os programas de auditório sofreram uma inevitável descaracterização. Afinal, todos precisam da aglomeração das plateias. Portanto, os apresentadores se viram obrigados a apresentar suas respectivas atrações de casa ou no palco sem ninguém presente (com exceção da produção). E quem melhor se virou com o inusitado novo formato foi Serginho Groisman.
A maior identidade do "Altas Horas", que completou 20 anos no ar no dia 14 de outubro de 2020, era a plateia repleta de jovens estudantes e com uma proximidade muito grande com os convidados. Todos ficavam sentados em um auditório que fazia quase um círculo no estúdio. Era quase uma arena do entretenimento e da informação. O mesmo já acontecia desde a época do inesquecível "Programa Livre", no SBT. Enquanto não houver a vacina contra a COVID-19 nada disso será possível. Um hiato é inevitável. Mas se engana quem pensa que a alteração do formato afetou a qualidade da atração.
Serginho foi muito inteligente ao mesclar conteúdo inédito com reprises. Ao invés de simplesmente reprisar programas antigos, como ocorria com o "Domingão do Faustão" e "Caldeirão do Huck", o apresentador exibe trechos de algumas entrevistas ou números musicais do programa e entrevista o convidado ou a convidada que esteve na época da exibição via vídeo-chamada.
Também tem sido fundamental na divulgação das "estreias" de novas reprises da Globo. Vide a deliciosa entrevista recente que teve com Vera Fisher, Reynaldo Gianecchini e Carolina Dieckmann para falar da volta de "Laços de Família" (2000) no "Vale a Pena Ver de Novo".
As entrevistas remotas que Serginho vem fazendo duram cerca de dez a quinze minutos e enriquecem a atração. O "Conversa com Bial" iniciou esse recurso de uma forma muito bem-sucedida e Serginho acertou ao seguir com a mesma proposta, ainda que com uma duração mais curta. Outro ótimo momento foi um bate-papo descontraído do apresentador com Susana Vieira e Renata Sorrah relembrando "Senhora do Destino" (2004). Marina Ruy Barbosa também marcaram presença em vídeo-chamadas para uma homenagem ao sucesso da personagem "Eliza" na época de "Totalmente Demais" (2016). Vale destacar ainda sua entrevista com Marjorie Estiano para falar do especial "Sob Pressão - Plantão Covid".
O êxito do "Altas Horas" com esse novo formato implicou na mudança no "Domingão do Faustão". Fausto no início apenas gravava vinhetas em casa e a reexibição dominava quase todo o tempo de programa. Algumas semanas depois, o comunicador começou a realizar entrevistas de sua casa em vídeo-chamadas. Ivete Sangalo foi um das convidadas. Agora Faustão já voltou ao palco com a nova temporada da "Dança dos Famosos", mesmo sem plateia. Agora é preciso apontar essa mexida da produção após o acerto de Serginho. Sinal que realmente funcionou.
Serginho Groisman sempre foi um dos melhores apresentadores do país e o "Altas Horas" o programa de maior qualidade na televisão aberta. O vitorioso novo formato apenas comprovou que nem uma pandemia será capaz de alterar isso. Está tudo igual, apenas um pouco diferente.
A segunda temporada teve um ótimo início em março deste ano, só que as gravações foram interrompidas por conta da pandemia do novo coronavírus. Enquanto não havia ainda uma data para o retorno do programa, Fábio fez o "Que Quarentena É Essa, Porchat?" com episódios temáticos das reprises dos melhores momentos das duas temporadas. Posteriormente, emplacou o "Que História É Essa, Vovó?", com ótimas e breves entrevistas com veteranos como Gilberto Gil, Ary Fontoura, Rita Lee e Aracy Balabanian; e somente em exibição na internet. E após longos meses de incertezas, o formato voltou ao ar no GNT na primeira terça-feira de agosto, dia 04.
O receio sobre a perda de rumo da atração era inevitável. Afinal, como manter o interesse sem plateia e com os três convidados em vídeo-chamadas que correm o risco de queda de sinal e problemas do gênero? Felizmente tudo se dissipou com o programa no ar. Fábio e sua produção conseguiram driblar todas as armadilhas impostas pela pandemia e mantiveram a qualidade do produto. Em um lindo cenário high-tech, o apresentador fica sozinho no estúdio e de frente para um imenso painel com a imagem dos três entrevistados do dia em destaque e pequenos círculos com pessoas que representam a plateia --- e também interagem e escutam as histórias. Por incrível que pareça, não houve mudança significativa no conjunto do formato. A conexão é excelente e a fala de ninguém é afetada por travamentos ou perdas de áudio, o que não prejudica o "timing" dos casos contados. Fafá de Belém, Rodrigo Hilbert e Leandro Hassum estiveram neste recomeço e brilharam.
O "Que História É Essa, Porchat?" chegou para ficar e a prova do sucesso é a reexibição da primeira temporada na TV aberta a partir desta quinta-feira, 15 de outubro ---- o primeiro programa reprisado foi com Ney Latorraca, Cláudia Raia e Marcos Veras. A trajetória é parecida com o elogiado "Lady Night", de Tatá Werneck --- o formato também migrou para a televisão com reprises, em virtude do sucesso no Multishow. Fábio Porchat conseguiu criar um produto simples e delicioso. Certeza que muitas outras temporadas já estão garantidas.
Repleta de situações constrangedoras e personagens rasos, "Fina Estampa" não merecia qualquer reprise
A audiência prova que a Globo acertou em cheio quando escolheu "Fina Estampa" para ser reprisada no lugar de "Amor de Mãe", que teve as gravações interrompidas por conta da pandemia do coronavírus. Os elevados índices têm feito a alegria da emissora e são bem maiores que os números alcançados pela antecessora, escrita por Manuela Dias.
A trama central se baseia no chavão da mãe batalhadora que é humilhada pelo filho ambicioso e bonitão. A mulher em questão atende pelo nome peculiar de 'Griselda' e é interpretada pela grande Lília Cabral. Ainda entra em um triângulo amoroso com uma perua fútil e um homem educado e rico. René (Dalton Vigh) se interessa pelo lado puro da protagonista, o que provoca o ódio de sua esposa, Tereza Cristina (Christiane Torloni). E a vilã tem um mordomo (Crô - Marcelo Serrado), um gay caricato, que é tratado como um capacho. Um conjunto de clichês que costuma funcionar. Porém, nada disso se sustentou por muito tempo na época e fica possível constatar facilmente na reprise que chega ao fim na sexta-feira, de 18/09/2020.
Tereza Cristina tentava ser engraçada em certos momentos e cruel em outros, mas nunca conseguiu. Christiane Torloni procurava fazer o que era proposto, mas sua vilã era tão irritante e sem rumo que a atriz não conseguia uma atuação digna de aplausos. Nem podia fazer milagre. Aguinaldo, na época, criticava vilões como a Flora ("A Favorita") e o Léo ("Insensato Coração") por serem vilões que agiam gratuitamente. Mas o propósito de Tereza Cristina não existia. O que movia suas supostas maldades contra Griselda? Apenas ciúme do marido? Esconder um segredo idiota? A ponto de até tentar assassinar os filhos da rival?
A novela afundou de vez quando a vilã empurrou um mafioso (Luciano Schirolli) que a ameaçava escada abaixo. Após o ato, Tereza agradeceu a Nazaré Tedesco e disse que fez isso porque aprendeu com a novela, exibida em 2004. Foi uma clara referência do autor ao sucesso da sua maior vilã em "Senhora do Destino". A sequência foi constrangedora em todos os aspectos. Qual foi o objetivo da cena? Um autoelogio do Aguinaldo. Nada fez sentido e a situação soou claramente forçada. Outro fator é a rivalidade entre a perua e Griselda (Lilia Cabral, grandiosa sempre). O ódio que a perua sente pela 'adversária' é boboca demais e só seria aceitável em um folhetim das sete.
No aspecto geral, a novela não andava. As histórias foram desenvolvidas a passos de tartaruga e o telespectador podia não assistir a trama por vários capítulos que não perdia algo de grande importância. A quantidade de personagens que nada acrescentavam era gritante. Qual a função do núcleo da praia? E da pensão da Zambeze (Totia Meirelles em um papel ingrato)? Aliás, eram perfis tão deslocados que foram praticamente cortados da reprise. Mal apareceram. A entrada de Carolina Dieckmann e Dudu Azevedo nada agregou à trama, além da interpretação limitada dos atores. E Dieckmann nem é má atriz, mas não conseguiu brilhar em um papel tão ruim. Arlete Salles, grande profissional, se viu com um papel de pífia importância. Sua taxista Wilma não serviu para nada. Teve como prêmio de consolação uma participação no "Caldeirão do Huck" no início da novela que nada acrescentou e foi uma bobagem só.
Renata Sorrah também não foi valorizada, apesar do seu núcleo ter sido um dos poucos que apresentaram uma história interessante. Mas a disputa pela guarda do sobrinho da doutora Danielle não foi bem abordada. Ana Rosa e Jaime Leibovitch (ótimos atores), que travaram uma guerra pela guarda do menino com a médica, mal se destacaram. Dan Stulbach e Julia Lemmertz tiveram boa química, mas a situação envolvendo a crise do casal por causa da inseminação artificial, que a esposa queria fazer e o marido era contra, andava em círculos.
As tentativas de conquistar mulheres pela internet era o enredo de René Junior (David Lucas). Difícil alguém se interessar por isso. Antenor e Patrícia formaram um casal sem o menor entrosamento. Caio Castro estava no pior momento de sua ainda inicial carreira e Adriana Birolli desaprendeu a atuar, após seu bom desempenho em "Viver a Vida" (2010). A violência doméstica sempre gera repercussão, mas a situação envolvendo Baltazar (Alexandre Nero), Celeste (Dira Paes) e Solange (Carol Macedo) era repetitiva e porcamente abordada. A garota só sabia dançar funk desde que apareceu na história. Detalhe: a música também era sempre a mesma. O agressor ainda foi perdoado pela esposa espancada e terminaram felizes. Isso porque o personagem fez uma dupla com Crô que caiu nas graças do público. O vilão virou elemento cômico através dos xingamentos homofóbicos que fazia contra o mordomo. O constrangimento da Globo com o núcleo é tão grande que toda a temática da violência foi quase escondida na reexibição. Até a trama da filha foi bastante editada. Quem não viu em 2011 dificilmente entende o que se trata o contexto envolvendo esses perfis.
Eva Wilma era um dos poucos pontos positivos com a sua Tia Íris. Sua parceria com a Thais de Campos (Alice) funcionou. Marcelo Serrado esteve muito bem como o afetado Crô, embora a veneração do mordomo em relação a Tereza Cristina tenha sido sem sentido. O perfil era uma caricatura e o ator fez o que foi pedido. Cumpriu a missão e entrou para o primeiro time da atores da emissora. Foi o maior destaque e tomou conta da história, que passou a se sustentar por muitas "esquetes" protagonizadas por ele. Não por acaso era o único personagem lembrado por grande parte dos telespectadores. Virou a "novela do Crô". Mas revendo atualmente fica perceptível como o perfil envelheceu mal. O gay afetado sempre existirá na teledramaturgia, pois existe na vida real, mas esse caso refletia em constantes humilhações nunca rebatidas pelo empregado.
O tal mistério envolvendo o segredo de Tereza Cristina era uma bobagem. Uma besteira ainda maior do que ser filha de uma empregada louca. Sim, esse "mistério" era uma mentida inventada por Tia Íris. O passado tão obscuro era a vilã ser fruto do marido de Íris com sua irmã. A tia nunca se conformou com o caso do esposo e inventou a origem humilde da sobrinha para "se vingar". A vilã era irmã de Álvaro (Wolf Maya) só por parte de pai. Ou seja, a perua cometeu inúmeros crimes por um segredo que nem era real. O outro enigma do enredo envolvia o namorado de Crô. Como o personagem cresceu, ganhou essa espécie de trunfo para aumentar ainda mais a audiência. Mas Aguinaldo não revelou a identidade do sujeito nem no último capítulo e citou como "referência" o final em aberto sobre o que tinha na caixa de Perpétua (Joana Fomm), em "Tieta". Mas, ao contrário do clássico de 1989, ficou evidente que o autor nem sabia quem era o tal namorado. Inventou para preencher o tempo dos capítulos e não conseguiu escolher o personagem que teoricamente já estava no enredo. O público foi feito de idiota. O enredo do mordomo foi tão mal colocado que a Globo também suprimiu na reprise. E a cena final até hoje é lembrada pela direção deprimente de Wolf Maya e a situação constrangedora criada pelo autor. Tereza Cristina foi dada como morta após uma sequência péssima da vilã naufragando com Pereirinha (José Mayer) em alto mar. Mas a perua apareceu na última cena em um carro de luxo debochando de Griselda, que foi atrás da inimiga segurando uma chave de grifo. Um desfecho vergonhoso.
"Fina Estampa" é um produto meramente escapista, mas nem para leveza funciona. A prova é a quantidade de personagens esquecíveis e tramas que não ficaram na memória. Até o ator Marco Pigossi (intérprete do machista Rafael), em uma live recente e deixando a ética de lado, declarou que a novela deveria ter sua reprise proibida pela quantidade de absurdos ditos no enredo. O grande público lembrar apenas do Crô é resultado da falta de densidade de todas as situações criadas por Aguinaldo Silva. A emissora teve uma boa estratégia ao escolher o folhetim de sucesso como "tapa-buraco", mas uma história desinteressante, rasa e com várias atuações abaixo da média não merecia ser reprisada em qualquer horário.
"O Clone" foi uma bela criação da dramaturgia do Brasil
Entre 1º de outubro de 2001 e 14 de junho de 2002, a televisão aberta exibiu "O Clone", um de seus maiores sucessos, e ainda conseguiu emplacar em vários países, consolidando seu êxito. A novela de Glória Perez foi um de seus melhores trabalhos da carreira e a autora foi muito feliz na construção desta história tão rica e repleta de personagens atraentes.
Protagonizada por Giovanna Antonelli e Murilo Benício, o folhetim estreou pouco depois do atentado às Torres Gêmeas, tragédia que abalou os Estados Unidos e chocou o mundo. Houve até um certo desconforto inicial, uma vez que parte da trama era ambientada em Marrocos, na cidade de Fez, onde viviam vários muçulmanos. Mas a polêmica não durou muito tempo e os costumes daquele povo caíram no gosto popular, comprovando que o núcleo foi um dos muitos acertos da produção.
A novela abordou vários temas polêmicos e soube explorá-los com competência. Dividida em duas fase, a história começa em 1983, apresentando a vida de Leônidas (Reginaldo Faria), rico empresário, pai de gêmeos idênticos (Lucas e Diogo, vividos por Murilo), que não tem muito tempo para os filhos.
Jade (Vivida por Giovanna) é uma muçulmana que vive no Rio de Janeiro, quando acaba voltando para Fez, após a morte de sua mãe (Walderez de Barros). Os filhos de Leônidas vão passar férias em Marrocos com o padrinho de Diogo (o geneticista Albieri - Juca de Oliveira) e a partir de então o destino de Jade e Lucas se cruza.
O romance do casal protagonista, impedido pelos rígidos costumes da família da mocinha, arrebatou o telespectador e a química do par era evidente. Já o acidente de helicóptero que mata Diogo resulta na trama envolvendo a clonagem humana, uma vez que Albieri guarda as células de Lucas, depois que o rapaz vai em seu laboratório extrair uma pinta. Tudo para 'reviver' Diogo. A situação rendeu ótimos desdobramentos e ainda fez Murilo Benício se destacar, pois o ator acabou interpretando três personagens distintos, ainda que iguais: os gêmeos e o clone.
A segunda fase é iniciada em 2001, prosseguindo com todos os dramas apresentados na primeira e ainda acrescentando novos núcleos que deixaram a novela ainda mais interessante. O mais dramático foi o protagonizado por Débora Falabella, que impressionou com sua atuação na pele da rebelde Mel, uma viciada em drogas, filha de Lucas com Maysa (Daniela Escobar). As cenas mais fortes da novela foram vividas por ela e algumas entraram para a história da teledramaturgia pela entrega da atriz. O alerta sobre o consumo de substâncias ilícitas mesclou entretenimento e utilidade pública.
Já a parte cômica da história ficou por conta de duas personagens, cujos bordões ainda são lembrados pelo telespectador: Dona Jura (ótima Solange Couto) e Odete (maravilhosa Mara Manzan). Jura tinha um bar e vendia pastéis que faziam um baita sucesso. O bordão "Né brinquedo, não" virou febre, assim como o "Cada mergulho é um flash", proferido por Odete, personagem hilária interpretada pela saudosa Mara, que amava frequentar o Piscinão de Ramos e incentivava sua filha Karla (Juliana Paes) a dar o golpe da barriga --- essa trama hoje em dia seria bem criticada até pelas resoluções absurdas da autora.
O núcleo de Marrocos também obteve êxito e as danças dos personagens faziam sucesso, assim como as expressões ditas por eles, como o inesquecível "Ishalá", falado constantemente por Khadija (Carla Dias). A solteirona Nazira (Eliane Giardini) também foi outro destaque desta trama, assim como Zoraide (Jandira Martini), cúmplice e confidente de Jade. E impossível não lembrar do rabugento Tio Abdul (saudoso Sebastião Vasconcellos), defensor da moral e dos bons costumes, que vivia mandando as pecadoras "Arder no mármore do inferno".
utro acerto da novela foi a questão do alcoolismo, abordada com competência através de Lobato, vivido magistralmente por Osmar Prado. Nesse mesmo núcleo havia uma vilã que não media esforços para atingir seus objetivos, a Alicinha, muito bem interpretada por Cristiana Oliveira. Vale destacar também as brilhantes atuações de Cissa Guimarães (Clarisse) e Thiago Fragoso (Nando), que emocionaram várias vezes nas cenas onde a mãe se desesperava com o vício de drogas do filho, que era amigo das também viciadas Mel e Regininha (Viviane Victorette).
Além dos ótimos profissionais já citados, a novela também contou com outros excelentes atores, como Nivea Maria, Adriana Lessa (perfeita na pele de Deusa, a mãe do clone), Ruth de Souza, Elizângela, Beth Goulart, Antônio Calloni, Letícia Sabatella, Françoise Fourton, Perry Salles, Totia Meirelles, Guilherme Karan, Léa Garcia, Stênio Garcia e Marcello Novaes. A trama ainda foi a última da carreira do mestre Mário Lago, que veio a falecer meses depois.
Curiosamente, a reprise no Canal Viva serviu para observar melhor algumas falhas que não são muito faladas pelos saudosistas. O núcleo de Dona Jura é bem deslocado dos demais enredos e tem como única função preencher o tempo dos capítulos com convidados especiais que visitavam o bar da popular personagem. Era o elemento utilizado pela autora para enrolar o telespectador. Há uma barriga bem clara na história, algo bem comum na época, importante ressaltar. A primeira fase, principalmente, cansa pelo ritmo arrastado e os conflitos também se desgastam perto do meio da produção. Até as idas e vindas de Jade e Lucas se esgotam. A burrice dos protagonistas é outro problema evidente. A sorte foi mesmo a química dos intérpretes. Felizmente os meses finais reaquecem os dramas e a novela volta a prender.
"O Clone" foi um marcante folhetim e Glória Perez viveu um grande momento. Com 221 capítulos, a produção está na lista dos mais elogiadas e lembradas novelas da dramaturgia nacional e fez por merecer a boa aceitação da reprise no Canal Viva.
Valeu rever a Proclamação da Independência do Brasil em "Novo Mundo"
A ótima "Novo Mundo" está em plena. E uma das muitas qualidades da trama de Alessandro Marson e Thereza Falcão foi a mescla de ficção com fatos históricos. Os autores foram muito habilidosos na construção de um folhetim clássico, tendo uma passagem importante da história do país como enredo central. E um dos momentos mais aguardados do enredo foi ao ar na exibição original, em 2017, bem no dia 7 de setembro: a declaração da Independência do Brasil.
Primeiramente, é preciso aplaudir a precisão dos escritores, há três anos, em colocar a cena justamente no dia que realmente aconteceu o fato. Obviamente, a precisão não foi se repetiu na reprise. Mas é apenas um detalhe. O grito de Dom Pedro (Caio Castro) foi arrepiante e conseguiu cercar esse momento emblemático com todo o clima necessário. Era um clímax bastante esperado, não apenas em virtude do contexto tão presente nos livros de história, como também pela trajetória do príncipe e da princesa que o público tem acompanhado desde a reestreia da novela.
A emoção da sequência foi temperada já no capítulo anterior com a exibição da belíssima cena em que Leopoldina (Letícia Colin) ignorou as ameaças da Corte Portuguesa e assinou a separação do Brasil de Portugal. Nomeada princesa regente pelo marido, a respeitável mulher reuniu os ministros e, com o apoio deles e de José Bonifácio (Felipe Camargo), tomou a decisão mais importante da história do país.
Após a assinatura, Joaquim (Chay Suede) ainda gritou "Viva o Brasil", provocando um inevitável sentimento de patriotismo em quem assistia, por pior que seja o atual cenário político. Todos os atores emocionaram, com destaque para Letícia.
Por sinal, vale observar que foi realmente Leopoldina que assinou a Independência. É um fato histórico. Mas, infelizmente, poucos dão importância e nem há um grande enfoque nos livros sobre isso, priorizando o grito de Dom Pedro. Esse é mais um ponto positivo da novela, pois houve uma justa valorização a um perfil tão importante para o Brasil. A princesa passou a ser vista e lembrada com outros olhos em grande parte por causa do folhetim. A força da teledramaturgia é muito grande e a própria atriz ficou marcada na carreira pela sua brilhante atuação, fazendo dessa personagem real uma pessoa tão cativante. Foi seu melhor momento até hoje.
A assinatura da princesa regente foi o gancho do capítulo, servindo de preparação para o grande momento. Após a passagem de Dom João (Leo Jaime) e Carlota Joaquina (Débora Olivieri), o casamento arranjado de Dom Pedro e Leopoldina, o retorno dos reis para Portugal e o Dia do Fico, chegou a hora da declaração da Independência do Brasil e pela primeira vez o contexto histórico teve mais importância que o enredo ficcional. O grito de "Independência ou Morte", com todos ao redor gritando jundo com Dom Pedro, foi de arrepiar.
A gravação da cena da proclamação durou quatro horas e reuniu 160 pessoas, entre equipe e figuração. Foram usadas 23 mulas, sete cavalos, 20 armas longas, 10 espadas e 80 figurinos de escravos, índios, fazendeiros, homens do campo e militares. Uma produção extremamente trabalhosa para um dos momentos mais esperados do enredo. E o resultado foi perfeito, valendo todo o esforço.
A cena da Independência do Brasil foi marcada pela cuidadosa direção de Vinícius Coimbra, bom texto dos autores e entrega do elenco, que mergulhou no clima de um dos momentos mais citados e lembrados da História do Brasil em "Novo Mundo".
Humilhação de Domitila destacou Agatha Moreira em "Novo Mundo"
E um dos momentos mais aguardados da trama foi a queda de Domitila (Agatha Moreira). A amante de Dom Pedro (Caio Castro), conhecida nos livros de História como a Marquesa de Santos, acabou mais vilanizada pelos autores Alessandro Marson e Thereza Falcão, privilegiando o bom folhetim, criando assim uma maior rivalidade com a doce princesa Leopoldina (Letícia Colin). A estratégia se mostrou um acerto e o desmascaramento da personagem destacou a atriz.
Inicialmente, Domitila parecia uma vítima sofredora, padecendo com as agressões do marido violento (Felício - Bruce Gomlesvky) e sofrendo nas mãos da irmã, a interesseira Benedita (Larissa Bracher). O início de seu romance com Chalaça (Rômulo Estrela), por sinal, rendia cenas delicadas para o casal. Entretanto, aos poucos, a verdadeira face da mulher foi sendo exposta para o público através de atitudes egoístas e traiçoeiras. O lado maquiavélico se firmou desde que ela adotou como principal meta a sua aproximação de Dom Pedro, com o intuito de se livrar do marido e conseguir a guarda dos filhos.
Mas, na verdade, Domitila sempre quis uma vida luxuosa e a posição de princesa do Brasil. Tanto que assim que conseguiu a guarda das crianças, as internou em um colégio. Também não pensou duas vezes antes de trair Chalaça, fazendo o amante odiar seu até então melhor amigo.
Quanto mais manipulava Dom Pedro, mais conseguia atingir seus objetivos, passando por cima de todos que atravessassem seu caminho. Se aliou até a Thomas (Gabriel Braga Nunes) para conseguir um dinheiro à parte através de acordos políticos, usando o príncipe como isca. Ou seja, ela acabou virando a maior vilã do enredo.
E, como sempre ocorre com as diabas das novelas, a maior expectativa era justamente em torno da sua desgraça. A longa espera valeu a pena. A sequência em que Chalaça armou uma cilada para a víbora, proporcionando o esperado flagra de Dom Pedro, ficou muito boa, destacando Agatha Moreira, Caio Castro e Rômulo Estrela. A atriz emocionou no confronto da mau-caráter com o ex, fazendo uma ótima dobradinha com Rômulo. Domitila confessou todas as suas armações e ainda tentou sensibilizar o amigo do príncipe demonstrando um falso arrependimento. A cena foi difícil, explorando o poder de manipulação daquela mulher.
Já o restante da sequência, com Dom Pedro transbordando de ódio para o desespero da amante, se mostrou ainda melhor. O marido de Leopoldina finalmente enxergou a verdadeira Domitila, não escondendo a fúria e a decepção. O momento em que ele a expulsou do Solar, a jogando no meio da rua, lavou a alma do público.
Agatha Moreira protagonizou sua melhor cena na novela e o choro de desespero da vilã foi vivenciado com total entrega da atriz. A intérprete, inclusive, se destacou ano com a mediana "Haja Coração", mesmo em um papel que se perdeu pelo caminho. Ela é uma grata revelação de "Malhação Intensa", temporada de 2012, onde viveu a doce Ju. Não por acaso ficou tão disputada pelos autores.
Alessandro Marson e Thereza Falcão foram corajosos na alteração da história real de Domitila em prol de uma boa ficção. Afinal, é sabido que a Marquesa de Santos nunca foi uma mulher sem caráter ou "malvada" e seguiu como amante de Dom Pedro, indo até morar junto com Leopoldina. Porém, seria demais acompanhar toda essa triste história também no mundo da fantasia. É certo que a vilã terminará com o príncipe novamente, pois não é possível tamanha liberdade poética. A melhor solução criada pelos autores foi o encerramento do enredo antes da morte da princesa do Brasil. E valeu acompanhar pela segunda vez essa derrocada de Domitila na reprise de "Novo Mundo". Agatha Moreira foi a maior beneficiada e na época nem imaginava que dois anos antes interpretaria uma personagem mais sarcástica e a melhor de sua carreira até então: a Giovana, de "Verdades Secretas", em 2015.
Há seis anos estreava Malhação Sonhos, uma das melhores temporadas do seriado, escrita por Rosane Svartman e Paulo Halm. Tinha trama, humor, ação, musicais lindos, casais apaixonantes, personagens carismáticos, elenco talentoso, enfim...Que saudades. Um belo dia resolvi mudar...
No dia 14 de julho de 2014 estreava "Malhação Sonhos", substituindo a fracassada "Malhação Casa Cheia", iniciada em 2013. A partir de então, o público começou a acompanhar uma trama adolescente repleta de tipos críveis, que precisavam enfrentar muitos dilemas e, apesar das inúmeras diferenças de personalidade, tinham algo em comum: todos sonhavam. O sonho era o que movia todos os personagens, sem exceção. Pois esta saga, que durou mais de um ano e envolveu o telespectador, chegou ao fim nesta sexta (14/08/2015), com um capítulo emocionante, tenso e irretocável.
Escrita por Rosane Svartman e Paulo Halm, com direção de Luiz Henrique Rios e Marcus Figueiredo, a história prendeu a atenção desde o primeiro capítulo. Apesar de ser um seriado adolescente, esta temporada foi voltada para todas as idades, uma vez que abordou diversos assuntos com propriedade, sem subestimar o público. O sucesso alcançado fez jus ao conteúdo de qualidade que foi apresentado. Não ficou devendo a nenhuma ótima novela, cujos gastos de produção são bem maiores. E esta foi praticamente a mesma equipe responsável pela "Malhação Intensa", exibida em 2012/2013, que também conseguiu conquistar o telespectador através de um enredo bem escrito.
A saga de vários jovens que buscavam seus sonhos foi muito bem desenvolvida pelos autores, que conseguiram manter o ritmo da história, evitando maiores enrolações ou estagnação do roteiro. O esquema de rodízio em torno dos casais e dos dramas de cada núcleo foi uma das principais razões para o êxito na condução da história. Enquanto uma trama ficava em evidência, repleta de reviravoltas, as demais serviam para 'sustentá-la', deixando um pouco os outros conflitos em compasso de espera. Assim, o enredo ia se encaminhando sem qualquer sinal de desgaste e muito menos com a sensação de 'barriga' ou repetição.
E todas as tramas tiveram seu momento de destaque. A história mesclou com extrema competência a comédia e o drama, havendo ainda muitos musicais, que ajudaram a permear toda a temporada com clipes lindos. Outro grande acerto foi a criação dos casais: todos os pares românticos funcionaram e apresentaram conflitos que envolveram o telespectador. Tanto os principais ---- compostos por Duca (Arthur Aguiar) e Bianca (Bruna Hamu), Pedro (Rafael Vitti) e Karina (Isabella Santoni), Cobra (Felipe Simas) e Jade (Anaju Dorigon) ----, quanto os coadjuvantes ---- compostos por Mari (Malu Campos) e Jeff (Cadu Libonati), Dandara (Emanuelle Araújo) e Gael (Eriberto Leão), Sol (Jeniffer Nascimento) e Wallace (Antônio Carlos), entre outros.
Colocar como pano de fundo uma Academia de Artes (a Ribalta) e uma de Lutas (a do Gael, que ainda rivalizava com a Khan), fazendo uma espécie de comparação entre dois universos completamente distintos, ao mesmo tempo que semelhantes em alguns aspectos, foi mais uma sacada de mestre. Os ambientes complementaram perfeitamente toda a história que foi sendo contada ao longo dos meses. E os relacionamentos estabelecidos, entre os frequentadores destes distintos locais, ajudou bastante nas interações, que muitas vezes resultavam em inúmeros conflitos. Afinal, Duca e Wallace, por exemplo, se apaixonaram por uma atriz e uma cantora, respectivamente, enquanto o guitarrista Pedro se viu envolvido com uma lutadora nada calma. Já o lutador Cobra se envolveu com a dançarina Jade, entre tantas outras relações peculiares. E houve também espaço para semelhante se atrair por semelhante, vide o dançarino Jeff e a cantora Mari.
A história contou ainda com bem construídos vilões, que ajudaram a movimentar o enredo e não ficaram devendo em nada aos 'malvados' de horários mais tardios. Apesar das limitações da Classificação Indicativa,
Lobão (Marcelo Faria) e Heideguer (Odilon Wagner) esbanjaram canalhice e crueldade, fazendo de tudo para atingir seus objetivos. O empresário era um poço de ambição e ganhava dinheiro fraudando torneios de muay thai, enquanto o treinador servia como seu capacho e aliado nos esquemas de apostas. Porém, o psicopata dono da Academia Khan tinha uma fixação por Gael ---- ele nunca perdoou o ex-amigo depois que o mesmo abandonou as lutas para ficar com a esposa ---- e este seu lado passional provocava uma constante rixa com o ricaço.
A tensão desta relação de interesses era um ingrediente a mais nas vilanias da dupla.
Vários temas importantes foram abordados e funcionaram muito bem na condução da trama.
A gravidez na adolescência foi explorada através do drama de Mari; a homofobia pôde ser vista na relação entre o pai Lincoln (Edmilson Barros) e o filho Jeff; o câncer de mama foi tratado com grande sensibilidade com a luta de Lucrécia (Helena Fernandes) pela cura da doença ---- houve até uma cena marcante da personagem fazendo um autoexame, que gerou repercussão ----; o sexismo foi exposto em virtude das atitudes de Duca e Gael em relação ao desejo de Bianca ser atriz e no de Karina em ser lutadora; e o racismo se evidenciou assim que Sol e Wallace melhoraram de vida.
Estas foram as principais questões exploradas, entre outras também citadas ao longo dos meses, que complementaram bem o roteiro e tiveram função no enredo, evitando uma 'panfletagem gratuita' que em nada acrescenta ao conteúdo ficcional (como ocorreu em "Babilônia", por exemplo).
Já as atrativas viradas se mostraram vitais para o fôlego da temporada. Muitas situações tensas e dramáticas marcaram a história, quase sempre provocando uma empolgante reviravolta.
O assassinato de Alan (Diego Amaral), irmão de Duca, foi uma delas. Atropelado por Lobão, o rapaz, que estava prestes a desmascarar o esquema de apostas dos vilões, não resistiu aos ferimentos e sua morte foi um choque para os personagens, destacando o talento dos atores, entre eles Arthur Aguiar e Iná de Carvalho (Dona Dalva). A revelação do suborno de Bianca --- que pagou Pedro para namorar sua irmã --- foi a mais forte, uma vez que culminou na armação de Lobão, que fingiu ser o verdadeiro pai da menina. E tudo só veio à tona depois que Bianca sofreu uma tentativa de sequestro, sendo salva por Duca.
Inúmeras cenas dramáticas marcaram esta fase, destacando principalmente Isabella Santoni, Eriberto Leão, Anaju Dorigon e Bruna Hamu.
Além destas, outras viradas empolgantes movimentaram a história, como: o início do Warriors
--- marcando a nova vida de Karina ao lado de Lobão ---; luta entre Nat (Maria Joana) e Lobão --- que culminou no desaparecimento da personagem, quase morta pelo vilão ---; o sequestro de Karina --- a garota ficou mantida em cárcere privado no apartamento do 'falso pai' ---; a ameaça de Heideguer aos familiares de Cobra no meio do Warriors; a internação de Dona Dalva; o esperado embate final entre Duca e Cobra no torneio --- cuja vitória foi do mocinho ---; a luta demonstrativa entre Lobão e Gael --- onde o canalha dopou o adversário e tentou matá-lo ---; o salvamento de Karina; a fuga de Cobra e Jade --- que ficaram perdidos em um lugar distante ---; a revelação de que Cobra é filho de Gael; o ataque do psicopata Haroldo (Álamo Facó); a prisão de Heideguer --- entregue pelo próprio filho, Henrique (Michel Joelsas) ---; a volta de Nat --- encontrada por Luiz (Maurício Pitanga) em uma clínica psiquiátrica ---; a quase morte de Cobra; a fuga de Nat da clínica; o plano de Lobão para separar Duca e Bianca --- provocando ainda um rompimento do lutador com Gael ---
; entre tantas outras.
Os romances também foram os responsáveis por muitos bons momentos, gerando grandes torcidas do público. A química esteve presente em todos os pares.
Pedro e Karina divertiam com o clima do primeiro amor e as constantes brigas do menino medroso com a garota estressada eram hilárias. A relação de Duca e Bianca era a representação do Gael com sua falecida esposa --- o lutador que não aceita a profissão da atriz --- e os dois precisaram enfrentar uma avalanche de problemas, onde uma gota no oceano ou simples grão de areia mudava tudo, até o final feliz. Cobra e Jade tinham um relacionamento quente e repleto de ironias, que culminou em um lindo casamento. Mari e Jeff eram o retrato da cumplicidade e do afeto, enquanto Sol e Wallace se sobressaíam através da arrogância da cantora, que mandava na relação. João tinha uma paixão por Bianca e a venerava, mas, depois de muito insistir e não ser correspondido, encontrou o amor nos braços de Vicki, menina tão debochada quanto ele. Lírio (Paulo Dalagnoli) e Ruiva (Ana Rios), Dandara e Gael, Delma (Patrícia França) e Renê (Mário Frias); Lincoln e Rute (Josie Antello) também se destacaram. E além de João com Bianca, aliás, alguns outros pares foram formados, como Duca e Nat, Lírio e Joaquina, Henrique e Bianca, Wallace e Ruiva, entre tantas outras 'combinações'.
Teve par para todos os gostos.
O elenco foi repleto de gratas revelações e escalações acertadas. Arthur Aguiar, Bruna Hamu, Rafael Vitti, Isabella Santoni, Felipe Simas e Anaju Dorigon brilharam, honrando a importância dos seus personagens, uma vez que todos moviam a história. Guilherme Hamacek foi ganhando cada vez mais destaque em virtude do seu bom desempenho e Jeniffer Nascimento se sobressaiu através do seu inquestionável talento vocal. Malu Campos foi outra cantora que se mostrou uma boa atriz e emocionou cada vez que soltou sua voz. Já Yasmin Gomlesvsky se entregou na pele da doida Joaquina, que de maluca não tinha nada, e ganhou um justo destaque na reta final. Maria Joana engrandeceu o elenco com sua presença e Nat foi o seu melhor papel até então (ela também esteve em "Araguaia" e "Flor do Caribe"). Outros bons nomes foram Jean Amorim (Marcão), Bruno Fraga (Zé), Ana Rios (Ruiva), Paulo Dalagnoli (Lírio), Lellêzinha (Guta), Jéssica Lobo (Fabi), Dani Dillan (Paula), Gabriel Reif (Rominho), Bianca Vedovato (Tomtom), Ramon Francisco (Rico), Caio Lucas Leão (Luiz Cláudio), Cadu Libonati (Jeff), Antônio Carlos (Wallace), Manu Gavassi (Vicki) e Maurício Pitanga (Luiz), que teve sua importância aumentada nos últimos meses.
Mas os atores mais experientes também fizeram a diferença na temporada. Iná de Carvalho deu um verdadeiro show vivendo a descolada Dona Dalva; Eriberto Leão viveu seu melhor momento na carreira interpretando Gael; Marcelo Faria se destacou na pele do diabólico Lobão; Patrícia França convenceu com sua responsável Delma; Emanuelle Araújo brilhou atuando e cantando com sua doce Dandara; Felipe Camargo se saiu muito bem vivendo o atrapalhado Marcelo; Danielle Suzuki exibiu sua sensualidade através da solitária Roberta; Leo Jaime novamente divertiu revivendo o Nando da "Malhação Intensa"; Mário Frias fez um cativante Renê; e foi um imenso prazer ver Odilon Wagner interpretando um personagem que fez jus ao seu talento. O Heideguer foi um vilão odiável e muito bem escrito. Já Helena Fernandes e Guilherme Piva esbanjaram sintonia, protagonizando inúmeras cenas ótimas através do inusitado 'casal' Lucrécia e Edgar. Ainda é preciso citar o talentoso Edmilson Barros, que divertiu com o arretado Lincoln (o bordão "Mas meniiiiino" era impagável), Josie Antello, Edvana Carvalho (Bete) e Ademir de Souza (que participou durante alguns meses vivendo o canalha Simplício).
A trilha sonora (nacional e internacional) foi outro ponto que complementou este harmônico conjunto. Foram várias músicas bem selecionadas e que ajudaram a contar a história, entre elas: "Agora só falta você" (Pitty), tocada na abertura; "Uma Gota no oceano" (NXZero), tema de 'Duanca'; "Tudo que você quiser" (Luan Santana), tema de 'Majeff'; "Quase sem querer" (Maria Gadú), tema de 'Perina'; 'Beside You' (Simply Red), tema de Karina e Cobra; "I told you so" (Kathryn Dean ---- que fez uma ótima participação na última semana), tema de 'Cobrade'; "Your Window Pain" (Kirsch & Bass), tema de Karina; "Love me again" (John Newman); "Ela me deixou" (Skank); "Meu novo mundo" (Charlie Brown Jr.); "Shake the room" (Gamu); "Summer" (Calvin Harris); "BOP" (Raimundos); entre tantas outras. Foi um presente para os ouvidos.
Mais uma ideia acertada foi a interação através do site da trama, chamado de 'transmídia'. Os telespectadores escreveram várias cenas curtas (chamadas de Fanfics) e os autores selecionaram uma para ir ao ar.
A felizarda foi a autora da sequência em que Bianca sonhava que estava com Duca e João ao mesmo tempo, ocorrendo uma alusão ao clássico "Dona Flor e seus dois maridos". Outra criação de uma fã, que também migrou para a televisão, foi o sonho de Pedro, imaginando Gael e Karina transformados em vampiros ---- houve, inclusive, uma lembrança ao último bom folhetim de Antônio Calmon: "O Beijo do Vampiro".
A reta final da trama foi repleta de emoção e cenas tensas, honrando tudo o que a temporada veio apresentando desde a estreia.
O casamento de Cobra e Jade foi lindo, assim como a reconciliação de Duca e Bianca. A união de Bianca e Jade (as cunhadinhas), aliás, foi um acerto, primando pela comicidade. O relacionamento de João e Vicki mostrou que o nerd encontrou uma garota que o ama pelo que ele é. Já o plano de Lobão, que aproveitou a falta de memória de Nat para manipulá-la, movimentou os momentos mais derradeiros. A luta do vilão com Duca foi muito bem feita, assim como o embate entre Nat e o mocinho. A cena da perseguição ao mestre da Khan também teve uma produção caprichada e a chegada de Josefina (Nanda Costa) ---- que conseguiu comprar a fábrica que servia de local para a academia de Gael e para a Ribalta ---- serviu como um 'bônus' que ajudou a deixar os acontecimentos finais mais tensos, revelando ainda a verdadeira Joaquina, que enganou os personagens e o público.
Os últimos capítulos mesclaram situações emocionantes com outras repletas de adrenalina. A cena em que Lucrécia revela para Edgar que ele é o pai de Jade foi arrepiante.
Helena Fernandes, Guilherme Piva e Anaju Dorigon protagonizaram um momento tocante, que apenas expôs o laço que já existia naquela família. A declaração de amor que Duca fez para Bianca, em meio ao espetáculo "A Megera Domada" ---- que inspirou o par 'Perina' ----, foi outra bonita cena. A sequência do nascimento do filho de Dandara e Gael também primou pela emoção, uma vez que todo o passado aterrorizante do mestre veio à tona --- sua primeira esposa faleceu no parto de Karina. A chegada do bebê, chamado de Miguel (uma referência indireta ao personagem de "Sete Vidas" que teve sete filhos ---- afinal, além de Karina, Bianca e Cobra, Gael também é um pouco pai de João, Pedro e Duca), foi delicada e um belo clipe (ao som de "Amor pra recomeçar", do Frejat) coroou este momento.
Já a tensão ficou por conta de Lobão e Josefina. O mestre da Khan sequestrou Karina ---- um dos maiores clichês novelescos, principalmente no penúltimo capítulo ---- para atrair Gael e conseguiu levar seu rival para onde queria. Esta relação obsessiva que o lutador tinha com o ex-amigo lembrou muito, inclusive, o ódio que Flora (Patrícia Pillar) nutria por Donatella (Cláudia Raia) em "A Favorita". A luta entre os personagens foi excepcional e teve como 'pano de fundo' o incêndio da Ribalta, provocado pelo parceiro da vilã (Paulo - Cleiton Moraes). Os dois lutavam, enquanto a fábrica era corroída pelo fogo. Foram cenas de extremo capricho e recheadas de adrenalina. A tensão aumentou ainda mais quando Nat e Pedro arrombaram a fábrica e conseguiram ajudar Gael. O guitarrista, inclusive, teve um atitude heroica e salvou a sua 'chamuscadinha'. Já Duca lutou com Luiz e Nat acabou salvando Lobão (seu algoz) do incêndio, mandando o canalha direto para cadeia para vê-lo pagar por seus crimes.
E após a sucessão de cenas tensas, o último capítulo ficou voltado para a sensibilidade. Todos se reuniram na fictícia praça José Wilker (uma homenagem ao saudoso ator) e cantaram "É preciso saber viver" (clássico de Roberto Carlos e Erasmo Carlos, tocado também pelos Titãs), protagonizando o último clipe da temporada, que ficou tão lindo quanto os anteriores. Lucrécia, Gael, Nando e Edgar fizeram um belo discurso sobre a arte de sonhar, que precisou ser renovada depois da Ribalta ter sido destruída pelo fogo. Além deste bonito momento, o público ainda pôde ver a punição de Josefina, que acabou presa junto de seu comparsa. E os casais tiveram seus merecidos finais felizes, sendo uma grata surpresa a exibição de um beijo entre duas meninas e dois homens, em meios aos inúmeros pares que se formaram na trama.
Já a última cena lembrou o desfecho da temporada "Intensa", dos mesmos autores. Nando ('coincidentemente' o personagem que participou das duas temporadas) contou o final de todos os personagens e foi emocionante ver os sonhos se realizando, um a um. Sol virou uma cantora de sucesso (uma Beyoncê brasileira); Pedro um guitarrista famoso; João um comediante de sucesso; Jade uma enfermeira dedicada; Cobra um lutador vitorioso; Nat uma campeã de muay thai; e Karina finalmente começou a lutar profissionalmente, sendo treinada pelo seu pai. Bianca se transformou em uma atriz requisitada; Wallace foi treinar na Tailândia; e Duca e Gael viraram sócios em uma Academia chamada de "Força e Honra". O único 'pesadelo' foi de Heideguer, Lobão e Luiz, que acabaram presos na mesma cela e jogando xadrez. Uma punição merecida. A imagem final foi com todo o elenco, direção e equipe reunidos na cidade cenográfica, soltando balões em meio a fogos de artifício. Um encerramento belíssimo de uma temporada que entrou para a lista das melhores.
Com um final irretocável, "Malhação Sonhos" fecha seu ciclo e entra para a lista das melhores temporadas
Com um final irretocável, "Malhação Sonhos" fecha seu ciclo e entra para a lista das melhores temporadas
"Malhação Sonhos" ficou praticamente 14 meses no ar, ou seja, mais de um ano. Foram 280 capítulos. Após a bem-sucedida temporada em 2013 ("Intensa"), Rosane Svartman, Paulo Halm e equipe conseguiram mais uma vez apresentar uma trama de grande qualidade. Os autores, inclusive, se mostram aptos para a estreia de "Totalmente Demais", primeira novela da dupla, cuja estreia será em novembro, no horário das sete. A fase, que acaba de ter o seu longo e elogiado ciclo fechado, conquistou o público, a crítica e ainda conseguiu comemorar os 20 anos do seriado adolescente (completados em abril) em grande estilo ----- afinal, a audiência também correspondeu, elevando os índices da temporada passada. Foram muitos dramas, risos, músicas e tensão ao longo deste tempo. E valeu muito a pena ter acompanhado cada conflito, cada reviravolta, cada relação, cada história. Porém, tudo tem um prazo para terminar e é bom que se encerre deixando um gosto de saudade, como esta temporada deixou. O sonho foi delicioso e deu para aproveitá-lo ao máximo. Mas chegou a hora de acordar. Resta agora a lembrança que ficou de uma produção onde absolutamente tudo funcionou. Força e honra!
Por que o "Mais Você" ainda não voltou à grade da Globo?
A programação matutina da Globo sofreu uma drástica alteração logo no início da pandemia do novo coronavírus, há mais de três meses. O jornalismo dominou as manhãs e programas como o "Mais Você" e o "Encontro" saíram do ar. Porém, a emissora resolveu trazer de volta a atração de Fátima Bernardes 49 dias depois. E inseriu Ana Maria Braga em um quadro de receitas dentro do formato da colega. Na verdade uma reprise das melhores receitas. Essa alteração vem provocando algumas dúvidas pertinentes.
Primeiramente, é preciso ressaltar as razões óbvias para o afastamento de Ana. A apresentadora tem 70 anos e está no grupo de risco da COVID-19. A doença é a principal causa das mortes dos idosos durante a pandemia. Para culminar, Ana está recém-curada de um terceiro câncer e na época do surgimento do coronavírus no Brasil ainda estava em pleno tratamento. A Globo agiu com todo o cuidado necessário e merece reconhecimento.
Todavia, as aparições de Ana Maria no meio do "Encontro" provam que o retorno do "Mais Você" já deveria ter acontecido há pelo menos dois meses. Claro que seria um absurdo a apresentadora ir diariamente aos Estúdios Globo gravar seu programa, como tem feito Fátima Bernardes. Mas Ana está atualmente em sua fazenda e vem anunciando as reprises de suas melhores receitas, e até realizando ações de merchandising, de lá. A imagem, vale observar, é de ótima qualidade, o que prova ser oriunda de equipamentos fornecidos pela própria emissora. Não são gravações feitas em celular ou computador/notebook.
Se Ana Maria Braga tem conseguido apresentar muito bem de sua fazenda através da boa estrutura fornecida pela emissora, qual a razão do "Mais Você" ainda não ter retornado? Não haveria problema nem nas gravações de matérias com repórteres, como Talitha Morete, uma vez que Ana apenas chamaria as reportagens, como já fazia bem antes do surgimento da pandemia. Não ocorreria apenas as entrevistas com artistas da Globo presencialmente e nem faria falta. A única presença a mais da fazenda da loura seria de Tom Veiga como Louro José. Ou nem isso, pois o parceiro da apresentadora poderia aparecer em chamada de vídeo.
É preciso lembrar que o "Mais Você" sempre foi uma das maiores audiências da Globo nas manhãs. Ana Maria Braga tem um público muito fiel que vem sentindo falta da apresentadora. Um quadro curto no meio do "Encontro" é muito pouco para o tamanho da apresentadora. Como medida emergencial, é algo compreensível. Mas semana passada Luciano Huck já voltou a gravar seu programa nos estúdios. Faustão retornará em breve. Ana só poderá ir aos estúdios quando a vacina for finalmente criada. Então, até lá, será um mero quadro de reprises durante o programa de Fátima Bernardes? Não dá mesmo para a apresentadora comandar o seu tão longevo formato de sua fazenda?
A resposta é bem óbvia: é perfeitamente possível. Basta a Globo querer.
Salve-se Quem Puder
3.6 13Mesmo com problemas, "Salve-se Quem Puder" foi a melhor novela de Daniel Ortiz
Daniel Ortiz ainda pode ser considerado um autor 'novato'. Afinal, "Salve-se Quem Puder" foi sua primeira novela autoral, de fato. As duas anteriores foram criadas por outros escritores. A sua estreia como autor solo foi com a despretensiosa "Alto Astral", em 2014, baseada na sinopse da saudosa Andrea Maltarolli, falecida em 2009. Foi um começo bem-sucedido. Já a fraca "Haja Coração", de 2016, era um remake de "Sassaricando" (1988), de Silvio de Abreu, escritor veterano que o lançou. E a produção que chegou ao fim nesta sexta-feira(16/07/2021), uma obra original, já pode ser considerada o melhor trabalho de Ortiz.
A premissa de "Salve-se Quem Puder" tinha tudo para cair no absurdo e no ridículo, mesmo na faixa leve das 19h. E funcionou. Os sonhos das protagonistas Luna (Juliana), Alexia (Deborah) e Kyra (Vitória) são interrompidos quando elas presenciam a execução de um juiz (vivido por Ailton Graça) e são obrigadas a viver sob custódia do Programa de Proteção à Testemunha. Para sobreviver, elas mudam o nome, a aparência, o estilo de vida e vão morar na fictícia Judas do Norte, no interior de São Paulo, depois que são dadas como mortas. Luna assumia o nome de Fiona, Alexia virava Josimara e Kyra era Cleyde, novas pessoas com um padrão de vida bem diferente. E tudo deu errado e o trio acaba voltando para São Paulo.
O início da novela tem um clima de superprodução. Isso porque abusaram dos efeitos especiais para a reprodução de um furacão no México, bem no dia que as protagonistas testemunham o assassinato que transforma suas vidas. E valeu a pena o esforço da produção. Foram 17 dias de filmagem. Os efeitos convenceram e não ficaram devendo aos filmes que utilizam os recursos em enredos com catástrofes naturais.
Uma qualidade do folhetim vista logo no começo foi a habilidade em mesclar sequências de ação com situações cômicas, o que costuma ser uma tarefa complicada. Não demorou para o público comprar a história e se envolver com os conflitos já promovidos diante de tantas situações um tanto quanto inusitadas.
A história teve um humor farsesco e infantil, o que não é um demérito, apenas uma característica. E o elenco conseguiu entender bem a proposta da novela, após um início um pouco inseguro. Os personagens caíram no gosto do público e o sucesso de audiência foi quase imediato. O enredo emplacou e tudo se encaminhava bem. A audiência estava em torno dos 29 pontos, índice excelente para a faixa. (Todavia, a trama sofreu uma interrupção por conta da pandemia do novo coronavírus. As gravações foram paralisadas em março de 2020 e retomadas apenas em setembro, com perdas no elenco, redução do número de capítulos e entrada de novos personagens. Foram gravados durante a pandemia 53 capítulos e a obra perdeu 55 capítulos. A continuação no ar só foi iniciada em maio de 2021, após a reprise de toda a chamada primeira fase. E o risco de se perder por completo, como ocorreu com "Amor de Mãe", era alto.) Felizmente o autor se saiu muito bem e conseguiu deixar seu roteiro mais atrativo. Ainda acertou quando transformou as fugitivas em 'heroínas' atrapalhadas, em um estilo parecido com "As Panteras", e sem inteligência alguma.
A diminuição do número de capítulos evitou a famigerada 'barriga' (o período de enrolação, quando nada de muito relevante acontece durante semanas) e o foco maior no trio protagonista deixou a novela bem mais dinâmica. Vale lembrar que Ortiz deixou um ótimo gancho no término da primeira parte:
a vilã Dominique (Guilhermina Guinle) flagrando Luna viva e tentando matá-la.
E a segunda parte apresentou ótimos ganchos em praticamente todos os capítulos, o que virou um bom chamariz para a produção. Fora o atrativo de ter sido a única novela inédita da TV no momento. A equipe disfarçou com habilidade as limitações impostas pela pandemia e o foco quase total em cima dos desdobramentos do núcleo principal, incluindo os dilemas das mocinhas em seus respectivos triângulos amorosos, foi o bastante para prender o telespectador e promover um bom engajamento nas redes sociais. Até a entrada de novos personagens não prejudicou o roteiro e as alternativas para os intérpretes que precisaram se afastar foram satisfatórias
, como Otávio Augusto (Inácio) ---- grupo de risco ---- aparecendo por vídeo-chamada e Sabrina Petraglia (Micaela) --- na época grávida do segundo filho --- protagonizando uma bonita despedida ao lado de Marcos Pitombo (Bruno). Também foi uma boa ideia manter Marianna Armellini na trama, mesmo após a saída repentina de Micaela. A estratégia da criação de uma 'gêmea boa' (a falsa puritana Marlene) funcionou, pois a gêmea má perdeu a função sem o alvo de sua vingança ---- um conflito que nem atraía antes da paralisação, vale ressaltar. Ainda serviu para substituir a querida Marilu Bueno, que é do grupo de risco.
Aliás, a escalação do elenco, em sua grande maioria, foi muito feliz. A sintonia das protagonistas foi imediata e ficou ainda melhor ao longo dos meses. Juliana Paiva emocionou com sua Luna, Deborah Secco divertiu com Alexia e Vitória Strada mostrou uma nova faceta cômica na pele da atrapalhada Kyra, após duas mocinhas dramáticas seguidas na ainda inicial carreira.
Guilhermina Guinle e Leopoldo Pacheco convenceram como os grandes vilões Dominique e Hugo; enquanto Rafael Cardoso esteve ótimo na pele do dúbio Renzo, que teve um bonito arco de redenção.
Já Flávia Alessandra acabou valorizada pela primeira vez por um autor que não foi Aguinaldo Silva quando fez a novela Duas Caras. Até hoje os melhores papéis da carreira da atriz foram os escritos pelo escritor e amigo pessoal Walcyr Carrasco.
Felizmente, Ortiz a presenteou com Helena, que inicialmente parecia uma vilã camuflada até se revelar uma grande sofredora que nunca superou a 'morte' da filha e ainda caiu em uma armadilha criada pelo marido.
o reencontro de Helena e Luna. A intérprete deu um show de emoção ao lado da talentosa Juliana Paiva.
Claro que nem tudo funcionou. O núcleo da ginástica artística foi o maior prejudicado pela interrupção das gravações e corte de capítulos. Ainda assim, nunca despertou interesse.
A trama de Bia, uma mulher linda que sofria com sua aparência por ter uma pequena cicatriz em virtude de um marcapasso, era forçada e todos os personagens ao redor dela não emplacaram. Ao menos o casal com Tarantino deu certo. Outro equívoco foi o enredo de Petra (Bruna Guerin). A vilã não aconteceu e a atriz deixou a desejar. Todas as tentativas de conquistar Alan andavam em círculos e quando a personagem sumiu por vários capítulos nem deu para notar a ausência. Ironicamente, a irmã de Alexia era uma atriz que não emplacava em uma novela e acabou sumindo da história. É necessário criticar também o pouco destaque dos atores negros. Não adianta um elenco diverso se não há conflitos relevantes para valorizar os intérpretes. Juliana Alves, Aline Dias (Úrsula) e Dandara Mariana (Bel) eram as rivais das mocinhas brancas e mal apareceram. Gabriela Moreyra entrou na segunda fase, e Aurora teve ainda menos destaque que as colegas. Cosme dos Santos (Edgar) foi outro subaproveitado.
O autor também não foi feliz no excesso de triângulos amorosos. Daniel sempre gostou do recurso, só que perdeu a mão. O trio formado por Rafael, Kyra e Alan era o único com uma boa construção e valeria para toda a trama.
Não havia necessidade de inserir um amor de infância de Luna e forçar uma dúvida que a mocinha já não tinha em relação a Teo apenas para criar um 'suspense' no final. Rodrigo Simas esteve bem como Alejandro, e com a saída de José Condessa (Juan) bastaria focar nos outros vários dramas da personagem para sustentar a história. E Luna era a que tinha o melhor enredo. Inclusive, ainda no núcleo, o escritor esqueceu que Gabi (Nina Frosi) armou uma falsa traição de Juan, no início da novela, para Luna terminar com ele e fingiu que nada aconteceu na primeira fase. Seria até menos pior se houvesse uma construção amorosa entre ela e Alejandro, pois ficou forçado a junção entre o mexicano e Bel.
Por sinal, um equívoco arrastar os triângulos até os últimos capítulos.
Colocar mocinhas indecisas até o fim enfraquece a narrativa dos romances e cria um suspense desnecessário. Qual a necessidade de deixar as duas bancando as sonsas e fazendo os rapazes de idiotas?
Só que as qualidades da produção foram maiores que os defeitos. E não é exagero afirmar que o encurtamento da trama beneficiou muito o conjunto. Até pelas próprias declarações de Ortiz.
Segundo o autor, haveria outro triângulo amoroso entre Helena, Agnes e Mário, com a mãe de Kyra grávida de um filho do pai de Luna. O núcleo da ginástica artística também teria um triângulo com Bia, Tarantino e mais uma personagem.
As melhores cenas da última semana foram em torno do encerramento da saga dos vilões.
A morte de Hugo, assassinado por Helena após ter sequestrado a ex e Luna, e a prisão de Dominique foram resultado de conflitos muito bem dirigidos e interpretados. Destaque para Guilhermina Guinle, Leopoldo Pacheco, Flávia Alessandra, Juliana Paiva, Deborah Secco e Felipe Simas. O único equívoco foi a não participação de Kyra. A terceira protagonista ficou de fora da conclusão de sua própria história porque o autor resolveu priorizar o triângulo com Alan e Rafael. E pelo menos Vitória Strada protagonizou uma bela cena com Carolina Kasting, quando Kyra voltou para casa e fez uma surpresa para sua mãe. Outro lindo momento foi quando Luna reencontrou seu pai e os dois deram um abraço caloroso. Ju Paiva e Murilo Rosa emocionaram.
Uma pena que o autor tenha pecado nos capítulos finais.
Ter resolvido o enredo da organização criminosa na segunda e na terça, deixou os três dias restantes arrastados e baseados apenas em triângulos amorosos. Após todo um desenvolvimento entre Kyra e Alan, o autor resolveu juntar a personagem com Rafael, o seu primeiro amor. Vitória teve química com Bruno e Thiago e o triângulo foi o único consistente. Ou seja, nenhum final ficaria forçado. Mas da forma como o autor fez ficou. Alan pediu Kyra em casamento e teve o pedido negado. Isso depois que Júlia botou Kyra contra a parede porque estava apaixonada pelo Rafael. E Kyra nem se despediu das crianças que tanto a amavam e muito menos do Seu Inácio, que só tomava remédio por causa dela. Pareceu, ainda, que a esterilidade de Alan era um 'defeito'. Custava ter desenvolvido uma relação do Alan com Júlia ao invés de simplesmente juntá-los no final de forma gratuita? Ou então ter escrito uma cena em que Alan conhece a personagem de Mariana Ximenes. Isso porque a atriz foi chamada para uma participação no final, em meio a uma pandemia, e nem teve a cena exibida ---- ela faria par com Teo, caso Luna escolhesse Alejandro. Um total descaso com a intérprete.
O final de Luna com Teo foi coerente com toda a narrativa, mas Ortiz também errou ao estender até o final uma dúvida que a mocinha nunca teve. Sempre foi óbvio o seu amor pelo enteado da mãe e essa tentativa de criar um suspense bobo prejudica o próprio roteiro. Daria tempo para ter um desenvolvimento entre Alejandro e Bel, de uma forma que valorizaria Dandara Mariana, tão deslocada no enredo. Mas o escritor preferiu apenas empurrá-la para Alejandro nos momentos finais e sem construção. Isso é péssimo para qualquer novela. Daniel também falhou ao não exibir o final de Bruno e Micaela (os atores gravaram durante a pandemia a última cena e a atriz estava grávida). A reconciliação entre Rafael e Renzo também fez falta. Decepcionante. O ponto alto do desfecho foi Petra sendo expulsa do elenco da novela. Alexia ganhando a fama e o reconhecimento que tanto almejou também foi um acerto, assim como a cena final com as três em Cancún e brindando a amizade que acabou criada em meio a um furacão que estava prestes a retornar.
"Salve-se Quem Puder" se mostrou um folhetim leve, agradável e que se tornou uma boa alternativa para aliviar um pouco a cabeça do brasileiro em tempos tão difíceis. Aquele típico entretenimento bobinho e despretensioso, mas não menos necessário. Entre erros e acertos, o saldo ficou positivo. O sucesso é uma resposta justa do público diante do que foi apresentado.
Elenco negro não foi valorizado em "Salve-se Quem Puder"
A novela das sete se encaminha para o final e a trama de Daniel Ortiz merece elogios. O autor conseguiu criar uma trama com traços bastante infantis que conquistou o público e acertou na escalação de grande parte do elenco. Todavia, "Salve-se Quem Puder" também teve problemas visíveis e um deles foi a pouca valorização do elenco negro.
Inicialmente, causou a melhor das impressões a escolha de vários intérpretes negros que não estavam na condição de empregados ou pobres ---- estereótipo corriqueiro nas novelas. Todos tinham uma boa condição e pareciam ter boas tramas. Mas só parecia. Ao longo dos meses foi ficando visível a função de quase todos eles: serem 'escada' ou antagonistas dos brancos. Caso tivessem um bom destaque, até valeria a intenção. Só que não foi o caso.
Renatinha (Juliana Alves) e Úrsula (Aline Dias) são os maiores exemplos. As duas agiram como vilãs em quase toda a história e só apresentaram uma 'redenção' na reta final. A primeira é ex-namorada e secretária de Rafael (Bruno Ferrari), por quem nutria uma paixão obsessiva.
Passou o tempo todo se rebaixando por ele. Já a segunda era namorada de Teo (Felipe Simas) e sempre foi viciada em antidepressivos. Nunca superou o término do relacionamento. As duas eram 'rivais' de Kyra (Vitória Strada) e Luna (Juliana Paiva), respectivamente. E não tiveram um bom destaque.
Bel (Dandara Mariana) é uma dançarina que se interessou por Zezinho (João Baldasserini). Não demorou para virar a 'adversária' de Alexia (Deborah Secco) na disputa pelo caipira. Se a situação ao menos rendesse boas cenas para a atriz, daria para relevar. Mas a personagem interpretada pela talentosa Dandara teve ainda menos destaque que Renatinha e Úrsula. O autor resolveu criar de última hora um interesse de Bel em Alejandro (Rodrigo Simas), novo perfil que entrou após a interrupção da novela, apenas para não deixá-la mais avulsa do que já estava.
Outro papel que não teve qualquer relevância foi Dionice, melhor amiga de Bia (Valentina Bulc). Interpretada por Bárbara Sut, a personagem teve poucas cenas. No caso, ainda é possível justificar em virtude do encurtamento do folhetim. Como as gravações foram paralisadas com a pandemia do novo coronavírus e só retornaram meses depois, com um encurtamento de 55 capítulos, o núcleo da ginástica artística acabou bem prejudicado. Mas os outros casos citados nada tiveram a ver com o enxugamento da história. Vale citar também a ótima Ana Carbatti, que vive a Consulesa Adriana, que oferece proteção para o trio protagonista. Dá para contar nos dedos as sequências que contaram com a presença da atriz. E o que comentar sobre Cosme dos Santos, o Edgar? Pior ainda o que houve com Vicky, vivida por Mila Carmo. A funcionária do Empório era amiga de Luna, tinha poucas cenas, e do nada virou uma mau-caráter.
É de se lamentar ainda a pouca relevância da ótima Gabriela Moreyra, que entrou na chamada 'segunda parte' para viver Aurora, prima de Renzo (Rafael Cardoso). A personagem só foi criada para substituir Cristina Pereira (Lúcia), intérprete da avó do rapaz, porque a veterana é do grupo de risco. Mas o autor não criou nenhum novo conflito para o perfil. A menina serve apenas para ouvir os desabafos de Renzo e aparece raras vezes. A única exceção do elenco negro da trama é Babu Santana. O ator também entrou na 'segunda fase' e tem um bom destaque como Nanico, policial que passou a proteger as protagonistas e acabou se envolvendo com Ermelinda (Grace Gianoukas). Pena que seja um caso isolado.
"Salve-se Quem Puder" pecou no desenvolvimento dos personagens negros. Não adianta escalar um elenco mais diverso se nenhuma história relevante se mostra presente nos núcleos onde os atores foram colocados. Esse fato sempre gerou um incômodo e vale a reflexão. Até para Daniel Ortiz.
"Salve-se Quem Puder" provou que é necessário um cuidado na escalação do elenco infantil
Não é fácil escalar um elenco e essa dificuldade duplica quando se trata de atores mirins. Embora exista muita procura, em virtude da necessidade dos personagens terem filhos, a oferta nem sempre condiz com a expectativa. Muitas vezes a profissão nem é o sonho da criança, mas uma ambição dos pais. Acaba sendo mais complicado achar pequenos que tenham desenvoltura diante das câmeras. Todavia, há muitos talentos revelados e exemplos não faltam. Mas o problema da seleção salta aos olhos em "Salve-se Quem Puder".
Alice Palmar e Ygor Marçal interpretam Queen e Mosquito, filhos adotivos de Alan (Thiago Fragoso). As crianças têm uma grande importância para o núcleo protagonizado pelo advogado. Afinal, é por causa da indisciplina dos pequenos que o personagem acaba contratando Kyra (Vitória Strada), chamada de Cleide, como babá. É o caso do patrão que se apaixona pela cuidadora de seus herdeiros, típico clichê visto inúmeras vezes em outras novelas, livros, peças teatrais e filmes. Ou seja, um cuidado maior na escalação era fundamental.
As crianças ainda não estavam prontas para tamanho desafio. O autor Daniel Ortiz escreve muitas falas para os personagens e os dois falam tudo decoradinho, parecendo um jogral. Não há emoção ou verdade em praticamente nada do que é dito.
Parece muito uma peça infantil produzida em escolas, onde todos os pequenos participam mesmo sem experiência alguma em atuação. Para culminar, há uma clara dificuldade de dicção. Muitas vezes fica difícil entender o que os filhos de Alan estão falando. E é normal porque ambos têm apenas seis anos.
A culpa, claro, não é dos atores mirins. São apenas crianças. Mas quem fez a escolha merece críticas. O próprio autor também se equivocou quando colocou uma grande quantidade de texto na boca dos pequenos. Se o intuito era colocar os perfis com tantas falas, por qual razão não escalaram ao menos crianças mais velhas? Com um pouco mais de experiência? Aliás, não falta exemplo visto na própria Globo nos últimos anos. Maria Luiza Galhano deu um show como Florzinha em "Espelho da Vida" (2019) e Maju Lima emocionou na pele da Isabel na primeira fase de "Éramos Seis" (2019).
Até a reprise de "A Vida da Gente" (2011) mostra o acerto na escalação das crianças. Jesuela Moro esteve impecável na pele da provocativa Júlia e honrava o texto que Lícia Manzo escrevia para a pequena. Victor Navega Motta foi outro bom nome e o garoto emocionou como o tímido Francisco. Já Kaic Crescente também convenceu como o carente Tiago. A produção da impecável novela das seis expôs um cuidado na escolha de cada ator mirim e fez toda diferença.
Inevitável, ainda, não comparar o caso de "Salve-se Quem Puder" com a produção que a antecedeu. Valentina Vieira e João Bravo divertiram e emocionaram o público em "Bom Sucesso", quando interpretaram com brilhantismo Sofia e Peter. Mas tem a questão da idade. Ele tinha dez anos e ela onze. Isso conta muito. Ou seja, se a criança não for pelo menos um pouquinho mais velha, a lição é clara: não a escale para um personagem que exija muito. Dificilmente haverá um bom retorno por razões óbvias. O menino e a menina ainda estão no processo do desenvolvimento da dicção. Como querem que ainda atuem com maior precisão? Difícil. Nada contra intérpretes muito pequenos, mas caso sejam, que vivam na trama personagens com poucas falas ou não muito importantes. Não é o caso da novela das sete que está perto do fim.
A retomada da novela, quase sete meses depois da interrupção das gravações por conta da pandemia, ao menos expôs uma leve melhora no desempenho de Alice Palmar. E as crianças têm o carisma como elemento de apoio. Mas "Salve-se Quem Puder", mesmo sem a intenção, deixou claro que é necessário um cuidado redobrado na escolha do elenco infantil. Para o bem dos pequenos e da novela.
Malhação Sonhos
3.9 83"Malhação Sonhos" abordou câncer de mama de forma corajosa e responsável, enquanto que na reprise censurou cena mais importante
A temporada de "Malhação" exibida em 2014 foi um grande acerto e a reprise tem sido muito bem-vinda. Aliás, vem marcando mais audiência que a exibição original. Além dos ótimos pares românticos, da trama verossímil, dos bons conflitos, da atrativa história, do texto de qualidade e do elenco de gratas revelações, a história de Rosane Svartman e Paulo Halm foi muito feliz na abordagem de temas importantes para a sociedade.
O câncer de mama, por exemplo, foi explorado de forma marcante. A maneira de prevenir o câncer foi realizada através de uma cena sensível e de muito bom gosto. A doença foi inserida na trama com Lucrécia, mãe rígida de Jade (Anajú Dorigon) e professora da Ribalta. A cena onde ela apalpa os seios diante do espelho e chora foi muito bonita, além de importante. Helena Fernandes emocionou.
Os autores foram muito felizes na inserção deste útil tema na temporada, ainda mais no mês que foi exibida na época (outubro), onde há a campanha 'Outubro Rosa', responsável pela conscientização da importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de mama.
E o interessante da sequência é que não foi preciso uma só palavra para deixar a história da personagem clara, assim como a utilidade pública do autoexame das mamas. Não precisou de didatismo. Todo o conjunto de extremo bom gosto durou menos de um minuto, mas deixou seu recado.
A teledramaturgia não tem obrigação de ser informativa e muito menos educativa. É um mero e saudável entretenimento, sempre é bom enfatizar. Entretanto, quando uma produção se propõe a informar em prol de uma causa, é preciso fazer com competência. E "Malhação" conseguiu atingir este objetivo com louvor.
É preciso citar ainda a ousadia de Rosane Svartman e Paulo Halm, que conseguiram driblar todas as limitações do horário, marcado pelas constantes intervenções do Ministério da Justiça. Tanto que era impensável, até hoje, ter em "Malhação" uma cena com uma mulher de seios à mostra, ainda que seja por algo de utilidade pública.
Vale destacar também um outro tema muito importante que foi abordado na temporada: o preconceito. Através de Jeff (Cadu Libonati) e Lincoln (Edmilson Barros), a homofobia foi tratada de uma forma concreta e apropriada para o público adolescente. Ironicamente, um cozinheiro não admite que seu filho dance com a turma da Ribalta por não considerar isso 'coisa de homem'. Jeff ainda se vê 'obrigado' a assumir a paternidade do filho de sua amiga ---- agora namorada (Mari - Maria Luiza) ---- para ajudá-la e também com o intuito de não duvidarem mais de sua sexualidade. Outro tema bem explorado.
"Malhação Sonhos" merece elogios pelo conjunto da obra, enquanto que Rosane Svartman e Paulo Halm merecem o reconhecimento pelo bom trabalho que apresentam. Os autores conseguiram mesclar ficção e temas de utilidade pública com muita competência. Uma pena que a reprise tenha cortado a cena em que o seio da atriz aparece. Se trata de uma censura incompreensível. Há sete anos foi uma atitude elogiosa. Agora, com o corte da emissora, parece que retrocedemos.
Salve-se Quem Puder
3.6 13O autor tinha conseguido encerrar a chamada "primeira parte" com um gancho de tirar o fôlego: Luna (Juliana Paiva) sendo descoberta por Dominique (Guilhermina Guinle). O público demorou longos meses para ver a continuação da cena, mas a espera valeu a pena. A novela teve um retorno com o pé direito e o lado positivo de tanto contratempo foi a aceleração do enredo central. Isso porque Daniel contou que esse flagra da vilã só aconteceria depois do capítulo 90 e acabou obrigado a antecipar para deixar os telespectadores ansiosos pela "segunda parte".
Pois a estratégia funcionou. A sequência em que Luna sofreu um sequestro e depois conseguiu escapar da vilã, roubando até a arma de Dominique, se mostrou muito bem realizada pela equipe de Fred Mayrink e o diretor disfarçou muito bem todas as limitações impostas pelos novos protocolos sanitários nas gravações.
Tanto que era plausível qualquer dúvida sobre os trabalhos terem sido feitos antes ou depois da pandemia. Juliana Paiva e Guilhermina Guinle brilharam e os momentos de ação lembraram bons filmes de aventura. Parecia até reta final.
E a nova fase também marcou uma virada interessante no trio protagonista. Luna, Kyra (Vitória Strada) e Aléxia (Deborah Secco) eram as fugitivas. As três passaram os 54 capítulos passados se escondendo e disfarçadas, com o apoio do Serviço de Proteção a Testemunhas, ganhando até identidades falsas. Agora, com a quase morte de Luna, as personagens decidem se vingar de Dominique e, para isso, começam uma saga de investigação em uma clara alusão ao clássico "As Panteras" ---- série de sucesso da década de 70 que resultou no filme de 2003. As mocinhas, no entanto, são medrosas e atrapalhadas, o que deixa o contexto com um tom te comédia e leveza propício para 'esquecer' um pouco o atual momento do país, onde tudo está cada vez mais pesado.
O autor também tem conseguido se virar com as mudanças no elenco. Como a saída de José Condessa, que deixou a novela por conta de compromissos já agendados em Portugal; a gravidez de Sabrina Petraglia (Micaela) e o inevitável afastamento dos atores mais velhos por serem grupo de risco. Juan (Condessa) é mencionado ao telefone, enquanto Micaela já prepara sua viagem para um curso no exterior. Já Marilu Bueno ensaia a despedida da fofoqueira Dulce e passa o bastão para Marianna Armellinni, que passa a viver a fogosa Marlene, a gêmea boa de Verônica, inserida por Daniel no enredo porque a vilã perderá a função sem a presença de Micaela para se vingar. Otávio Augusto (Ignácio) ainda aparece em chamadas de vídeo, pois interpreta o avô de Aléxia, uma das protagonistas. Grace Gianoukas segue presencialmente, pois Ermelinda é uma das figuras que está sempre ao lado do trio principal. Ou seja, ao menos até o momento, o enredo vai se ajustando aos poucos, sem prejudicar o todo.
"Salve-se Quem Puder" teve uma boa volta e o maior acerto foi o esquecimento da pandemia no roteiro. A trama seria prejudicada com a inserção do coronavírus, vide o equívoco do retorno de "Amor de Mãe". A produção tem disfarçado as limitações e só não consegue em algumas cenas de beijo, como o de Luna e Teo (Felipe Simas), onde o telespectador notou o truque de câmeras em um beijo um tanto estranho. Mas é uma situação que faz parte do atual momento. Ao menos a história ganhou um ritmo dos mais interessantes, em virtude do encurtamento da trama, sem perder a essência do que foi visto anteriormente. Resta torcer para o nível se manter assim até o final.
A Vida da Gente
3.9 194Passagem de tempo enaltece as qualidades de "A Vida da Gente"
A reprise de "A Vida da Gente" tem servido para ampliar o público de uma das melhores novelas já produzidas pela TV brasileira. Lícia Manzo estreou como novelista em grande estilo e criou uma história que arrebata quem assiste através de dramas reais e de fácil identificação. Ainda ousou com um folhetim cujo protagonismo não é um par romântico e, sim, o amor de duas irmãs. A direção de Jayme Monjardim também capta toda a essência da autora, servindo como uma bela complementação. As qualidades da trama ficam ainda mais evidentes quando ocorre a passagem de tempo e Ana (Fernanda Vasconcellos) acorda do coma.
A história tem a sua tão esperada passagem dos anos após 45 capítulos. Antes do fato acontecer, a novela apresenta uma clara diminuição de ritmo. Mesmo assim, ao contrário do que acontece com as fatídicas 'barrigas' (enrolações) da maioria das produções, não há diálogos avulsos ou cenas desnecessárias. Tudo que é mostrado tem um objetivo específico: estruturar o enredo. Tanto para mostrar o início da linda relação de amor entre Manuela (Marjorie Estiano) e Rodrigo (Rafael Cardoso); quanto pelos demais acontecimentos envolvendo Vitória (Gisele Fróes), Marcos (Ângelo Antônio), Dora (Malu Galli), o estado de coma de Ana; o início do próspero negócio de Manu e Maria (Neusa Borges); o estreitamento das relações familiares; o cada vez maior distanciamento de Eva (Ana Beatriz Nogueira), enfim.
Lícia Manzo criou uma história tão linda e tocante que conquista facilmente o telespectador, e o 'mergulha' naquela gama de sentimentos em que os personagens estão envolvidos. Os atores também são grandes responsáveis por isso. Não há um só capítulo que não tenha ao menos uma cena que emocione. Na semana passada, houve a formação do casal Manu e Rodrigo. Marjorie Estiano e Rafael Cardoso foram impecáveis e protagonizaram sequências lindíssimas. O fato do casal ter sido unido aos poucos, com muita sutileza e cuidado da autora, fez com que houvesse uma grande divisão de torcidas há dez anos e as discussões seguem as mesmas durante a reprise. Ana acorda do coma, após quatro anos, e vê a irmã e melhor amiga praticamente vivendo a sua vida. Claro que Eva envenena a filha contra a irmã, o que rende grandes conflitos. E Júlia (Jesuela Moro) sabe que tem duas mães, mas só considera Manuela como tal.
Outro núcleo que desperta a compaixão do público é o de Jonas (Paulo Betti). Seu filho com Cris (Regiane Alves) é ignorado e só tem a atenção de Lorena (Júlia Almeida), enfermeira contratada para cuidar do menino. A futura influência de Nanda (Maria Eduarda, ótima) na situação também é outro ponto positivo do enredo. Vale citar até o núcleo mais desinteressante da primeira fase, que ganha bons contornos com a passagem de tempo: o de Marcos e Dora. O ex-marido de Vitória (Gisele Fróes) é um acomodado e finalmente inicia uma relação com Dora, após anos de separação. O personagem, no entanto, começa a enfrentar a cobrança de Sofia (Alice Wegmann), a filha mais velha, que não se conforma com a vida estagnada do pai. São conflitos que provocam interesse e acabam mostrando que Vitória sempre teve razão em relação ao ex.
O enredo ainda tem uma dose de leveza com os conflitos em torno de Iná e o baile da terceira idade que sempre organiza. A personagem foi o último grande papel de Nicette Bruno na televisão. A saudosa atriz protagoniza cenas dramáticas grandiosas com Ana Beatriz Nogueira e Marjorie Estiano, ao mesmo tempo que diverte ao lado do ótimo Stênio Garcia (Laudelino) e dos talentosos Luiz Serra (Seu Wilson) e Cláudia Mello (Moema), que interpretam um hilário casal de hipocondríacos. O folhetim se mostra agradável também nos núcleos secundários.
Em meio a tantas reexibições por conta da interrupção de novelas inéditas em virtude da pandemia do novo coronavírus, "A Vida da Gente" é a melhor reprise atual. Tem sido um prazer rever uma história tão envolvente e bem escrita, cujas qualidades sobressaem com a delicada passagem de tempo.
Amor de Mãe
3.8 52 Assista AgoraParte final desnudou todos os problemas que sempre estiveram presentes em "Amor de Mãe"
A primeira novela de Manuela Dias estreou logo no horário nobre. Uma responsabilidade e tanto. Normalmente, todos os escritores da emissora estreiam na faixa das seis ou sete e somente depois migram para a cobiçada faixa das 21h. Mas os ótimos trabalhos da autora nas minisséries "Ligações Perigosas" e "Justiça" (ambas em 2016) a credenciaram ao posto. No entanto, não teve sorte. A produção estreou em 25 de novembro de 2019 repleta de louvores da crítica especializada, mas parte do público não comprou a história, que apresentava problemas em vários núcleos. E quando o enredo central parecia engrenar, houve a interrupção das gravações em 21 de março de 2020 por conta da pandemia do novo coronavírus.
Voltou ao ar praticamente um ano depois, no dia 15 de março de 2021, com apenas 23 capítulos restantes. A produção já estava entrando na reta final, mas mesmo assim sofreu um corte. Porém, não parece ter afetado o roteiro, pois a verdade é que muitas tramas já estavam sem rumo antes da interrupção das gravações.
O grande interesse ficou em torno do enredo de Lurdes (Regina Casé) à procura do filho Domênico (Chay Suede). E sempre foi a única parte do folhetim que caiu nas graças do público. O maior clichê dramatúrgico raramente falha.
Já os demais conflitos, que já estavam se perdendo, tiveram desfechos decepcionantes. A constante troca de casais era um dos problemas do roteiro e seguiu assim até o final. Nunca houve uma construção sólida que despertasse alguma torcida do público. O menos pior foi o par formado por Camila (Jéssica Ellen) e Danilo/Domênico.
Mas ainda assim a relação se esgotou em virtude da quantidade de desgraças que Camila encarou ----- foi abandonada pela mãe biológica e quando a encontrou mal teve tempo de iniciar uma aproximação porque a mulher acabou assassinada por Thelma; levou um tiro na escola em que lecionava; não podia ter filhos e por isso precisou de uma barriga de aluguel da sogra; foi atropelada em uma tentativa de assassinato; precisou levar o filho recém-nascido para uma cirurgia e no penúltimo capítulo viu seu filho ser sequestrado pela avó. Difícil.
Já Nanda Costa e Vladimir Brichta foram os atores que mais 'sofreram' com a saída fácil da autora da troca de casais. Érica chegou a ficar noiva de Raul (Murilo Benício). Depois, acabou se apaixonando por Sandro (Humberto Carrão) e na segunda parte da trama se encantou por Davi, vivido por Brichta. Já o ativista ambiental se envolveu com Amanda (Camila Márdila), Vitória (Taís Araújo) ---- com quem teve uma filha ---- e Betina (Isis Valverde). Na fase final, se apaixonou subitamente por Érica. E a relação se mostrou tão rasa quanto as outras. Foi até complicado de entender a necessidade de explorar essa narrativa. O beijo dos personagens no acrílico da mesa do bar que os separava foi constrangedor. Se tivessem se beijado mesmo, o risco de infecção seria menor.
Aliás, outro grave erro da autora: abordar a pandemia do novo coronavírus na trama. Não havia a necessidade restando apenas 23 capítulos para o encerramento e o resultado foi catastrófico. O principal equívoco foi exibir personagens falando que não precisavam usar máscara porque já tinham contraído a doença. Manuela se justificou nas redes sociais alegando que as gravações foram feitas no final de 2020 e ainda não era sabido que a reinfecção ocorria. Porém, nunca foi confirmado que o risco não existia. Em nenhum jornal, por nenhum médico ou pela OMS (Organização Mundial da Saúde). Nem ano passado. Ou seja, foi uma falha inaceitável. Após uma avalanche de críticas, a Globo passou a exibir no final de cada capítulo um aviso sobre o risco da reinfecção. E a pandemia não acrescentou nada ao roteiro, só prejudicou. Além das falas questionáveis, a trama da Betina ficou ainda mais perdida. A enfermeira, antes da interrupção da trama, tinha descoberto que era irmã de Álvaro (Irandhir Santos), o grande vilão, e iria se vingar dele. O empresário até tentou assassinar a personagem para não dividir a fortuna. Mas tudo foi jogado fora para colocar Betina ajudando pacientes internados com covid-19 e quase morrendo por conta da doença.
Por sinal, a trama da enfermeira era uma das mais promissoras e virou a mais decepcionante antes mesmo da interrupção das gravações. A questão da violência doméstica promovia grandes cenas para Isis brilhar e a personagem era uma das mais dramáticas do enredo. Um sopro na carreira da atriz, tão estigmatizada por perfis mais sensuais ou debochados. Mas a autora assassinou Vicente (Rodrigo Garcia) logo no início e a personagem perdeu a importância. Começou a protagonizar cenas repetitivas de sexo com Magno (Juliano Cazarré) e o casal nunca teve química. Entrou em cena, então, Leila (Arieta Correa), ex do filho mais velho de Lurdes que estava em coma e era cuidada pela enfermeira. A vilã se mudou para casa do pai de sua filha e fez da vida do casal um inferno até conseguir separá-los através de uma denúncia anônima ---- a personagem descobriu que Magno tinha matado acidentalmente o irmão de Betina. Novamente o perfil de Isis acabou deslocado até se envolver com Davi. Depois se envolveu com Sandro e se casaram na 'segunda parte' da novela. Tudo superficial demais.
Várias outras tramas não empolgaram e muitos personagens sem carisma não despertaram qualquer interesse. O núcleo focado no meio ambiente, por exemplo, foi um dos casos mais explícitos. Todos os ativistas foram mostrados como egoístas e mimados. Amanda (ótima Camila Márdila) tinha como mote a vingança contra o malvado Álvaro (Irandhir Santos) porque seu pai acabou infectado pela substância que a empresa do vilão produz, fruto da época em que trabalhava na PWA. Porém, a menina era insuportável, radical e não se importava com mais ninguém. Vinicius (Antônio Benício) demorou a entrar no enredo e quando chegou já se voltou contra o pai, Raul (Murilo Benício), e estabeleceu um caso com a colega ativista. Mimado, o garoto achou um absurdo o pai compactuar com Álvaro, mas sempre aproveitou muito bem as regalias que teve. Para culminar, acabou assassinado poucas semanas depois. Nem função teve. E Amanda também morreu sem ter realizado vingança alguma. Já Davi era para ser um ativista mais centrado e responsável, mas abandonou a filha recém-nascida para se intoxicar em uma área poluída pela PWA com o intuito de "denunciar" a fábrica. Na retomada da novela, vale lembrar, a sua filha com Vitória nem foi mencionada.
E todo folhetim abusa das coincidências que resultam em clichês. Inevitável e comum. A autora soube fazer isso com brilhantismo na série "Justiça", de 2015. Mas ligar uns 10 personagens em uma série de 20 capítulos é uma coisa, ligar mais de 40 perfis em uma novela é outra. No início, as ligações empolgavam e provocavam várias teorias em quem assistia. Mas depois virou uma bobagem. Todo mundo tinha alguma ligação afetiva ou sanguínea e todos viviam próximos. Se ao menos essa preocupação da escritora servisse para valorizar todo o elenco ainda valia uma ressalva, mas nem foi o caso. Foram vários profissionais que mal apareceram ou tiveram seus conflitos esquecidos. Érika Januza ganhou um papel ingrato, após seu ótimo desempenho como a juíza Raquel em "O Outro Lado do Paraíso" (2017). Marina foi uma tenista que teve um sério problema no joelho, abandonou a carreira para ficar com o amor de sua vida e acabou traída assim que Ryan (Thiago Martins) conquistou a fama. O casal se separou, mas a personagem o perdoou na volta de "Amor de Mãe" e ficaram juntos. Um enredo sobre 'cancelamento' nas redes sociais foi criado para o casal. Frustrante. Por falar em frustração, Letícia Lima protagonizava as mesmas cenas desde a estreia: Estela era uma neurótica que se apossava de todo homem com quem se envolvia e transformava a vida da pessoa em um inferno. Fez com Raul e depois com Álvaro. Não teve nem chance na retomada da produção: foi assassinada por Belizário (Tuca Andrada). Um claro descarte de personagem.
E o que dizer de Clara Galinari, uma das gratas revelações de "Espelho da Vida" (2019)? Brenda mal abria a boca. A menina foi apresentada inicialmente com uma saúde frágil, mas ao longo dos meses nada mais foi falado e a criança praticamente desapareceu. O núcleo protagonizado por Milhem Cortaz e Débora Lamm foi outro desperdício. O casal perfeito que entra em crise e se separa nunca rendeu cenas atrativas e quando o tema "vale-night" entrou em discussão tudo naufragou de vez. Malu Galli é uma atriz extraordinária e deu show no início da novela e nas cenas da morte do filho Vinícius; porém, Lídia perdeu a relevância quando começou um caso com Tales (Alejandro Claveaux) e depois com Magno ---- já na volta das gravações. Ainda sobre o desperdício de atores, vários acabam descartados, vide Dan Ferreira (Wesley). O raro policial honesto da novela estava crescendo com a investigação sobre o verdadeiro assassino do irmão de Betina, mas acabou morto por Belizário. E nem tinha descoberto nada. Sua morte também não provocou virada alguma no roteiro.
A derrocada da poderosa advogada foi outro ponto de difícil aceitação. A controvérsia envolvendo a caminhada de Vitória sempre atraiu. Afinal, era uma mulher íntegra que ganhava a vida defendendo um criminoso. O seu rompimento com Álvaro foi um esperado momento, mas não fez sentido ficar pobre por conta da milionária multa contratual. O único bem que a mulher adquiriu em toda a carreira foi um apartamento de luxo na zona sul do Rio de Janeiro? E precisou se mudar para São Cristóvão e andar de ônibus? Parece que vida simples e humildade eram requisitos vitais para ser íntegro na história, pois Raul teve seus momentos nada louváveis ----- vide a demissão da empregada para acabar com a amizade de sua então namorada Érica.
Mais um ponto que merece citação foi a propaganda enganosa. Autora e diretor deram várias entrevistas antes da estreia garantindo que a novela não teria vilões. A vida seria a vilã. Porém, isso nunca existiu. Álvaro sempre se mostrou um tipo maniqueísta e nada sutil: empresário corrupto, poluía o meio ambiente, tinha amantes, era aliado de um miliciano e matava inimigos. Ainda usava um estiloso cachimbo. Só faltava um corvo no ombro. Nada contra maniqueísmo, sempre bom lembrar. Mas havia vilão, sim. E Irandhir Santos esteve impecável no papel. Que ator extraordinário. Além do poderoso dono da PWA, havia o sanguinário Belizário e a mau-caráter Leila. Vale até mencionar os que foram mortos logo no começo, como o irmão chantagista de Thelma, vivido por Júlio Andrade, e o já mencionado Vicente. O que não faltou foi malvado.
A impressão é que a novela contou várias histórias que perderam o fôlego no meio do caminho ---- alguém ainda se interessava pelo aneurisma que nunca estourava de Thelma (Adriana Esteves)? ---- e teve como único trunfo a trajetória de Lurdes. Porque a mais carismática e querida personagem da trama foi a única que teve uma saga exposta. Tanto que foi o enredo que a autora quis enrolar na retomada. Assim que Lurdes descobriu o paradeiro de Domênico, acabou sequestrada por Thelma. Tudo para deixar o aguardado encontro de mãe e filho somente para o final. Aliás, a transformação de Thelma foi difícil de engolir. A personagem sempre teve um claro desequilíbrio emocional, mas virar uma assassina fria e calculista foi uma apelação da autora. A forma como matou sua melhor amiga, Jane (Isabel Teixeira), foi risível e ainda retirou uma grande atriz da trama. Tirar a personagem para deixá-la como foto para Thelma conversar? Ao menos Adriana Esteves brilhou.
O sequestro de Lurdes teve a função de postergar o encontro de mãe e filho ao máximo. E o melhor perfil da novela chegou a ficar sumido por dois capítulos. O desaparecimento apenas expôs que a história nunca se sustentou sem ela. Lurdes ainda era o alívio cômico do folhetim. Sem a matriarca tudo ficou ainda mais sombrio e pesado. Mas é importante ressaltar que a obrigatoriedade de núcleo cômico é algo ridículo. Uma produção não é boa ou ruim pela presença ou ausência de comicidade. Os problemas de "Amor de Mãe" passaram longe disso. A quantidade de desgraças da retomada provocou uma avalanche de críticas merecidas. No entanto, se todas as cenas violentas ou fortes tivessem um contexto valeria a pena. O telespectador se envolveria. O fato é que todos os acontecimentos criados pela autora se mostraram rasos e gratuitos. Vale citar até algumas cenas constrangedoras: Davi saindo do carro, pedindo calma para Belizário, e sendo baleado pelo miliciano; Vitória deixando o agressor de sua empregada doméstica entrar em seu carro e depois ameaçá-lo com uma faquinha de cortar pão; e Thelma levando Lurdes até uma casa completamente isolada sem Lurdes perceber nada de anormal.
A única cena realmente boa da parte final foi o aguardado encontro de Lurdes e Domênico. Regina Casé e Chay Suede se entregaram no momento mais emocionante do único drama que funcionou no enredo. Deixando todo o contexto sem sentido de lado (a fuga do cativeiro, por exemplo), foi lindo aquele instante de felicidade da mãe achando o filho que tanto procurou. Ao som de "Onde Estará o Meu Amor", de Maria Bethânia. Todavia, as demais sequências deixaram a desejar, fazendo jus ao conjunto equivocado do folhetim. O drama de Vitória inserido no penúltimo capítulo ---- a mãe biológica que surgiu do nada para recuperar a criança que a advogada adotou ---- foi raso, além de causar a falsa sensação de que todo menino ou menina adotada pode ser reivindicado pela família a qualquer momento. Penha (Clarisse Pinheiro) e Leila (Ariêta Correa) formaram um casal inusitado na reta final e tiveram boas cenas. Mas a fuga das bandidas com perucas chamativas soou ridículo. A morte de Álvaro, atingido por um tiro disparado por Raul em uma briga, repetiu o que a autora já tinha usado na briga de Lurdes e Thelma no cativeiro e não teve emoção alguma.
Já uma cena merecedora de elogios do último capítulo foi a despedida de Thelma e Danilo. Embora curto, o momento foi emocionante e defendido com brilhantismo por Adriana Esteves e Chay Suede. O desfecho de Penha e Leila, administrando um bar 'sertanejo', foi criativo. O final feliz de Lurdes com sua família reunida, encerrando a trama, fechou o ciclo de forma bonita. Uma pena que o restante dos momentos tenha sido tão descartável e sonolento. Embora Enrique Diaz seja ótimo, houve um destaque desnecessário ao enredo do "unicórnio". O drama de Vitória nem teve condições de ser desenvolvido de fato, enquanto a participação de Eliane Giardini não teve função alguma. Uma pena.
"Amor de Mãe" nunca foi o novelão revolucionário que grande parte da crítica especializada tentou mostrar. E a pandemia não pode ser a culpada pela quantidade de equívocos vistos na retomada da produção. O desfecho da história de Manuela Dias apenas desnudou todos os problemas que o enredo sempre teve e eram colocados para debaixo do tapete por vários jornalistas. A Globo sabia do risco quando resolveu colocar uma escritora que nunca tinha criado uma novela sozinha para estrear no horário nobre. Todos os autores do canal estreiam na faixa das seis, das sete ou em "Malhação". Manu quebrou essa regra e o resultado não foi bom.
Segundo a própria, seu próximo trabalho será "Justiça 2" --- uma minissérie com o mesmo formato da bem-sucedida "Justiça". Que tenha mais êxito no novo desafio.
Império
3.4 98"Império": o que esperar da próxima novela das nove?
Autor de sucessos como "Tieta", "Pedra sobre Pedra" e "Senhora do Destino", Aguinaldo Silva terá a chance de voltar aos bons tempos com "Império", a nova trama terá que aumentar o baixíssimo Ibope do horário nobre e, por tudo o que tem sido visto nas chamadas, a chance de elevar os índices é bastante alta.
Aguinaldo parece disposto a escrever um novelão. Ele mesmo chegou a dar esta declaração várias vezes. O autor tem um grande currículo, "Duas Caras" foi uma trama com muitos desafios e não deixou a desejar; mesmo tem errado em algumas de produções: a série "Lara com Z" (derivada da boa "Cinquentinha" ---- seu último acerto até então) foi uma bobagem e a novela "Fina Estampa" foi um festival de situações constrangedoras, culminando em um deboche final, que riu da cara do telespectador.
Agora, com "Império", após algumas desconfianças iniciais, Aguinaldo parece inspirado. As chamadas estão bem atrativas e a história terá duas fases (a primeira com três capítulos). Os primeiros capítulos, ambientados em 1989, acompanharão a chegada de José Alfredo (Chay Suede/Alexandre Nero), vindo do nordeste, à casa do irmão, Evaldo (Thiago Martins), em Santa Tereza, no Rio de Janeiro.
O protagonista acabará se apaixonando pela cunhada Eliane (Vanessa Giácomo/Malu Galli) e os dois decidirão fugir. Mas tudo muda quando a mulher descobre que está grávida e acaba sendo aconselhada pela sua irmã Cora (Marjorie Estiano/Dirca Moraes) a desistir de tudo.
Na rodoviária, sem dinheiro e sem Eliane, José Alfredo acaba aceitando uma vaga em um garimpo, oferecida por Sebastião (Reginaldo Faria). A partir desta oportunidade, a vida do controverso personagem central muda completamente. Sebastião o leva para Suíça, e no avião ele conhece Maria Marta (Adriana Birolli), de uma família tradicional decadente, e casa-se com ela para ter seu nome reconhecido na alta sociedade. Acaba se envolvendo no contrabando de pedras preciosas ---- graças a Maria Joaquina (Regina Duarte), que o insere neste meio ---- e consegue construir um império, ficando rico.
Cristina (Leandra Leal) será a mocinha e, como é filha de Eliane, irá descobrir que faz parte da poderosa família Alfredo, graças ao plano de sua Tia Cora, que quer aproveitar a fortuna dos ricaços. Aliás, o grande atrativo desta novela até o momento é justamente esta víbora, que tem tudo para ser uma vilã antológica. Vivida por Marjorie Estiano na primeira fase e Drica Moraes na segunda, a personagem estará muito bem representada e o desempenho das duas já impressiona apenas em rápidas passagens de cena.
E esta é apenas a trama central de "Império", há muitas outras, que surgem na segunda fase. Incluindo um núcleo cômico, que contará com Viviane Araújo (Naná, uma manicure) e Aílton Graça interpretando uma travesti (Xana Summer), que mantém um salão de beleza. Ao que tudo indica, o personagem será um Crô (papel de Marcelo Serrado em "Fina Estampa") ainda mais exagerado. O ator tem tudo para se destacar. E outro tipo que parece inspirado no mordomo homossexual é o jornalista fofoqueiro interpretado por Paulo Betti.
Ainda haverá outra grande desafiante, a Maria Marta, vivida pela grande Lilia Cabral (e Adriana Birolli na primeira fase). A esposa de José Alfredo, segundo o autor, será tão dura quanto um diamante. Haverá, inclusive, embate entre a peste interpretada por Drica e a esposa do José Alfredo. Com certeza, serão cenas muito bem interpretadas.
A polêmica envolvendo um romance homoafetivo também estará presente. No caso, os atores envolvidos serão José Mayer e Klebber Toledo. Cláudio será um homem muito bem casado, com uma família sólida, e terá um amante, com quem se relaciona há anos: Leonardo, vivido por Klebber. Ou seja, será um homossexual enrustido. E vale aqui elogiar a atitude de Aguinaldo, que sempre presenteia Zé Mayer (marcado pelos galãs conquistadores) com papéis diferenciados.
No elenco ainda há, além dos nomes já citados, Andreia Horta, Elizângela, José Mayer, Flávio Galvão, Marina Ruy Barbosa, Othon Bastos, Rafael Cardoso, Tato Gabus Mendes, Klebber Toledo, Suzy Rêgo, Zezé Polessa, Karen Junqueira, Joaquim Lopes, Maria Ribeiro, Caio Blat, entre outros.
Ainda é difícil traçar algum caminho para "Império", até porque a trama terá duas fases e somente os personagens principais têm aparecido nas chamadas. E de acordo com o clipe apresentado e a história escrita, Aguinaldo Silva parece inspirado. Será que a TVterá motivos para sorrir com esta nova produção? Resta aguardar o dia da estréia.
Laços de Família
3.7 202 Assista AgoraEvolução da sociedade expõe o péssimo envelhecimento de Pedro em "Laços de Família".
A evolução do comportamento do público já deixou bem claro que o galã de uma novela da década de 80 pode se tornar quase um vilão em 2021. Por isso a teledramaturgia é tão estudada e apreciada por vários historiadores, além dos tradicionais noveleiros. Há até ótimas monografias de faculdade sobre o tema. A atual reprise de "Laços de Família", em plena reta final, por exemplo, expõe uma completa mudança do olhar do público diante do personagem Pedro, interpretado por José Mayer.
O sucesso de Manoel Carlos vem repetindo o êxito no "Vale a Pena Ver de Novo". A audiência está elevada. E com todo mérito. É um dos melhores trabalhos do autor, além de ser um dos mais lembrados com carinho pelo telespectador. Agora, Pedro é o tipo que pior 'envelheceu' no enredo. A expressão 'envelheceu mal' virou uma espécie de 'meme' na internet justamente por mostrar como determinadas situações, antes vistas como naturais, soam problemáticas hoje em dia. E pouco se salva deste perfil criado por Maneco.
O administrador do Haras de Alma (Marieta Severo) é um sujeito solitário e rabugento. Transborda grosseria com todos ao seu redor, principalmente com as mulheres. Chegou a ter um casamento relativamente duradouro, e acabou se divorciando. Os cavalos são sua única paixão.
Nem mesmo quando tem sentimentos por alguma mulher consegue evitar que seu lado agressivo seja exposto. O intuito do autor era mostrar uma pessoa que era movida pelo instinto, quase tão irracional quanto os animais. Porém, o resultado foi catastrófico aos olhos de hoje.
O contexto mais inacreditável é a relação entre Pedro e Cintia (Helena Ranaldi). O administrador e a veterinária têm uma temperatura sexual elevada e há um claro jogo de gato e rato que costuma funcionar na ficção. Agora há uma pequena linha que é ultrapassada em vários instantes do enredo, resultando em situações
de abuso sexual e até estupro. A própria Cintia chega a admitir que foi forçada em uma relação flagrada por Iris (Deborah Secco). E em uma discussão com Pedro, o sujeito não só admite que a estuprou como diz que tem o direito de estuprá-la quantas vezes quiser ----- a parte da cena foi cortada na reprise por razões óbvias.
O relacionamento do personagem com Íris, sua prima de segundo grau, também desperta ojeriza.
Pedro a trata como uma criança, ignorando o desejo que a garota de mais de 18 anos sente por ele. Ainda a agride diversas vezes, como se fosse uma espécie de 'pai educando a filha'. Em uma das sequências mais chocantes, o empregado de Alma se choca ao vê-la de maquiagem e lava seu rosto à força, ainda puxando seus cabelos para dar um banho. Depois bate na bunda de Íris várias vezes como se estivesse 'dando palmadas educativas'.
os dois terminam juntos e com ela grávida.
A forma como Pedro vai para cima das mulheres é outro fato que incomoda.
Sua insistência em reconquistar Helena (Vera Fisher), um ex-amor do passado com quem tem uma filha (Camila - Carolina Dieckmann), remete a de um perseguidor (o chamado 'stalker').
"Laços de Família" é um novelão da melhor qualidade e são vários os acertos do clássico de Manoel Carlos. E há muitas situações que se transformaram em problemas graves com o passar dos anos e o desenvolvimento do Pedro é um deles. Ao menos serve para uma boa análise comportamental da sociedade.
Haja Coração
3.2 30 Assista AgoraFracasso da reprise de "Haja Coração" corrigiu uma injustiça do passado
Resolveram repetir a estratégia que funcionou em 2016: duas novelas das sete de sucesso em sequência. Há quase cinco anos, "Totalmente Demais" era um fenômeno de repercussão. Foi substituída por "Haja Coração", uma produção tão popular quanto a anterior, e de qualidade bastante inferior. A trama de Daniel Ortiz acabou com um décimo a mais na média de audiência que o produto de Rosane Svartman e Paulo Halm (27,5 pontos, enquanto a antecessora marcou 27,4). Como era de se esperar, a estratégia da Globo não deu certo com as reprises. A primeira conseguiu fazer ainda mais sucesso que em 2016 (obteve 29 pontos de média). Já a segunda conseguiu apenas 25 pontos.
Após seu bom trabalho como estreante em "Alto Astral" (2014), Daniel Ortiz apresentou um início promissor de seu segundo folhetim. Havia ali todos os ingredientes de uma deliciosa novela das sete. E o primeiro mês foi animador, onde a dupla formada por Fedora e Teodora logo se destacou, assim como o trio impagável de amigas interesseiras formado por Rebeca, Penélope e Leonora (Ellen Roche). A composição de Mariana Ximenes como Tancinha também agradou e parecia uma ótima protagonista, tendo ainda a rivalidade com Fedora como um dos atrativos. Os erros observados em alguns núcleos paralelos deslocados e na história cansativa do mocinho Apolo pareciam pequenos diante dos acertos.
E, ao longo dos meses, Ortiz começou a dar claros sinais de falta de domínio de seu enredo. Os problemas começaram a crescer e até mesmo os pontos positivos começaram a ficar negativos.
A falsa morte de Teodora
O romance de Fedora e Leozinho ficou repetitivo, Lucrécia passou a protagonizar situações cansativas indo atrás do seu marido, que a rejeitava, e até mesmo a vilania de Gigi se esvaziou depois que fez seu discípulo Leozinho se casar com Fedora. Já Aparício começou a protagonizar cenas de armações bobocas para conquistar Rebeca se fingindo de faxineiro.
A trama de Tancinha se mostrou rasa para protagonizar a novela.
A personagem começou a história investigando o desaparecimento do seu pai e até invadiu a festa de aniversário de Fedora para cobrar satisfações. E, pouco depois de um mês, não tocou mais no assunto. A situação parece ter sido esquecida pelo autor. Ela passou a ficar 'divididinha' entre Apolo e Beto e seguiu assim até o final.
Até mesmo as aulas de balé que passou a ter por volta da metade de trama não era fruto de seu sonho, ou objetivo de vida, e sim de sua mãe. E a rivalidade inicial com Fedora foi desprezada ao longo dos meses. Elas mal contracenaram, mesmo tendo rendido cenas ótimas juntas. A inimizade da patricinha rica com a feirante pobre tinha tudo para render bastante, o que não ocorreu
O roteiro do trio de amigas, juntamente com a empregada Dinalda, se mostrou limitado para tantos meses no ar.
O resultado foi a perda de destaque delas, incluindo a inserção de Rebeca em repetitivas idas e vindas com Aparício, a separando sutilmente das demais. A única que conseguiu manter situações atrativas foi Leonora, que passou a formar uma dupla com Dinalda, protagonizando divertidas cenas em busca da fama. A participação da ex-bbb Ana Paula acabou dando um gás para o contexto que cercava a fictícia ex-Casa de Vidro. Já Penélope formou um lindo casal com Henrique, e o autor não criou bons conflitos para o par, que acabou deixado de lado, lamentavelmente. Só nas semanas finais houve a entrada da mãe esnobe do rapaz (vivida pela ótima Sônia Lima), proporcionando boas cenas com a futura nora. Mas era tarde e a falta de aproveitamento de um casal que havia funcionado ficou claro.
O triângulo envolvendo Camila (Agatha Moreira), Giovanni e Bruna (Fernanda Vasconcellos) foi outro ponto que Ortiz desperdiçou.
O casal "Gimila" emplacou logo no início, só que a demora no desenvolvimento de todo o contexto da explosão do Gran Bazar, o mal aproveitamento da psicopatia de Bruna e as constantes perdas de memória de Camila deixaram a situação cansativa.
Bruna tentou matar Camila, foi frustrante em virtude da equivocada direção de Fred Mayrink, que tirou todo o impacto do embate das rivais com um trilha não condizente. A cegueira de Giovanni em cima dos surtos de Bruna também pecou pela falta de verossimilhança, assim como os apagões de memória que Camila sempre tinha
Já o núcleo do Apolo desde o início foi fraco e se manteve assim ao longo da trama.
A paixão do personagem pelas corridas implicava em cenas desinteressantes e o conflito entre Nair e Adônis ---- o filho que sentia vergonha da mãe ---- era exatamente o mesmo vivido pela mesma atriz em "Alto Astral". Para culminar, só no penúltimo capítulo a mãe soube que o rapaz não usou o seu dinheiro para pagar a faculdade e sim curtir a vida ---- uma situação forçada, por sinal, foi Adônis descobrir que, ao contrário dos irmãos, não era adotado e sim o filho renegado pela mãe (isso só serviu para inverter os papéis, o transformando em vítima, sendo que sempre foi um filho racista e ingrato). Outro equívoco que merece ser citado foi o péssimo personagem dado a Conrado Caputo, depois do sucesso do Pepito em "Alto Astral". O ator ficou avulso o tempo todo na pele de Renan (inicialmente um vlogger fracassado e depois ajudante da cantina de Tancinha), assim como Marcella Valente, intérprete da Larissa, irmã de Apolo e Adônis./spoiler]
Ainda citando perfis avulsos, vale mencionar o drama dos irmãos Carol (Bruna Griphao), Nicolas (Henry Fiuka) e Bia (Melissa Nóbrega). O núcleo sempre ficou deslocado na história e parecia pertencer a uma novela paralela. O absurdo da situação também abusava da inteligência do telespectador, afinal, não tinha como acreditar [spoiler]que os três conseguiram esconder dos vizinhos por meses a morte do pai. Já na reta final, a adoção do trio serviu para mexer no triângulo formado por Tancinha, Beto e Apolo, uma vez que todos quiseram adotá-los.
E, em meio a tantos problemas de desenvolvimento, Daniel Ortiz acertou em cheio na condução do romance de Shirlei (Sabrina Petraglia) e Felipe (Marcos Pitombo), virando o melhor casal da história. A personagem caiu no gosto popular e se transformou no maior sucesso da novela. Curiosamente, foi o único perfil que não veio de "Sassaricando" e sim de outra novela de Silvio de Abreu: "Torre de Babel". A menina que tinha uma deficiência na perna foi a Cinderela da trama das sete e formou o melhor casal da história junto de Felipe, praticamente a reencarnação do príncipe encantado. O par era tão bom que teve três vilãs para separá-lo: a patricinha Jéssica (Karen Junqueira), a invejosa Carmela (Chandelly Braz) e a arrogante Vitória (Betty Gofman). A ex-namorada e a mãe de Felipe, juntamente com a irmã de Shirlei, atrapalharam muito o romance, movimentando o núcleo, que virou o melhor do enredo de longe, ofuscando o triângulo central. Foi a única parte da produção que se manteve atrativa ao longo dos meses, no melhor estilo conto de fadas. Sabrina deu um show em cena e viveu um grande momento na carreira. Foi o maior destaque do folhetim, esbanjando química com Marcos Pitombo. Os verdadeiros mocinhos.
O elenco teve bons nomes e alguns sobressaíram, embora nem todos tenham tido o destaque merecido.
Marisa Orth pôde exercer uma faceta dramática pouco explorada através da batalhadora Francesca; Grace Gianoukas foi a grata surpresa da novela e deu um show na pele da arrogante Teodora (até um spin-off na streaming ganhou); Chandelly Braz brilhou vivendo a complexa Carmela (cuja vilania teve explicação na hora que sua culpa pelo problema na perna de Shirlei foi revelada); Agatha Moreira se destacou vivendo a Camila "boa" e a Camila "má"; Karen Junqueira fez uma Jéssica odiável; Bruna Griphao emocionou com o drama de Carol; Malu Mader, Carolina Ferraz, Ellen Roche e Renata Augusto formaram um ótimo quarteto; Tatá Werneck e Gabriel Godoy tiveram uma evidente sintonia; João Baldasserini se destacou vivendo o seu primeiro perfil cômico na carreira; e a participação de Cristina Pereira interpretando a tia Safira engrandeceu o núcleo Abdala. Já Mariana Ximenes, apesar do enredo fraco, conseguiu compor uma Tancinha carismática. Pena que Cláudia Jimenez, Conrado Caputo e Marcelo Médici não foram valorizados como mereciam.
A reta final da novela expôs com maior nitidez a barriga da produção. O autor quis guardar tudo para o fim, resultando em uma correria que comprometeu todo o conjunto, deixando vários desfechos superficiais e decepcionantes.
A entrada de Guido no último mês foi um erro grave, implicando em resoluções forçadas. O público não teve tempo de acompanhar os possíveis embates entre ele e Francesca, muito menos a reaproximação do pai com os filhos. Para piorar, uma das revelações mais aguardadas não teve impacto algum: a cena em que Guido conta para Shirlei que é seu pai verdadeiro não chocou ninguém, nem Felipe, que é enteado do sogro. A situação foi resolvida em poucos minutos, ficando nisso. E nem deu para ver a reação de Carmela porque foi a única filha que nem soube da volta dele.
depois da revelação sobre a culpa da vilã na deficiência da irmã.
E toda a resolução do triângulo Bruna, Camila e Giovanni foi feita de forma primária.
O último embate entre a filha de Gigi e a psicopata foi muito mal dirigido, implicando em cenas sem qualquer impacto. Após ter mantido Giovanni preso, a víbora levou um golpe de Camila e acabou morrendo queimada em uma explosão.
, que sofreram um acidente de carro depois que sequestraram Carmela em um tempo recorde ---- Carmela ligou para avisar que contaria tudo para a polícia (sobre a armação contra Shirlei) e em menos de 30 segundos foi pega pela vilã.
O ponto positivo do final foi a sequência do casamento de Shirlei e Felipe, repleta de clichês, fazendo jus ao que o casal representou. A delicadeza esteve presente e os atores emocionaram.
A reconciliação de Shirlei e Carmela também merece menção, comprovando que o enredo da menina com um problema na perna foi realmente o mais rico da trama ---- e claramente copiado de "Torre de Babel". Já a dúvida de Tancinha se arrastou até o final, dominando todo o último capítulo. Como já estava claro no roteiro, ela ficou com Apolo, dispensando Beto. O atrapalhado filho de Penélope,
E Teodora abriu mão de sua fortuna, indo morar com Tarzan na ilha onde se conheceram. A melhor cena do desfecho foi a reconciliação de Tancinha e Fedora, sendo necessário destacar Tatá Werneck e Mariana Ximenes.
"Haja Coração" foi um sucesso de audiência em 2016, agora os números altos não refletiram a qualidade da mesma. Não foi uma novela ruim. O saldo geral é mediano, levando em consideração os erros e os acertos. E, tinha tudo para ter sido um folhetim excelente, pois apresentou todos os ingredientes necessários de uma deliciosa trama das sete. Só que o desenvolvimento equivocado de vários personagens e núcleos prejudicou muito o conjunto. O fracasso da reprise, no caso, acabou corrigindo a injustiça de quase cinco anos atrás. Afinal, essa produção jamais mereceu uma audiência maior que o fenômeno "Totalmente Demais", mesmo que por apenas um décimo.
A Força do Querer
3.8 59Paralelo entre Ivan e Nonato foi um dos trunfos de "A Força do Querer"
A reprise da trama de "A Força do Querer" está em plena reta final e todas as qualidades da melhor novela de Glória Perez puderam ser constatadas mais uma vez. A maior ousadia da autora foi o drama de Ivana (Carol Duarte), uma menina que não se identificava com seu corpo e sofria diante da pressão da mãe e da sociedade. A situação foi um dos principais trunfos do folhetim, ganhando novos contornos através de um interessante paralelo criado com um outro personagem que cresceu: o Nonato (Silvero Pereira).
A questão do transgênero ser explorada em uma novela foi um bom avanço e a escritora se mostrou muito corajosa. O método escolhido expôs a sua criatividade, além de ter servido como uma explicação objetiva, sem parecer didático ou piegas. Isso porque a dualidade que focalizada no enredo funcionou para destacar os dois perfis, ao mesmo tempo que expôs as diferenças que os separam, embora enfrentem o mesmo tipo de preconceito. O que o público via era um homem muito bem resolvido com seu corpo e uma mulher que não se identificava com o seu reflexo no espelho.
Ivana sempre sofreu pressão da mãe, a fútil Joyce (Maria Fernanda Cândido), para que fosse quase um clone seu. Na breve primeira fase da novela, que durou apenas o primeiro bloco do primeiro capítulo, ficou explícita a intenção da perua para com sua filha, transformando a criança em uma cópia mirim de si mesma.
A menina já demonstrava desconforto na época. O tempo passou, mas nada mudou, a não ser a vontade da garota, que cresceu e deixou de seguir as ordens da mãe. A personagem sempre teve mais compreensão do pai, Eugênio (Dan Stulbach). O que se via era uma mulher linda, mas sem qualquer vaidade, deixando de lado maquiagem acessórios, sapatos, enfim.
Já Nonato começou timidamente na história. Parecia uma mero figurante inicialmente. Mas não era. Pelo contrário, serviria para engrandecer o convidativo drama de Ivana. O rapaz deixou o nordeste para tentar a vida no Rio de Janeiro e começou a trabalhar como motorista do preconceituoso Eurico (Humberto Martins). Aos poucos, a autora foi revelando para o público a vida desse homem aparentemente muito tímido e retraído. Transformista e homossexual, ele precisou se portar como 'homem' para conseguir um emprego digno, pois declarou que no Brasil não dão emprego para pessoas como ele, que acaba entrando na prostituição. Mas Nonato faz questão de dizer que é muito bem resolvido e não quer se transformar em mulher. Gosta do seu corpo e adora interpretar a Elis Miranda, perfil que criou para se apresentar em shows. Não é transexual, é transformista.
Desde que se revelou para o telespectador, as cenas do motorista eram exibidas intercaladas com as da Ivana, que a cada dia tinha sua autoestima piorada em virtude da não identificação com seu corpo. O seu drama é o melhor enredo da novela e a condução de Glória foi de forma cautelosa, sem atropelos. A autora criou uma história que impossibilitou o telespectador de não se envolver com a angústia daquela garota. A situação virou uma poderosa arma para a reflexão até dos preconceituosos. Ela é um homem que nasceu no corpo de uma mulher. Tudo o que envolve os transgêneros ainda era muito 'novo' para o grande público em 2017, inclusive o fato de existir mulher que se 'transforma' em homem, mas segue se interessando pelo sexo masculino, como é o caso de Ivana.
E essa mescla com a vida de Nonato deixou o contexto ainda mais convidativo, expondo as diferenças entre transexualidade e transformismo. As cenas eram ótimas e destacaram o talento dos intérpretes. Silvero Pereira e Carol Duarte eram dois estreantes na televisão e não poderiam ter começado de forma melhor. Ele, na época, estrelava o espetáculo BR-Trans pelo Brasil e aproveitou o momento. Foi por causa deste trabalho do ator cearense que Glória o chamou para seu folhetim. Nonato foi defendido com competência e o perfil misturou humor e drama com maestria. Já Carol brilhou em todos os momentos, tanto como Ivana quanto como Ivan, já realizado com sua nova condição. Foi a grande revelação de 2017.
Glória Perez acertou em cheio na abordagem dos trans em "A Força do Querer" e valeu rever a apresentação simultânea de dois tipos tão parecidos e tão distintos.
Globo de Ouro (2018)
3.5 1Hipócritas Unidos
Aviso: Spoilers
Nada que já não souramos. Hollywood na verdadeira moda hollywoodiana hi-jacks a causa social da moda do dia e dedica um de seus shows anuais pat-ourselves-on-the-back para ele. Uma lista de pessoas lançam uma linha sobre como diretoras femininas são sub-representadas em Hollywood, sem nomear nenhuma mulher que esteja em par com Steven Spielberg, Clint Eastwood ou Ridley Scott. FYI, você não precisa de um pênis para ser nomeado para um prêmio,
você só tem que ser bom no que você faz. Esta indústria foi construída sobre a objetificação de mulheres (e homens), e tem empurrado os limites do conteúdo sexual aceitável desde o início. No entanto, seus representantes querem se virar e perguntar por que tantas mulheres estão sendo agredidas e assediadas? Isso seria como Sylvester Stallone fazendo Rambo e depois falando pelo controle de armas. Além disso, alguém está realmente convencido de que essas pessoas estão alheias à má conduta sexual que vem acontecendo há décadas? Quer dizer que mulheres como Oprah, Meryl Streep e Jennifer Anniston não são populares e/ou poderosas o suficiente para falar sobre esse tipo de coisa sem repercussões? Que tal todos aqueles homens hipócritas na plateia que nunca defenderam as mulheres em Hollywood? Claro, esta é a indústria que saudou Hugh Hefner como um grande homem e revolucionário após sua morte no meio de todo esse movimento, apesar de passar a vida construindo uma empresa dedicada à objetificação das mulheres.
Houve um tempo em que poderíamos dizer: "Eu não tenho que concordar com a política dos atores para desfrutar de seus
filmes." Bem, considerando que a maioria dos filmes lançados no ano passado tem algum tipo de mensagem PC/SJW em oposição ao bom cinema, está se tornando difícil desenhar essa distinção.
No globo de ouro de 2020...
Era bastante comum um filme dominar a cerimônia de premiação varrendo inúmeras categorias (e muitas vezes fazendo da cerimônia um verdadeiro furo no processo). Agora, nos últimos 15 anos, as varreduras têm sido cada vez mais raras, como podemos ver nesse
Nomadland é o filme a ser batido para o Oscar de melhor filme e melhor diretor.
Melhor atriz e melhor atriz coadjuvante estão completamente e sem precedentes no ar.
Melhor ator e melhor ator coadjuvante parecem estar tomando forma.
Foi uma noite ruim para Mank, Promising Young Woman, The Father, e The Trial of the Chicago 7
The Crown é a série dramática a ser batida nos Emmys.
Ted Lasso é um provável candidato para preencher o buraco deixado por Schitt's Creek.
A vitória do Queen's Gambit pode ser um Emmy, mas não necessariamente.
OBS: Apenas uma vez na última década um show marcou uma vitória repetida nesta categoria (Homeland ganhou um segundo troféu em 2012) e é muito raro para um show ganhar três Globos de atuação (a última vez foi em 2017, quando Tom Hiddleston, Hugh Laurie e Olivia Colman ganharam prêmios pela série limitada The Night Manager).
Haja Coração
3.2 30 Assista AgoraReprise comprova que Shirlei e Felipe foram os verdadeiros mocinhos de "Haja Coração"
"Haja Coração" teve um ótimo início em 2016, mas foi perdendo o rumo ao longo das semanas e a reprise comprova. Essa queda de qualidade pôde ser observada principalmente através do desenvolvimento de vários casais da história ---- muitos deles começaram promissores e tiveram o enredo estagnado. Já o par protagonista, composto por Tancinha (Mariana Ximenes) e Apolo (Malvino Salvador), cansa pela repetição desde o começo do folhetim. Porém, em contraponto a tudo o que foi mencionado, Daniel Ortiz criou um casal que caiu nas graças do público assim que surgiu e roubou o protagonismo: Shirlei e Felipe.
Os personagens interpretados com competência por Sabrina Petraglia e Marcos Pitombo protagonizam um dos enredos mais clássicos dos contos de fadas: o da gata borralheira em busca do seu príncipe encantado. É uma situação que transborda clichê, mas sempre funciona quando bem construída. E foi o caso da novela. Aliás, embora seja um remake de "Sassaricando" (1987), Shirlei não pertencia ao folhetim das sete de Silvio de Abreu. Mas fazia parte de outra novela do autor, do horário das nove: "Torre de Babel" (1998). A menina ingênua que tinha um problema na perna foi vivida na época por Karina Barum, fazendo um grande sucesso ---- a música "Corazón Patío", de Alejandro Sanz (tema da personagem), estourou.
Ao inserir Shirlei no contexto de "Haja Coração", o autor se viu obrigado a criar uma trama e não simplesmente seguir com a obra original. E foi algo bem positivo, ainda mais levando em consideração os erros que Daniel Ortiz cometeu com vários perfis e enredos da sua história, muitas vezes tentando repetir situações de 1987 que não funcionaram ---- vide o sumiço de Teodora (Grace Gianoukas) e toda a trajetória de Aparício (Alexandre Borges).
E todo o contexto que cerca a personagem é, propositalmente ou não, digno de uma mocinha de novela. Portanto, não demorou para a menina assumir esse posto com louvor. Ela e Felipe, que se comporta como o verdadeiro mocinho do enredo.
O rapaz está sempre com um sorriso no rosto, é solícito, transborda integridade e trabalha na empresa de Beto (João Baldasserini). Vale mencionar que o personagem demorou para entrar na novela, juntamente com a sua até então namorada, a patricinha Jéssica (Karen Junqueira). Foi só com a chegada dele que a trama da Shirlei deslanchou, pois a situação em torno da paixão platônica por Adônis (José Loreto) já estava cansativa. E o primeiro encontro do casal representou o clássico "Cinderela", da Disney. Isso porque o bom moço quase atropelou a menina, que acabou perdendo sua bota ortopédica em um bueiro, durante uma forte chuva. Felipe pegou o sapato e passou a procurar a moça para devolvê-lo.
Após muita procura e vários desentendimentos (a garota chegou a achar que estava debochando de sua deficiência), os dois finalmente se 'entenderam' e o rapaz devolveu a famigerada bota. O encontro se deu por uma 'coincidência' digna de folhetins: ela passou a trabalhar na casa dele como empregada. E não demorou para o interesse mútuo se manifestar, despertando o ciúme de Jéssica. Foi a partir de então que começou o calvário da mocinha, encarnando de vez a gata borralheira. A patricinha fazia de tudo para diminuir a funcionária e até a obrigou a subir vários andares de escada, carregando compras pesadas, ignorando seu problema na perna. A vilã encarnou de vez a madrasta da Cinderela, fazendo jus ao contexto da trama de Shirlei.
Para culminar, a filha de Francesca (Marisa Orth) é constantemente alvo da irmã Carmela (Chandelly Braz), que sempre faz questão de humilhar a caçula. Ainda há a presença do já citado Adônis, sujeito aproveitador que nunca retribuiu os sentimentos de Shirlei ---- mas depois passou a enxergá-la com outros olhos, virando mais um obstáculo para o casal. Outro ponto é a chegada da mãe de Felipe, interpretada por Betty Gofman. A nova personagem não admite o romance, pois sabe que a menina é filha de seu marido, Guido (Wernner Schunemann) ---- o desaparecimento dele é um dos mistérios da história. Portanto, fica claro que Shirlei tem um enredo próprio muito mais atrativo do que todo o restante da novela, que se mostrou bastante equivocada.
E uma ironia do 'destino' é ver o casal Shirlipe ofuscando o par protagonista, exatamente como ocorreu em "Sassaricando", reprisada atualmente pelo Canal Viva. Porém, curiosamente, na época, era o triângulo formado por Tancinha, Apolo e Beto que apagou o protagonismo de Aparício. Agora, o trio amoroso virou protagonista, mas de nada adiantou, pois foi ofuscado pelo casal de coadjuvantes. Ou seja, os personagens cresceram na obra original e no remake (por razões óbvias) entraram para o núcleo principal. O imponderável novamente se fez presente.
Os atores são ótimos juntos e a sintonia da dupla se evidencia em todos os momentos. A troca de olhares é outro ponto que enriquece o relacionamento que demorou bastante para finalmente acontecer. Ainda assim, valeu a espera. O aguardado beijo foi bonito e valeu ter visto atores não tão 'conhecidos' em destaque. Afinal, a atriz estreou no SBT em 2010, quando viveu a Terezinha em "Uma Rosa com Amor". Foi para a Globo no mesmo ano, onde teve uma pequena participação em "Passione". Também fez uma ponta em "Flor do Caribe" (2013), também atualmente reprisada, até ganhar a Itália em "Alto Astral" (2014), estreia de Daniel Ortiz como autor solo. Ela brilhou e acabou conquistando a ótima personagem posteriormente.
Já Marcos Pitombo é mais experiente, pois é revelação da temporada de 2006 da "Malhação". Depois do sucesso no seriado adolescente, foi para a Record, onde esteve em seis novelas: "Os Mutantes" (2008), "Os Mutantes: promessas de amor" (2009), "A História de Ester" (2010), "Vidas em Jogo" (2011), "Pecado Mortal" (2013) e "Vitória" (2014). Porém, é inegável que atuar fora da líder não dá a mesma visibilidade. O ator voltou para a Globo em 2015, onde fez uma breve participação na fracassada "Babilônia", e aproveitou a chance como o carismático Felipe. Não é por acaso que o personagem, mesmo não aparecendo tanto, ofuscou a figura de 'galã' de Apolo. Aliás, o casal se sobressaiu com grande facilidade, virando o melhor par do enredo com larga vantagem. Tanto no quesito química, quando na questão do desenvolvimento do romance.
Shirlei e Felipe (Shirlipe para os 'shippers') representam o amor puro dos contos de fadas e o imenso sucesso do casal apenas comprova que o clássico, quando bem feito, funciona sempre. Os dois viraram os verdadeiros mocinhos de "Haja Coração", protagonizando a melhor história da novela, com direito a cenas românticas, maldades de vilões e questões envolvendo a baixa autoestima de uma menina com deficiência. Sabrina Petraglia e Marcos pitombo fizeram por merecer todo o êxito do par, que é o único drama da novela que tem valido a pena rever.
Big Brother Brasil (21ª Temporada)
3.5 191‘Big Brother Brasil 21’: um reality show sem realidade?
Excesso de interferências da produção no 'Big Brother Brasil 21' traz desconfianças sobre a veracidade da narrativa configurada pelo programa.
Quando imaginávamos que não havia mais o que acontecer no BBB21 além do que já transcorreu nessas três semanas, lá vem o programa e nos joga na cara: nada mais imponderável que um reality show de convivência que se fundamenta em isolar um grupo de sujeitos do mundo externo. Presos nesse grande aquário com transmissão em cadeia nacional, tais indivíduos negociam um bem valioso – sua privacidade – em troca de uma sonhada visibilidade. Se vai ser bom ou não para eles, é sempre uma incógnita (quase nunca é).
Em pouquíssimo tempo, BBB21 tematizou uma quantidade absurda de assuntos: falou de relacionamentos abusivos, tortura psicológica, “sequestro” de pautas identitárias, homofobia, bifobia e xenofobia, dentre tantos outros tópicos de conversa. No entanto, aqui nesse texto pretendo olhar menos para a questão mais controversa de todas (falo da situação enfrentada por Lucas Penteado na casa, culminando em sua desistência), já abordada com qualidade por muitos especialistas, para falar de outro tópico: o fato de que a “cozinha” do BBB esteja aparecendo o tempo todo para os espectadores.
Em outras palavras: BBB 21 tem sido tão caótico que temos tido relances o tempo todo de “sobras” que normalmente ficam restritas apenas ao âmbito da produção. Para ilustrar, cito aqui dois exemplos. O primeiro é a conversa mantida entre o apresentador Tiago Leifert com o cantor Projota, após o último ter “aconselhado” Lucas Penteado num discurso algo acolhedor. Em um momento isolado no confessionário (mas exibido em tempo real e ao vivo pela Globo), Leifert elogiou a “força” que Projota – que caiu no choro – deu ao jovem ator em um momento de crise.
O segundo momento é o áudio “vazado” (as aspas se dão apenas por não ter confirmação de que se trata, de fato, de um “vazamento”, ou seja, não-intencional) da conversa entre Projota e uma voz que, pelo que sabemos, é de Boninho – o sujeito que poderia ser definido como o big brother onisciente que dá o nome ao programa. Neste episódio, Boninho chama Projota no mesmo confessionário e, vindo de lá, ouvimos um diálogo em que ele dá explicações ao cantor sobre a saída de Lucas Penteado e tenta convencê-lo a não desistir do programa. Dentre essas explicações, está de que a produção não sabia que Lucas tinha problema com bebidas e que, quando consome álcool, vira um “monstro”.
É ruim que ambos (diretor e apresentador) interfiram nos rumos da casa? Não necessariamente. A produção tem sim um importante papel nos direcionamentos da casa, tal qual um titereiro, mas que nunca consegue controlar totalmente seus marionetes. Os problemas vistos no BBB21 estão na forma que as intervenções têm sido feitas e no fato de elas privilegiarem apenas alguns participantes.
No primeiro caso, Leifert claramente mexe na estrutura do programa pois dá uma pista a Projota – que, paradoxalmente, saiu prejudicado, pois dali com uma sensação de aprovação coletiva que ele não tinha. Não por acaso, Projota passou a emitir cada vez mais discursos de tom evangelizador nas interações com as pessoas da casa, sugerindo acreditar ser um líder ali dentro. Já a conversa com Boninho dá a entender o esforço da Globo de mantê-lo ali dentro. No diálogo, Projota dá a impressão de que precisou de uma longa negociação (o que provavelmente envolve promessas) para levá-lo ao BBB.
Uma das principais acusações para se desmerecer reality shows é de que eles forjariam um discurso de realidade a partir de muita manipulação (obtida no trato com os participantes) e edição (a produção cria uma narrativa de realidade conforme seus interesses). Há, inclusive, uma série, Unreal, que mostraria justamente o que seriam esses meandros – baseados tanto na falta de ética com os competidores quanto com o público.
Ao sinalizar indícios muito claros de interferência no jogo (importante destacar, aliás, que ambos os exemplos citados aqui envolvem o mesmo participante, Projota), Big Brother Brasil dá certos sinais de descontrole no programa, que provavelmente rumou a um caminho imprevisto aos desejos da produção. Tudo ali parece muito errado: um casting que se amalgamou em uma dinâmica extremamente tóxica, participantes abusivos e abusados, ameaças de desistência a todo instante. Talvez fosse interessante à produção do BBB tomar uma atitude mais transparente com o público sobre todas essas questões.
Por outro lado, vale lembrar: é justamente esse descontrole (o fato de que, mesmo escolhendo minuciosamente cada elemento deste reality show, nunca há como garantir que o script será cumprido conforme se espera) que traz a graça e a essência de um programa deste tipo. Nada poderia ser mais real que isso.
Laços de Família
3.7 202 Assista AgoraSempre vale a pena rever a cena mais emblemática de "Laços de Família"
A televisão reprisou a cena mais emblemática de "Laços de Família" nesta segunda-feira (08/02/2021), no "Vale a Pena Ver de Novo": a raspagem dos cabelos de Camila (Carolina Dieckmann). Um dos maiores sucessos de Manoel Carlos que vem repetindo o êxito nas tardes da emissora. A média fica em torno de 18/19 pontos, índices excelentes para a faixa. É a prova do carinho do público pelo novelão que marcou tantas gerações.
A aguardada sequência entrou para a história da teledramaturgia e marcou a carreira de Carolina. Foi um momento de total entrega. Ao som de "Love By Grace", música cantada por Lara Fabian que passa a embalar o drama da personagem, a cena não tem texto e mostra apenas a raspagem dos cabelos de Camila, que decide retirá-los após o desespero com as constantes quedas em virtude da quimioterapia. É evidente que a emoção da intérprete se misturou com a da personagem. Afinal, é uma mudança de visual brusca.
E Carolina merece todos os elogios pelo seu profissionalismo. O grande público sabe que não é toda atriz que aceita um pedido assim. Mas valeu a pena o risco. Ninguém esquece da cena e até hoje há uma forte comoção. Embora não seja a função da teledramaturgia, também serviu como um grande estímulo a todos que enfrentam a leucemia. Vale lembrar que a novela fez aumentar significativamente a doação de medula óssea na época graças ao desenvolvimento competente do drama de Camila.
Aliás, Maneco foi de uma habilidade invejável. A filha de Helena (Vera Fisher) era a personagem mais detestável de "Laços de Família" e já havia páginas na internet destilando ódio pela garota, mesmo em uma época onde a internet ainda engatinhava. E nada mais natural. Camila deu em cima do namorado da mãe descaradamente e foi correspondida. Helena abriu mão de seu amor pela felicidade da filha. Difícil encarar todo o contexto com naturalidade e por isso a acidez de Íris (Deborah Secco) era tão adorada. Representava quem assistia.
Mas o autor conseguiu promover uma virada no sentimento do telespectador. E vale ressaltar que a doença estava planejada desde a sinopse. Muitos veículos chegaram a noticiar que o câncer foi criado de improviso como uma estratégia de Maneco para diminuir a rejeição de Camila. Mas sempre foi tudo bem colocado. Até nos primeiros meses de novela alguns personagens destacavam a palidez da personagem e como vivia abatida. Tudo piora quando engravida de Edu (Reynaldo Gianecchini) e vários sintomas da leucemia surgem. O fato do marido médico ignorar a gravidade é um tanto absurdo, mas não prejudica a narrativa. E quando a leucemia é descoberta aquele ódio do público vai cedendo lugar para uma comoção difícil de segurar. Aliás, o elenco se entrega junto com Carolina. Vale destacar os momentos emocionantes de Luigi Barricelli (Fred), Vera Fisher, Gianecchini e Júlia Almeida (Estela).
A marcante sequência da raspagem dos cabelos é uma catarse dilacerante e coroa a competente condução de Manoel Carlos na abordagem do tratamento contra a leucemia. Nenhuma outra novela conseguiu chegar nem perto neste quesito. Uma curiosidade: a cena não foi escrita pelo autor. Foi gravada apenas para uma campanha de doação de medula óssea. Mas ficou tão impactante que acabou inserida no enredo. E valeu muito a pena rever um momento tão importante para a teledramaturgia nacional. A reprise de "Laços de Família" merece todo o sucesso.
Gênesis
4.2 12"Gênesis" apresenta bom início e conhecida história bíblica desperta a atenção do público
A 'nova superprodução da Record', "Gênesis" estreou na terça-feira (19/01/21), na faixa antes ocupada por "Amor sem Igual", até então a única novela inédita no ar atualmente. A nova produção bíblica da emissora agora é o segundo folhetim inédito. Após ter fugido um pouco da mesmice com a boa trama de Cristianne Fridman, o canal volta a apostar nas histórias bíblicas para atrair o público.
A nova novela tem um alto investimento da emissora. É o maior elenco da teledramaturgia nacional até hoje, com mais de 250 atores, e dividida em sete fases: "Criação" (Adão e Eva); "Dilúvio" (Arca de Noé); "Torre de Babel"; "Ur dos Caldeus", "Abraão"; "Jacó" e "José do Egito". Serão 150 capítulos. Ou seja, a bem da verdade, há uma boa estratégia de marketing. Afinal, analisando friamente, não se trata de um folhetim e, sim, de várias minisséries interligadas por poucos atores. Apenas dois estão em todas as fases: Flávio Galvão, intérprete de Deus (apenas por voz), e Igor Rickli, que vive Lúcifer.
A produção é escrita por Camilo Pelegrini, Raphaela Castro e Stephanie Ribeiro, dirigida por Edgard Miranda. A trama aborda os primeiros 2.300 anos da humanidade a partir da história contada no primeiro livro da Bíblia. Há uma boa frente de capítulos já prontos. O início das gravações foi em janeiro de 2020, dois meses antes do início da pandemia de COVID-19 no Brasil.
A primeira fase teve locações no Rio Grande do Sul e no Paraná. A fase do "Dilúvio" foi feita em estúdio no Rio de Janeiro e parte da equipe também filmou em Marrocos pouco antes da pandemia interromper os trabalhos. Como há muito dinheiro investido pela Record, o intuito é repetir o sucesso de "Os Dez Mandamentos" (2015), nunca mais alcançado.
A estreia teve uma ótima audiência (16 pontos) e o chamariz do enredo de "Adão e Eva" foi um dos responsáveis pelo interesse do público. Afinal, todo mundo conhece a história e a curiosidade em vê-la produzida como 'novela' atrai. Carlo Porto e Juliana Boller não fazem feio em cena, embora o excesso de maquiagem nos atores deixe o resultado artificial. Já os efeitos especiais merecem elogios. A primeira parte (envolvendo uma clara licença poética até da Bíblia) impressionou pelo bom trabalho da equipe em cima da representação dos dinossauros sendo extintos ---- Lúcifer e todos os anjos rebelados foram expulsos por Deus do reino do céu e todos se transformaram em meteoros pela força da 'queda', destruindo o mundo jurássico. Foi uma ideia criativa juntar a teoria criacionista com a evolucionista.
A agilidade é outro fator que tem contribuído para a atenção do espectador. Adão e Eva comeram o fruto proibido logo na estreia e no segundo capítulo já houve uma passagem de tempo com a chegada de vários filhos e filhas do casal, incluindo Caim (Eduardo Speroni) e Abel (Caio Manhente), que protagonizaram a conhecida passagem da Bíblia no terceiro capítulo: um irmão matando o outro por inveja. O trágico momento ainda destacou o talento de Juliana Boller, que transmitiu lindamente a dor da Eva com a perda do filho. Na sexta-feira (22/01/21), no quarto capítulo, a fase de Noé (Bruno Guedes) foi iniciada. E já na próxima semana vai ao ar toda a sequência da Arca de Noé (Oscar Magrini). Ou seja, são muitos acontecimentos de forte apelo indo ao ar em apenas duas semanas. Tem sido interessante acompanhar a trama, que provavelmente terá uma queda de ritmo na fase "Torre de Babel", algo já esperado.
"Gênesis" vem apresentando um promissor começo e o sucesso nos números de audiência serve para ligar o sinal de alerta da Globo. A Record nunca escondeu que pretende repetir o êxito do fenômeno "Os Dez Mandamentos" (2015), até hoje nunca mais alcançado. Se o conjunto se mantiver atrativo ao longo das fases, a chance de acontecer é real.
Simples Assim
1"Simples Assim" é simples e chato
Angélica ficou quase três anos fora do ar. O "Estrelas", programa comandado por ela entre 2006 e 2018, chegou ao fim desgastado e sem atrativos. A Globo encerrou a atração sem ter um novo projeto para a apresentadora. Muitas especulações foram feitas durante a ausência da loira, incluindo o desligamento da emissora. E todos os "projetos" de um novo formato eram adiados. Até surgir o "Simples Assim", em outubro deste ano.
Antes da estreia, no dia 20, pouco se falava sobre o novo programa. A falta de informações implicou em uma expectativa elevada. Afinal, era o retorno de Angélica após um longo hiato. Mas o resultado ficou abaixo da média. As explicações sobre a proposta do formato são ótimas: "uma reflexão sobre algo que nos une como seres humanos. A busca pela felicidade. Um propósito comum a todos e, ao mesmo tempo, único e individual, que cada um percorre a seu modo. Trilhar o caminho não é simples e chegar à simplicidade, ao estado de espírito que permite encarar a vida com mais leveza, pode custar uma vida inteira".
A cada episódio, um tema ---- como felicidade, fé, trabalho, família, solidariedade, diversidade, vaidade e amor ---- foi abordado. E, para cada assunto, diferentes percepções e maneiras de contar essas histórias, que vieram das ruas, das casas dos personagens (sempre anônimos), através de esquetes de humor ---- que marcaram a volta de Angélica como atriz ---- ou das dinâmicas com alguns convidados em um palco. O intuito do programa é exibir momentos felizes e na primeira temporada a missão foi bem cumprida. O formato é leve e despretensioso. Mas, no ar, provocou tédio.
Angélica é uma ótima apresentadora, mas os longos papos com os convidados, tanto anônimos quanto famosos, sobre amenidades não flui e nem as dinâmicas no palco entretêm. Muitas vezes há a sensação de acompanhar uma espécie de grupo de autoajuda, onde a apresentadora é a 'coach'. É mais legal para quem participa do que para quem assiste. Nem mesmo as curtas cenas protagonizadas por Angélica com participações especiais (Marcos Caruso, Paulo Gustavo, Camila Queiroz, Mariana Santos, Marisa Orth e Ingrid Guimarães foram alguns que contracenaram com a loira) divertiram. Na realidade, se mostraram bem artificiais ou até bobinhas. Nada pior para uma cena do que parecer uma cena.
E o programa também teve o azar de ser lançado em plena pandemia do novo coronavírus. A primeira temporada já tinha sido toda gravada antes da covid-19 aterrorizar o mundo. O quadro "Dilemas da Vida Real", por exemplo, soa risível hoje em dia com tantas mortes diárias. Um homem e uma mulher moravam em cidades diferentes e os dois tiveram que decidir no palco quem iria abdicar de sua casa para se mudar e ir morar com o outro. Vale destacar mais um "dilema" apresentado: o marido queria mais filhos e a mulher não. A missão do programa foi conciliá-los. Na realidade, houve um claro "convencimento" para a mulher ceder e ter filho. Soou até machista nos tempos atuais. Enfim, problemas que ficaram ainda mais bestas em 2020.
Com direção-geral de Geninho Simonetti e supervisão de direção de LP Simonetti, "Simples assim" não é um programa ruim. Longe disso. Mas Angélica merecia algo um pouquinho mais empolgante após tanto tempo longe do ar. O título faz jus ao que é apresentado. São propostas simples em um formato sem novidades. Mas o conjunto, infelizmente, resulta em um programa esquecível e chato.
Comportamento Típico da Rede Globo em não investir em qualidade.
Altas Horas
3.4 13Há 20 anos no ar, "Altas Horas" foi o programa que melhor se adaptou ao momento de pandemia
A pandemia do novo coronavírus afetou toda a programação televisiva. Do Brasil e do mundo. Os produtos mais afetados foram o do entretenimento, vide o agravamento da crise do setor cultural. E os programas de auditório sofreram uma inevitável descaracterização. Afinal, todos precisam da aglomeração das plateias. Portanto, os apresentadores se viram obrigados a apresentar suas respectivas atrações de casa ou no palco sem ninguém presente (com exceção da produção). E quem melhor se virou com o inusitado novo formato foi Serginho Groisman.
A maior identidade do "Altas Horas", que completou 20 anos no ar no dia 14 de outubro de 2020, era a plateia repleta de jovens estudantes e com uma proximidade muito grande com os convidados. Todos ficavam sentados em um auditório que fazia quase um círculo no estúdio. Era quase uma arena do entretenimento e da informação. O mesmo já acontecia desde a época do inesquecível "Programa Livre", no SBT. Enquanto não houver a vacina contra a COVID-19 nada disso será possível. Um hiato é inevitável. Mas se engana quem pensa que a alteração do formato afetou a qualidade da atração.
Serginho foi muito inteligente ao mesclar conteúdo inédito com reprises. Ao invés de simplesmente reprisar programas antigos, como ocorria com o "Domingão do Faustão" e "Caldeirão do Huck", o apresentador exibe trechos de algumas entrevistas ou números musicais do programa e entrevista o convidado ou a convidada que esteve na época da exibição via vídeo-chamada.
Também tem sido fundamental na divulgação das "estreias" de novas reprises da Globo. Vide a deliciosa entrevista recente que teve com Vera Fisher, Reynaldo Gianecchini e Carolina Dieckmann para falar da volta de "Laços de Família" (2000) no "Vale a Pena Ver de Novo".
As entrevistas remotas que Serginho vem fazendo duram cerca de dez a quinze minutos e enriquecem a atração. O "Conversa com Bial" iniciou esse recurso de uma forma muito bem-sucedida e Serginho acertou ao seguir com a mesma proposta, ainda que com uma duração mais curta. Outro ótimo momento foi um bate-papo descontraído do apresentador com Susana Vieira e Renata Sorrah relembrando "Senhora do Destino" (2004). Marina Ruy Barbosa também marcaram presença em vídeo-chamadas para uma homenagem ao sucesso da personagem "Eliza" na época de "Totalmente Demais" (2016). Vale destacar ainda sua entrevista com Marjorie Estiano para falar do especial "Sob Pressão - Plantão Covid".
O êxito do "Altas Horas" com esse novo formato implicou na mudança no "Domingão do Faustão". Fausto no início apenas gravava vinhetas em casa e a reexibição dominava quase todo o tempo de programa. Algumas semanas depois, o comunicador começou a realizar entrevistas de sua casa em vídeo-chamadas. Ivete Sangalo foi um das convidadas. Agora Faustão já voltou ao palco com a nova temporada da "Dança dos Famosos", mesmo sem plateia. Agora é preciso apontar essa mexida da produção após o acerto de Serginho. Sinal que realmente funcionou.
Serginho Groisman sempre foi um dos melhores apresentadores do país e o "Altas Horas" o programa de maior qualidade na televisão aberta. O vitorioso novo formato apenas comprovou que nem uma pandemia será capaz de alterar isso. Está tudo igual, apenas um pouco diferente.
Que História é Essa, Porchat? (2ª Temporada)
3.8 2A segunda temporada teve um ótimo início em março deste ano, só que as gravações foram interrompidas por conta da pandemia do novo coronavírus. Enquanto não havia ainda uma data para o retorno do programa, Fábio fez o "Que Quarentena É Essa, Porchat?" com episódios temáticos das reprises dos melhores momentos das duas temporadas. Posteriormente, emplacou o "Que História É Essa, Vovó?", com ótimas e breves entrevistas com veteranos como Gilberto Gil, Ary Fontoura, Rita Lee e Aracy Balabanian; e somente em exibição na internet. E após longos meses de incertezas, o formato voltou ao ar no GNT na primeira terça-feira de agosto, dia 04.
O receio sobre a perda de rumo da atração era inevitável. Afinal, como manter o interesse sem plateia e com os três convidados em vídeo-chamadas que correm o risco de queda de sinal e problemas do gênero?
Felizmente tudo se dissipou com o programa no ar. Fábio e sua produção conseguiram driblar todas as armadilhas impostas pela pandemia e mantiveram a qualidade do produto. Em um lindo cenário high-tech, o apresentador fica sozinho no estúdio e de frente para um imenso painel com a imagem dos três entrevistados do dia em destaque e pequenos círculos com pessoas que representam a plateia --- e também interagem e escutam as histórias. Por incrível que pareça, não houve mudança significativa no conjunto do formato. A conexão é excelente e a fala de ninguém é afetada por travamentos ou perdas de áudio, o que não prejudica o "timing" dos casos contados. Fafá de Belém, Rodrigo Hilbert e Leandro Hassum estiveram neste recomeço e brilharam.
O "Que História É Essa, Porchat?" chegou para ficar e a prova do sucesso é a reexibição da primeira temporada na TV aberta a partir desta quinta-feira, 15 de outubro ---- o primeiro programa reprisado foi com Ney Latorraca, Cláudia Raia e Marcos Veras. A trajetória é parecida com o elogiado "Lady Night", de Tatá Werneck --- o formato também migrou para a televisão com reprises, em virtude do sucesso no Multishow. Fábio Porchat conseguiu criar um produto simples e delicioso. Certeza que muitas outras temporadas já estão garantidas.
Fina Estampa
3.1 209 Assista AgoraRepleta de situações constrangedoras e personagens rasos, "Fina Estampa" não merecia qualquer reprise
A audiência prova que a Globo acertou em cheio quando escolheu "Fina Estampa" para ser reprisada no lugar de "Amor de Mãe", que teve as gravações interrompidas por conta da pandemia do coronavírus. Os elevados índices têm feito a alegria da emissora e são bem maiores que os números alcançados pela antecessora, escrita por Manuela Dias.
A trama central se baseia no chavão da mãe batalhadora que é humilhada pelo filho ambicioso e bonitão. A mulher em questão atende pelo nome peculiar de 'Griselda' e é interpretada pela grande Lília Cabral. Ainda entra em um triângulo amoroso com uma perua fútil e um homem educado e rico. René (Dalton Vigh) se interessa pelo lado puro da protagonista, o que provoca o ódio de sua esposa, Tereza Cristina (Christiane Torloni). E a vilã tem um mordomo (Crô - Marcelo Serrado), um gay caricato, que é tratado como um capacho. Um conjunto de clichês que costuma funcionar. Porém, nada disso se sustentou por muito tempo na época e fica possível constatar facilmente na reprise que chega ao fim na sexta-feira, de 18/09/2020.
Tereza Cristina tentava ser engraçada em certos momentos e cruel em outros, mas nunca conseguiu. Christiane Torloni procurava fazer o que era proposto, mas sua vilã era tão irritante e sem rumo que a atriz não conseguia uma atuação digna de aplausos. Nem podia fazer milagre.
Aguinaldo, na época, criticava vilões como a Flora ("A Favorita") e o Léo ("Insensato Coração") por serem vilões que agiam gratuitamente. Mas o propósito de Tereza Cristina não existia. O que movia suas supostas maldades contra Griselda? Apenas ciúme do marido? Esconder um segredo idiota? A ponto de até tentar assassinar os filhos da rival?
A novela afundou de vez quando a vilã empurrou um mafioso (Luciano Schirolli) que a ameaçava escada abaixo. Após o ato, Tereza agradeceu a Nazaré Tedesco e disse que fez isso porque aprendeu com a novela, exibida em 2004. Foi uma clara referência do autor ao sucesso da sua maior vilã em "Senhora do Destino". A sequência foi constrangedora em todos os aspectos. Qual foi o objetivo da cena? Um autoelogio do Aguinaldo. Nada fez sentido e a situação soou claramente forçada. Outro fator é a rivalidade entre a perua e Griselda (Lilia Cabral, grandiosa sempre). O ódio que a perua sente pela 'adversária' é boboca demais e só seria aceitável em um folhetim das sete.
No aspecto geral, a novela não andava. As histórias foram desenvolvidas a passos de tartaruga e o telespectador podia não assistir a trama por vários capítulos que não perdia algo de grande importância. A quantidade de personagens que nada acrescentavam era gritante. Qual a função do núcleo da praia? E da pensão da Zambeze (Totia Meirelles em um papel ingrato)? Aliás, eram perfis tão deslocados que foram praticamente cortados da reprise. Mal apareceram. A entrada de Carolina Dieckmann e Dudu Azevedo nada agregou à trama, além da interpretação limitada dos atores. E Dieckmann nem é má atriz, mas não conseguiu brilhar em um papel tão ruim. Arlete Salles, grande profissional, se viu com um papel de pífia importância. Sua taxista Wilma não serviu para nada. Teve como prêmio de consolação uma participação no "Caldeirão do Huck" no início da novela que nada acrescentou e foi uma bobagem só.
Renata Sorrah também não foi valorizada, apesar do seu núcleo ter sido um dos poucos que apresentaram uma história interessante. Mas a disputa pela guarda do sobrinho da doutora Danielle não foi bem abordada. Ana Rosa e Jaime Leibovitch (ótimos atores), que travaram uma guerra pela guarda do menino com a médica, mal se destacaram. Dan Stulbach e Julia Lemmertz tiveram boa química, mas a situação envolvendo a crise do casal por causa da inseminação artificial, que a esposa queria fazer e o marido era contra, andava em círculos.
As tentativas de conquistar mulheres pela internet era o enredo de René Junior (David Lucas). Difícil alguém se interessar por isso. Antenor e Patrícia formaram um casal sem o menor entrosamento. Caio Castro estava no pior momento de sua ainda inicial carreira e Adriana Birolli desaprendeu a atuar, após seu bom desempenho em "Viver a Vida" (2010). A violência doméstica sempre gera repercussão, mas a situação envolvendo Baltazar (Alexandre Nero), Celeste (Dira Paes) e Solange (Carol Macedo) era repetitiva e porcamente abordada. A garota só sabia dançar funk desde que apareceu na história. Detalhe: a música também era sempre a mesma. O agressor ainda foi perdoado pela esposa espancada e terminaram felizes. Isso porque o personagem fez uma dupla com Crô que caiu nas graças do público. O vilão virou elemento cômico através dos xingamentos homofóbicos que fazia contra o mordomo. O constrangimento da Globo com o núcleo é tão grande que toda a temática da violência foi quase escondida na reexibição. Até a trama da filha foi bastante editada. Quem não viu em 2011 dificilmente entende o que se trata o contexto envolvendo esses perfis.
Eva Wilma era um dos poucos pontos positivos com a sua Tia Íris. Sua parceria com a Thais de Campos (Alice) funcionou. Marcelo Serrado esteve muito bem como o afetado Crô, embora a veneração do mordomo em relação a Tereza Cristina tenha sido sem sentido. O perfil era uma caricatura e o ator fez o que foi pedido. Cumpriu a missão e entrou para o primeiro time da atores da emissora. Foi o maior destaque e tomou conta da história, que passou a se sustentar por muitas "esquetes" protagonizadas por ele. Não por acaso era o único personagem lembrado por grande parte dos telespectadores. Virou a "novela do Crô". Mas revendo atualmente fica perceptível como o perfil envelheceu mal. O gay afetado sempre existirá na teledramaturgia, pois existe na vida real, mas esse caso refletia em constantes humilhações nunca rebatidas pelo empregado.
O tal mistério envolvendo o segredo de Tereza Cristina era uma bobagem. Uma besteira ainda maior do que ser filha de uma empregada louca. Sim, esse "mistério" era uma mentida inventada por Tia Íris. O passado tão obscuro era a vilã ser fruto do marido de Íris com sua irmã. A tia nunca se conformou com o caso do esposo e inventou a origem humilde da sobrinha para "se vingar". A vilã era irmã de Álvaro (Wolf Maya) só por parte de pai. Ou seja, a perua cometeu inúmeros crimes por um segredo que nem era real. O outro enigma do enredo envolvia o namorado de Crô. Como o personagem cresceu, ganhou essa espécie de trunfo para aumentar ainda mais a audiência. Mas Aguinaldo não revelou a identidade do sujeito nem no último capítulo e citou como "referência" o final em aberto sobre o que tinha na caixa de Perpétua (Joana Fomm), em "Tieta". Mas, ao contrário do clássico de 1989, ficou evidente que o autor nem sabia quem era o tal namorado. Inventou para preencher o tempo dos capítulos e não conseguiu escolher o personagem que teoricamente já estava no enredo. O público foi feito de idiota. O enredo do mordomo foi tão mal colocado que a Globo também suprimiu na reprise. E a cena final até hoje é lembrada pela direção deprimente de Wolf Maya e a situação constrangedora criada pelo autor. Tereza Cristina foi dada como morta após uma sequência péssima da vilã naufragando com Pereirinha (José Mayer) em alto mar. Mas a perua apareceu na última cena em um carro de luxo debochando de Griselda, que foi atrás da inimiga segurando uma chave de grifo. Um desfecho vergonhoso.
"Fina Estampa" é um produto meramente escapista, mas nem para leveza funciona. A prova é a quantidade de personagens esquecíveis e tramas que não ficaram na memória. Até o ator Marco Pigossi (intérprete do machista Rafael), em uma live recente e deixando a ética de lado, declarou que a novela deveria ter sua reprise proibida pela quantidade de absurdos ditos no enredo. O grande público lembrar apenas do Crô é resultado da falta de densidade de todas as situações criadas por Aguinaldo Silva. A emissora teve uma boa estratégia ao escolher o folhetim de sucesso como "tapa-buraco", mas uma história desinteressante, rasa e com várias atuações abaixo da média não merecia ser reprisada em qualquer horário.
O Clone
3.8 401 Assista Agora"O Clone" foi uma bela criação da dramaturgia do Brasil
Entre 1º de outubro de 2001 e 14 de junho de 2002, a televisão aberta exibiu "O Clone", um de seus maiores sucessos, e ainda conseguiu emplacar em vários países, consolidando seu êxito. A novela de Glória Perez foi um de seus melhores trabalhos da carreira e a autora foi muito feliz na construção desta história tão rica e repleta de personagens atraentes.
Protagonizada por Giovanna Antonelli e Murilo Benício, o folhetim estreou pouco depois do atentado às Torres Gêmeas, tragédia que abalou os Estados Unidos e chocou o mundo. Houve até um certo desconforto inicial, uma vez que parte da trama era ambientada em Marrocos, na cidade de Fez, onde viviam vários muçulmanos. Mas a polêmica não durou muito tempo e os costumes daquele povo caíram no gosto popular, comprovando que o núcleo foi um dos muitos acertos da produção.
A novela abordou vários temas polêmicos e soube explorá-los com competência. Dividida em duas fase, a história começa em 1983, apresentando a vida de Leônidas (Reginaldo Faria), rico empresário, pai de gêmeos idênticos (Lucas e Diogo, vividos por Murilo), que não tem muito tempo para os filhos.
Jade (Vivida por Giovanna) é uma muçulmana que vive no Rio de Janeiro, quando acaba voltando para Fez, após a morte de sua mãe (Walderez de Barros). Os filhos de Leônidas vão passar férias em Marrocos com o padrinho de Diogo (o geneticista Albieri - Juca de Oliveira) e a partir de então o destino de Jade e Lucas se cruza.
O romance do casal protagonista, impedido pelos rígidos costumes da família da mocinha, arrebatou o telespectador e a química do par era evidente. Já o acidente de helicóptero que mata Diogo resulta na trama envolvendo a clonagem humana, uma vez que Albieri guarda as células de Lucas, depois que o rapaz vai em seu laboratório extrair uma pinta. Tudo para 'reviver' Diogo. A situação rendeu ótimos desdobramentos e ainda fez Murilo Benício se destacar, pois o ator acabou interpretando três personagens distintos, ainda que iguais: os gêmeos e o clone.
A segunda fase é iniciada em 2001, prosseguindo com todos os dramas apresentados na primeira e ainda acrescentando novos núcleos que deixaram a novela ainda mais interessante. O mais dramático foi o protagonizado por Débora Falabella, que impressionou com sua atuação na pele da rebelde Mel, uma viciada em drogas, filha de Lucas com Maysa (Daniela Escobar). As cenas mais fortes da novela foram vividas por ela e algumas entraram para a história da teledramaturgia pela entrega da atriz. O alerta sobre o consumo de substâncias ilícitas mesclou entretenimento e utilidade pública.
Já a parte cômica da história ficou por conta de duas personagens, cujos bordões ainda são lembrados pelo telespectador: Dona Jura (ótima Solange Couto) e Odete (maravilhosa Mara Manzan). Jura tinha um bar e vendia pastéis que faziam um baita sucesso. O bordão "Né brinquedo, não" virou febre, assim como o "Cada mergulho é um flash", proferido por Odete, personagem hilária interpretada pela saudosa Mara, que amava frequentar o Piscinão de Ramos e incentivava sua filha Karla (Juliana Paes) a dar o golpe da barriga --- essa trama hoje em dia seria bem criticada até pelas resoluções absurdas da autora.
O núcleo de Marrocos também obteve êxito e as danças dos personagens faziam sucesso, assim como as expressões ditas por eles, como o inesquecível "Ishalá", falado constantemente por Khadija (Carla Dias). A solteirona Nazira (Eliane Giardini) também foi outro destaque desta trama, assim como Zoraide (Jandira Martini), cúmplice e confidente de Jade. E impossível não lembrar do rabugento Tio Abdul (saudoso Sebastião Vasconcellos), defensor da moral e dos bons costumes, que vivia mandando as pecadoras "Arder no mármore do inferno".
utro acerto da novela foi a questão do alcoolismo, abordada com competência através de Lobato, vivido magistralmente por Osmar Prado. Nesse mesmo núcleo havia uma vilã que não media esforços para atingir seus objetivos, a Alicinha, muito bem interpretada por Cristiana Oliveira. Vale destacar também as brilhantes atuações de Cissa Guimarães (Clarisse) e Thiago Fragoso (Nando), que emocionaram várias vezes nas cenas onde a mãe se desesperava com o vício de drogas do filho, que era amigo das também viciadas Mel e Regininha (Viviane Victorette).
Além dos ótimos profissionais já citados, a novela também contou com outros excelentes atores, como Nivea Maria, Adriana Lessa (perfeita na pele de Deusa, a mãe do clone), Ruth de Souza, Elizângela, Beth Goulart, Antônio Calloni, Letícia Sabatella, Françoise Fourton, Perry Salles, Totia Meirelles, Guilherme Karan, Léa Garcia, Stênio Garcia e Marcello Novaes. A trama ainda foi a última da carreira do mestre Mário Lago, que veio a falecer meses depois.
Curiosamente, a reprise no Canal Viva serviu para observar melhor algumas falhas que não são muito faladas pelos saudosistas. O núcleo de Dona Jura é bem deslocado dos demais enredos e tem como única função preencher o tempo dos capítulos com convidados especiais que visitavam o bar da popular personagem. Era o elemento utilizado pela autora para enrolar o telespectador. Há uma barriga bem clara na história, algo bem comum na época, importante ressaltar. A primeira fase, principalmente, cansa pelo ritmo arrastado e os conflitos também se desgastam perto do meio da produção. Até as idas e vindas de Jade e Lucas se esgotam. A burrice dos protagonistas é outro problema evidente. A sorte foi mesmo a química dos intérpretes. Felizmente os meses finais reaquecem os dramas e a novela volta a prender.
"O Clone" foi um marcante folhetim e Glória Perez viveu um grande momento. Com 221 capítulos, a produção está na lista dos mais elogiadas e lembradas novelas da dramaturgia nacional e fez por merecer a boa aceitação da reprise no Canal Viva.
Novo Mundo
3.7 23Valeu rever a Proclamação da Independência do Brasil em "Novo Mundo"
A ótima "Novo Mundo" está em plena. E uma das muitas qualidades da trama de Alessandro Marson e Thereza Falcão foi a mescla de ficção com fatos históricos. Os autores foram muito habilidosos na construção de um folhetim clássico, tendo uma passagem importante da história do país como enredo central. E um dos momentos mais aguardados do enredo foi ao ar na exibição original, em 2017, bem no dia 7 de setembro: a declaração da Independência do Brasil.
Primeiramente, é preciso aplaudir a precisão dos escritores, há três anos, em colocar a cena justamente no dia que realmente aconteceu o fato. Obviamente, a precisão não foi se repetiu na reprise. Mas é apenas um detalhe. O grito de Dom Pedro (Caio Castro) foi arrepiante e conseguiu cercar esse momento emblemático com todo o clima necessário. Era um clímax bastante esperado, não apenas em virtude do contexto tão presente nos livros de história, como também pela trajetória do príncipe e da princesa que o público tem acompanhado desde a reestreia da novela.
A emoção da sequência foi temperada já no capítulo anterior com a exibição da belíssima cena em que Leopoldina (Letícia Colin) ignorou as ameaças da Corte Portuguesa e assinou a separação do Brasil de Portugal. Nomeada princesa regente pelo marido, a respeitável mulher reuniu os ministros e, com o apoio deles e de José Bonifácio (Felipe Camargo), tomou a decisão mais importante da história do país.
Após a assinatura, Joaquim (Chay Suede) ainda gritou "Viva o Brasil", provocando um inevitável sentimento de patriotismo em quem assistia, por pior que seja o atual cenário político. Todos os atores emocionaram, com destaque para Letícia.
Por sinal, vale observar que foi realmente Leopoldina que assinou a Independência. É um fato histórico. Mas, infelizmente, poucos dão importância e nem há um grande enfoque nos livros sobre isso, priorizando o grito de Dom Pedro. Esse é mais um ponto positivo da novela, pois houve uma justa valorização a um perfil tão importante para o Brasil. A princesa passou a ser vista e lembrada com outros olhos em grande parte por causa do folhetim. A força da teledramaturgia é muito grande e a própria atriz ficou marcada na carreira pela sua brilhante atuação, fazendo dessa personagem real uma pessoa tão cativante. Foi seu melhor momento até hoje.
A assinatura da princesa regente foi o gancho do capítulo, servindo de preparação para o grande momento. Após a passagem de Dom João (Leo Jaime) e Carlota Joaquina (Débora Olivieri), o casamento arranjado de Dom Pedro e Leopoldina, o retorno dos reis para Portugal e o Dia do Fico, chegou a hora da declaração da Independência do Brasil e pela primeira vez o contexto histórico teve mais importância que o enredo ficcional. O grito de "Independência ou Morte", com todos ao redor gritando jundo com Dom Pedro, foi de arrepiar.
A gravação da cena da proclamação durou quatro horas e reuniu 160 pessoas, entre equipe e figuração. Foram usadas 23 mulas, sete cavalos, 20 armas longas, 10 espadas e 80 figurinos de escravos, índios, fazendeiros, homens do campo e militares. Uma produção extremamente trabalhosa para um dos momentos mais esperados do enredo. E o resultado foi perfeito, valendo todo o esforço.
A cena da Independência do Brasil foi marcada pela cuidadosa direção de Vinícius Coimbra, bom texto dos autores e entrega do elenco, que mergulhou no clima de um dos momentos mais citados e lembrados da História do Brasil em "Novo Mundo".
Valeu muito a pena rever!
Novo Mundo
3.7 23Humilhação de Domitila destacou Agatha Moreira em "Novo Mundo"
E um dos momentos mais aguardados da trama foi a queda de Domitila (Agatha Moreira). A amante de Dom Pedro (Caio Castro), conhecida nos livros de História como a Marquesa de Santos, acabou mais vilanizada pelos autores Alessandro Marson e Thereza Falcão, privilegiando o bom folhetim, criando assim uma maior rivalidade com a doce princesa Leopoldina (Letícia Colin). A estratégia se mostrou um acerto e o desmascaramento da personagem destacou a atriz.
Inicialmente, Domitila parecia uma vítima sofredora, padecendo com as agressões do marido violento (Felício - Bruce Gomlesvky) e sofrendo nas mãos da irmã, a interesseira Benedita (Larissa Bracher). O início de seu romance com Chalaça (Rômulo Estrela), por sinal, rendia cenas delicadas para o casal. Entretanto, aos poucos, a verdadeira face da mulher foi sendo exposta para o público através de atitudes egoístas e traiçoeiras. O lado maquiavélico se firmou desde que ela adotou como principal meta a sua aproximação de Dom Pedro, com o intuito de se livrar do marido e conseguir a guarda dos filhos.
Mas, na verdade, Domitila sempre quis uma vida luxuosa e a posição de princesa do Brasil. Tanto que assim que conseguiu a guarda das crianças, as internou em um colégio. Também não pensou duas vezes antes de trair Chalaça, fazendo o amante odiar seu até então melhor amigo.
Quanto mais manipulava Dom Pedro, mais conseguia atingir seus objetivos, passando por cima de todos que atravessassem seu caminho. Se aliou até a Thomas (Gabriel Braga Nunes) para conseguir um dinheiro à parte através de acordos políticos, usando o príncipe como isca. Ou seja, ela acabou virando a maior vilã do enredo.
E, como sempre ocorre com as diabas das novelas, a maior expectativa era justamente em torno da sua desgraça. A longa espera valeu a pena. A sequência em que Chalaça armou uma cilada para a víbora, proporcionando o esperado flagra de Dom Pedro, ficou muito boa, destacando Agatha Moreira, Caio Castro e Rômulo Estrela. A atriz emocionou no confronto da mau-caráter com o ex, fazendo uma ótima dobradinha com Rômulo. Domitila confessou todas as suas armações e ainda tentou sensibilizar o amigo do príncipe demonstrando um falso arrependimento. A cena foi difícil, explorando o poder de manipulação daquela mulher.
Já o restante da sequência, com Dom Pedro transbordando de ódio para o desespero da amante, se mostrou ainda melhor. O marido de Leopoldina finalmente enxergou a verdadeira Domitila, não escondendo a fúria e a decepção. O momento em que ele a expulsou do Solar, a jogando no meio da rua, lavou a alma do público.
Alessandro Marson e Thereza Falcão foram corajosos na alteração da história real de Domitila em prol de uma boa ficção. Afinal, é sabido que a Marquesa de Santos nunca foi uma mulher sem caráter ou "malvada" e seguiu como amante de Dom Pedro, indo até morar junto com Leopoldina. Porém, seria demais acompanhar toda essa triste história também no mundo da fantasia. É certo que a vilã terminará com o príncipe novamente, pois não é possível tamanha liberdade poética. A melhor solução criada pelos autores foi o encerramento do enredo antes da morte da princesa do Brasil. E valeu acompanhar pela segunda vez essa derrocada de Domitila na reprise de "Novo Mundo". Agatha Moreira foi a maior beneficiada e na época nem imaginava que dois anos antes interpretaria uma personagem mais sarcástica e a melhor de sua carreira até então: a Giovana, de "Verdades Secretas", em 2015.
Malhação Sonhos
3.9 83Há seis anos estreava Malhação Sonhos, uma das melhores temporadas do seriado, escrita por Rosane Svartman e Paulo Halm. Tinha trama, humor, ação, musicais lindos, casais apaixonantes, personagens carismáticos, elenco talentoso, enfim...Que saudades. Um belo dia resolvi mudar...
No dia 14 de julho de 2014 estreava "Malhação Sonhos", substituindo a fracassada "Malhação Casa Cheia", iniciada em 2013. A partir de então, o público começou a acompanhar uma trama adolescente repleta de tipos críveis, que precisavam enfrentar muitos dilemas e, apesar das inúmeras diferenças de personalidade, tinham algo em comum: todos sonhavam. O sonho era o que movia todos os personagens, sem exceção. Pois esta saga, que durou mais de um ano e envolveu o telespectador, chegou ao fim nesta sexta (14/08/2015), com um capítulo emocionante, tenso e irretocável.
Escrita por Rosane Svartman e Paulo Halm, com direção de Luiz Henrique Rios e Marcus Figueiredo, a história prendeu a atenção desde o primeiro capítulo. Apesar de ser um seriado adolescente, esta temporada foi voltada para todas as idades, uma vez que abordou diversos assuntos com propriedade, sem subestimar o público. O sucesso alcançado fez jus ao conteúdo de qualidade que foi apresentado. Não ficou devendo a nenhuma ótima novela, cujos gastos de produção são bem maiores. E esta foi praticamente a mesma equipe responsável pela "Malhação Intensa", exibida em 2012/2013, que também conseguiu conquistar o telespectador através de um enredo bem escrito.
A saga de vários jovens que buscavam seus sonhos foi muito bem desenvolvida pelos autores, que conseguiram manter o ritmo da história, evitando maiores enrolações ou estagnação do roteiro. O esquema de rodízio em torno dos casais e dos dramas de cada núcleo foi uma das principais razões para o êxito na condução da história.
Enquanto uma trama ficava em evidência, repleta de reviravoltas, as demais serviam para 'sustentá-la', deixando um pouco os outros conflitos em compasso de espera. Assim, o enredo ia se encaminhando sem qualquer sinal de desgaste e muito menos com a sensação de 'barriga' ou repetição.
E todas as tramas tiveram seu momento de destaque. A história mesclou com extrema competência a comédia e o drama, havendo ainda muitos musicais, que ajudaram a permear toda a temporada com clipes lindos. Outro grande acerto foi a criação dos casais: todos os pares românticos funcionaram e apresentaram conflitos que envolveram o telespectador. Tanto os principais ---- compostos por Duca (Arthur Aguiar) e Bianca (Bruna Hamu), Pedro (Rafael Vitti) e Karina (Isabella Santoni), Cobra (Felipe Simas) e Jade (Anaju Dorigon) ----, quanto os coadjuvantes ---- compostos por Mari (Malu Campos) e Jeff (Cadu Libonati), Dandara (Emanuelle Araújo) e Gael (Eriberto Leão), Sol (Jeniffer Nascimento) e Wallace (Antônio Carlos), entre outros.
Colocar como pano de fundo uma Academia de Artes (a Ribalta) e uma de Lutas (a do Gael, que ainda rivalizava com a Khan), fazendo uma espécie de comparação entre dois universos completamente distintos, ao mesmo tempo que semelhantes em alguns aspectos, foi mais uma sacada de mestre. Os ambientes complementaram perfeitamente toda a história que foi sendo contada ao longo dos meses. E os relacionamentos estabelecidos, entre os frequentadores destes distintos locais, ajudou bastante nas interações, que muitas vezes resultavam em inúmeros conflitos. Afinal, Duca e Wallace, por exemplo, se apaixonaram por uma atriz e uma cantora, respectivamente, enquanto o guitarrista Pedro se viu envolvido com uma lutadora nada calma. Já o lutador Cobra se envolveu com a dançarina Jade, entre tantas outras relações peculiares. E houve também espaço para semelhante se atrair por semelhante, vide o dançarino Jeff e a cantora Mari.
A história contou ainda com bem construídos vilões, que ajudaram a movimentar o enredo e não ficaram devendo em nada aos 'malvados' de horários mais tardios. Apesar das limitações da Classificação Indicativa,
Lobão (Marcelo Faria) e Heideguer (Odilon Wagner) esbanjaram canalhice e crueldade, fazendo de tudo para atingir seus objetivos. O empresário era um poço de ambição e ganhava dinheiro fraudando torneios de muay thai, enquanto o treinador servia como seu capacho e aliado nos esquemas de apostas. Porém, o psicopata dono da Academia Khan tinha uma fixação por Gael ---- ele nunca perdoou o ex-amigo depois que o mesmo abandonou as lutas para ficar com a esposa ---- e este seu lado passional provocava uma constante rixa com o ricaço.
Vários temas importantes foram abordados e funcionaram muito bem na condução da trama.
A gravidez na adolescência foi explorada através do drama de Mari; a homofobia pôde ser vista na relação entre o pai Lincoln (Edmilson Barros) e o filho Jeff; o câncer de mama foi tratado com grande sensibilidade com a luta de Lucrécia (Helena Fernandes) pela cura da doença ---- houve até uma cena marcante da personagem fazendo um autoexame, que gerou repercussão ----; o sexismo foi exposto em virtude das atitudes de Duca e Gael em relação ao desejo de Bianca ser atriz e no de Karina em ser lutadora; e o racismo se evidenciou assim que Sol e Wallace melhoraram de vida.
Já as atrativas viradas se mostraram vitais para o fôlego da temporada. Muitas situações tensas e dramáticas marcaram a história, quase sempre provocando uma empolgante reviravolta.
O assassinato de Alan (Diego Amaral), irmão de Duca, foi uma delas. Atropelado por Lobão, o rapaz, que estava prestes a desmascarar o esquema de apostas dos vilões, não resistiu aos ferimentos e sua morte foi um choque para os personagens, destacando o talento dos atores, entre eles Arthur Aguiar e Iná de Carvalho (Dona Dalva). A revelação do suborno de Bianca --- que pagou Pedro para namorar sua irmã --- foi a mais forte, uma vez que culminou na armação de Lobão, que fingiu ser o verdadeiro pai da menina. E tudo só veio à tona depois que Bianca sofreu uma tentativa de sequestro, sendo salva por Duca.
Além destas, outras viradas empolgantes movimentaram a história, como: o início do Warriors
--- marcando a nova vida de Karina ao lado de Lobão ---; luta entre Nat (Maria Joana) e Lobão --- que culminou no desaparecimento da personagem, quase morta pelo vilão ---; o sequestro de Karina --- a garota ficou mantida em cárcere privado no apartamento do 'falso pai' ---; a ameaça de Heideguer aos familiares de Cobra no meio do Warriors; a internação de Dona Dalva; o esperado embate final entre Duca e Cobra no torneio --- cuja vitória foi do mocinho ---; a luta demonstrativa entre Lobão e Gael --- onde o canalha dopou o adversário e tentou matá-lo ---; o salvamento de Karina; a fuga de Cobra e Jade --- que ficaram perdidos em um lugar distante ---; a revelação de que Cobra é filho de Gael; o ataque do psicopata Haroldo (Álamo Facó); a prisão de Heideguer --- entregue pelo próprio filho, Henrique (Michel Joelsas) ---; a volta de Nat --- encontrada por Luiz (Maurício Pitanga) em uma clínica psiquiátrica ---; a quase morte de Cobra; a fuga de Nat da clínica; o plano de Lobão para separar Duca e Bianca --- provocando ainda um rompimento do lutador com Gael ---
Os romances também foram os responsáveis por muitos bons momentos, gerando grandes torcidas do público. A química esteve presente em todos os pares.
Pedro e Karina divertiam com o clima do primeiro amor e as constantes brigas do menino medroso com a garota estressada eram hilárias. A relação de Duca e Bianca era a representação do Gael com sua falecida esposa --- o lutador que não aceita a profissão da atriz --- e os dois precisaram enfrentar uma avalanche de problemas, onde uma gota no oceano ou simples grão de areia mudava tudo, até o final feliz. Cobra e Jade tinham um relacionamento quente e repleto de ironias, que culminou em um lindo casamento. Mari e Jeff eram o retrato da cumplicidade e do afeto, enquanto Sol e Wallace se sobressaíam através da arrogância da cantora, que mandava na relação. João tinha uma paixão por Bianca e a venerava, mas, depois de muito insistir e não ser correspondido, encontrou o amor nos braços de Vicki, menina tão debochada quanto ele. Lírio (Paulo Dalagnoli) e Ruiva (Ana Rios), Dandara e Gael, Delma (Patrícia França) e Renê (Mário Frias); Lincoln e Rute (Josie Antello) também se destacaram. E além de João com Bianca, aliás, alguns outros pares foram formados, como Duca e Nat, Lírio e Joaquina, Henrique e Bianca, Wallace e Ruiva, entre tantas outras 'combinações'.
O elenco foi repleto de gratas revelações e escalações acertadas. Arthur Aguiar, Bruna Hamu, Rafael Vitti, Isabella Santoni, Felipe Simas e Anaju Dorigon brilharam, honrando a importância dos seus personagens, uma vez que todos moviam a história. Guilherme Hamacek foi ganhando cada vez mais destaque em virtude do seu bom desempenho e Jeniffer Nascimento se sobressaiu através do seu inquestionável talento vocal. Malu Campos foi outra cantora que se mostrou uma boa atriz e emocionou cada vez que soltou sua voz. Já Yasmin Gomlesvsky se entregou na pele da doida Joaquina, que de maluca não tinha nada, e ganhou um justo destaque na reta final. Maria Joana engrandeceu o elenco com sua presença e Nat foi o seu melhor papel até então (ela também esteve em "Araguaia" e "Flor do Caribe"). Outros bons nomes foram Jean Amorim (Marcão), Bruno Fraga (Zé), Ana Rios (Ruiva), Paulo Dalagnoli (Lírio), Lellêzinha (Guta), Jéssica Lobo (Fabi), Dani Dillan (Paula), Gabriel Reif (Rominho), Bianca Vedovato (Tomtom), Ramon Francisco (Rico), Caio Lucas Leão (Luiz Cláudio), Cadu Libonati (Jeff), Antônio Carlos (Wallace), Manu Gavassi (Vicki) e Maurício Pitanga (Luiz), que teve sua importância aumentada nos últimos meses.
Mas os atores mais experientes também fizeram a diferença na temporada. Iná de Carvalho deu um verdadeiro show vivendo a descolada Dona Dalva; Eriberto Leão viveu seu melhor momento na carreira interpretando Gael; Marcelo Faria se destacou na pele do diabólico Lobão; Patrícia França convenceu com sua responsável Delma; Emanuelle Araújo brilhou atuando e cantando com sua doce Dandara; Felipe Camargo se saiu muito bem vivendo o atrapalhado Marcelo; Danielle Suzuki exibiu sua sensualidade através da solitária Roberta; Leo Jaime novamente divertiu revivendo o Nando da "Malhação Intensa"; Mário Frias fez um cativante Renê; e foi um imenso prazer ver Odilon Wagner interpretando um personagem que fez jus ao seu talento. O Heideguer foi um vilão odiável e muito bem escrito. Já Helena Fernandes e Guilherme Piva esbanjaram sintonia, protagonizando inúmeras cenas ótimas através do inusitado 'casal' Lucrécia e Edgar. Ainda é preciso citar o talentoso Edmilson Barros, que divertiu com o arretado Lincoln (o bordão "Mas meniiiiino" era impagável), Josie Antello, Edvana Carvalho (Bete) e Ademir de Souza (que participou durante alguns meses vivendo o canalha Simplício).
A trilha sonora (nacional e internacional) foi outro ponto que complementou este harmônico conjunto. Foram várias músicas bem selecionadas e que ajudaram a contar a história, entre elas: "Agora só falta você" (Pitty), tocada na abertura; "Uma Gota no oceano" (NXZero), tema de 'Duanca'; "Tudo que você quiser" (Luan Santana), tema de 'Majeff'; "Quase sem querer" (Maria Gadú), tema de 'Perina'; 'Beside You' (Simply Red), tema de Karina e Cobra; "I told you so" (Kathryn Dean ---- que fez uma ótima participação na última semana), tema de 'Cobrade'; "Your Window Pain" (Kirsch & Bass), tema de Karina; "Love me again" (John Newman); "Ela me deixou" (Skank); "Meu novo mundo" (Charlie Brown Jr.); "Shake the room" (Gamu); "Summer" (Calvin Harris); "BOP" (Raimundos); entre tantas outras. Foi um presente para os ouvidos.
Mais uma ideia acertada foi a interação através do site da trama, chamado de 'transmídia'. Os telespectadores escreveram várias cenas curtas (chamadas de Fanfics) e os autores selecionaram uma para ir ao ar.
A felizarda foi a autora da sequência em que Bianca sonhava que estava com Duca e João ao mesmo tempo, ocorrendo uma alusão ao clássico "Dona Flor e seus dois maridos". Outra criação de uma fã, que também migrou para a televisão, foi o sonho de Pedro, imaginando Gael e Karina transformados em vampiros ---- houve, inclusive, uma lembrança ao último bom folhetim de Antônio Calmon: "O Beijo do Vampiro".
A reta final da trama foi repleta de emoção e cenas tensas, honrando tudo o que a temporada veio apresentando desde a estreia.
O casamento de Cobra e Jade foi lindo, assim como a reconciliação de Duca e Bianca. A união de Bianca e Jade (as cunhadinhas), aliás, foi um acerto, primando pela comicidade. O relacionamento de João e Vicki mostrou que o nerd encontrou uma garota que o ama pelo que ele é. Já o plano de Lobão, que aproveitou a falta de memória de Nat para manipulá-la, movimentou os momentos mais derradeiros. A luta do vilão com Duca foi muito bem feita, assim como o embate entre Nat e o mocinho. A cena da perseguição ao mestre da Khan também teve uma produção caprichada e a chegada de Josefina (Nanda Costa) ---- que conseguiu comprar a fábrica que servia de local para a academia de Gael e para a Ribalta ---- serviu como um 'bônus' que ajudou a deixar os acontecimentos finais mais tensos, revelando ainda a verdadeira Joaquina, que enganou os personagens e o público.
Os últimos capítulos mesclaram situações emocionantes com outras repletas de adrenalina. A cena em que Lucrécia revela para Edgar que ele é o pai de Jade foi arrepiante.
Helena Fernandes, Guilherme Piva e Anaju Dorigon protagonizaram um momento tocante, que apenas expôs o laço que já existia naquela família. A declaração de amor que Duca fez para Bianca, em meio ao espetáculo "A Megera Domada" ---- que inspirou o par 'Perina' ----, foi outra bonita cena. A sequência do nascimento do filho de Dandara e Gael também primou pela emoção, uma vez que todo o passado aterrorizante do mestre veio à tona --- sua primeira esposa faleceu no parto de Karina. A chegada do bebê, chamado de Miguel (uma referência indireta ao personagem de "Sete Vidas" que teve sete filhos ---- afinal, além de Karina, Bianca e Cobra, Gael também é um pouco pai de João, Pedro e Duca), foi delicada e um belo clipe (ao som de "Amor pra recomeçar", do Frejat) coroou este momento.
Já a tensão ficou por conta de Lobão e Josefina. O mestre da Khan sequestrou Karina ---- um dos maiores clichês novelescos, principalmente no penúltimo capítulo ---- para atrair Gael e conseguiu levar seu rival para onde queria. Esta relação obsessiva que o lutador tinha com o ex-amigo lembrou muito, inclusive, o ódio que Flora (Patrícia Pillar) nutria por Donatella (Cláudia Raia) em "A Favorita". A luta entre os personagens foi excepcional e teve como 'pano de fundo' o incêndio da Ribalta, provocado pelo parceiro da vilã (Paulo - Cleiton Moraes). Os dois lutavam, enquanto a fábrica era corroída pelo fogo. Foram cenas de extremo capricho e recheadas de adrenalina. A tensão aumentou ainda mais quando Nat e Pedro arrombaram a fábrica e conseguiram ajudar Gael. O guitarrista, inclusive, teve um atitude heroica e salvou a sua 'chamuscadinha'. Já Duca lutou com Luiz e Nat acabou salvando Lobão (seu algoz) do incêndio, mandando o canalha direto para cadeia para vê-lo pagar por seus crimes.
E após a sucessão de cenas tensas, o último capítulo ficou voltado para a sensibilidade. Todos se reuniram na fictícia praça José Wilker (uma homenagem ao saudoso ator) e cantaram "É preciso saber viver" (clássico de Roberto Carlos e Erasmo Carlos, tocado também pelos Titãs), protagonizando o último clipe da temporada, que ficou tão lindo quanto os anteriores. Lucrécia, Gael, Nando e Edgar fizeram um belo discurso sobre a arte de sonhar, que precisou ser renovada depois da Ribalta ter sido destruída pelo fogo. Além deste bonito momento, o público ainda pôde ver a punição de Josefina, que acabou presa junto de seu comparsa. E os casais tiveram seus merecidos finais felizes, sendo uma grata surpresa a exibição de um beijo entre duas meninas e dois homens, em meios aos inúmeros pares que se formaram na trama.
Já a última cena lembrou o desfecho da temporada "Intensa", dos mesmos autores. Nando ('coincidentemente' o personagem que participou das duas temporadas) contou o final de todos os personagens e foi emocionante ver os sonhos se realizando, um a um. Sol virou uma cantora de sucesso (uma Beyoncê brasileira); Pedro um guitarrista famoso; João um comediante de sucesso; Jade uma enfermeira dedicada; Cobra um lutador vitorioso; Nat uma campeã de muay thai; e Karina finalmente começou a lutar profissionalmente, sendo treinada pelo seu pai. Bianca se transformou em uma atriz requisitada; Wallace foi treinar na Tailândia; e Duca e Gael viraram sócios em uma Academia chamada de "Força e Honra". O único 'pesadelo' foi de Heideguer, Lobão e Luiz, que acabaram presos na mesma cela e jogando xadrez. Uma punição merecida. A imagem final foi com todo o elenco, direção e equipe reunidos na cidade cenográfica, soltando balões em meio a fogos de artifício. Um encerramento belíssimo de uma temporada que entrou para a lista das melhores.
Com um final irretocável, "Malhação Sonhos" fecha seu ciclo e entra para a lista das melhores temporadas
Com um final irretocável, "Malhação Sonhos" fecha seu ciclo e entra para a lista das melhores temporadas
"Malhação Sonhos" ficou praticamente 14 meses no ar, ou seja, mais de um ano. Foram 280 capítulos. Após a bem-sucedida temporada em 2013 ("Intensa"), Rosane Svartman, Paulo Halm e equipe conseguiram mais uma vez apresentar uma trama de grande qualidade. Os autores, inclusive, se mostram aptos para a estreia de "Totalmente Demais", primeira novela da dupla, cuja estreia será em novembro, no horário das sete. A fase, que acaba de ter o seu longo e elogiado ciclo fechado, conquistou o público, a crítica e ainda conseguiu comemorar os 20 anos do seriado adolescente (completados em abril) em grande estilo ----- afinal, a audiência também correspondeu, elevando os índices da temporada passada. Foram muitos dramas, risos, músicas e tensão ao longo deste tempo. E valeu muito a pena ter acompanhado cada conflito, cada reviravolta, cada relação, cada história. Porém, tudo tem um prazo para terminar e é bom que se encerre deixando um gosto de saudade, como esta temporada deixou. O sonho foi delicioso e deu para aproveitá-lo ao máximo. Mas chegou a hora de acordar. Resta agora a lembrança que ficou de uma produção onde absolutamente tudo funcionou. Força e honra!
Mais Você
3.1 5Por que o "Mais Você" ainda não voltou à grade da Globo?
A programação matutina da Globo sofreu uma drástica alteração logo no início da pandemia do novo coronavírus, há mais de três meses. O jornalismo dominou as manhãs e programas como o "Mais Você" e o "Encontro" saíram do ar. Porém, a emissora resolveu trazer de volta a atração de Fátima Bernardes 49 dias depois. E inseriu Ana Maria Braga em um quadro de receitas dentro do formato da colega. Na verdade uma reprise das melhores receitas. Essa alteração vem provocando algumas dúvidas pertinentes.
Primeiramente, é preciso ressaltar as razões óbvias para o afastamento de Ana. A apresentadora tem 70 anos e está no grupo de risco da COVID-19. A doença é a principal causa das mortes dos idosos durante a pandemia. Para culminar, Ana está recém-curada de um terceiro câncer e na época do surgimento do coronavírus no Brasil ainda estava em pleno tratamento. A Globo agiu com todo o cuidado necessário e merece reconhecimento.
Todavia, as aparições de Ana Maria no meio do "Encontro" provam que o retorno do "Mais Você" já deveria ter acontecido há pelo menos dois meses. Claro que seria um absurdo a apresentadora ir diariamente aos Estúdios Globo gravar seu programa, como tem feito Fátima Bernardes.
Mas Ana está atualmente em sua fazenda e vem anunciando as reprises de suas melhores receitas, e até realizando ações de merchandising, de lá. A imagem, vale observar, é de ótima qualidade, o que prova ser oriunda de equipamentos fornecidos pela própria emissora. Não são gravações feitas em celular ou computador/notebook.
Se Ana Maria Braga tem conseguido apresentar muito bem de sua fazenda através da boa estrutura fornecida pela emissora, qual a razão do "Mais Você" ainda não ter retornado? Não haveria problema nem nas gravações de matérias com repórteres, como Talitha Morete, uma vez que Ana apenas chamaria as reportagens, como já fazia bem antes do surgimento da pandemia. Não ocorreria apenas as entrevistas com artistas da Globo presencialmente e nem faria falta. A única presença a mais da fazenda da loura seria de Tom Veiga como Louro José. Ou nem isso, pois o parceiro da apresentadora poderia aparecer em chamada de vídeo.
É preciso lembrar que o "Mais Você" sempre foi uma das maiores audiências da Globo nas manhãs. Ana Maria Braga tem um público muito fiel que vem sentindo falta da apresentadora. Um quadro curto no meio do "Encontro" é muito pouco para o tamanho da apresentadora. Como medida emergencial, é algo compreensível. Mas semana passada Luciano Huck já voltou a gravar seu programa nos estúdios. Faustão retornará em breve. Ana só poderá ir aos estúdios quando a vacina for finalmente criada. Então, até lá, será um mero quadro de reprises durante o programa de Fátima Bernardes? Não dá mesmo para a apresentadora comandar o seu tão longevo formato de sua fazenda?
A resposta é bem óbvia: é perfeitamente possível. Basta a Globo querer.
Totalmente Demais
3.7 50 Assista Agora"Minha irmã chorando o pão que o diabo amassou e o Arthur com esse arroto de cenoura!!!"
"Vc com uma periguete com idade pra ser SUA NETA!!!! Vai jogar viode-game, pirralha, que os adultos estão conversando!"
"Se vc bancar o Arthur e me trocar por uma periguete de 20 anos eu vou no médico e ponho silicone até na lingua pra pegar geral. Experimenta!!!!!!!!!"
DORINHA HAHAHAHAHAHHAHAHA