Sabia que eu e a Jean Seberg tínhamos afinidades, afora o nascimento em um fatídico 13 de novembro. A dor. A solidão. A tristeza. O abandono. O mundo não tem espaço para a tristeza. Por isso nos isolamos, com um sorriso de pedra no rosto. 80 silenciosos minutos. Mudos. Dolorosos como a própria vida.
Aquela atmosfera da solidão e da velhice que me vi arrebatado com o "Era uma vez em Tóquio" volta aqui. Não sei se nesse entremeio o tema aparece em outras obras. Espero que sim, quero mergulhar. A velhice é sempre um medo. Medo por nos colocar diante da morte. Ou eliminar as relações antipodais vida/morte. E como Ozu faz isso com maestria. O cinema de Ozu é como andar de bicicleta: uma vez que assiste, você nunca esquece. Fica para a vida. Grande aprendizagem.
Tenho muito medo da velhice. Quer dizer, da solidão da velhice. Do abandono. O peso do tempo. A morte. Lembro-me sempre do sábio Norbert Elias que dizia que a velhice começa com o abandono, até afastarmos a morte de nosso convívio. Aí o Ozu toca fundo. Toca como estado de arte. E como doi. Como doi n'alma.
Confesso que só tomei gosto pelo filme nos 10min. finais. E fez daquilo que (me) estava sendo tedioso algo interessantíssimo -- a trilha sonora meio Senhor dos Anéis com Harry Potter não ajudaram nada. O filme constrói uma atmosfera muito boa: a busca pela sabedoria e pelo sentido da vida. Há uma coloração muito forte do budismo nessa busca, ou do que podemos chamar de "filosofia budista", se nos reportarmos ao budismo primitivo indiano. E quando eu digo que o final tornou interessante o tedioso foi justamente na apoteose do ciclo, ou da roda da fortuna, que recai sobre o protagonista do filme. Ai sim, o filme vale como um exímio aprendizado a nós, lógicos, aristotélicos e cultuadores do materialismo. Agora, se a intenção dos diretores foi essa, ou construir uma aventura qualquer, não se sabe. Na minha sessão, após o filme, um dos diretores estava presente mas falou pouco, detendo-se mais sobre os aspectos técnicos e o processo criativo. Não obstante, fica aí o dado lançado.
Bressane radicalizou em seu novo filme. Poético, gestual, cheio de citações, diretas e indiretas, flertando com o mitológico e o simbólico. De Platão, passando pelos neoplatônicos, aos poetas românticos do séc. XIX: um aprendizado (a descrição do pai morto que se suicidou no fogão da cozinha, referência ao suicidio do poeta marginal Torquato Neto? Não duvido..). E ainda: Lua, noite, escritura: quão blanchotiano! Esse filme precisa ser exibido nas faculdades de Letras!!! Meu desejo!!! (Também quero uma educação sentimental, Bressane. Sensibilidade...)
P.s: A locação inicial, aquela ladeira, é a mesma locação do seu anterior RUA APERANA 52 ???
O que eu comento em outros filmes do Bianchi, torno a dizer aqui: Bianchi é uma metralhadora, com toda a força sartreana possível. Mais um filme-bala ao estilo MATO ELES e DIVINA PREVIDÊNCIA. E ainda coloca um mestrando da USP (há cenas gravadas na fflch) obrigado a tomar partido e terminar sua tese, mais uma dessas teses-para-enfeitar-biblioteca (e não tenho dúvida que Bianchi não quis meter o dedo nessa babaquice que é o espaço atual da pós-graduação). Grande filme. Espero rever.
(Tive a sorte de ter o Bianchi na sessão de estreia na Mostra de SP, e o próprio Bianchi , antes de o filme começar, meteu crítica numa jornalista que entendeu completamente errado o filme. Infelizmente há quem não consiga acompanhar e penetrar na esfera crítica machadiana de Bianchi, como o jovem abaixo. Pena..).
Nunca chorei tanto em um filme!! Eu e as pessoas ao redor, na sala de cinema, ilhadas em pranto!! Que filme!! Um filme que nos conduz às coisas mais simples da vida. Um filme que busca a felicidade e mostra que ela é , sim, possível, pela ótica de Mateusz, desce cedo diagnosticado com paralisia cerebral. Mateusz, uma incógnita. Mateusz, imcompreensível. Um objeto, um obstáculo, um estorvo. Vegetal. A luta de Mateusz: uma luta com o corpo, com as palavras, com o olhar -- sua comunicação. Uma luta pela compreensão, pelo amor, pela vida. Mostrar que não é obstáculo, que não é vegetal. Que é gente. E aí, melhor que muitos livros de filosofia, nos mostra e nos diz: o que é a vida. CHCE SIE ZYC é um filme raro. Que todos deviam ver. Um filme para refletirmos: que fazemos, nós, da vida? Ficarei aqui, imerso, me perguntando. E por um bom tempo.
Um bom filme. Confesso que muito me identifiquei com a solidão do escrevente das cartas. Talvez não tivesse efeito em outro suporte, como e-mail. A carta traz esse jogo de poesia e mistério. Que casa com o filme. Acho que vou escrever umas. P.S: muito lembrou-me o CACHÉ, do Haneke e a sua construção de uma atmosfera de mistério e busca.
Documentário importantíssimo para quem estuda o Guimarães Rosa ou se interessa. No atual momento nosso em que falar da vida do autor está se tornando proibido (ah, a ironia da história), este documentário só vem a somar na fortuna crítica rosiana. Um doc. riquissimo, desde entrevista com dois singulares professores da UFMG e criticos literários, Eneida Maria e Wander Melo, a judeus que tiveram suas vidas cruzadas com a do diplomata Rosa. Além da voz do próprio Rosa comentando suas obras (este é um ponto interessante do doc. quando o Rosa toca na questão na poesia e é algo que passa "batido" em sua crítica: o crítico alemão pergunta a Rosa se dos contos "longos" de Corpo de Baile aos contos curtos do Primeiras Estórias, Rosa iria desembocar na poesia. O próprio Rosa muito bem lembra que ele já começou poeta. E vale descatar que Rosa segue poeta!! Mesmo na prosa...). Que OUTRO SERTÃO circule pelos cinemas. Afinal, o sertão está em nós. Todo meu agradecimento às realizadoras.
Que lindo filme!! Fui ver na Mostra de Cinema de Sp movido pela sinopse, que já maldosamente delineou a relação dos personagens como "ambigua" (odeio sinopses carregadas de spoiler, mas.. E quem não viu o filme, não continue neste comentário, por favor). Devo confessar que não vi ambiguidade no filme. Mas sim a descoberta de uma cúmplice amizade. Uma amizade transcendente. Uma relação quase beirando o místico. Uma relação movida (pela parte do tio) pela solidão, pelo estar só. OU no máximo dos máximos a reafirmação da tese heideggeriana de "estar-com-os-outros". A união - mesmo que essa acepção esteja carregada de mística. Ao meu ver, esse foi o "centro" do filme. E não digo isso arbitrariamente. Digo pensando em cineastas como o russo Alexsandr Sokurov, que muito bem filmou a oniricidade de uma relação entre dois corpos, o brilho de uma amizade transcendente. Ou um Carlos Hugo Christensen, inspirado em Guimarães Rosa, na poesia do encontro, na poesia da relação, na poesia do dois. Logo, com esses senhores e com esse pensamento que me oponho à ambiguidade e vejo o filme. Claro, não é a verdade imutável e eterna, pois não creio nisso. No mais, um filme para ficar gravado na vida.
maravilhoso. a câmera de Ozu toca como "estado de arte" no drama familiar, concentrado no pai, chefe de familia, tipico homem que resolve os problemas da rua, mas é incapaz de resolver os problemas de sua casa. E se vê nesse embate. Aí Ozu consegue magistralmente costurar os conflitos e dar fluido à exegese. Sem dúvida, um excelente filme p/ se debater a questão moral -- essa "moral" tão hasteada maldosamente pelo conservadorismo atual (e isso faz do filme atual) -- de uma tradição peculiar como a nipônica. Filme para se aprender. Hoje e sempre...
Não funcionou muito bem comigo. Pena. O filme tem seus pontos altos. Mas a trilha sonora meio comédia romântica francesa arruinou com o que poderia ser o ponto alto da poeticidade. Quer dizer, a trilha sonora, a meu ver, nada coerente com o "possível" da questão, arruinou com a minha relação com o filme. (pontuo sempre o cuidado em minha crítica e o ofício do afastar-me do "espevara mais", tão caro aos bravateadores do cinema). Há imagens e jogos de linguagens interessantes no filme. O sentido do barco e o sentido do deserto, por ex. Poderíamos ler com o velho Drummond e parodiá-lo: Mar não há mais, Marat, e agora? Mas o final do filme é ainda mais hiperbólico e, mais uma vez, arruina aquilo que chamo de "minha relação com o filme". O que eu, leitor-espectador incauto, pergunto é: nonsense?? Se em outro espectador funcionar, que bom. Quanto a mim, espero não ver barcos tão cedo.
Que filme maravilhoso!!!! De modo peculiar, o filme coloca a crise econômica como pano de fundo e toca como "estado de arte" na fragilidade humana, na fragilidade da vida, no cerne da existência, no centro, no sofrimento, nos liames dos laços afetivos. De modo peculiar, vai da crítica ao humano. Em um intenso diálogo e em um único espaço-temporal, o filme se (des)dobra. Flui. Anda. Recua. Corta. Fala pelas sondas do inconsciente (os cortes em preto-e-branco).
(Quando a protagonista diz que o mundo não gosta de pessoas que sofrem.. Ah, perfeito. Lembro-me sempre do sábio filósofo Blaise Pascal. O mundo gosta do divertimento. Pensar é sofrer. E como a protagonista desse filme sabe o que é sofrimento!!!!) Favorito porque é preciso. E que possamos aprender com o cinema espanhol contemporâneo.
Cru é realmente, como já apontado aqui, uma palavra-chave do filme. Olivier mais Francis. Este, um duplo. Ou melhor: uma dupla falta. E quantos Oliviers e Francis não estão por aí afora. Meu primeiro dos Dardenne. Doeu. Ainda estou lá na marcenaria..
Gostei do jogo da organização social posta no filme e dos elementos alinhados, como o pavor à heterogeneidade de Elysium na secretária Rhodes, uma Hitler do futuro a fundar Elysium apenas para elysianos. Lembrou-me muito de alguns contos do Cortázar. Fortemente. * * * E como não tenho doutorado em Cinema (e deus me livre em tê-lo), não me interessa o blablabla da atuação e da fotografia. Ganha-se muito discutindo o protagonista Max. A semiótica do corpo hibrido, não semiótica puramente fenomenológica: que corpo é esse que falamos? Como pensar a relação corpo x sentido nesse espaço? Que corpo cultural é esse? Não é isso o "pós-humano" que discute-se na semiótica? Não é esse o "corpo biocibernético" que diz a semioticista Lucia Santaella? Ora, e não é Elysium tão bem um "duplo" de nossa realidade????????? Pois bem. É um filme interessante para se ver/debater. Quem não gostou, paciência. Cada um com seus discursos.
De todos que vi do Paradjanov, esse foi o que mais me encantou, me tocou, me dilacerou.. Um verdadeiro encontro entre a poesia e a música, entre o trovador--rapsodo e a palavra cantada, ou para lembrar do ensaísta Octavio Paz, o encontro do nascimento da poesia ocidental com a música e com a dança. Tudo isso é muito próprio nesta obra. Certamente, um filme de encontros. De muitos encontros e diálogos. (E que cena belíssima do trovador
Lindíssimo, embora eu não tenha compreendido algumas cenas. Mas a cena do emparedamento é uma das coisas mais lindas que já vi. "Se o povo tem um mancebo capaz de se emparedar numa muralha da fortaleza, então esse povo e esse país são invencíveis"...
"E quem foi que disse que a poesia não embriaga?" Obra magistral do Claudio Assim. Traz um forte traço do que foi o "movimento Beat", poesia nas ruas, na estrada, na vida. Poesia libertária. De Kerouac a Ginsberg até o boom de nossa poesia despojada brasileira, com Leminski e demais. Aliás, "despojado" é palavra-chave no filme. Filme que vale muito mais que todo meu curso de Letras. Lembro sempre d'um poema do Manuel Bandeira, "Nova Poética", que diz que o poema deve ser uma nódoa que suja o paletó branco do sujeito. O Poema deve conter a "marca suja da vida". Sujar aquele leitor 100% virgens e as meninininhas estrelas-alfas. Sujar o bom-mocismo. E certamentente, à Bandeira, o filme e a poesia de Claudio Assis são essa nódoa de lama no paletó da caretice!!! (E sim, rapariga e cachaça são poesia, "tome e receba"!!!!).
Uma das coisas mais absurdamente maravilhosas que já vi no espaço cinematográfico. Muito além de uma mera biografia do poeta e trovador armênio Sayat Nova, do século XVIII. Como diz a epígrafe do filme, uma recriação simbolista e alegórica do mundo interior do poeta. Pra quem se interessa por poesia, este filme é fundamental. Uma poesia pra ser sentida... e com a alma... Experiência contemplativa.. Ou uma presença do Neoplatonismo.
Um ótimo filme para o velho debate "o que é literatura", "realidade x ficção", ou quando a imaginação é fuga.. e melhor. Entre loucura e manicômios, loucos abandonados em meio à guerra da Chechênia de 1996. Filme bárbaro. Um aprendizado p/ a vida. Sim, aprende-se muito com os loucos. E com estes então.
Excelente documentário sobre o Tarkovsky. Nos 10 primeiros minutos o doc. toca numa peculiar questão, que é a da chuva nos filmes do cineasta, assim como há no cinema de Kurosawa, retratando a sensibilidade nipônica e o elo com a natureza ("phýsis", como diziam os gregos). Isso me fez lembrar um texto que li na Revista Contracampo, não lembro o nome do autor, que dizia ser a obra de Tarkovsky um "cinema úmido". E as frases finais....belíssimo. Doc. pra se ver e rever.
Saí arrasado da sala de cinema. Peguei um ônibus, pensei na existência. Na minha solidão. No vazio do mundo (quase como se assistisse a um filme de Tarkovsky). Ilhado. Assim como Petra, me olho no espelho e não vejo nada através de meus olhos. Vazio. Uma fala de Petra nas cenas finais são magistrais e dolorosas: "Eu me afogo em você. Em Ofélias". Também me afogo em Elena. Todos nós -- e aí o documentário ganha na universalização.
. Uma luta da memória contra o esquecimento, contra a sombra do traumático. Silêncio? A saída: não esquecer (Em um texto, o prof. e pesquisador da Unicamp Marcio Seligmann-Silva diz-nos: "lembrar de esquecer, não esquecer de lembrar"). Um doc. que mais é um grito. Ou um exorcisar de traumas. A frase final dita por uma mulher sintetiza:
Altas Solidões
4.0 11Sabia que eu e a Jean Seberg tínhamos afinidades, afora o nascimento em um fatídico 13 de novembro. A dor. A solidão. A tristeza. O abandono. O mundo não tem espaço para a tristeza. Por isso nos isolamos, com um sorriso de pedra no rosto. 80 silenciosos minutos. Mudos. Dolorosos como a própria vida.
A Rotina Tem Seu Encanto
4.2 29 Assista AgoraAquela atmosfera da solidão e da velhice que me vi arrebatado com o "Era uma vez em Tóquio" volta aqui. Não sei se nesse entremeio o tema aparece em outras obras. Espero que sim, quero mergulhar. A velhice é sempre um medo. Medo por nos colocar diante da morte. Ou eliminar as relações antipodais vida/morte. E como Ozu faz isso com maestria. O cinema de Ozu é como andar de bicicleta: uma vez que assiste, você nunca esquece. Fica para a vida. Grande aprendizagem.
Era uma Vez em Tóquio
4.4 187 Assista AgoraTenho muito medo da velhice. Quer dizer, da solidão da velhice. Do abandono. O peso do tempo. A morte. Lembro-me sempre do sábio Norbert Elias que dizia que a velhice começa com o abandono, até afastarmos a morte de nosso convívio. Aí o Ozu toca fundo. Toca como estado de arte. E como doi. Como doi n'alma.
Dendrologium
2.5 2Confesso que só tomei gosto pelo filme nos 10min. finais. E fez daquilo que (me) estava sendo tedioso algo interessantíssimo -- a trilha sonora meio Senhor dos Anéis com Harry Potter não ajudaram nada. O filme constrói uma atmosfera muito boa: a busca pela sabedoria e pelo sentido da vida. Há uma coloração muito forte do budismo nessa busca, ou do que podemos chamar de "filosofia budista", se nos reportarmos ao budismo primitivo indiano. E quando eu digo que o final tornou interessante o tedioso foi justamente na apoteose do ciclo, ou da roda da fortuna, que recai sobre o protagonista do filme. Ai sim, o filme vale como um exímio aprendizado a nós, lógicos, aristotélicos e cultuadores do materialismo.
Agora, se a intenção dos diretores foi essa, ou construir uma aventura qualquer, não se sabe. Na minha sessão, após o filme, um dos diretores estava presente mas falou pouco, detendo-se mais sobre os aspectos técnicos e o processo criativo. Não obstante, fica aí o dado lançado.
Educação Sentimental
3.4 32Bressane radicalizou em seu novo filme. Poético, gestual, cheio de citações, diretas e indiretas, flertando com o mitológico e o simbólico. De Platão, passando pelos neoplatônicos, aos poetas românticos do séc. XIX: um aprendizado (a descrição do pai morto que se suicidou no fogão da cozinha, referência ao suicidio do poeta marginal Torquato Neto? Não duvido..). E ainda: Lua, noite, escritura: quão blanchotiano! Esse filme precisa ser exibido nas faculdades de Letras!!! Meu desejo!!!
(Também quero uma educação sentimental, Bressane. Sensibilidade...)
P.s: A locação inicial, aquela ladeira, é a mesma locação do seu anterior RUA APERANA 52 ???
Jogo das Decapitações
3.6 20O que eu comento em outros filmes do Bianchi, torno a dizer aqui: Bianchi é uma metralhadora, com toda a força sartreana possível. Mais um filme-bala ao estilo MATO ELES e DIVINA PREVIDÊNCIA. E ainda coloca um mestrando da USP (há cenas gravadas na fflch) obrigado a tomar partido e terminar sua tese, mais uma dessas teses-para-enfeitar-biblioteca (e não tenho dúvida que Bianchi não quis meter o dedo nessa babaquice que é o espaço atual da pós-graduação). Grande filme. Espero rever.
(Tive a sorte de ter o Bianchi na sessão de estreia na Mostra de SP, e o próprio Bianchi , antes de o filme começar, meteu crítica numa jornalista que entendeu completamente errado o filme. Infelizmente há quem não consiga acompanhar e penetrar na esfera crítica machadiana de Bianchi, como o jovem abaixo. Pena..).
Quero Viver
4.3 23Nunca chorei tanto em um filme!! Eu e as pessoas ao redor, na sala de cinema, ilhadas em pranto!! Que filme!!
Um filme que nos conduz às coisas mais simples da vida. Um filme que busca a felicidade e mostra que ela é , sim, possível, pela ótica de Mateusz, desce cedo diagnosticado com paralisia cerebral. Mateusz, uma incógnita. Mateusz, imcompreensível. Um objeto, um obstáculo, um estorvo. Vegetal. A luta de Mateusz: uma luta com o corpo, com as palavras, com o olhar -- sua comunicação. Uma luta pela compreensão, pelo amor, pela vida. Mostrar que não é obstáculo, que não é vegetal. Que é gente. E aí, melhor que muitos livros de filosofia, nos mostra e nos diz: o que é a vida. CHCE SIE ZYC é um filme raro. Que todos deviam ver. Um filme para refletirmos: que fazemos, nós, da vida?
Ficarei aqui, imerso, me perguntando. E por um bom tempo.
Caracóis Na Chuva
3.2 43Um bom filme. Confesso que muito me identifiquei com a solidão do escrevente das cartas. Talvez não tivesse efeito em outro suporte, como e-mail. A carta traz esse jogo de poesia e mistério. Que casa com o filme. Acho que vou escrever umas.
P.S: muito lembrou-me o CACHÉ, do Haneke e a sua construção de uma atmosfera de mistério e busca.
Outro Sertão
4.1 9Documentário importantíssimo para quem estuda o Guimarães Rosa ou se interessa. No atual momento nosso em que falar da vida do autor está se tornando proibido (ah, a ironia da história), este documentário só vem a somar na fortuna crítica rosiana. Um doc. riquissimo, desde entrevista com dois singulares professores da UFMG e criticos literários, Eneida Maria e Wander Melo, a judeus que tiveram suas vidas cruzadas com a do diplomata Rosa. Além da voz do próprio Rosa comentando suas obras (este é um ponto interessante do doc. quando o Rosa toca na questão na poesia e é algo que passa "batido" em sua crítica: o crítico alemão pergunta a Rosa se dos contos "longos" de Corpo de Baile aos contos curtos do Primeiras Estórias, Rosa iria desembocar na poesia. O próprio Rosa muito bem lembra que ele já começou poeta. E vale descatar que Rosa segue poeta!! Mesmo na prosa...).
Que OUTRO SERTÃO circule pelos cinemas. Afinal, o sertão está em nós. Todo meu agradecimento às realizadoras.
O Brilho do Dia
4.0 2Que lindo filme!! Fui ver na Mostra de Cinema de Sp movido pela sinopse, que já maldosamente delineou a relação dos personagens como "ambigua" (odeio sinopses carregadas de spoiler, mas.. E quem não viu o filme, não continue neste comentário, por favor).
Devo confessar que não vi ambiguidade no filme. Mas sim a descoberta de uma cúmplice amizade. Uma amizade transcendente. Uma relação quase beirando o místico. Uma relação movida (pela parte do tio) pela solidão, pelo estar só. OU no máximo dos máximos a reafirmação da tese heideggeriana de "estar-com-os-outros". A união - mesmo que essa acepção esteja carregada de mística. Ao meu ver, esse foi o "centro" do filme. E não digo isso arbitrariamente. Digo pensando em cineastas como o russo Alexsandr Sokurov, que muito bem filmou a oniricidade de uma relação entre dois corpos, o brilho de uma amizade transcendente. Ou um Carlos Hugo Christensen, inspirado em Guimarães Rosa, na poesia do encontro, na poesia da relação, na poesia do dois. Logo, com esses senhores e com esse pensamento que me oponho à ambiguidade e vejo o filme. Claro, não é a verdade imutável e eterna, pois não creio nisso. No mais, um filme para ficar gravado na vida.
Flor do Equinócio
4.3 13maravilhoso. a câmera de Ozu toca como "estado de arte" no drama familiar, concentrado no pai, chefe de familia, tipico homem que resolve os problemas da rua, mas é incapaz de resolver os problemas de sua casa. E se vê nesse embate. Aí Ozu consegue magistralmente costurar os conflitos e dar fluido à exegese. Sem dúvida, um excelente filme p/ se debater a questão moral -- essa "moral" tão hasteada maldosamente pelo conservadorismo atual (e isso faz do filme atual) -- de uma tradição peculiar como a nipônica. Filme para se aprender. Hoje e sempre...
Waiting for the Sea
3.0 1Não funcionou muito bem comigo. Pena. O filme tem seus pontos altos. Mas a trilha sonora meio comédia romântica francesa arruinou com o que poderia ser o ponto alto da poeticidade. Quer dizer, a trilha sonora, a meu ver, nada coerente com o "possível" da questão, arruinou com a minha relação com o filme.
(pontuo sempre o cuidado em minha crítica e o ofício do afastar-me do "espevara mais", tão caro aos bravateadores do cinema).
Há imagens e jogos de linguagens interessantes no filme. O sentido do barco e o sentido do deserto, por ex. Poderíamos ler com o velho Drummond e parodiá-lo: Mar não há mais, Marat, e agora?
Mas o final do filme é ainda mais hiperbólico e, mais uma vez, arruina aquilo que chamo de "minha relação com o filme". O que eu, leitor-espectador incauto, pergunto é: nonsense?? Se em outro espectador funcionar, que bom. Quanto a mim, espero não ver barcos tão cedo.
Ontem Nunca Termina
3.5 5Que filme maravilhoso!!!! De modo peculiar, o filme coloca a crise econômica como pano de fundo e toca como "estado de arte" na fragilidade humana, na fragilidade da vida, no cerne da existência, no centro, no sofrimento, nos liames dos laços afetivos. De modo peculiar, vai da crítica ao humano. Em um intenso diálogo e em um único espaço-temporal, o filme se (des)dobra. Flui. Anda. Recua. Corta. Fala pelas sondas do inconsciente (os cortes em preto-e-branco).
(Quando a protagonista diz que o mundo não gosta de pessoas que sofrem.. Ah, perfeito. Lembro-me sempre do sábio filósofo Blaise Pascal. O mundo gosta do divertimento. Pensar é sofrer. E como a protagonista desse filme sabe o que é sofrimento!!!!)
Favorito porque é preciso. E que possamos aprender com o cinema espanhol contemporâneo.
O Filho
3.9 45Cru é realmente, como já apontado aqui, uma palavra-chave do filme. Olivier mais Francis. Este, um duplo. Ou melhor: uma dupla falta. E quantos Oliviers e Francis não estão por aí afora. Meu primeiro dos Dardenne. Doeu. Ainda estou lá na marcenaria..
Guerra Conjugal
3.4 14Grandioso filme do Joaquim P. Andrade!! E que dó do sofrimento de Amália. Que só ri finalmente
com a morte do marido - e como ri, com sua boca quase banguela.
Fico e acompanho as palavras do josé carlos avellar sobre o filme: "Num processo antropofágico, o Brasil devora os brasileiros". sem mais.
Elysium
3.3 2,0K Assista AgoraGostei do jogo da organização social posta no filme e dos elementos alinhados, como o pavor à heterogeneidade de Elysium na secretária Rhodes, uma Hitler do futuro a fundar Elysium apenas para elysianos. Lembrou-me muito de alguns contos do Cortázar. Fortemente.
* * *
E como não tenho doutorado em Cinema (e deus me livre em tê-lo), não me interessa o blablabla da atuação e da fotografia.
Ganha-se muito discutindo o protagonista Max. A semiótica do corpo hibrido, não semiótica puramente fenomenológica: que corpo é esse que falamos? Como pensar a relação corpo x sentido nesse espaço? Que corpo cultural é esse? Não é isso o "pós-humano" que discute-se na semiótica? Não é esse o "corpo biocibernético" que diz a semioticista Lucia Santaella? Ora, e não é Elysium tão bem um "duplo" de nossa realidade?????????
Pois bem. É um filme interessante para se ver/debater. Quem não gostou, paciência. Cada um com seus discursos.
O Trovador Kerib
4.2 11De todos que vi do Paradjanov, esse foi o que mais me encantou, me tocou, me dilacerou.. Um verdadeiro encontro entre a poesia e a música, entre o trovador--rapsodo e a palavra cantada, ou para lembrar do ensaísta Octavio Paz, o encontro do nascimento da poesia ocidental com a música e com a dança. Tudo isso é muito próprio nesta obra. Certamente, um filme de encontros. De muitos encontros e diálogos.
(E que cena belíssima do trovador
beijando o pombo
A Lenda da Fortaleza Suram
4.1 13Lindíssimo, embora eu não tenha compreendido algumas cenas. Mas a cena do emparedamento é uma das coisas mais lindas que já vi.
"Se o povo tem um mancebo capaz de se emparedar numa muralha da fortaleza, então esse povo e esse país são invencíveis"...
Febre do Rato
4.0 657"E quem foi que disse que a poesia não embriaga?"
Obra magistral do Claudio Assim. Traz um forte traço do que foi o "movimento Beat", poesia nas ruas, na estrada, na vida. Poesia libertária. De Kerouac a Ginsberg até o boom de nossa poesia despojada brasileira, com Leminski e demais. Aliás, "despojado" é palavra-chave no filme. Filme que vale muito mais que todo meu curso de Letras.
Lembro sempre d'um poema do Manuel Bandeira, "Nova Poética", que diz que o poema deve ser uma nódoa que suja o paletó branco do sujeito. O Poema deve conter a "marca suja da vida". Sujar aquele leitor 100% virgens e as meninininhas estrelas-alfas. Sujar o bom-mocismo.
E certamentente, à Bandeira, o filme e a poesia de Claudio Assis são essa nódoa de lama no paletó da caretice!!!
(E sim, rapariga e cachaça são poesia, "tome e receba"!!!!).
A Cor da Romã
4.1 133Uma das coisas mais absurdamente maravilhosas que já vi no espaço cinematográfico. Muito além de uma mera biografia do poeta e trovador armênio Sayat Nova, do século XVIII. Como diz a epígrafe do filme, uma recriação simbolista e alegórica do mundo interior do poeta. Pra quem se interessa por poesia, este filme é fundamental. Uma poesia pra ser sentida... e com a alma... Experiência contemplativa.. Ou uma presença do Neoplatonismo.
Casa dos Loucos
4.0 27Um ótimo filme para o velho debate "o que é literatura", "realidade x ficção", ou quando a imaginação é fuga.. e melhor. Entre loucura e manicômios, loucos abandonados em meio à guerra da Chechênia de 1996. Filme bárbaro. Um aprendizado p/ a vida. Sim, aprende-se muito com os loucos. E com estes então.
Um Dia na Vida de Andrei Arsenievitch
4.5 5Excelente documentário sobre o Tarkovsky. Nos 10 primeiros minutos o doc. toca numa peculiar questão, que é a da chuva nos filmes do cineasta, assim como há no cinema de Kurosawa, retratando a sensibilidade nipônica e o elo com a natureza ("phýsis", como diziam os gregos). Isso me fez lembrar um texto que li na Revista Contracampo, não lembro o nome do autor, que dizia ser a obra de Tarkovsky um "cinema úmido". E as frases finais....belíssimo. Doc. pra se ver e rever.
Elena
4.2 1,3K Assista AgoraSaí arrasado da sala de cinema. Peguei um ônibus, pensei na existência. Na minha solidão. No vazio do mundo (quase como se assistisse a um filme de Tarkovsky). Ilhado. Assim como Petra, me olho no espelho e não vejo nada através de meus olhos. Vazio.
Uma fala de Petra nas cenas finais são magistrais e dolorosas: "Eu me afogo em você. Em Ofélias".
Também me afogo em Elena. Todos nós -- e aí o documentário ganha na universalização.
P.S: Uma das cenas finais mais lindas que já vi,
a de Petra e a mãe no lago. Antológico!!
Que Bom Te Ver Viva
4.3 55 Assista Agora"Tempos de chumbo". Diz-nos uma das mulheres em depoimento:
“nosso corpo como objeto de tortura"
Uma luta da memória contra o esquecimento, contra a sombra do traumático. Silêncio? A saída: não esquecer (Em um texto, o prof. e pesquisador da Unicamp Marcio Seligmann-Silva diz-nos: "lembrar de esquecer, não esquecer de lembrar"). Um doc. que mais é um grito. Ou um exorcisar de traumas. A frase final dita por uma mulher sintetiza:
"tentar não esquecer e continuar vivendo".
Para quem se interessa pelo tema da Memória, História e Esquecimento, é uma obra antológica. Se eu pudesse, dava 10 estrelas.