Resisti por mais de dez anos a ideia de rever esse filme. Às vezes tenho medo de descobrir que essas coisas que mais me tocaram na vida perderam o sentido, o impacto. Considerando a temática do filme, talvez, neste caso, fosse interessante essa perda , provavelmente eu estaria mais adaptado a tudo, mas não aconteceu, o impacto permanece. Tanta coisa foi vivida, perdida, superada, mas o impacto é o mesmo. Talvez eu não tenha mudado quase nada fundamentalmente, pensar nisso me atormenta, mas me conforta, também. É contraditório mesmo. Eu ainda acho que eles continuaram a história em algum lugar, e isso me alegra um pouco. E me alegra saber que ainda sou o cara que acredita nisso.
Talvez, pensando rapidamente, a escolha do personagem líder dos "invasores" como um alemão, tipicamente alemão, pudesse ser encarado como um clichê imperdoável, mas não vejo assim. Às vezes, é importante pegar emprestado do imaginário coletivo uma imagem facilmente identificável para reforçar o seu ponto, deixá-lo cristalino, torná-lo o mais acessível possível - esse não deveria ser um dos mais primordiais objetivos de qualquer Arte? Penso ser o caso. O que esse filme diz precisava ser dito dessa forma, límpida, crua. E admiro profundamente a coragem dos envolvidos em todo o processo por fazerem-no AGORA.
Outro possível choque para o público talvez seja a interpretação equivocada de que o filme se trata de uma espécie de levante regionalista. Mas não, longe disso. Quando os personagens “brasileiros do sul” argumentam que não são nascidos na região de Bacurau, e sim numa região próspera e descendente de europeus... os “invasores” os ridicularizam, e os lembram de que no fim eles são só, no máximo, mexicanos brancos – e mexicanos brancos capazes de fazer qualquer serviço sujo, inclusive tornarem-se assassinos de sua própria gente. O complexo vira-latista encarnado pelos “brasileiros do sul” na verdade é uma metáfora para o pensamento reinante da classe média brasileira que se aliena de sua condição de ser brasileiro, e tenta se imergir desesperadamente numa fantasiosa auto percepção estrangeirada, bebendo como se um líquido divino fosse qualquer ditame europeu branco, como se isso os fosse desvencilhar de sua condição de “primitivos semi-selvagens”. Jessé de Sousa escreve com brilhantismo sobre essa condição vira-lata desses brasileiros que odeiam tudo que nós somos, mas que no fim, como é dito no filme, não passam de mexicanos brancos.
Algo que me tocou muito nesse filme foi uma pergunta - feita por duas vezes: “por que vocês fazem isso?” A resposta não é dada inicialmente e depois nos chega como: “Eu não sei!”, dito pela personagem feminina estrangeira que sobrevive ao primeiro revide dos moradores. Para mim, a não-resposta dada é de interpretação ampla, mas me soou, também, como um processo profundo de alienação. Os estrangeiros, na condição simbólica de exploradores, no fim, não se veem pertencentes da mesma categoria de humanos dos moradores de Bacurau. Para eles, os nativos não são mais do que animais em caça, com baixa capacidade de resistência – excelentes candidatos, assim, para servirem de distração ao tédio dos dias.
Imediatamente ao terminar o filme lembrei de uma visita que fiz ao museu da escravidão, na cidade de Redenção, no Ceará: O museu preserva a Casa Grande, e também a Senzala. A imagem que eu tinha desses ambientes era formatada pelas produções nacionais que retratavam a época. Ver de perto aquela estrutura, com meus olhos in loco, foi absurdamente perturbador, especialmente por um detalhe macabro: a Senzala ficava no subsolo da Casa Grande. Havia na Senzala várias divisões: o local para dormida, outro que servia como uma espécie de solitária, para os mais rebeldes e também havia um local para punição e açoite, onde os escravos tinham suas mãos presas no alto junto à parede, para facilitar as chibatadas e excluir qualquer possibilidade de revide. Ver toda aquela estrutura me fez pensar: como pode a Casa Grande estar localizada EXATAMENTE em cima da Senzala??? Seriam os moradores do andar de cima totalmente PSICOPATAS??? Uma família inteira de psicopatas!!! Só podia ser isso! Tinha que ser isso! Nenhum ser humano seria capaz de ignorar os sons vindos das profundezas de seu subsolo, não quando esses sons fossem produzidos por outros seres humanos, pensei! Ah, não ser que... os moradores de cima não vissem os moradores de baixo como seres humanos! É isso! De repente as coisas me ficaram lógicas. Os senhores de engenho não enxergavam os escravos como seres humanos; eram apenas coisas, posses, objetos capazes de lhes prouverem tudo aquilo que lhes parecia necessário, e para isso podiam se utilizar da sua força de trabalho, ou de seus corpos – com as mucamas/escravas sexuais - ou suas vidas, para aplacar um dia mais pesado de tédio, talvez.
A mesma coisificação que servia como auto legitimação por parte dos senhores de engenho não se difere de forma fundamental da auto legitimação que faz os povos “mais desenvolvidos” deste tempo presente acharem aceitável sua condição de exploradores do mundo. A questão é que – terrivelmente – essa coisificação não se encerra dentro da leitura de mundo dos “exploradores”, ou dos “mexicanos brancos” – tão ávidos para conseguir o seu passaporte para a terra prometida dos exploradores. Essa coisificação alicerça toda uma estratégia de dominação e é implantada na mentalidade de cada explorado desde o dia que nasce, em cada sabotagem do sistema de Ensino... Este filme percebe todo esse intrincado e propõe ações. Propõe resistência, de dentro da Escola, e dos nossos museus, é o caminho, o único caminho.
Não assisti a esse filme no Cinema, o que me faz lamentar muito perder toda a energia coletiva espantada que certamente emanou em cada sala onde essa obra prima foi rodada. Mas, ontem, quando assisti pela primeira vez, no Youtube, numa Live de Cinema – que nem sabia que existia... notei que junto comigo assistiram ao vivo mais de 65.000 mil pessoas!!! E pensei: Caralho, acho que nunca mais vou participar de uma sala de cinema tão grande!
A quem ainda está aqui me lendo, minhas últimas palavras: esse filme dialoga profundamente com o trabalho do sociólogo Jessé de Souza. Se você chegou até aqui, o sentimento que essa obra te causou vai permanecer com você por uma bom tempo, talvez pela vida toda; então, como sugestão para você dialogar mais um pouquinho com esse sentimento, te deixo como uma indicação urgente a leitura do livro do Jessé: “A classe média no espelho: Sua história, seus sonhos e ilusões, sua realidade”.
Post Scriptum:
Eu imagino que a maioria das pessoas que lerão esta resenha virão aqui depois de terem visto a live do dia 18/06/2020, junto comigo, de muuuitos lugares desse Brasil. Deixo um abraço fraterno a cada um de vocês. E vamos fazer o que o filme sugere! Resistir.
Não sou um fã de Sigur Rós, mas sou um grande fã de cinema e só dá pra pensar que esses caras fizeram um filme genial, um filme que jorra "poesia" por todos os poros. Por mais mais que essa palavra esteja tão desgastada, que tenha tido seu sentido tão pulverizado, banalizado... não consigo imaginar outra que sintetise melhor o impacto natural desse filme: poesia.
Por diversas vezes eu pausei só pra deixar o estalo que o filme iniciou no meu pensamento reverberar.
Definitivamente é um filme capaz de mudar algo em mim, e espero que em todos os outros que o vejam também.
ps: depois de ver os amantes do círculo polar, e esse filme, eu TENHO que ir até a Islândia.
Há alguns exemplos de excelentes filmes americanos que se valeram dessa fórmula de contar dramas de núcleos distintos, todos interligados por um fio. O problema desse foi a falta de apego na abordagem do tema... expandiram de uma forma tão grotesca que perdeu o sentido e a unidade.
O conto do garoto que fazia chats pornôs na net é tão mais amplo que fica tosco e absurdo forçar a inclusão dele na idéia inicial de alta conectividade... e não é o único.
Além disso, a proposição do filme em si é um pouco bizarra. Agora vamos desconectar??? Talvez fosse uma boa também pararmos de usar aviões, porque, em guerra, aviões matam... A vida não passa por um período de virtualização, de desapego tátil... ela evoluiu para isso, é o que, agora, somos e seremos. É fato consumado. A questão caótica dos valores é outra história... e é simplesmente bobo atribuir uma parcela profunda desse caos à virtualização da vida.
hehe Cabei lembrando uma frase do Caetano: "... vai sempre matar amanhã o velhote inimigo que morreu ontem."
Achei a trilha sonora terrível, a exceção de Air, e não há como negar que a trama tinha um desfecho previsível também, mas a atuação dos protagonistas foi tão boa... talvez seja a melhor representação de desejo que já vi no cinema. Quando vi Chimo observar a passagem de Lila pela primeira vez, pensei 'esse cara tá muito ferrado'. E ainda tem essa frase do Chimo:
"ESTA GAROTA É CAPAZ DE CAUSAR UMA GUERRA SANTA" . E era mesmo.
Quando eu não tou legal, eu gosto de caminhar por ruas movimentadas. Gosto porque ver as pessoas seguindo por tantos caminhos, ouvir os sons do dia, observar algum animal vadio transitando me faz sentir menor. Menor em um sentido literal... me faz ter uma dimensão menos egocêntrica de mim mesmo. Eu sempre acabo pensando alguma coisa assim: a vida vai acabar seguindo de alguma forma, não importa o que me aconteça... os problemas então parecem um pouco menores e eu me sinto melhor. Esse filme me fez vivenciar essa sensação numa escala planetária. O mundo é tão vasto, as pessoas podem ser tão terríveis. Mas, por outro lado, toda a beleza não-natural que existe fomos nós que criamos. É claro que o oposto disso também é verdade, mas porra! Temos pelo menos um copo meio cheio pra louvar. Não há só fel espalhado por todos os poros do mundo. De tudo, uma frase aparentemente banal do ciclista coreano, que já passou por mais de 190 países, dita de uma forma tão despretensiosa, me pareceu uma metáfora perfeita para simbolizar a grandiosidade desse projeto: “vi muitos tamanhos diferentes de mosca”. Um filme belíssimo, feito por muitos, e expondo tudo que nós somos e poderíamos ser.
Não consegui ver nem de longe esse espírito de homenagem, de aconchego... é um dos filmes mais descrentes que já vi. Um filme de resistência, nostálgico, mas uma nostalgia atrofiada, sem esperança de retorno. E é interessante como vários bons comentários partem de um ponto em comum e no fim se afastam tanto que se tornam quase antíteses perfeitas. Mas acho que esse é um bom plano pra qualquer expressão de arte, provocar a discussão, incitar... Arte não é um mandamento, é sempre bom ter isso em mente.
Além da seleção de atores horrível, ficou a sensação de que esqueceram da necessidade de desenvolver o argumento além da idéia inicial. Tudo é triste, tudo é caótico eeee....?? pensar isso todo mundo consegue sozinho. Essa coisa minimalista tem acobertado tanta porcaria com carinha de coisa refinada. Mas todos amamos o cinema francês, e é isso que importa.
Em geral eu tenho resistência ao Lynch porque não me dou muito com essa linguagem tão onírica, simbólica... mas nesse filme as coisas foram transmitidas de uma forma mais direta - embora ainda escatológica - e daí eu finalmente pude ter um vislumbre da razão de tanta gente idolatrar o cara. Não há muitos diretores capazes de tornar um John Merrick um ser encantador e quase me fazer dizer que esse é um filme bonito.
Eu não sou um fã do Scorcese. Apesar de achar Taxi Driver brilhante, eu não gosto muito do noir e talvez por isso tenha ficado sempre com um pé atrás com os filmes mais recentes dele. Mas em a invenção de Hugo Cabret ele foi tão distante de qualquer expectativa minha... e eu acho mesmo que ele se distanciou do próprio estilo pra fazer esse filme. Vi em Hugo tantas semelhanças com o cinema francês atual... Personagens que poderiam ser facilmente transportados para um filme do Jean-Pierre Jeunet... Uma homenagem não apenas ao cinema, mas também especificamente à origem francesa. O filme todo cheira a uma nostalgia doce. É tão bonito poder sentir o amor que ele tem por esse mundo. Em um profundo contraste, lembrei de uma entrevista que vi do Kieslowski em que ele dizia, com a expressão mais carrancuda do universo, que não gostava de cinema, que era apenas o trabalho dele. Alguém tão seco jamais poderia fazer algo como Hugo. Esse filme pode não ter me tornado fã do Scorcese, mas garantiu meu respeito eterno por ele.
É bom esperar de um filme do Bergman um tratamento cru do tema que aborda. Cru, às vezes grotesco, impiedoso... é quase inevitável sair com um gosto seco de coisa mal digerida. Nesse filme há tudo isso, mas o plano de dirigir quase toda a dramaticidade usando como meio apenas o enredo acabou diluindo o impacto da trama, pra mim. As cenas, claro, são densas, ainda, mas o texto não acompanhou a profundidade, ficou ralo. Uma pena.
Tem coisas que só o cinema japonês mostra pra você: um cachorro sádico-telepata-assistente-fiscal de um emissário da morte - que por acaso dança como um teletubbie. E tudo regado a uma trilha tipo Tom e Jerrie. GENIAL.
Esse não tá entre os meus favoritos dele... Ainda assim, ver uma personagem feminina tão genuinamente feliz em Bergman foi tão surpreendente que vai ser difícil esquecer.
Caramba, eu tinha ouvido falar tão pouco desse filme e achei tão bom. Um dos melhores do gênero 'suspense-aventura'(inventei mesmo). Eu não conheço quase nada da biografia do Poe, então vou desconsiderar qualquer eventual estupro da realidade nesse sentido. Claro que o Poe acabou parecendo um pouco pouco-sombrio demais hehe... Mas a idéia que preencheu a lacuna dos dias finais foi tão boa, e tão bem orquestrada ao longo do filme que acabou derrubando minhas defesas.
Em algum momento, apesar das semelhanças nem tão óbvias assim, eu tava pensando 'até quando ela vai fazer amélies??'... mas o filme passa, e é realmente um filme bonito, e a Audrey tem mesmo alguma coisa que ilumina tudo, ela passa, ela olha pra câmera e pronto: o filme já justificou sua existência.
A Pior Pessoa do Mundo
4.0 601 Assista AgoraQue alívio ver um filme desse nível feito nessa década! Parece um milagre!
Encontros e Desencontros
3.8 1,7K Assista AgoraResisti por mais de dez anos a ideia de rever esse filme. Às vezes tenho medo de descobrir que essas coisas que mais me tocaram na vida perderam o sentido, o impacto. Considerando a temática do filme, talvez, neste caso, fosse interessante essa perda , provavelmente eu estaria mais adaptado a tudo, mas não aconteceu, o impacto permanece. Tanta coisa foi vivida, perdida, superada, mas o impacto é o mesmo. Talvez eu não tenha mudado quase nada fundamentalmente, pensar nisso me atormenta, mas me conforta, também. É contraditório mesmo. Eu ainda acho que eles continuaram a história em algum lugar, e isso me alegra um pouco. E me alegra saber que ainda sou o cara que acredita nisso.
Bacurau
4.3 2,7K Assista Agora(Contém spoiler!)
Talvez, pensando rapidamente, a escolha do personagem líder dos "invasores" como um alemão, tipicamente alemão, pudesse ser encarado como um clichê imperdoável, mas não vejo assim. Às vezes, é importante pegar emprestado do imaginário coletivo uma imagem facilmente identificável para reforçar o seu ponto, deixá-lo cristalino, torná-lo o mais acessível possível - esse não deveria ser um dos mais primordiais objetivos de qualquer Arte? Penso ser o caso. O que esse filme diz precisava ser dito dessa forma, límpida, crua. E admiro profundamente a coragem dos envolvidos em todo o processo por fazerem-no AGORA.
Outro possível choque para o público talvez seja a interpretação equivocada de que o filme se trata de uma espécie de levante regionalista. Mas não, longe disso. Quando os personagens “brasileiros do sul” argumentam que não são nascidos na região de Bacurau, e sim numa região próspera e descendente de europeus... os “invasores” os ridicularizam, e os lembram de que no fim eles são só, no máximo, mexicanos brancos – e mexicanos brancos capazes de fazer qualquer serviço sujo, inclusive tornarem-se assassinos de sua própria gente. O complexo vira-latista encarnado pelos “brasileiros do sul” na verdade é uma metáfora para o pensamento reinante da classe média brasileira que se aliena de sua condição de ser brasileiro, e tenta se imergir desesperadamente numa fantasiosa auto percepção estrangeirada, bebendo como se um líquido divino fosse qualquer ditame europeu branco, como se isso os fosse desvencilhar de sua condição de “primitivos semi-selvagens”. Jessé de Sousa escreve com brilhantismo sobre essa condição vira-lata desses brasileiros que odeiam tudo que nós somos, mas que no fim, como é dito no filme, não passam de mexicanos brancos.
Algo que me tocou muito nesse filme foi uma pergunta - feita por duas vezes: “por que vocês fazem isso?” A resposta não é dada inicialmente e depois nos chega como: “Eu não sei!”, dito pela personagem feminina estrangeira que sobrevive ao primeiro revide dos moradores. Para mim, a não-resposta dada é de interpretação ampla, mas me soou, também, como um processo profundo de alienação. Os estrangeiros, na condição simbólica de exploradores, no fim, não se veem pertencentes da mesma categoria de humanos dos moradores de Bacurau. Para eles, os nativos não são mais do que animais em caça, com baixa capacidade de resistência – excelentes candidatos, assim, para servirem de distração ao tédio dos dias.
Imediatamente ao terminar o filme lembrei de uma visita que fiz ao museu da escravidão, na cidade de Redenção, no Ceará: O museu preserva a Casa Grande, e também a Senzala. A imagem que eu tinha desses ambientes era formatada pelas produções nacionais que retratavam a época. Ver de perto aquela estrutura, com meus olhos in loco, foi absurdamente perturbador, especialmente por um detalhe macabro: a Senzala ficava no subsolo da Casa Grande. Havia na Senzala várias divisões: o local para dormida, outro que servia como uma espécie de solitária, para os mais rebeldes e também havia um local para punição e açoite, onde os escravos tinham suas mãos presas no alto junto à parede, para facilitar as chibatadas e excluir qualquer possibilidade de revide. Ver toda aquela estrutura me fez pensar: como pode a Casa Grande estar localizada EXATAMENTE em cima da Senzala??? Seriam os moradores do andar de cima totalmente PSICOPATAS??? Uma família inteira de psicopatas!!! Só podia ser isso! Tinha que ser isso! Nenhum ser humano seria capaz de ignorar os sons vindos das profundezas de seu subsolo, não quando esses sons fossem produzidos por outros seres humanos, pensei! Ah, não ser que... os moradores de cima não vissem os moradores de baixo como seres humanos! É isso! De repente as coisas me ficaram lógicas. Os senhores de engenho não enxergavam os escravos como seres humanos; eram apenas coisas, posses, objetos capazes de lhes prouverem tudo aquilo que lhes parecia necessário, e para isso podiam se utilizar da sua força de trabalho, ou de seus corpos – com as mucamas/escravas sexuais - ou suas vidas, para aplacar um dia mais pesado de tédio, talvez.
A mesma coisificação que servia como auto legitimação por parte dos senhores de engenho não se difere de forma fundamental da auto legitimação que faz os povos “mais desenvolvidos” deste tempo presente acharem aceitável sua condição de exploradores do mundo. A questão é que – terrivelmente – essa coisificação não se encerra dentro da leitura de mundo dos “exploradores”, ou dos “mexicanos brancos” – tão ávidos para conseguir o seu passaporte para a terra prometida dos exploradores. Essa coisificação alicerça toda uma estratégia de dominação e é implantada na mentalidade de cada explorado desde o dia que nasce, em cada sabotagem do sistema de Ensino... Este filme percebe todo esse intrincado e propõe ações. Propõe resistência, de dentro da Escola, e dos nossos museus, é o caminho, o único caminho.
Não assisti a esse filme no Cinema, o que me faz lamentar muito perder toda a energia coletiva espantada que certamente emanou em cada sala onde essa obra prima foi rodada. Mas, ontem, quando assisti pela primeira vez, no Youtube, numa Live de Cinema – que nem sabia que existia... notei que junto comigo assistiram ao vivo mais de 65.000 mil pessoas!!! E pensei: Caralho, acho que nunca mais vou participar de uma sala de cinema tão grande!
A quem ainda está aqui me lendo, minhas últimas palavras: esse filme dialoga profundamente com o trabalho do sociólogo Jessé de Souza. Se você chegou até aqui, o sentimento que essa obra te causou vai permanecer com você por uma bom tempo, talvez pela vida toda; então, como sugestão para você dialogar mais um pouquinho com esse sentimento, te deixo como uma indicação urgente a leitura do livro do Jessé: “A classe média no espelho: Sua história, seus sonhos e ilusões, sua realidade”.
Post Scriptum:
Eu imagino que a maioria das pessoas que lerão esta resenha virão aqui depois de terem visto a live do dia 18/06/2020, junto comigo, de muuuitos lugares desse Brasil. Deixo um abraço fraterno a cada um de vocês. E vamos fazer o que o filme sugere! Resistir.
Heima
4.7 140 Assista AgoraNão sou um fã de Sigur Rós, mas sou um grande fã de cinema e só dá pra pensar que esses caras fizeram um filme genial, um filme que jorra "poesia" por todos os poros. Por mais mais que essa palavra esteja tão desgastada, que tenha tido seu sentido tão pulverizado, banalizado... não consigo imaginar outra que sintetise melhor o impacto natural desse filme: poesia.
Por diversas vezes eu pausei só pra deixar o estalo que o filme iniciou no meu pensamento reverberar.
Definitivamente é um filme capaz de mudar algo em mim, e espero que em todos os outros que o vejam também.
ps: depois de ver os amantes do círculo polar, e esse filme, eu TENHO que ir até a Islândia.
Os Desconectados
3.9 442 Assista AgoraHá alguns exemplos de excelentes filmes americanos que se valeram dessa fórmula de contar dramas de núcleos distintos, todos interligados por um fio. O problema desse foi a falta de apego na abordagem do tema... expandiram de uma forma tão grotesca que perdeu o sentido e a unidade.
O conto do garoto que fazia chats pornôs na net é tão mais amplo que fica tosco e absurdo forçar a inclusão dele na idéia inicial de alta conectividade... e não é o único.
Além disso, a proposição do filme em si é um pouco bizarra. Agora vamos desconectar??? Talvez fosse uma boa também pararmos de usar aviões, porque, em guerra, aviões matam... A vida não passa por um período de virtualização, de desapego tátil... ela evoluiu para isso, é o que, agora, somos e seremos. É fato consumado. A questão caótica dos valores é outra história... e é simplesmente bobo atribuir uma parcela profunda desse caos à virtualização da vida.
hehe Cabei lembrando uma frase do Caetano: "... vai sempre matar amanhã o velhote inimigo que morreu ontem."
Agora e Para Sempre
4.0 1,5KMuito bonita a interpretação de Dakota.
Uivo
3.8 215 Assista AgoraEsse filme poderia ter sido genial, se tivesse com um ator a altura do personagem principal.
Deus Abençoe a América
4.0 799Um dos filmes mais doces que já vi. Completamente adorável. Só achei uma pena passar tão rapidinho. Espero muito que tenha continuação.
Lila Diz
3.8 27Achei a trilha sonora terrível, a exceção de Air, e não há como negar que a trama tinha um desfecho previsível também, mas a atuação dos protagonistas foi tão boa... talvez seja a melhor representação de desejo que já vi no cinema. Quando vi Chimo observar a passagem de Lila pela primeira vez, pensei 'esse cara tá muito ferrado'. E ainda tem essa frase do Chimo:
"ESTA GAROTA É CAPAZ DE CAUSAR UMA GUERRA SANTA" . E era mesmo.
A Vida em um Dia
4.3 257 Assista AgoraQuando eu não tou legal, eu gosto de caminhar por ruas movimentadas. Gosto porque ver as pessoas seguindo por tantos caminhos, ouvir os sons do dia, observar algum animal vadio transitando me faz sentir menor. Menor em um sentido literal... me faz ter uma dimensão menos egocêntrica de mim mesmo. Eu sempre acabo pensando alguma coisa assim: a vida vai acabar seguindo de alguma forma, não importa o que me aconteça... os problemas então parecem um pouco menores e eu me sinto melhor. Esse filme me fez vivenciar essa sensação numa escala planetária. O mundo é tão vasto, as pessoas podem ser tão terríveis. Mas, por outro lado, toda a beleza não-natural que existe fomos nós que criamos. É claro que o oposto disso também é verdade, mas porra! Temos pelo menos um copo meio cheio pra louvar. Não há só fel espalhado por todos os poros do mundo. De tudo, uma frase aparentemente banal do ciclista coreano, que já passou por mais de 190 países, dita de uma forma tão despretensiosa, me pareceu uma metáfora perfeita para simbolizar a grandiosidade desse projeto: “vi muitos tamanhos diferentes de mosca”. Um filme belíssimo, feito por muitos, e expondo tudo que nós somos e poderíamos ser.
Holy Motors
3.9 652 Assista AgoraNão consegui ver nem de longe esse espírito de homenagem, de aconchego... é um dos filmes mais descrentes que já vi. Um filme de resistência, nostálgico, mas uma nostalgia atrofiada, sem esperança de retorno. E é interessante como vários bons comentários partem de um ponto em comum e no fim se afastam tanto que se tornam quase antíteses perfeitas. Mas acho que esse é um bom plano pra qualquer expressão de arte, provocar a discussão, incitar... Arte não é um mandamento, é sempre bom ter isso em mente.
Entre os Muros da Escola
3.9 363 Assista AgoraAlém da seleção de atores horrível, ficou a sensação de que esqueceram da necessidade de desenvolver o argumento além da idéia inicial. Tudo é triste, tudo é caótico eeee....?? pensar isso todo mundo consegue sozinho. Essa coisa minimalista tem acobertado tanta porcaria com carinha de coisa refinada. Mas todos amamos o cinema francês, e é isso que importa.
A Última Vida no Universo
3.9 39Gostei bastante desse texto sobre o filme:
O Homem Elefante
4.4 1,0K Assista AgoraEm geral eu tenho resistência ao Lynch porque não me dou muito com essa linguagem tão onírica, simbólica... mas nesse filme as coisas foram transmitidas de uma forma mais direta - embora ainda escatológica - e daí eu finalmente pude ter um vislumbre da razão de tanta gente idolatrar o cara. Não há muitos diretores capazes de tornar um John Merrick um ser encantador e quase me fazer dizer que esse é um filme bonito.
Madagascar 3: Os Procurados
3.5 1,4K Assista AgoraQue leãozinho mais bipolar.
A Invenção de Hugo Cabret
4.0 3,6K Assista AgoraEu não sou um fã do Scorcese. Apesar de achar Taxi Driver brilhante, eu não gosto muito do noir e talvez por isso tenha ficado sempre com um pé atrás com os filmes mais recentes dele. Mas em a invenção de Hugo Cabret ele foi tão distante de qualquer expectativa minha... e eu acho mesmo que ele se distanciou do próprio estilo pra fazer esse filme. Vi em Hugo tantas semelhanças com o cinema francês atual... Personagens que poderiam ser facilmente transportados para um filme do Jean-Pierre Jeunet... Uma homenagem não apenas ao cinema, mas também especificamente à origem francesa. O filme todo cheira a uma nostalgia doce. É tão bonito poder sentir o amor que ele tem por esse mundo. Em um profundo contraste, lembrei de uma entrevista que vi do Kieslowski em que ele dizia, com a expressão mais carrancuda do universo, que não gostava de cinema, que era apenas o trabalho dele. Alguém tão seco jamais poderia fazer algo como Hugo. Esse filme pode não ter me tornado fã do Scorcese, mas garantiu meu respeito eterno por ele.
Noites de Circo
3.9 49É bom esperar de um filme do Bergman um tratamento cru do tema que aborda. Cru, às vezes grotesco, impiedoso... é quase inevitável sair com um gosto seco de coisa mal digerida. Nesse filme há tudo isso, mas o plano de dirigir quase toda a dramaticidade usando como meio apenas o enredo acabou diluindo o impacto da trama, pra mim. As cenas, claro, são densas, ainda, mas o texto não acompanhou a profundidade, ficou ralo. Uma pena.
Sweet Rain
4.0 53(Spoiler)
Tem coisas que só o cinema japonês mostra pra você: um cachorro sádico-telepata-assistente-fiscal de um emissário da morte - que por acaso dança como um teletubbie. E tudo regado a uma trilha tipo Tom e Jerrie. GENIAL.
Jogo de Cena
4.4 336Quando a realidade é bem melhor que a ficção..
Música na Noite
3.6 19Esse não tá entre os meus favoritos dele... Ainda assim, ver uma personagem feminina tão genuinamente feliz em Bergman foi tão surpreendente que vai ser difícil esquecer.
O Corvo
3.5 998Caramba, eu tinha ouvido falar tão pouco desse filme e achei tão bom. Um dos melhores do gênero 'suspense-aventura'(inventei mesmo). Eu não conheço quase nada da biografia do Poe, então vou desconsiderar qualquer eventual estupro da realidade nesse sentido. Claro que o Poe acabou parecendo um pouco pouco-sombrio demais hehe... Mas a idéia que preencheu a lacuna dos dias finais foi tão boa, e tão bem orquestrada ao longo do filme que acabou derrubando minhas defesas.
A Delicadeza do Amor
3.9 919 Assista AgoraEm algum momento, apesar das semelhanças nem tão óbvias assim, eu tava pensando 'até quando ela vai fazer amélies??'... mas o filme passa, e é realmente um filme bonito, e a Audrey tem mesmo alguma coisa que ilumina tudo, ela passa, ela olha pra câmera e pronto: o filme já justificou sua existência.
Geração Prozac
3.6 465preciso parar de favoritar esses filmes
Se Enlouquecer, Não se Apaixone
3.8 1,7K Assista AgoraDaria 50 estrelas, se pudesse.
E alguém por favor assassine o tradutor do título.