Escrito e dirigido pela britânica Andrea Arnold, “Docinho da América” é um conto de fadas. Só que não. Alheio a poucas sutilezas e repleto de pormenores em seu mais de 160 minutos, o filme acompanha Star (Sasha Lane), uma jovem de 18 anos que se responsabiliza pelos seus dois irmãos pequenos da maneira que pode já que tem uma mãe relapsa e ausente e suporta uma relação abusiva com seu padrasto bêbado e drogado. Infeliz e frustrada, ela deixa tudo para trás e embarca em uma viagem com Jake (Shia LaBeouf) e um grupo formado por outros jovens que também deixaram suas famílias para trás com a expectativa de trabalho, um futuro melhor, descobrir a fórmula mágica da felicidade ou encontrar o sentido da vida. Na verdade, nem eles mesmos sabem o que querem da vida enquanto vendem um catálogo de revistas no porta a porta das casas das pessoas em busca de dinheiro para o consumo de drogas e bebidas.
Funcionando como uma versão alternativa e nada ortodoxa da viagem realizada pela personagem central de “Alice no País das Maravilhas”, o filme é prolixo na sua tentativa de acompanhar Star ao lado do grupo vivendo as mais vazias experiências para que possam se sentir vivos ou que lhes deem uma mera sensação de fazer parte de um coletivo. Apesar de Andrea Arnold adotar um estilo semidocumental com o intuito de captar com a câmera na mão a essência dos momentos de maneira orgânica e natural, “Docinho da América” é um filme vazio, imaturo e inconsequente sobre pessoas vazias, imaturas e inconsequentes, logo não dá para reclamar de incoerência. Geração perdida? Juventude sem perspectivas? Na verdade, tudo é muito vago e prosaico para se chegar há alguma conclusão crítica com exceção da qualidade técnica do ótimo e caprichado trabalho de fotografia que usa e abusa de filtros e vários tons ao longo do filme que não deixam negar que há uma preocupação estética rígida até mesmo nas sequências que supostamente seriam naturais e espontâneas, logo o filme não é tão naturalista ou documental quanto pretende ser.
Com relação à suposta oportunidade de trabalho não há nada de lícito nas atividades do grupo e Jake, uma espécie de “Chapeleiro Maluco”, não é ético no seu trabalho. Ele é o único que é apresentado praticando pequenos roubos, mas uma das poucas informações objetivas oferecidas pelo filme é que ele foi o responsável pelo treinamento dos demais integrantes, logo não é difícil associar o que os outros também faziam já que a natureza do trabalho é um mero pretexto para levantar fundos, ainda mais que Krystal (Riley Keough), a chefe do grupo ou “A Rainha Má”, nada mais é do que uma mescla de traficante, agiota e cafetã. Assim como muitos do grupo, Star está em busca de qualquer alternativa que a tire da realidade que considera insuportável, porém com o tempo, Jake se mostrará um perdedor ou na melhor das hipóteses um golpista que possui uma lábia mais apurada, menos com relação a sua maneira torta e machista de demonstrar que nutre algum sentimento por ela que vá além da mera excitação. No entanto, embora Star seja a “mocinha”, ela jamais se mostra uma personagem digna de torcida ou de pena, logo quando ela parece se incomodar com as mentiras que Jake conta para vender as revistas, Star acaba se tornando irritante em função da sua ingenuidade e da sua própria hipocrisia, como se fosse moralmente superior, sendo que é igual a todos os outros e distanciando-se ainda mais de qualquer sentimento de empatia.
Entre trancos e barrancos, a relação entre Jake e Star, que de maneira bastante conveniente e expositiva descobrem-se com os mesmos sonhos, acaba sendo o elemento mais próximo de um dilema que se cria dentro da narrativa já que promove pelo menos algum tipo de fagulha, mesmo sendo dois personagens rasos e desinteressantes e até por isso que Shia LaBeouf está tão à vontade enquanto Sasha Lane demonstra potencial, cumpre o seu papel, mas sem ser especialmente marcante ou cativante. As idas e vindas do casal, normalmente acompanhadas de carentes decepções e recomeços instantâneos só demonstram o quanto se merecem, no pior sentido do termo, com direito até mesmo ao acompanhamento de um ato sexual entre os dois bastante naturalista, sem que seja explícito, mas que não deixa de ser apenas mais uma sequência corriqueira dentro da flexível e às vezes irritante dinâmica da relação do casal. Riley Keough, como a traficante Krystal, se mostra uma atriz muito mais intensa e interessante em sua performance, sugerindo que caso a narrativa acompanhasse a jornada da sua vida desde o começo até chegar ali, o filme tenderia a ter muito mais sucesso.
Sem justificar a sua suposta pretensão de lançar um olhar crítico sobre a sociedade e uma geração desamparada e/ou sem perspectivas, “Docinho da América” acaba apresentando sequências isoladas que sugerem algum objetivo narrativo específico, que possa servir de evento catalisador e/ou motivador e/ou redentor para Star, mas são possibilidades que não se confirmam e que dentro do contexto geral ficam deslocadas, sem mérito algum. Em uma determinada residência, por exemplo, uma mulher se declara cristã, mas não percebe a erotização das brincadeiras da própria filha com as amigas (seriam elas tão perdidas quanto o grupo de Star?); em outro momento, três idosos milionários parecem não se importar em levar Star para dentro de casa e embebedá-la, mesmo sendo maior de idade (será que o dinheiro pode comprar tudo?); ao pegar carona com um caminhoneiro, Star tem um bom exemplo sobre a construção de uma família (será que felicidade e bom caráter caminham juntos pela estrada da vida?); já em outro momento se submete ao fetiche sexual de um melancólico petroleiro (será que o dinheiro não é tudo na vida já que não garante a felicidade?) e lá pelo final usa seu dinheiro para alimentar os filhos de uma mulher drogada que encontra pelo caminho (será que Star sente falta dos irmãos que deixou pra trás?). Dessa forma, assim como os momentos em grupo, essas sequências se tornam frustrantes e decepcionantes já que são tão corriqueiras quanto às experimentadas ao lado dos demais delinquentes (e se uso essa expressão é por não encontrar uma classificação melhor para um grupo de jovens que fingem que trabalham a mando de uma traficante apenas para farrear, beber e se drogar).
Sendo assim, “Docinho da América” é um filme que tenta se sustentar em meio a um vácuo de ideias sob um vazio pretexto existencialista de crítica social e que traz uma personagem central igualmente vazia e sem brilho. Em meio a canções, geralmente do hip hop americano, que tentam imprimir um senso artificial de harmonia e comunidade entre os integrantes do grupo, inclusive a bela balada country “American Honey” que dá título ao filme, “Docinho da América” é apenas um drama longo e enfadonho que não chega a lugar algum já que não justifica suas próprias escolhas narrativas, inclusive o seu desfecho surreal, e talvez nem faça jus a minha própria comparação com “Alice no País das Maravilhas”. Ou será que sim? Quer saber? Quem se importa...
Se o holandês Paul Verhoeven (“Robocop”, “Instinto Selvagem”, “Showgirls”, “A Espiã”) também não fosse um diretor polêmico, controverso e provocador, o francês “Elle” seria um filme que caberia perfeitamente na filmografia do alemão Michel Haneke (“A Professora de Piano”, “Violência Gratuita”, “Cachè” e “Amor”) em virtude da sua sagaz abordagem narrativa e psicológica sobre a natureza da violência, além de contar com a presença hipnótica e perturbadora de Isabelle Hubert, uma de suas intérpretes mais assíduas. A sequência de abertura de “Elle” acompanha fora de plano o estupro violento sofrido por Michele (Hubert) dentro da sua casa, enquanto ouvimos sons e barulhos que tornam a experiência ainda mais terrível e angustiante, porém em diversos momentos do filme ela é repetida através das lembranças da personagem com um nível de detalhes cada vez maior e às vezes até mesmo com resultados distintos. É quase que um jogo sádico conduzido por Verhoeven para testar os limites do espectador diante de um ato tão violento, gratuito e repulsivo.
Além desse choque inicial, o que espanta é a postura fria e racional de Michele diante do ocorrido, parecendo anestesiada emocionalmente já que não se preocupa em procurar a polícia enquanto arruma o estrago provocado pelo agressor em sua casa, mas pelo menos tem o discernimento de procurar auxílio médico para evitar uma possível contaminação por alguma doença sexualmente transmissível. De qualquer forma, o roteiro de David Birke, escrito a partir da obra de Philippe Djian, explora a frieza da personagem através da profissão de Michele, como executiva de uma produtora de jogos de videogame que vive uma situação crítica em função do atraso no lançamento de um novo jogo por considerar que ele não atingiu o nível de violência esperado. Ou seja, é um artifício até bastante óbvio e rasteiro que serve para ilustrar que ela (assim como a sociedade) está tão acostumada a lidar com a violência ficcional, ou até mesmo explorá-la comercialmente, em seu dia-a-dia que consegue abstraí-la do mundo real ao ponto dela não ter a mínima noção da gravidade do ato sofrido (ou talvez um excesso de familiaridade), afinal ela não hesita em revelar de maneira bastante corriqueira que sofreu o estupro para o seu ex-marido (Charles Berling) e a um casal de amigos antes de um jantar informal, como se não fosse um assunto indigesto.
Esse nível de estranheza de Michele é realçado quando o roteiro oferece pistas sobre a sua infância traumática, influenciada pelo pai, um assassino em série, através do artifício da televisão que mostra a sua história em uma surreal reportagem carregada de sentimentalismo barato quase que em uma necessidade explícita de banalizá-la (assim como a própria televisão o faz). O estuprador, supostamente, passa a espreitar Michele como uma forma de provocá-la seja no trabalho ou na sua vida social, porém ao invés de se mostrar assustada, ela parece decidida a encarar o criminoso de frente, quase que como um desafio pessoal. Essa mesma excitação também ocorre diante de um flerte com o vizinho (Laurent Lafitte) que, ironicamente, se manifesta mais intensamente quando ele monta o presépio de Natal na sua casa, mostrando que o nível de provocação de Verhoeven também pode ser o mesmo de um birrento adolescente ateu. Esse festival de bizarrices também é explorado pela falsa aproximação de Michele com a jovem namorada do ex-marido (Virginie Efira), por não sentir um mínimo de remorso em transar com o marido da sua melhor amiga (Anne Consigny), pelo fato da sua mãe (Judith Magre) ter o interesse de se casar com um jovem garoto de programa e até mesmo com seu filho (Jonas Bloquet), intelectualmente limitado, que parece preso a um relacionamento doentio com uma jovem possessiva que carrega um filho que não é seu, mesmo que seja uma constatação bastante evidente. E, de certa forma, com todo esse circo excêntrico, Verhoeven desmoraliza com veemência todas as convenções sociais e a hipocrisia cristã através da postura sarcástica de Michele durante o jantar de Natal com mais indiscrição, pequenas doses de violência psicológica e muito mais requintes narrativos.
Ao oferecer pistas falsas, Paul Verhoeven até demonstra que está interessado em fazer com que seu filme se desenvolva através do mistério acerca da identidade do estuprador diante dos potenciais suspeitos mesmo que o próprio roteiro quebre a expectativa de revelá-lo até de maneira pouco sutil (vide a própria sequência do jantar de Natal), mas ele parece mais preocupado em ilustrar uma espécie de ciclo de violência sem fim que pode acompanhar a formação de uma pessoa desde a infância até a velhice assim como ocorre com Michele, como se a violência fizesse parte da vida dela como um ente familiar ou uma representação íntima da sua psique. Não é à toa, por exemplo, que no filme o sexo é quase sempre retratado de maneira violenta ou empregado como uma arma que exerce poder e/ou funciona como um poderoso mecanismo de manipulação com consequências tão ou mais violentas do que as cometidas pelo próprio estuprador. Não é à toa também que os pais de Michele possuam destinos trágicos que são incapazes de despertar qualquer tipo de emoção nela antes da própria sofrer com um acidente violento, além de outros episódios catárticos até ser, finalmente, salva pelo seu improvável herói que a sua maneira inicia o seu próprio histórico de violência.
Ainda assim, apesar de tudo isso, “Elle” é mesmo de Isabelle Hubert que encarna Michele como devoção e energia devastadoras, comprometida a se entregar física e emocionalmente a uma personagem fria, indiferente e calculista que pode ser facilmente classificada como uma sociopata incapaz de viver em paz e/ou em tranquilidade, afinal ela é dominada pelo caos, estimulando a violência em todos os níveis, afetando direta e indiretamente as pessoas ao seu redor. É certamente uma atuação corajosa e sem pudores de uma atriz que parece não ter mais nada a provar para ninguém, revelando o mesmo despojamento artístico que já demonstrara ao longo de sua carreira em filmes mais ou menos polêmicos e depravados do que esse. Não adianta fechar a cortina, Paul Verhoeven está interessado no que há de pior em nós mesmos e, mesmo não sendo uma obra autoral, é o que ele faz como “Elle” em mais um filme carregado de violência, perversão, simbolismos, cinismo, ironia e… humanidade.
“Passageiros” é uma mistura irregular de ficção científica, drama de sobrevivência e romance que tem uma abordagem pouco ambiciosa e levemente filosófica, mas que conta com as boas presenças de cena dos talentosos e carismáticos Chris Pratt e Jennifer Lawrence para alavancar boa parte das virtudes de sua narrativa. O engenheiro mecânico James Preston (Pratt) é um dos 5000 passageiros da tripulação da espaçonave Avalon que está realizando uma viagem de 120 anos da Terra até o planeta Homestead II que será uma nova colônia habitada pela raça humana, porém após uma tempestade de meteoros, a sua cabine de hibernação sofre um dano que o desperta 90 anos antes do tempo, deixando-o em uma situação solitária e desesperadora.
O primeiro ato do roteiro escrito por Jon Spaihts (“Prometheus”) se encarrega de fazer com que “Passageiros” funcione como uma espécie de “Náufrago” ambientado no espaço em uma situação parecida com a vista em “Perdido no Espaço”, logo cabe ao diretor Morten Tyldum (“O Jogo da Imitação”) acompanhar Jim em suas sucessivas tentativas de encontrar uma solução para o seu problema crítico até abraçar um tom levemente cômico, auxiliado pelo eficiente trabalho da montadora Maryann Brandon (“Star Trek”), mas com algumas eventuais doses de melancolia, como quando Jim se emociona diante da solidão e da imensidão do espaço sideral em um momento sombrio belissimamente fotografado por Rodrigo Prieto (“O Lobo de Wall Street”) que também consegue se destacar em outros momentos repletos de luz e claridade ou em outros que se passam em ambientes internos, como nas sequências do bar. O ótimo Chris Pratt é um ator versátil que se mostra muito feliz em suas escolhas para ilustrar a personalidade do seu personagem, seja o seu lado leve, divertido e debochado assim como a tristeza, a depressão e a fragilidade emocional que invariavelmente o cerca.
Essa apresentação ágil e eficiente de Jim é fundamental para estabelecer o principal dilema moral do personagem que após um ano de isolamento decide acordar a jovem jornalista e escritora Aurora Lane (Jennifer Lawrence) de sua câmara de hibernação em função de uma paixão platônica e por não suportar mais a solidão. A atitude egoísta de Jim é compreensível, mas indefensável, porém o convívio dos dois permite que superem as diferenças e se desenvolva gradativamente uma relação e eles explorem ao máximo o universo que lhes é oferecido e, levadas as devidas proporções, o que eles vivem dentro da espaçonave é vida, logo ambos são capazes de fazer bem um para o outro. A dinâmica e a cumplicidade entre os dois atores é muito orgânica e autêntica, não se valendo apenas do artifício de serem os únicos tripulantes acordados, apesar da intrusiva trilha sonora de Thomas Newman antecipar certos momentos românticos, permitindo inclusive que eles vivam um lindo momento lúdico ao melhor estilo “Wall-E” ao compartilharem uma dança no espaço. A partir do momento que Aurora descobre que foi acordada por Jim, a intensidade dramática da ótima Jennifer Lawrence é forte o bastante para legitimar o drama, a frustração e a completa decepção da personagem com relação ao companheiro a bordo.
O design de produção e os efeitos especiais são muito atraentes em “Passageiros”, especialmente a arquitetura arrojada da espaçonave e uma bela sequência em que há uma súbita suspensão de gravidade, porém o diretor Morten Tyldum realiza um trabalho bastante prosaico. Os diálogos até aqui não são nada rebuscados e funcionam relativamente bem, seja na interação entre Jim e Aurora como na de Jim com um robô-bartender (Michael Sheen, divertindo-se), salvo alguns momentos mais rasteiros e reducionistas, como quando Aurora afirma conhecer as pessoas por se tratar de uma jornalista. A partir do momento que surge Gus Mancuso (Laurence Fishburne), o roteiro abusa das convenções já que a sua pra lá de conveniente presença ocorre quando os principais sistemas da nave começam a falhar, servindo apenas para que ele dê acesso a Jim e Aurora às áreas que eles não conseguiriam por conta própria e conduzindo-os ao absurdo clímax que servirá para o casal fazer as pazes, após sobreviverem ilesos à explosão de um imenso reator e até mesmo à morte, pelo menos preliminarmente.
Embora seja um drama de sobrevivência e um romance que tem como pano de fundo a ficção científica, o roteiro de Jon Spaihts não está isento de “furos”, afinal uma megacorporação é capaz de fazer uma imensa e impressionante espaçonave com vida útil mínima de 120 anos, com réplicas de cada uma das peças, mas não tem plano B para emergências nas cabines de hibernação. E se a espaçonave foi projetada para que os passageiros despertassem quatro meses antes da chegada e pudessem usufruir de toda a infraestrutura disponível, como é que a interferência de Jim e Aurora por tanto tempo não impacta na energia consumida e nos suprimentos armazenados? A natureza criada pelos dois no final teve algum efeito objetivo no estilo de vida do casal? O roteiro também apenas sugestiona implicações sobre interesses corporativos, diferenças sociais entre os passageiros, os motivos que fizeram os membros dessa viagem serem escolhidos para colonizar um novo planeta ou até mesmo o egocêntrico plano de voo da viagem de volta de Aurora (que poderia servir para outras pessoas já que ela não voltaria sozinha), mas sem muita profundidade ou maior complexidade.
Encerrando-se de maneira abrupta e com uma rápida e muda aparição de Andy Garcia, “Os Passageiros” se mostra um filme eficiente e divertido quando não se leva a sério, consegue ser levemente romântico em seu aspecto mais açucarado e limitado na maioria de suas ambições dentro do gênero da ficção científica já que emula muitos outros filmes em seus melhores momentos e falha quando tem que mostrar ao que veio até mesmo com relação ao uso do 3D. A falta de identidade e personalidade próprias faz com que o filme não sobreviva muito tempo sem as presenças marcantes de Chris Pratt e Jennifer Lawrence que, felizmente, foram sabiamente escolhidos a dedo para participar dessa viagem.
Comentário extraído do blog ARGUMENTÁRIO - UM ESPAÇO DE IDÉIAS E REFLEXÕES
A CASA SILENCIOSA
O excesso de filmes de terror e suspense que exploram o subgênero de casas amaldiçoadas esgotou e/ou desgastou a fórmula, logo quando surge alguma produção que se esforça para tentar algo novo ou que explora os clichês de maneira diferente é sempre um alento. “A Casa Silenciosa” é uma consequência dessa falta de criatividade do gênero, especialmente do cinema americano, já que é a refilmagem do suspense uruguaio “A Casa”, mais uma entre tantas outras que querem pegar carona no mérito alheio, lançada apenas dois anos depois da obra original. Críticas à parte, ainda assim é um filme que tem seus méritos por extrair tensão e medo através de uma proposta eficiente em sua estética, mesmo que seja uma virtude decorrente da sua fonte.
Justiça seja feita, “A Casa Silenciosa” não é um filme americano de estúdio, mas uma produção independente que como tal consegue manter a essência do filme original (que eu não vi, vale a pena dizer) que consiste basicamente na criação de um clima de tensão e suspense a partir da impressão provocada pelo uso de apenas uma câmera e, consequentemente, de um longo e falso plano-sequência, o que por si só também não é uma novidade. O crédito de direção ficou dividido entre o diretor Chris Kentis e a roteirista Laura Lau já que a dificuldade que se tem de determinar onde termina o trabalho de um e começa o do outro nesse tipo de produção é ainda maior (ambos já trabalharam juntos em “Grind – Correndo Contra a Vida” e “Mar Aberto” em condições similares).
Baseada em fatos reais, a narrativa acompanha a jovem Sarah (Elisabeth Olsen) juntamente com o seu pai John (Adam Trese) e seu tio Peter (Eric Sheffer Stevens) em uma visita a uma antiga casa de veraneio da família que está em reforma para ser vendida. Durante a vistoria, Sarah começa a ouvir ruídos estranhos e a sua experiência dentro da casa vai se tornando cada vez mais assustadora e angustiante. A câmera acompanha a jornada física e emocional de Sarah, logo o terror e o suspense são construídos através da sua perspectiva, o que naturalmente exige que as soluções encontradas por Kentis e Lau sejam mais simples e orgânicas e nem por isso menos eficiente. Dessa forma, um rangido ou um vulto que apareça próximo de Sarah acaba sendo o suficiente para que o clima de terror se instale, pois os estímulos visuais são mínimos, o que colabora para a indefinição entre a suspeita de uma invasão e/ou de uma assombração propriamente dita.
A atriz Elisabeth Olsen tem uma atuação formidável já que a sua personagem é o centro emocional do filme e mesmo que ela seja obrigada a reagir a tudo o que acontece ao seu redor, ela é muito feliz na grande maioria das suas escolhas, resultando em um desempenho bastante elogioso. Adam Trese e Eric Sheffer Stevens são atores mais limitados e oferecem atuações irregulares. Embora seja uma produção com uma proposta arrojada, os diretores não estão isentos do uso de recorrentes clichês, como ao fazer com que Sarah suba as escadas quando deveria sair de casa ou hesite na fuga quando já está do lado de fora ou ainda quando utiliza o “flash” de uma câmera fotográfica para iluminar o ambiente. Ainda assim são elementos, como a própria representação da casa ou da condição que faz Sarah se esconder debaixo de camas e mesas, que possuem justificativas dentro da proposta explicitada em seu clímax cujo apelo dramático é legítimo, mas que falha especialmente em virtude das diversas vezes que o roteiro sentiu a necessidade de “materializar” a ameaça, inclusive com a deslocada presença de uma amiga de Sarah.
Embora não seja original e mesmo que reverencie a sua fonte ao manter a proposta do falso plano-sequência, “A Casa Silenciosa” é apenas um bom filme de suspense que conta com uma ótima atuação da jovem Elisabeth Olsen, sendo que provavelmente seria uma produção que não se destacaria tanto assim se fosse feita de maneira mais convencional, seja no Uruguai ou nos EUA.
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RAMBO IV
“Rambo IV”, dirigido e estrelado por Sylvester Stallone, é um filme que entrega o que promete: ação e muita violência. De certa forma é uma produção que parece que parou no tempo e mantém a mesma energia da franquia que fez sucesso a partir da década de 80, mas sem a mesma complexidade temática, apropriando-se de uma trama qualquer para justificar a máxima do exército de um homem só. Se bem que neste aqui, o veterano de guerra John Rambo não está tão sozinho assim.
Vivendo recluso em uma região isolada de Mianmar e responsável por caçar cobras para os habitantes locais que ganham dinheiro com uma espécie de rinha disputada entre humanos e animais peçonhentos, Rambo acaba sendo recrutado por uma equipe de missionários que pretendem ajudar a população local que está sendo dizimada pelo exército do governo ditatorial da região. A contragosto, mas cedendo aos encantos humanos e femininos (muito mais os femininos) da integrante Sarah (Julie Benz), ele realiza a missão, mas é obrigado a retornar posteriormente com um grupo de mercenários para resgatar os missionários que foram aprisionados e correm risco de morte.
Diferente do que parece sugerir as imagens reais que abrem o filme, Sylvester Stallone não está preocupado com a situação política e humanitária de Mianmar, logo o cenário é apenas um pretexto para que Rambo seja inserido dentro de uma trama em que a sua presença se justifique. É bom ressaltar que em nenhum momento ele se apresenta com o ex-combatente, mas sim apenas como John e a única referência existente ao seu sobrenome clássico ocorre já no final, mas como um indício de paz e não de guerra, porém, é claro, que quando começamos a assistir o filme já sabemos muito bem o que e quem esperar em ação, o que é muito bem ilustrado na tensa, eficiente e dinâmica sequência de resgate realizada embaixo de uma chuva torrencial.
Sem medo da censura e com vilões estereotipados e unidimensionais, a narrativa é perfeita para que Stallone empregue um estilo de direção cruel e brutal que serve para ilustrar uma ação em que se preza a utilização de tiros e explosões com o maior requinte de violência necessário e da maneira mais gráfica e gratuita possível, inclusive utilizando-se de uma bomba de natureza nuclear, mas de alcance limitado e controlável, afinal ela só atinge as pessoas más. E neste filme se há similaridade entre o “modus operandi” do exército da ditadura e da missão de resgate que também conta com a ajuda de rebeldes armados, a discussão não cabe nem mesmo como nota de rodapé, permitindo apenas que eu use uma expressão em latim no texto sobre um filme do Rambo.
Servindo como um leve e tímido exercício de redenção para o personagem central, “Rambo IV” é um filme moralmente vazio, fora de moda e que não tem vergonha de ser violento e gratuito mesmo que utilize o carisma e a boa presença de cena de Sylvester Stallone para fazer com o espectador torça para que John Rambo, literalmente, estoure os miolos dos seus inimigos.
O primeiro filme da franquia “MIB – Homens de Preto” foi lançado em 1997 como uma mistura simpática e levemente criativa de comédia e ficção científica, valorizado pela química em cena da dupla Will Smith e Tommy Lee Jones, tornando-o um sucesso inesperado. A continuação estreou em 2002, mas a repetição da fórmula e da dupla deu sinais de desgaste e não garantiu a mesma repercussão entre crítica e público, praticamente enterrando as pretensões da franquia. Bem verdade, no entanto, é que o nível do primeiro filme nunca foi tão alto, assim como o segundo não é tão ruim, o que nos leva ao igualmente inofensivo terceiro filme, lançado em 2012.
Os agentes J (Will Smith) e K (Tommy Lee Jones) continuam protegendo a humanidade de ameaças vindas de outros planetas. A partir da fuga do alienígena Boris (Jermaine Clement) de uma penitenciária de segurança máxima localizada na Lua, ele faz uma viagem de 43 anos no tempo para evitar a sua prisão, mata o agente K e estabelece uma nova cadeia de eventos que culmina em uma invasão que coloca o planeta Terra em perigo. Em função disso, o agente J precisa voltar ao passado para eliminar Boris, salvar a versão mais nova de K (Josh Brolin) e reestabelecer a ordem. A premissa não é tão complexa quanto parece já que tramas que investem em viagens no tempo são corriqueiras no cinema e o roteirista Etan Cohen abraça a convenção de trabalhar a sua narrativa apenas entre passado e presente, ignorando o que acontece nesse intervalo de tempo. Boris, por exemplo, volta no tempo para escapar do seu destino trágico de 43 anos, mas convenientemente só é capaz de executar seu novo plano nesse mesmo intervalo de tempo justamente quando poderia ser impedido através do mesmo artifício que utilizou.
De maneira geral, o roteiro não se revela especialmente inspirado, as piadas envolvendo Andy Warhol e Mick Jagger como seres de outro planeta são corriqueiras e a viagem no tempo de J ocorre na véspera de um momento-chave apenas para dar um senso de urgência artificial, logo os eventos acabam funcionando mesmo apenas em função de Boris e Griffin (Michael Stuhlbarg), um alienígena com dons premonitórios, que dão a dinâmica necessária para levar os personagens de um lugar para o outro. Ambientada em 1969 através de um discreto, mas eficiente trabalho de direção de arte, a narrativa sabe brincar com as versões ultrapassadas das tecnologias modernas utilizadas pelos agentes, mas investe na velha dinâmica de dupla antagonista vista no primeiro filme e reciclada no segundo, logo sem o mesmo apelo e charme.
O carisma de Will Smith já não é mais o mesmo, mas neste aqui ainda funciona, porém o seu status de astro já não permite que piadas de conotação racista lhe caibam de maneira cômica como foi no início de carreira. Tommy Lee Jones está mais do que à vontade ao encarnar o tipo durão e taciturno, porém não dá pra negar que assim como no segundo filme a sua participação é reduzida e limitada, como se o próprio ator estivesse cansado da franquia. Embora Josh Brolin não convença como um personagem de 29 anos, ele realiza um trabalho de composição bastante competente ao referenciar a (falta de) expressividade e os gestuais de Tommy Lee Jones com frescor e certo ar jovial.
O diretor Barry Sonnenfield parece anestesiado, realiza um trabalho pouco vibrante e bastante convencional, o que de certa forma parece justificar o resultado tão morno e indiferente de “MIB – Homens de Preto 3”. O clímax é pouco empolgante, mas oferece um momento de apelo dramático que procura alinhar emocionalmente os agentes J e K, dando uma dimensão coerente e um significado maior à parceria entre os dois e os sacrifícios que K fez ao longo da sua vida, mas o filme é estéril e jamais alcança o nível do primeiro filme que, na verdade, nunca foi tão alto e consegue ser levemente superior ao segundo que, por sua vez, não era tão ruim, mas acho que eu já disse isso antes.
Comentário extraído do blog ARGUMENTÁRIO - UM ESPAÇO DE IDÉIAS E REFLEXÕES
FILTH
“Filth” é um filme ultrajante, esquizofrênico e misógino que espelha a natureza do personagem central, Bruce Robertson (James McAvoy), um investigador da polícia escocesa que anseia por uma promoção e que trabalha para desmoralizar os outros concorrentes à vaga durante a investigação de um crime. A partir da obra de Irvine Welsh, autor de “Trainspotting”, o roteirista e diretor Jon S. Baird cria um filme imoral e politicamente incorreto que tenta emular muito mais o estilo e a estética dos filmes comandados por Guy Ritchie do que do excepcional e energético filme de Danny Boyle, resultando em uma produção vazia, sem personalidade e repulsiva assim como a tradução sugere de maneira apropriada, afinal trata-se de sujeira e imundície em formato cinematográfico, um verdadeiro lixo descartável, embora atraente e excitante tecnicamente.
Viciado em cocaína, Bruce é um homem traumatizado pelo passado e com laços familiares em frangalhos que parece viver em uma realidade paralela decorrente do uso incontrolável de entorpecentes que lhe faz perder qualquer tipo de código moral e/ou ética e/ou bom senso, não pensando duas vezes em desqualificar seu parceiro (Jamie Bell) em função do tamanho do seu órgão genital ou traindo seu melhor amigo (Eddie Marsan) ao manter relações sexuais com sua esposa, entre outras atitudes inadequadas. Como dá pra notar, Bruce não é o melhor dos amigos e a trama policial parece uma mera desculpa para que o filme promova o maior número possível de sequências com algum tipo de conotação imprópria ou imoral como se o próprio filme estivesse sob o efeito de algum tipo de droga com a adição de uma fotografia multicolorida, uma trilha sonora psicodélica e uma montagem disléxica que ajudam a construir uma estética apropriada e atraente, mesmo que seja em meio a um vácuo de ideias.
Essa incômoda sensação de esquizofrenia narrativa faz com que Jon S. Baird tenha uma boa resposta na sequência de apresentação dos colegas de trabalho e candidatos à vaga da promoção, mas a partir de então ele só consegue provocar o nojo ou o enjoo com uma verborragia visual descontrolada, fora do tom e muitas vezes sem ritmo, muito bem ilustrada pela alucinação de porco visualizada por Bruce em alguns momentos convenientes e cruciais. James McAvoy não pode ser acusado de passividade já que confere energia e intensidade a um sujeito insano e repulsivo, mas os seus esforços são inúteis já que nada ao seu redor é capaz de colaborar com a mesma competência e dedicação. Os demais integrantes do elenco oscilam entre a inexpressividade e o desperdício, como nos casos de Jim Broadbent e até mesmo da quase sempre irregular Imogen Poots que parece ganhar voz lá pelo terceiro ato quando já é tarde demais.
Contando com uma reviravolta risível até mesmo para os fãs de Alfred Hitchcock e Brian De Palma em seu clímax, “Filth” tenta preencher a sua essência com uma lição de moral bonita e edificante que ajuda a explicar as irracionalidades cometidas por Bruce, mas a tentativa só torna a experiência de acompanhar a sua jornada ainda mais chata e aborrecida, desejando desesperadamente que o filme termine logo em troca de algum tipo de paz de espírito..
Lilly (Dakota Fanning) e Gerry (Elizabeth Olsen) são duas amigas inseparáveis de 16 anos que estão em vias de ingressar na faculdade, mas que antes desse rito de passagem ainda enfrentarão alguns dilemas de vida, especialmente o relacionado à lealdade da amizade entre as duas a partir do momento que Lily se envolve secretamente com David (Boyd Holbrook), um jovem fotógrafo por quem Gerry é apaixonada. “Garotas Inocentes” marca a estreia na direção da roteirista Naomi Foner Gyllenhaal (mãe dos atores Jake e Maggie Gyllenhaal) e se apresenta com um filme que traz certo frescor quando é simples, mas que se perde quando quer soar pretensioso.
Enquanto Lilly é uma garota mais introspectiva, melancólica e precisa enfrentar a tumultuada crise conjugal dos seus pais (Ellen Barkin e Clark Gregg), Gerry é mais extrovertida, desencanada e com aptidões musicais, mas que mesmo assim se sente deslocada diante dos seus exóticos pais (Richard Dreyfuss e Demi Moore). Dessa forma, embora com personalidades distintas, elas se ajudam e se completam. A narrativa, no entanto, acontece através da perspectiva de Lilly, logo quando ela se envolve com David é natural que haja uma identificação acerca dos benefícios daquela relação em sua vida, apesar de optar por não revelar para a melhor amiga. Nesse ponto, a atuação de Dakota Fanning é um tanto quanto enigmática e irregular já que Lilly se projeta de maneira fria em seu romance que lhe proporciona experiências intensas e inéditas, mas quando está ao lado da amiga compartilha um misto de remorso por Gerry e sofrimento, sugerindo que o seu sentimento por David é verdadeiro.
A atuação de Elizabeth Olsen é mais visceral. Embora Gerry às vezes se comporte de maneira egoísta com a amiga, ela é uma jovem que parece muito mais à vontade para transmitir as suas emoções, logo essa sensibilidade acaba fazendo com que Olsen experiente um alcance dramático muito maior do que Fanning que, por sua vez, tem a missão de conduzir uma incógnita. Quando Gerry, por exemplo, pede que David faça amor com ela por pura carência emocional, ela está sendo transparente em seus defeitos, porém quando Lily afirma que vai sentir a ausência dele, essa falta de conexão emocional a torna uma personagem mais irritante, mesmo que seja decorrente da mesma imaturidade compartilhada por Gerry. Ainda assim a atuação de Dakota Fanning consegue ser sensível e a sua parceira em cena ao lado de Elizabeth Olsen edifica o filme que se dá ao luxo de colocar Richard Dreyfuss, Demi Moore e Peter Sarsgaard como meras participações especiais, sendo que este último se sai um pouco melhor, como o chefe de Lilly, já que consegue construir um personagem levemente dúbio e complexo com pouquíssimo tempo de cena.
Boyd Holbrook não chega a comprometer, mas o seu personagem é extremamente estereotipado e dentro de um universo com duas personagens jovens e femininas tão atraentes, cada qual com o seu perfil, ele acaba empalidecendo e até mesmo enfraquecendo o interesse romântico que ambas nutrem por ele. E aqui Gyllenhaal se sente confortável para explorar um tom mais presunçoso através das fotografias e da alma de artista de David, permitindo até mesmo uma encenação gratuita em um espaço público apenas para que isso se torne alvo da câmera (dela e do personagem). A analogia que o roteiro tenta estabelecer entre a traição entre as amigas e a dos pais de Lilly é bastante óbvia por si só, sendo desnecessário discurso expositivo do pai lá pelo terceiro ato, e o arco dramático decorrente da traição é igualmente previsível, mas felizmente o filme nos priva de uma eventual “narração em off” que poderia nos martelar essas mesmas convicções ao longo do filme todo.
Contando com uma bela seleção de canções melancólicas, inclusive uma belíssima cantada por Gerry, “Garotas Inocentes” acaba oferecendo uma experiência levemente agridoce já que através da sua ótica feminina traz personalidade ao abordar temas que já foram exaustivamente explorados em outras produções, mesmo ocasionalmente escorregando ora em clichês, ora na própria presunção mesmo. Nada que o talento, o carisma e a beleza de Dakota Fanning e Elizabeth Olsen não se encarreguem de consertar.
6.0/10
Comentário extraído do blog ARGUMENTÁRIO - UM ESPAÇO DE IDEIAS E REFLEXÕES
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ERA UMA VEZ EM NOVA IORQUE
O diretor James Gray já realizou três pequenos grandes filmes: “Caminho Sem Volta” (2000), “Os Donos da Noite” (2007) e “Amantes” (2008), que se mostraram filmes sóbrios, acima da média e que o colocaram como um dos diretores americanos mais promissores desses últimos anos. Infelizmente, “Era Uma Vez em Nova Iorque” (tradução pretensiosa para “The Immigrant”) é o seu filme menos virtuoso, uma espécie de ponto fora da curva.
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SUÍTE FRANCESA
“Suíte Francesa” é um filme baseado na obra literária de mesmo nome, escrita pela judia Irène Némirovsky, durante a 2ª Guerra Mundial, antes de ser morta em um campo de concentração. O livro carrega por si só um valor histórico e artístico incontestável, pois os manuscritos foram salvos pelas filhas e por uma governanta por acreditarem que se tratava de um diário pessoal e seu conteúdo ficou inédito por 62 anos. Dirigida por Saul Dibb (“A Duquesa”), a partir do roteiro coescrito ao lado de Matt Charman, esta adaptação cinematográfica, no entanto, resulta em um drama sensível, mas de apelo mediano.
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A HISTÓRIA REAL DE UM ASSASSINO FALSO
Apresentada como uma produção original da NETFLIX, mas sem ser tão original assim, “A História Real de Um Assassino Falso” é um filme ocasionalmente divertido bem defendido por Kevin James e que consegue explorar o potencial da piada central que serve de base para a sua premissa, mas que falha em sua missão de oferecer bem mais do que isso, o que pode parece pouco e que, na verdade, realmente é.
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Holland March (Ryan Gosling) e Jackson Healy (Russel Crowe) são dois detetives particulares que se esbarram e passam a atuar juntos em um caso em que envolve o desaparecimento de Amelia (Margaret Qualley), filha da chefe do Departamento de Justiça (Kim Bassinger), e que parece potencialmente relacionado com a indústria de cinema pornográfica. Ambientado na década de 70, “Dois Caras Legais” é uma divertida comédia policial em que o roteirista e diretor Shane Black recicla mais uma vez de maneira inspirada a fórmula da dupla de detetives de personalidades opostas, como já tinha se especializado como roteirista da franquia “Máquina Mortífera” e mais recentemente com “Beijos e Tiros”, estrelado por Robert Downey Jr. e Val Kilmer.
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Em “Transformers: A Era da Extinção” a receita é a mesma vista nos filmes anteriores, logo não há muita esperança de ver algum tipo de evolução substancial, ainda mais que Michael Bay segue na direção comandando um Carnaval de efeitos especiais gratuitos, abusando de tiros e explosões em escalas apoteóticas, ocasionalmente servindo de comercial para algumas marcas famosas e/ou clipe musical para uma trilha ou canções de qualidade discutível, mas é claro, sem deixar de apostar na beleza de um lindo pôr-do-sol como pano de fundo.
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Se há algo de positivo que possa despertar algum tipo de interesse em “A Vida Secreta de Zoe” é o elenco, ainda que irregular. Sharon Leal é uma atriz bastante virtuosa que consegue sair ilesa desse filme já que ela consegue explorar com sensibilidade a vulnerabilidade da personagem e mesmo quando Zoe assume uma postura mais controversa e/ou menos inteligente há uma empatia que não se perde totalmente. Boris Kodjoe demonstra bastante segurança e serenidade, representando uma espécie de balança moral dentro da história, mas sem se tornar uma figura estéril e/ou apagada. Já William Levy e Tyson Beckford, que interpreta a outra transa casual de Zoe, tem participações risíveis já que interpretam os amantes e são verdadeiros estereótipos ambulantes, o que de certa forma só justifica o tom piegas desse casto e caótico thriller erótico que mais parece interessado em ser comercial de margarina.
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“O Último Capítulo” é mais um filme de suspense que explora o potencial do subgênero de casas mal assombradas e, infelizmente, é isso mesmo: apenas mais um filme de suspense.
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"Transcendence - A Revolução" tenta explorar através da sua premissa o potencial dos conceitos de inteligência artificial e nanotecnologia, mas o resultado final é bastante limitado e, em seus piores momentos, até banal. Will Caster (Johnny Depp) é um renomado cientista, pesquisador dedicado ao desenvolvimento da tecnologia para que a ciência melhore a vida da humanidade, especialista em Inteligência Artificial, mas que sofre um atentado de um grupo de "hackers" contrário à evolução da Ciência. Antes de morrer, a sua esposa Evelyn (Rebecca Hall), também cientista, resolve armazenar "literalmente" a sua consciência, as suas lembranças e memórias, levando o conceito do uso da inteligência artificial a um nível extraordinário e ainda assim extremamente perigoso.
Marcando a estréia discreta de Wally Pfister na direção, responsável pela fotografia dos filmes do Christopher Nolan, "Transcendence" é um filme que tem um conceito interessante, afinal o tema da inteligência artificial explora vertentes que vão desde a evolução da ciência para a cura de doenças até mesmo questões relacionadas à humanidade e a natureza das emoções. Por mais absurdo que seja a premissa, o apelo central do filme reside muito em função da interpretação da Rebecca Hall que legitima a "sobrevivência" do marido com muito mais propriedade do que qualquer explicação científica. Ainda assim, o filme desenvolve essa ideia de forma que não soa cansativo ou massante e até visualmente aceitável, apesar dos absurdos envolvendo transferência milionária de dinheiro que passa impune e a construção de uma empresa tecnologicamente absurda em uma cidade miserável. A devoção da esposa e essa carga são os principais trunfos do filme até porque a atuação do Johnny Depp é bastante preguiçosa e sem um mínimo de inspiração. Ironicamente, ele parece no piloto automático.
A partir do momento que a narrativa dá um salto de 2 anos, o nível de absurdos passa a se tornar maior e a história começa a escorregar na extensão das suas idéias, justamente ao fazer com que as pessoas se tornem escravos com superpoderes em uma versão extrapolada do uso da tecnologia. Se não bastasse a tal inteligência artificial ter a capacidade de ter o controle da matéria (ela é capaz de reconstruir objetos destruídos por explosões), ou seja, interferindo fisicamente na história. Os furos no roteiro se tornam mais indefensáveis, como quando Evelyn convida dois personagens para visitar as instalações da sua empresa em meio ao deserto, expondo-se de maneira frágil e desnecessária. O grupo de "hackers" que, em determinado momento, é classificado como terroristas, promovendo a morte de muitas pessoas, acaba sendo usado como um parceiro do FBI de maneira inconsequente e desproporcional. Dessa forma, a segunda metade do filme acaba sendo carregando o filme ladeira abaixo, apesar dos esforços já reconhecidos da Rebecca Hall, mas também do Paul Bettany, sendo que Morgan Freeman e Cillian Murphy estão apáticos.
Falhando na sua missão de se tornar uma ficção científica destacável, apesar da sua premissa interessante e dos bons efeitos especiais, "Transcendence - A Revolução" também não funciona na sua tentativa de explorar o seu material no âmbito romântico, apesar dos esforços da Rebeca Hall e por causa do seu desfecho piegas, ou seja, o filme acaba ficando no meio do caminho e acaba não chegando a lugar algum, logo não transcendeu.
"A 13ª Emenda" é um documentário dirigido por Ava DuVenay que investiga as raízes e a natureza histórica da segregação racial nos EUA desde os primórdios da escravidão, passando pelo crescimento do ativismo civil, pela emenda da Constituição que relativiza a condição de liberdade até devassar o sistema carcerário privado americano, dominado por uma série de corporações com interesses escusos. Do ponto de vista narrativo é um documentário muito bem dirigido, ágil, dinâmico e que possui uma fluidez orgânica como se estivesse sendo apresentado, do início ao fim, em um mesmo "take" já que em nenhum momento a narrativa perde o ritmo, sendo constante e explorando uma coerência cronológica através dos depoimentos fundamental para o painel histórico que pretende relatar.
O documentário é preciso ao retratar como o fim da escravidão foi um evento importante, porém chocante para a população negra já que foram retiradas de um sistema opressor para conviverem em uma sociedade que não estava preparada em aceitá-los, sendo que nem mesmo eles tinham a dimensão do choque de realidade que teriam que enfrentar agora que eram pessoas livres. Deduzir que essa imensa população negra não teria direito as mesmas oportunidades, que seriam marginalizadas, discriminadas e que parte dela viveria na pobreza ou se envolveria com diferentes formas de crime acaba sendo uma condição natural, porém houve uma potencialização que tornou homens e mulheres negros alvos fáceis para qualquer tipo de política repreensiva. Ava DuVenay poderia ter "amarrado" um pouco melhor essa ligação entre a condição social e a repressão já que os elementos para ilustrar essa narrativa surge ocasionalmente ao longo da narrativa.
De qualquer forma, o documentário explora que ao longo da História, a população negra vem sofrendo diversas e diferentes formas de opressão, seja o da discriminação, o da repressão pela luta de direitos iguais ou até mesmo da criminalização já que atualmente, a população negra responde por 6% da população norte-americana, mas corresponde a mais de 40% do total da população carcerária nos EUA, o que é uma estatística assustadora, mas cuja resposta está justamente na maneira como esse assunto foi conduzido com o passar do tempo. Um dos aspectos mais chocantes relatados no documentário é perceber como a maior parte das políticas públicas de segurança adotados pelos governos americanos servem para "atacar" a população mais pobre e carente (e consequentemente negra), como uma forma de eliminar o problema, sem o menor interesse de investigar a causa. E aqui vale o adendo de que não há a menor intenção de alegar que não possam existir criminosos negros que mereçam estar presos (que não é o foco do documentário, mas que convenientemente relata apenas crimes "pequenos"), mas o encarceramento em massa é um fenômeno social que vai muito além do espectro policial. Em qualquer lugar do mundo, a população mais pobre e carente estará mais suscetível às práticas criminosas e o problema não se resolve escondendo-o debaixo do tapete ou colocando-o dentro de uma cela e com isso não estou dizendo que criminosos não devam ser punidos.
Passando pelos registros de algumas personalidades da liderança do movimento negro pela igualdade de direitos, o documentário deixa evidente como essa questão da desigualdade racial é algo enraizado na cultura norte-americana, seja através do cinema ou da televisão, mas sempre sendo representativo no debate político. E nesse ponto, a privatização do sistema carcerário é intimamente relacionado, pois muitas leis adotadas pelos estados americanos ou pelo próprio governo federal buscou ao longo do tempo não a prática da justiça de maneira genuína, mas o que se promoveu foi o atendimento de interesses corporativos interessados em lucrar com uma população carcerária cada vez maior, especialmente a partir da década de 70 com o governo Nixon, crescendo exponencialmente com Reagan, Clinton e até hoje. A maneira escancarada com que as empresas abusam dessa indústria do encarceramento, seja aquelas relacionadas a fornecer alimentos aos presos ou a que garante que os presidiários liguem para suas famílias ou até mesmo aquelas que usam do trabalho gratuito como mão-de-obra, é algo alarmante, afinal um sistema econômico amplo e complexo passa a existir a partir da necessidade que cada vez mais pessoas sejam presas. Estas mesmas empresas tem uma vasta influência na aprovação de projetos de leis que lhe sejam favoráveis (algumas delas criadas por elas mesmas) e, ironicamente, com o discurso hipócrita visam investimentos em tecnologia de tornozeleiras eletrônicas para permitir que certos criminosos possam cumprir suas penas em "liberdade".
Competente e preciso, mesmo sem ser absolutamente perfeito, "A 13ª Emenda" é um documentário contundente que toca uma ferida importante da sociedade norte-americana, mas que apresenta um cenário que pode ser perfeitamente transferido para qualquer país, especialmente no Brasil em que minorias são marginalizadas e criminalizadas à exaustão. É um filme inteligente, envolvente e esclarecedor que certamente traz à luz uma série de elementos que merecem ser discutidos por todo cidadão de bem que pretende viver em uma sociedade mais digna, justa e igualitária, tornando-se uma produção obrigatória, essencial e fundamental.
"Lucy" é um filme problemático do início ao fim ao explorar de maneira rasteira uma premissa interessante e intrigante que mescla ação e ficção científica através de um fiapo de roteiro. Lucy (Scarlett Johansson) é uma jovem americana em Taiwan que acaba sendo envolvida em uma trama de tráfico de drogas internacional quando é forçada a transportar uma nova e poderosa substância sintética em um pacote que foi cirurgicamente instalada em seu estômago. Acidentalmente, o pacote se rompe, a droga é absorvida pelo seu corpo e ela passa a ter uma capacidade sobre-humana que, segundo a teoria defendida pelo filme, faz com que ela passe a usar cada vez mais a sua capacidade cerebral. Sua missão passa a ser o de recuperar os outros pacotes de drogas injetados nas outras "mulas" para alcançar o 100% de uso de seu cérebro e ajudar a comunidade científica antes que a droga seja recuperada por um sanguinário traficante.
O roteiro escrito pelo diretor Luc Besson é uma colcha de retalhos, um samba do crioulo doido, um queijo suiço de proporções homéricas, analogias não faltam para se equiparar à proposta. Inicialmente, o filme peca pelo excesso de didatismo ao nos apresentar a figura do professor/cientista Norman (Morgan Freeman) dando uma palestra como se estivesse explicando ao próprio espectador a teoria defendida pelo filme com a inserção de imagens excessivamente auto-explicativas, certamente duvidando da capacidade de quem assiste se de fato entende o que está sendo dito. Ora as imagens são totalmente desconexas, apenas para que se estabeleça um paralelo com a situação-limite vivida por Lucy que é de falta de sutileza sem tamanho, afinal um hotel luxuoso serve de esconderijo/laboratório do tal traficante que recruta suas "mulas" para o trabalho forçado sem a menor intenção de parecer discreto. Esteticamente, o filme é desinteressante, sem chamar a atenção para nenhum dos seus aspectos técnicos e Luc Besson decepciona por não ser capaz de criar uma narrativa atraente seja pela forma, pelo ritmo e/ou pela energia, mesmo que seja tão problemática em seu conteúdo.
Os esforços dramáticos de Scarlett Johansson são legítimos já que ela consegue explorar a tensão diante da catarse com bastante intensidade e quando ela precisa se comportar mais como uma "entidade", em função dos efeitos da droga, a sua falta de expressividade, quase robótica, é muito bem utilizada pela atriz. Mas de qualquer forma, o filme abusa da própria incapacidade ao limitar as potencialidades adquiridas pela personagem ou até mesmo subutilizá-las quase que em um exercício desnecessário de tentativa e erro, pois ela é capaz de extrair a bala de um tiro com a própria mão, mas é incapaz de realizar a própria cirurgia para extrair o restante do pacote que permanece em seu corpo. Ela não se comporta como uma heroína, mas também não tem o menor pudor de colocar civis e policiais em risco durante os acidentes que provoca durante uma perseguição automobilística. E se ao longo do filme, ela vai se tornando cada vez mais magnânima ao utilizar o seu cérebro, ela parece medir cada vez menos as consequências dos seus atos, afinal em determinado momento é capaz de adivinhar a cor da caneta que está ao lado de um detetive em um outro país, mas é incapaz de impedir e/ou evitar que professores e cientistas sejam mortos pelos traficantes já que ela mesmo é quem os colocou em risco.
Contando com um clímax que traz uma série de imagens que parecem extraídas de um documentário qualquer e que remetem à Criação, "Lucy" chega ao ápice das suas idéias constrangedoras ao sugerir que o ápice do potencial do conhecimento humano possa ser devidamente armazenado em um pen drive, afinal ninguém é capaz de criar uma tecnologia mais sofisticada do que essa. Em meio ao turbilhão de idéias que poderiam ser usadas para fazer com que o filme se mostrasse mais inteligente ou o mais próximo possível do 100% da sua capacidade, "Lucy" ficou mesmo com aquele 1%.
O documentário da diretora Crystal Moselle parte de uma premissa interessante e excêntrica, mas que se perde pela falta de foco e o resultado final acaba sendo exótico e bastante irregular. Os tais "Irmãos Lobo" fazem parte de uma família que vive enclausurada em seu apartamento na cidade de Nova Iorque, longe do convívio social, logo a educação dos filhos ficou por conta da mãe e o maior contato que eles tinham com o mundo externo era através dos filmes que eles assistiam, sendo capazes de reconstituir cenas com muita criatividade, realçando ainda mais a natureza escapista do cinema, potencializada pelo estilo de vida da família imposto pelo pai que resolver levar às últimas consequências a distorção de uma filosofia "hippie", anti-capitalista ou seja lá o que for.
Basicamente se sustentando através dos depoimentos dos irmãos, o documentário tem como aspecto positivo um certo distanciamento por parte de Moselle, deixando que os próprios garotos façam uma auto-análise de suas vidas, mas a falta de pulso da diretora faz com que o filme se torne prolixo, repetitivo e até mesmo auto-referencial já que parece encantado com as encenações estreladas pelos irmãos. De qualquer forma, o documentário explora a vertente lúdica da relevância cinematográfica na vida desses garotos, certamente a ponte de salvação que permitiu que eles mantivessem a sanidade (além é claro da dedicação da própria mãe), porém essa paixão pelos filmes só é mais uma distorção da atitude exagerada do pai, afinal ele achava que o mundo lá fora estava perdido, mas se rendeu ao cinema e deixava que a Coca-Cola entrasse dentro do seu lar. E esse "hobby" certamente serviu de inspiração para que os filhos "quebrassem" a ditadura patriarcal que marcou tanto a história daquela família.
Irregular, curioso e bizarro, "Os Irmãos Lobos" acaba sendo um documentário fundamental por trazer em sua essência a importância que a educação promovida pelos pais tem sob os filhos a partir de um exemplo extremista. Cada decisão e a maneira como a educação e os valores são transmitidos são fundamentais para determinar a formação do caráter de uma pessoa e se não fossem os filmes, os filhos certamente seriam condicionados a serem figuras menos humanas se vivessem apenas sob influência do pai, mas a humanidade se manteve presente, muito em função da abertura que tiveram com os filmes, mas também pela participação da mãe que se manteve passiva diante de um relacionamento amoroso opressor com o pais dos seus filhos, mas que ainda assim buscou fazer o melhor com o que tinha a sua disposição. A figura da mãe é trágica, porém a tragédia da sua vida foi compensada pela redenção dos filhos e na capacidade deles de reescrever a sua história, como eles fizeram questão de encenar no ato final deste documentário que de certa forma é uma redentora história de sobrevivência.
Do ponto de vista emocional, "The Witness" é um documentário angustiante e inquietante já que acompanha a saga de Bill Genovese na busca de uma melhor compreensão sobre a morte de sua irmã Kitty, assassinada há 50 anos nos arredores do bairro residencial em que morava em Nova Iorque onde, supostamente, 38 vizinhos testemunharam o ocorrido, de maneira direta ou indireta, sem demonstrar nenhum tipo de solidariedade. Na época o caso ganhou muita repercussão e um artigo publicado pelo New York Times influenciou a opinião público e algumas políticas de segurança até ser desmentido décadas depois através de um novo editorial publicado pelo jornal.
Aqui, neste caso, o responsável pelo crime foi preso cinco dias depois através de uma confissão do próprio assassino após ter cometido um outro crime, porém o que instigou Bill a desenterrar o passado foi a passividade dos vizinhos, conforme relatado, e consequentemente o desmentido do NYT que jogou por terra a teoria que todos tinham sobre o caso até então. O documentário segue um caminho investigativo limitado, resgatando os depoimentos dados na época do crime, inserindo fatos novos apenas através do relato da melhor amiga da irmã (ignorado na investigação inicial), funcionando muito mais como uma espécie de redenção para servir de oportunidade para que a história de vida de Kitty seja contada, mesmo que de maneira superficial, e do próprio Bill que por ter uma afinidade maior com a irmã desde criança sentiu muito a sua perda, o que acabou influenciando diretamente a sua própria vida e as suas escolhas já que decidiu servir o país no Vietnã para não ser apenas um agente passivo durante uma guerra e teve suas duas pernas amputadas como consequência.
Inconclusivo e afetado pela carga emocional, o documentário parece trazer a paz para a vida de Bill muito mais em função da mais nova e afetada declaração feita pelo assassino através de uma carta que só o compromete ainda mais do que propriamente pelas respostas que o próprio procurava (fica claro que mesmo os vizinhos vivos da época não querem se comprometer com a possibilidade de serem considerados "covardes" por não terem feito nada). De qualquer forma não deixa de ser tenso e angustiante, o encontro de Bill com o filho do assassino já que ambos foram afetados pelo ocorrido, mesmo que cada um carregue as suas próprias verdades. Ao final, o documentarista James Solomon parece interessado em uma catarse dramática ao convocar uma atriz para simular os gritos de Kitty no mesmo horário em que o crime ocorreu, quase que como um estudo sociológico, afinal a reação dos vizinhos acaba sendo surpreendentemente triste, mas honestamente o efeito acaba sendo nulo, mórbido e mais uma vez inconclusivo.
"Como Eu Era Antes de Você" é um filme que cativa pela simplicidade em que lida com sua premissa que perigosamente flerta com o melodrama e essa sua aposta simplista torna genuína a experiência emocional promovida pelo filme muito em função também do carisma do seu casal de protagonistas. Louisa Clark (Emilia Clarke) é uma jovem desempregada de uma cidade do interior da Inglaterra que aceita o trabalho de acompanhante do jovem Will Traynor (Sam Clafin) que fica tetraplégico após um atropelamento e a interação entre os dois transformará a vida de ambos.
A partir do roteiro adaptado de Jojo Moyes do seu próprio "best seller", a diretora Thea Sharrock realiza um trabalho praticamente invisível quase que de uma espectadora privilegiada, encarregada de não "estragar" a história já que as suas intervenções são mínimas e tímidas, quase que imperceptíveis. Essa sua postura não chega a ser totalmente um problema, mas revela a falta de ambição do filme assumir uma personalidade própria que vá além do apelo da obra literária por maiores que sejam as "adaptações" que a própria Moyes tenha promovido. A leveza do filme acaba funcionando a favor da condução da história que. se de certa forma deixa de lado a rotina pesada decorrente da limitação física de Will, afinal Louisa não é sua enfermeira ao menos permite uma visão menos pedante da figura da pessoa deficiente já que ele não tem pena de si mesmo, o que de certa forma se assemelha levemente ao protagonista de "Intocáveis".
Emilia Clarke é uma atriz bastante esforçada e mesmo que exagere aqui e ali com uma atuação um tanto quanto careteira em certos momentos, ainda assim consegue trazer na maior parte do tempo uma sensibilidade à flor da pele a uma personagem claramente positiva e que procura agregar à rotina de Will um pouco mais de energia e alegria. Essa generosidade da personagem é uma dádiva à condução da história, afinal ela não se comporta como se estivesse em busca de uma recompensa, nem mesmo emocional, porém a sua interação com Will lhe traz uma vivacidade que ela não tem em seu relacionamento com o atual namorado, por exemplo, que coincidentemente (e não ironicamente) é um corredor que não lhe dá a mínima atenção. Já Will, inicialmente, se apresenta como um sujeito frio, mas que gradativamente vai se mostrando mais receptivo à presença de Louisa e de certa forma, mesmo diante das suas limitações, utiliza da sua condição para permitir que ela viva experiências que naturalmente ela não teria seja pela sua condição social ou até mesmo por certo comodismo ou ignorância intelectual. Certamente é uma relação em que existe uma troca, não necessariamente romântica, mas humanamente admirável e o carismático Sam Clafin realiza um trabalho digno, seguro e preciso, mesmo sem ser absolutamente cativante.
Pontuado por eventos fracos do ponto de vista narrativo (o melhor deles se resume a uma sequência de dança, mas mal ilustrada por Sharrock), "Como Eu Era Antes de Você" pode ser resumido através de alguns termos clichês do tipo "que seja eterno enquanto dure", "viva a vida como se não existisse amanhã", "não importa o quanto se vive, mas como se vive" e muito desse "blábláblá" que se vende em literatura de auto-ajuda, mas a trama tenta se equilibrar entre essa necessidade de deixar uma mensagem sem soar piegas ao mesmo tempo que tem um apelo universal e romântico. Existe um ponto de virada no terceiro ato que de certa forma é previsível, mas não deixa de ser corajoso ao passo que coloca Will como protagonista da sua vida e plenamente responsável pela sua tomada de decisão final, independente do que aconteceu até ali, porém não deixa de ser irônico que o suporte emocional e financeiro dado por ele a ela seja superior ao do próprio enfermeiro, por exemplo, que esteve lá nos melhores e piores momentos de Will, pelo menos, nos últimos 2 anos de sua vida. Ok, é uma história romântica, entre um homem e uma mulher, mas não deixo de ficar curioso sobre o que foi destinado ao leal enfermeiro no testamento de Will, algo que não chega a repercutir no filme.
Com uma trilha sonora cativante e apaixonante, "Como Eu Era Antes de Você" é um filme sensível e carismático que de forma simples e simplista explora o potencial da sua premissa, tornando-se um filme leve, positivo, mesmo quando precisa embarcar em um tom mais pesado e melancólico, e que deixa o seu recado de maneira moderada já que não tem muita ambição, mas também sem exagerar na pieguice, representando o que há de melhor e pior no estilo "água com açúcar".
Este documentário acompanha o caso controverso de assassinato da jovem britânica Meredith Kercher que ocorreu em 2007 na pequena cidade de Perúgia na Itália e que ganhou repercussão midiática internacional. A jovem americana Amanda Knox e o jovem italiano Raffaele Sollecito foram considerados culpados pelo crime, passaram 4 anos na prisão até serem absolvidos em função do trabalho de uma perícia independente que refutou a qualidade da investigação inicial, porém somente 8 anos após o crime receberam a definitiva absolvição pela Suprema Corte Italiana, mas que ainda assim não foi o bastante para eliminar totalmente as suspeitas e/ou acalmar a opinião pública sobre a verdadeira inocência dos dois.
O aspecto mais curioso deste documentário é que a sua narrativa acompanha a evolução cronológica dos fatos e das investigações, o que de certa forma faz com que a percepção sobre o caso também mude conforme a evolução do que é narrado, mesmo que haja depoimentos recentes de Amanda e Raffaele já em liberdade. Confesso que essa sensação é um tanto quanto incômoda, pois parece que o documentário não tem a mínima intenção de dissipar as dúvidas e/ou tenta se aproveitar da controvérsia para construir um clima de suspense, como uma peça de entretenimento. A maneira irregular como os fatos são apresentados seja antes do crime e até a prisão dos dois jovens, inclusive com destaque para declarações mentirosas e falsas acusações por parte de Amanda e Raffaele que fazem parte do processo, parece ter justamente o interesse de confundir ou deixar a dúvida no ar.
Ao mesmo tempo, o documentário não deixa de funcionar como uma espécie de material de defesa dos dois jovens, afinal há a exposição da precipitação relacionada à investigação policial, inclusive dos peritos, através do depoimento do próprio investigador responsável pelo caso que em determinado se declara fã de Sherlock Holmes, assim como a cobertura sensacionalista da imprensa através de um dos principais jornalistas que acompanhou o caso e que não tem a menor pretensão de esconder que a sua maior preocupação era o de ter o maior número de manchetes, a qualquer custo. Em um primeiro momento é até compreensível que certas deduções e/ou atitudes tenham sido tomadas, mas gradativamente a espontaneidade dos dois em expor diante das câmeras seus juízos e defeitos diante do caso, especialmente em alguns momentos cruciais, beira o constrangimento.
E esse sentimento parece ser mais evidente diante da condenação de um terceiro acusado pelo crime, o marfinês Rudy Guede, com histórico criminal de invasão à residências, cujo DNA também estava presente na cena do crime, que teve um julgamento isolado dos outros dois com condenação de 16 anos e que não recebeu a mesma atenção da mídia. A presença de uma terceira pessoa na cena do crime, diante das circunstâncias, tornou as teorias quanto aos requintes do crime ainda mais chocantes e sensacionalistas. Os diretores Brian McGinn e Rod Blackhurst exploram superficialmente o drama da família de Meredith que provavelmente se reservaram ao direito de não participar diretamente do documentário, afinal o material utilizado se resume às coletivas de imprensa concedidas pelos familiares e uma rápida declaração da mãe de Meredith, quase de supetão.
De qualquer forma, o documentário acaba perdendo uma boa oportunidade de contextualizar esse caso com uma abordagem muito mais profunda e ampla sobre a cobertura midiática de casos chocantes, ao circo de horrores em que se dá mais ênfase à figura dos assassinos, aos detalhes sórdidos e consequentemente a maneira como a sociedade reage diante disso. A conscientização acaba vindo tardiamente, quase no final e, ironicamente, muito mais através do depoimento de Amanda ao invés de buscar opinião de especialistas jurídicos, comportamentais e da própria imprensa para tratar sobre esses temas, seja com relação a este caso ou de maneira geral. E, assim, o sorriso de Amanda para a câmera acaba encerrando o documentário de maneira emblemática.
"Audrie & Daisy" é um documentário que serve para dar voz a uma série de adolescentes que sofreram abusos sexuais, mas que não tiveram coragem para denunciar, a partir da narrativa de dois casos chocantes que aconteceram nos EUA: um é o da garota Audrie que foi abusada sexualmente, teve fotos nuas expostas na Internet e cometeu o suicídio; o outro é o da garota Daisy que após ser estuprada e denunciar o caso contra os garotos responsáveis pelo crime teve a sua versão contestada na justiça. Em ambos os casos, as garotas tinham 14 anos e de certa forma não foram devidamente amparadas pela família, pelo Estado e/ou pela sociedade para lidar com a situação.
Na abordagem do documentário chama a atenção que os episódios tinham uma relação com amigos próximos das vítimas, logo faziam parte do círculo de amizades das garotas, o que demonstra que esse tipo de situação é passível de ocorrer com qualquer adolescente. No caso de Audrie, a discrição e a reclusão da garota após o ocorrido fez com que ela simplesmente não tivesse a capacidade emocional de lidar com a situação provocada pelo ostensivo "bullyng", fazendo com que seus pais não conseguissem compreender o drama que ela estava vivendo em sua totalidade, o que só aumenta ainda mais o trauma da tragédia. Com relação a Daisy, o aspecto mais assombroso é que embora os adolescentes envolvidos no casos tenham assumido a participação no ocorrido, uma série de falhas processuais fizeram com que a versão dela se tornasse frágil o suficiente para que as opiniões ficassem divididas e o caso fosse encerrado, passando a ser considerada por muitos como mentirosa.
A influência de políticos locais parece ter sido crucial para a reviravolta do caso ao ponto do próprio xerife, responsável por recolher e registrar as confissões, simplesmente considerar que "nem sempre os garotos são os culpados" nesse tipo de ocorrência. E, se não bastasse a revolta pela desqualificação da denúncia da vítima, o xerife ainda exibe com sarcasmo a sua própria ignorância por não conseguir entender porque Daisy é a única que não superou o ocorrido já que os três garotos seguiram em frente com suas vidas, inclusive ingressando em faculdades (e o depoimento de pelo menos um deles é ultrajante por mostrar que a falta de punição não permitiu que ele tivesse a verdadeira noção do crime que cometeu e das consequências que provocou). Nesse ponto, um grupo de apoio criado e liderado por outra adolescente, também vítima de abuso sexual, mas que não teve coragem de denunciar na época, acaba funcionando como um importante suporte emocional e social para que esse tipo de caso não seja negligenciado pela sociedade, fazendo com que suas vozes sejam ouvidas, possibilitando não apenas a existência desse documentário, mas também pela possibilidade de que o próprio caso de Daisy fosse revisitado, também diante da repercussão nacional tomada pelo caso, mesmo que as penas definitivas não tenham sido muito representativas em função de um processo investigativo claramente comprometido. De qualquer forma é notório como o abuso e a repercussão do caso trouxe marcas para a vida de Daisy decorrentes dos traumas que provocaram mudanças emocionais e físicas e interferiu diretamente na vida da sua mãe e do seu irmão que por sua vez encontrou um importante papel na formação de futuras gerações de garotos.
Um outro aspecto importante que deve ser mencionado com relação aos casos registrados é também a influência direta das drogas e, especialmente, das bebidas alcoólicas, mas que não recebe o tom crítico e responsável que merecia dentro dos contextos abordados. A facilidade com que adolescentes tem acesso a esse tipo de droga, seja legalizada ou não, é alarmante, o que deve chamar a atenção de autoridades, independente do país, e também dos pais no sentido de estarem mais presentes e serem mais responsáveis e atentos nessa relação que os filhos possuem com suas formas de "diversão", embora sob nenhuma circunstâncias justifique os atos criminosos praticados. Funcionando como uma importante plataforma de cooperação para que as vítimas desse tipo de crime não se sintam sozinhas e/ou intimidadas, "Audrie & Daisy" é um documentário que lança um olhar triste e melancólico sobre as vítimas adolescentes de crimes de abuso sexual e de injustiça, mas que também não deixa de ser um alento e um sopro de esperança para que situações como essa não voltem a ocorrer e/ou sejam tratadas impunemente.
Com "Magia Ao Luar", o roteirista e diretor Woody Allen consegue realizar um filme charmoso, leve e doce, mas que ainda assim traz uma abordagem inteligente, contundente e sarcástica sobre a maneira como o ceticismo e a espiritualidade interferem em nossa vida como uma forma de nos confortar e permitir que lidemos com as adversidades e as imprevisibilidades da vida, cada um a sua maneira e com sua respectiva linha de raciocínio ou de sensibilidade.
Stanley Crawford (Colin Firth) é um experiente, cético e talentoso mágico que é convidado por um amigo para desmascarar a jovem médium Sophie (Emma Stone) e evitar que ela aplique um golpe em uma família ricaça do interior da França de quem ganhou a confiança ao ponto de estar em vias de se casar com o único herdeiro. O roteiro faz questão de estabelecer o mágico como um homem arrogante, esnobe e prepotente através de diálogos deliciosos, incisivos e cortantes, porém isso acaba depondo um pouco contra a própria premissa já que se a ideia inicial era que Sophie não desconfiasse que está sendo investigada, a falta de sutileza na abordagem de Stanley chega a ser imatura e chama facilmente a atenção dela para as suas reais intenções.
E se Sophie desmascara Stanley rapidamente em função da sua abordagem equivocada, mas que valoriza a legitimidade do seu dom mediúnico, o experiente mágico passa a ficar cada vez mais inseguro diante da sua convicção de que ela é uma farsa até que ele finalmente admite o talento sobrenatural da jovem. A grande sacada do roteiro de Allen é fazer com que a partir do encantamento que o mágico passa a ter sobre a médium uma série de questionamentos passe a ser feito sobre convicções científicas e convenções populares relacionadas à vida e a morte, a maneira como nos relacionamos com os imprevistos e as coincidências da vida e até que ponto a ciência e a espiritualidade existem como "pontes de salvação" para conforto e auto-afirmação, dependendo do ponto de vista. E de forma até aliviada é que Stanley encara a possibilidade de que pela primeira vez na vida possa estar errado e por assim dizer livre dos seus dogmas para viver de maneira leve e plena justamente pelo sentimento que nutre por Sophie.
Esse embate e os diálogos travados pelo casal são muito bem defendidos por Colin Firth e Emma Stone que realizam dois trabalhos leves, sensíveis e bastante seguros, ele já demonstrando a elegância que já lhe é característica como ator talentoso que é enquanto ela traz uma doçura para este que certamente é um dos seus melhores e mais sofisticados trabalhos como atriz. Essa legitimidade emocional sustentada pelo carismático casal de atores é fundamental para que o apelo da narrativa se mantenha intacto a partir da segunda metade do filme, mesmo que o ponto de virada estabelecido pelo roteiro que serve de trampolim para o terceiro ato seja frágil e discutível (a ideia da publicidade e de um instituto paranormal prejudicaria os próprios envolvidos na trama). De qualquer forma, o dilema romântico enfrentado por Stanley não abandona a sua natureza racional assim como a postura de Sophie é plenamente defensável pela honestidade da sua natureza romântica.
Contando com um trabalho de fotografia divino e deslumbrante e um desfecho doce e delicado, "Magia Ao Luar" é um filme adorável e encantador que permite mais uma vez que Woody Allen investigue seus próprios demônios, afinal é um homem intelectual que deve viver em constante conflito com sua cada vez mais aperfeiçoada racionalidade e a sua infinita incapacidade de encontrar respostas razoáveis para muitos dos seus questionamentos, especialmente aqueles que cercam a sua apaixonada alma de artista que certamente é inexplicavelmente romântica. Graças a Deus!
Docinho da América
3.5 215 Assista AgoraDOCINHO DA AMÉRICA
Escrito e dirigido pela britânica Andrea Arnold, “Docinho da América” é um conto de fadas. Só que não. Alheio a poucas sutilezas e repleto de pormenores em seu mais de 160 minutos, o filme acompanha Star (Sasha Lane), uma jovem de 18 anos que se responsabiliza pelos seus dois irmãos pequenos da maneira que pode já que tem uma mãe relapsa e ausente e suporta uma relação abusiva com seu padrasto bêbado e drogado. Infeliz e frustrada, ela deixa tudo para trás e embarca em uma viagem com Jake (Shia LaBeouf) e um grupo formado por outros jovens que também deixaram suas famílias para trás com a expectativa de trabalho, um futuro melhor, descobrir a fórmula mágica da felicidade ou encontrar o sentido da vida. Na verdade, nem eles mesmos sabem o que querem da vida enquanto vendem um catálogo de revistas no porta a porta das casas das pessoas em busca de dinheiro para o consumo de drogas e bebidas.
Funcionando como uma versão alternativa e nada ortodoxa da viagem realizada pela personagem central de “Alice no País das Maravilhas”, o filme é prolixo na sua tentativa de acompanhar Star ao lado do grupo vivendo as mais vazias experiências para que possam se sentir vivos ou que lhes deem uma mera sensação de fazer parte de um coletivo. Apesar de Andrea Arnold adotar um estilo semidocumental com o intuito de captar com a câmera na mão a essência dos momentos de maneira orgânica e natural, “Docinho da América” é um filme vazio, imaturo e inconsequente sobre pessoas vazias, imaturas e inconsequentes, logo não dá para reclamar de incoerência. Geração perdida? Juventude sem perspectivas? Na verdade, tudo é muito vago e prosaico para se chegar há alguma conclusão crítica com exceção da qualidade técnica do ótimo e caprichado trabalho de fotografia que usa e abusa de filtros e vários tons ao longo do filme que não deixam negar que há uma preocupação estética rígida até mesmo nas sequências que supostamente seriam naturais e espontâneas, logo o filme não é tão naturalista ou documental quanto pretende ser.
Com relação à suposta oportunidade de trabalho não há nada de lícito nas atividades do grupo e Jake, uma espécie de “Chapeleiro Maluco”, não é ético no seu trabalho. Ele é o único que é apresentado praticando pequenos roubos, mas uma das poucas informações objetivas oferecidas pelo filme é que ele foi o responsável pelo treinamento dos demais integrantes, logo não é difícil associar o que os outros também faziam já que a natureza do trabalho é um mero pretexto para levantar fundos, ainda mais que Krystal (Riley Keough), a chefe do grupo ou “A Rainha Má”, nada mais é do que uma mescla de traficante, agiota e cafetã. Assim como muitos do grupo, Star está em busca de qualquer alternativa que a tire da realidade que considera insuportável, porém com o tempo, Jake se mostrará um perdedor ou na melhor das hipóteses um golpista que possui uma lábia mais apurada, menos com relação a sua maneira torta e machista de demonstrar que nutre algum sentimento por ela que vá além da mera excitação. No entanto, embora Star seja a “mocinha”, ela jamais se mostra uma personagem digna de torcida ou de pena, logo quando ela parece se incomodar com as mentiras que Jake conta para vender as revistas, Star acaba se tornando irritante em função da sua ingenuidade e da sua própria hipocrisia, como se fosse moralmente superior, sendo que é igual a todos os outros e distanciando-se ainda mais de qualquer sentimento de empatia.
Entre trancos e barrancos, a relação entre Jake e Star, que de maneira bastante conveniente e expositiva descobrem-se com os mesmos sonhos, acaba sendo o elemento mais próximo de um dilema que se cria dentro da narrativa já que promove pelo menos algum tipo de fagulha, mesmo sendo dois personagens rasos e desinteressantes e até por isso que Shia LaBeouf está tão à vontade enquanto Sasha Lane demonstra potencial, cumpre o seu papel, mas sem ser especialmente marcante ou cativante. As idas e vindas do casal, normalmente acompanhadas de carentes decepções e recomeços instantâneos só demonstram o quanto se merecem, no pior sentido do termo, com direito até mesmo ao acompanhamento de um ato sexual entre os dois bastante naturalista, sem que seja explícito, mas que não deixa de ser apenas mais uma sequência corriqueira dentro da flexível e às vezes irritante dinâmica da relação do casal. Riley Keough, como a traficante Krystal, se mostra uma atriz muito mais intensa e interessante em sua performance, sugerindo que caso a narrativa acompanhasse a jornada da sua vida desde o começo até chegar ali, o filme tenderia a ter muito mais sucesso.
Sem justificar a sua suposta pretensão de lançar um olhar crítico sobre a sociedade e uma geração desamparada e/ou sem perspectivas, “Docinho da América” acaba apresentando sequências isoladas que sugerem algum objetivo narrativo específico, que possa servir de evento catalisador e/ou motivador e/ou redentor para Star, mas são possibilidades que não se confirmam e que dentro do contexto geral ficam deslocadas, sem mérito algum. Em uma determinada residência, por exemplo, uma mulher se declara cristã, mas não percebe a erotização das brincadeiras da própria filha com as amigas (seriam elas tão perdidas quanto o grupo de Star?); em outro momento, três idosos milionários parecem não se importar em levar Star para dentro de casa e embebedá-la, mesmo sendo maior de idade (será que o dinheiro pode comprar tudo?); ao pegar carona com um caminhoneiro, Star tem um bom exemplo sobre a construção de uma família (será que felicidade e bom caráter caminham juntos pela estrada da vida?); já em outro momento se submete ao fetiche sexual de um melancólico petroleiro (será que o dinheiro não é tudo na vida já que não garante a felicidade?) e lá pelo final usa seu dinheiro para alimentar os filhos de uma mulher drogada que encontra pelo caminho (será que Star sente falta dos irmãos que deixou pra trás?). Dessa forma, assim como os momentos em grupo, essas sequências se tornam frustrantes e decepcionantes já que são tão corriqueiras quanto às experimentadas ao lado dos demais delinquentes (e se uso essa expressão é por não encontrar uma classificação melhor para um grupo de jovens que fingem que trabalham a mando de uma traficante apenas para farrear, beber e se drogar).
Sendo assim, “Docinho da América” é um filme que tenta se sustentar em meio a um vácuo de ideias sob um vazio pretexto existencialista de crítica social e que traz uma personagem central igualmente vazia e sem brilho. Em meio a canções, geralmente do hip hop americano, que tentam imprimir um senso artificial de harmonia e comunidade entre os integrantes do grupo, inclusive a bela balada country “American Honey” que dá título ao filme, “Docinho da América” é apenas um drama longo e enfadonho que não chega a lugar algum já que não justifica suas próprias escolhas narrativas, inclusive o seu desfecho surreal, e talvez nem faça jus a minha própria comparação com “Alice no País das Maravilhas”. Ou será que sim? Quer saber? Quem se importa...
4.0/10
Elle
3.8 886ELLE
Se o holandês Paul Verhoeven (“Robocop”, “Instinto Selvagem”, “Showgirls”, “A Espiã”) também não fosse um diretor polêmico, controverso e provocador, o francês “Elle” seria um filme que caberia perfeitamente na filmografia do alemão Michel Haneke (“A Professora de Piano”, “Violência Gratuita”, “Cachè” e “Amor”) em virtude da sua sagaz abordagem narrativa e psicológica sobre a natureza da violência, além de contar com a presença hipnótica e perturbadora de Isabelle Hubert, uma de suas intérpretes mais assíduas. A sequência de abertura de “Elle” acompanha fora de plano o estupro violento sofrido por Michele (Hubert) dentro da sua casa, enquanto ouvimos sons e barulhos que tornam a experiência ainda mais terrível e angustiante, porém em diversos momentos do filme ela é repetida através das lembranças da personagem com um nível de detalhes cada vez maior e às vezes até mesmo com resultados distintos. É quase que um jogo sádico conduzido por Verhoeven para testar os limites do espectador diante de um ato tão violento, gratuito e repulsivo.
Além desse choque inicial, o que espanta é a postura fria e racional de Michele diante do ocorrido, parecendo anestesiada emocionalmente já que não se preocupa em procurar a polícia enquanto arruma o estrago provocado pelo agressor em sua casa, mas pelo menos tem o discernimento de procurar auxílio médico para evitar uma possível contaminação por alguma doença sexualmente transmissível. De qualquer forma, o roteiro de David Birke, escrito a partir da obra de Philippe Djian, explora a frieza da personagem através da profissão de Michele, como executiva de uma produtora de jogos de videogame que vive uma situação crítica em função do atraso no lançamento de um novo jogo por considerar que ele não atingiu o nível de violência esperado. Ou seja, é um artifício até bastante óbvio e rasteiro que serve para ilustrar que ela (assim como a sociedade) está tão acostumada a lidar com a violência ficcional, ou até mesmo explorá-la comercialmente, em seu dia-a-dia que consegue abstraí-la do mundo real ao ponto dela não ter a mínima noção da gravidade do ato sofrido (ou talvez um excesso de familiaridade), afinal ela não hesita em revelar de maneira bastante corriqueira que sofreu o estupro para o seu ex-marido (Charles Berling) e a um casal de amigos antes de um jantar informal, como se não fosse um assunto indigesto.
Esse nível de estranheza de Michele é realçado quando o roteiro oferece pistas sobre a sua infância traumática, influenciada pelo pai, um assassino em série, através do artifício da televisão que mostra a sua história em uma surreal reportagem carregada de sentimentalismo barato quase que em uma necessidade explícita de banalizá-la (assim como a própria televisão o faz). O estuprador, supostamente, passa a espreitar Michele como uma forma de provocá-la seja no trabalho ou na sua vida social, porém ao invés de se mostrar assustada, ela parece decidida a encarar o criminoso de frente, quase que como um desafio pessoal. Essa mesma excitação também ocorre diante de um flerte com o vizinho (Laurent Lafitte) que, ironicamente, se manifesta mais intensamente quando ele monta o presépio de Natal na sua casa, mostrando que o nível de provocação de Verhoeven também pode ser o mesmo de um birrento adolescente ateu. Esse festival de bizarrices também é explorado pela falsa aproximação de Michele com a jovem namorada do ex-marido (Virginie Efira), por não sentir um mínimo de remorso em transar com o marido da sua melhor amiga (Anne Consigny), pelo fato da sua mãe (Judith Magre) ter o interesse de se casar com um jovem garoto de programa e até mesmo com seu filho (Jonas Bloquet), intelectualmente limitado, que parece preso a um relacionamento doentio com uma jovem possessiva que carrega um filho que não é seu, mesmo que seja uma constatação bastante evidente. E, de certa forma, com todo esse circo excêntrico, Verhoeven desmoraliza com veemência todas as convenções sociais e a hipocrisia cristã através da postura sarcástica de Michele durante o jantar de Natal com mais indiscrição, pequenas doses de violência psicológica e muito mais requintes narrativos.
Ao oferecer pistas falsas, Paul Verhoeven até demonstra que está interessado em fazer com que seu filme se desenvolva através do mistério acerca da identidade do estuprador diante dos potenciais suspeitos mesmo que o próprio roteiro quebre a expectativa de revelá-lo até de maneira pouco sutil (vide a própria sequência do jantar de Natal), mas ele parece mais preocupado em ilustrar uma espécie de ciclo de violência sem fim que pode acompanhar a formação de uma pessoa desde a infância até a velhice assim como ocorre com Michele, como se a violência fizesse parte da vida dela como um ente familiar ou uma representação íntima da sua psique. Não é à toa, por exemplo, que no filme o sexo é quase sempre retratado de maneira violenta ou empregado como uma arma que exerce poder e/ou funciona como um poderoso mecanismo de manipulação com consequências tão ou mais violentas do que as cometidas pelo próprio estuprador. Não é à toa também que os pais de Michele possuam destinos trágicos que são incapazes de despertar qualquer tipo de emoção nela antes da própria sofrer com um acidente violento, além de outros episódios catárticos até ser, finalmente, salva pelo seu improvável herói que a sua maneira inicia o seu próprio histórico de violência.
Ainda assim, apesar de tudo isso, “Elle” é mesmo de Isabelle Hubert que encarna Michele como devoção e energia devastadoras, comprometida a se entregar física e emocionalmente a uma personagem fria, indiferente e calculista que pode ser facilmente classificada como uma sociopata incapaz de viver em paz e/ou em tranquilidade, afinal ela é dominada pelo caos, estimulando a violência em todos os níveis, afetando direta e indiretamente as pessoas ao seu redor. É certamente uma atuação corajosa e sem pudores de uma atriz que parece não ter mais nada a provar para ninguém, revelando o mesmo despojamento artístico que já demonstrara ao longo de sua carreira em filmes mais ou menos polêmicos e depravados do que esse. Não adianta fechar a cortina, Paul Verhoeven está interessado no que há de pior em nós mesmos e, mesmo não sendo uma obra autoral, é o que ele faz como “Elle” em mais um filme carregado de violência, perversão, simbolismos, cinismo, ironia e… humanidade.
8.0/10
Passageiros
3.3 1,5K Assista AgoraPASSAGEIROS
“Passageiros” é uma mistura irregular de ficção científica, drama de sobrevivência e romance que tem uma abordagem pouco ambiciosa e levemente filosófica, mas que conta com as boas presenças de cena dos talentosos e carismáticos Chris Pratt e Jennifer Lawrence para alavancar boa parte das virtudes de sua narrativa. O engenheiro mecânico James Preston (Pratt) é um dos 5000 passageiros da tripulação da espaçonave Avalon que está realizando uma viagem de 120 anos da Terra até o planeta Homestead II que será uma nova colônia habitada pela raça humana, porém após uma tempestade de meteoros, a sua cabine de hibernação sofre um dano que o desperta 90 anos antes do tempo, deixando-o em uma situação solitária e desesperadora.
O primeiro ato do roteiro escrito por Jon Spaihts (“Prometheus”) se encarrega de fazer com que “Passageiros” funcione como uma espécie de “Náufrago” ambientado no espaço em uma situação parecida com a vista em “Perdido no Espaço”, logo cabe ao diretor Morten Tyldum (“O Jogo da Imitação”) acompanhar Jim em suas sucessivas tentativas de encontrar uma solução para o seu problema crítico até abraçar um tom levemente cômico, auxiliado pelo eficiente trabalho da montadora Maryann Brandon (“Star Trek”), mas com algumas eventuais doses de melancolia, como quando Jim se emociona diante da solidão e da imensidão do espaço sideral em um momento sombrio belissimamente fotografado por Rodrigo Prieto (“O Lobo de Wall Street”) que também consegue se destacar em outros momentos repletos de luz e claridade ou em outros que se passam em ambientes internos, como nas sequências do bar. O ótimo Chris Pratt é um ator versátil que se mostra muito feliz em suas escolhas para ilustrar a personalidade do seu personagem, seja o seu lado leve, divertido e debochado assim como a tristeza, a depressão e a fragilidade emocional que invariavelmente o cerca.
Essa apresentação ágil e eficiente de Jim é fundamental para estabelecer o principal dilema moral do personagem que após um ano de isolamento decide acordar a jovem jornalista e escritora Aurora Lane (Jennifer Lawrence) de sua câmara de hibernação em função de uma paixão platônica e por não suportar mais a solidão. A atitude egoísta de Jim é compreensível, mas indefensável, porém o convívio dos dois permite que superem as diferenças e se desenvolva gradativamente uma relação e eles explorem ao máximo o universo que lhes é oferecido e, levadas as devidas proporções, o que eles vivem dentro da espaçonave é vida, logo ambos são capazes de fazer bem um para o outro. A dinâmica e a cumplicidade entre os dois atores é muito orgânica e autêntica, não se valendo apenas do artifício de serem os únicos tripulantes acordados, apesar da intrusiva trilha sonora de Thomas Newman antecipar certos momentos românticos, permitindo inclusive que eles vivam um lindo momento lúdico ao melhor estilo “Wall-E” ao compartilharem uma dança no espaço. A partir do momento que Aurora descobre que foi acordada por Jim, a intensidade dramática da ótima Jennifer Lawrence é forte o bastante para legitimar o drama, a frustração e a completa decepção da personagem com relação ao companheiro a bordo.
O design de produção e os efeitos especiais são muito atraentes em “Passageiros”, especialmente a arquitetura arrojada da espaçonave e uma bela sequência em que há uma súbita suspensão de gravidade, porém o diretor Morten Tyldum realiza um trabalho bastante prosaico. Os diálogos até aqui não são nada rebuscados e funcionam relativamente bem, seja na interação entre Jim e Aurora como na de Jim com um robô-bartender (Michael Sheen, divertindo-se), salvo alguns momentos mais rasteiros e reducionistas, como quando Aurora afirma conhecer as pessoas por se tratar de uma jornalista. A partir do momento que surge Gus Mancuso (Laurence Fishburne), o roteiro abusa das convenções já que a sua pra lá de conveniente presença ocorre quando os principais sistemas da nave começam a falhar, servindo apenas para que ele dê acesso a Jim e Aurora às áreas que eles não conseguiriam por conta própria e conduzindo-os ao absurdo clímax que servirá para o casal fazer as pazes, após sobreviverem ilesos à explosão de um imenso reator e até mesmo à morte, pelo menos preliminarmente.
Embora seja um drama de sobrevivência e um romance que tem como pano de fundo a ficção científica, o roteiro de Jon Spaihts não está isento de “furos”, afinal uma megacorporação é capaz de fazer uma imensa e impressionante espaçonave com vida útil mínima de 120 anos, com réplicas de cada uma das peças, mas não tem plano B para emergências nas cabines de hibernação. E se a espaçonave foi projetada para que os passageiros despertassem quatro meses antes da chegada e pudessem usufruir de toda a infraestrutura disponível, como é que a interferência de Jim e Aurora por tanto tempo não impacta na energia consumida e nos suprimentos armazenados? A natureza criada pelos dois no final teve algum efeito objetivo no estilo de vida do casal? O roteiro também apenas sugestiona implicações sobre interesses corporativos, diferenças sociais entre os passageiros, os motivos que fizeram os membros dessa viagem serem escolhidos para colonizar um novo planeta ou até mesmo o egocêntrico plano de voo da viagem de volta de Aurora (que poderia servir para outras pessoas já que ela não voltaria sozinha), mas sem muita profundidade ou maior complexidade.
Encerrando-se de maneira abrupta e com uma rápida e muda aparição de Andy Garcia, “Os Passageiros” se mostra um filme eficiente e divertido quando não se leva a sério, consegue ser levemente romântico em seu aspecto mais açucarado e limitado na maioria de suas ambições dentro do gênero da ficção científica já que emula muitos outros filmes em seus melhores momentos e falha quando tem que mostrar ao que veio até mesmo com relação ao uso do 3D. A falta de identidade e personalidade próprias faz com que o filme não sobreviva muito tempo sem as presenças marcantes de Chris Pratt e Jennifer Lawrence que, felizmente, foram sabiamente escolhidos a dedo para participar dessa viagem.
6.5/10
A Casa Silenciosa
2.5 718 Assista AgoraComentário extraído do blog ARGUMENTÁRIO - UM ESPAÇO DE IDÉIAS E REFLEXÕES
A CASA SILENCIOSA
O excesso de filmes de terror e suspense que exploram o subgênero de casas amaldiçoadas esgotou e/ou desgastou a fórmula, logo quando surge alguma produção que se esforça para tentar algo novo ou que explora os clichês de maneira diferente é sempre um alento. “A Casa Silenciosa” é uma consequência dessa falta de criatividade do gênero, especialmente do cinema americano, já que é a refilmagem do suspense uruguaio “A Casa”, mais uma entre tantas outras que querem pegar carona no mérito alheio, lançada apenas dois anos depois da obra original. Críticas à parte, ainda assim é um filme que tem seus méritos por extrair tensão e medo através de uma proposta eficiente em sua estética, mesmo que seja uma virtude decorrente da sua fonte.
Justiça seja feita, “A Casa Silenciosa” não é um filme americano de estúdio, mas uma produção independente que como tal consegue manter a essência do filme original (que eu não vi, vale a pena dizer) que consiste basicamente na criação de um clima de tensão e suspense a partir da impressão provocada pelo uso de apenas uma câmera e, consequentemente, de um longo e falso plano-sequência, o que por si só também não é uma novidade. O crédito de direção ficou dividido entre o diretor Chris Kentis e a roteirista Laura Lau já que a dificuldade que se tem de determinar onde termina o trabalho de um e começa o do outro nesse tipo de produção é ainda maior (ambos já trabalharam juntos em “Grind – Correndo Contra a Vida” e “Mar Aberto” em condições similares).
Baseada em fatos reais, a narrativa acompanha a jovem Sarah (Elisabeth Olsen) juntamente com o seu pai John (Adam Trese) e seu tio Peter (Eric Sheffer Stevens) em uma visita a uma antiga casa de veraneio da família que está em reforma para ser vendida. Durante a vistoria, Sarah começa a ouvir ruídos estranhos e a sua experiência dentro da casa vai se tornando cada vez mais assustadora e angustiante. A câmera acompanha a jornada física e emocional de Sarah, logo o terror e o suspense são construídos através da sua perspectiva, o que naturalmente exige que as soluções encontradas por Kentis e Lau sejam mais simples e orgânicas e nem por isso menos eficiente. Dessa forma, um rangido ou um vulto que apareça próximo de Sarah acaba sendo o suficiente para que o clima de terror se instale, pois os estímulos visuais são mínimos, o que colabora para a indefinição entre a suspeita de uma invasão e/ou de uma assombração propriamente dita.
A atriz Elisabeth Olsen tem uma atuação formidável já que a sua personagem é o centro emocional do filme e mesmo que ela seja obrigada a reagir a tudo o que acontece ao seu redor, ela é muito feliz na grande maioria das suas escolhas, resultando em um desempenho bastante elogioso. Adam Trese e Eric Sheffer Stevens são atores mais limitados e oferecem atuações irregulares. Embora seja uma produção com uma proposta arrojada, os diretores não estão isentos do uso de recorrentes clichês, como ao fazer com que Sarah suba as escadas quando deveria sair de casa ou hesite na fuga quando já está do lado de fora ou ainda quando utiliza o “flash” de uma câmera fotográfica para iluminar o ambiente. Ainda assim são elementos, como a própria representação da casa ou da condição que faz Sarah se esconder debaixo de camas e mesas, que possuem justificativas dentro da proposta explicitada em seu clímax cujo apelo dramático é legítimo, mas que falha especialmente em virtude das diversas vezes que o roteiro sentiu a necessidade de “materializar” a ameaça, inclusive com a deslocada presença de uma amiga de Sarah.
Embora não seja original e mesmo que reverencie a sua fonte ao manter a proposta do falso plano-sequência, “A Casa Silenciosa” é apenas um bom filme de suspense que conta com uma ótima atuação da jovem Elisabeth Olsen, sendo que provavelmente seria uma produção que não se destacaria tanto assim se fosse feita de maneira mais convencional, seja no Uruguai ou nos EUA.
6.0/10
Rambo IV
3.3 455 Assista AgoraComentário extraído do blog ARGUMENTÁRIO - UM ESPAÇO DE IDÉIAS E REFLEXÕES:
RAMBO IV
“Rambo IV”, dirigido e estrelado por Sylvester Stallone, é um filme que entrega o que promete: ação e muita violência. De certa forma é uma produção que parece que parou no tempo e mantém a mesma energia da franquia que fez sucesso a partir da década de 80, mas sem a mesma complexidade temática, apropriando-se de uma trama qualquer para justificar a máxima do exército de um homem só. Se bem que neste aqui, o veterano de guerra John Rambo não está tão sozinho assim.
Vivendo recluso em uma região isolada de Mianmar e responsável por caçar cobras para os habitantes locais que ganham dinheiro com uma espécie de rinha disputada entre humanos e animais peçonhentos, Rambo acaba sendo recrutado por uma equipe de missionários que pretendem ajudar a população local que está sendo dizimada pelo exército do governo ditatorial da região. A contragosto, mas cedendo aos encantos humanos e femininos (muito mais os femininos) da integrante Sarah (Julie Benz), ele realiza a missão, mas é obrigado a retornar posteriormente com um grupo de mercenários para resgatar os missionários que foram aprisionados e correm risco de morte.
Diferente do que parece sugerir as imagens reais que abrem o filme, Sylvester Stallone não está preocupado com a situação política e humanitária de Mianmar, logo o cenário é apenas um pretexto para que Rambo seja inserido dentro de uma trama em que a sua presença se justifique. É bom ressaltar que em nenhum momento ele se apresenta com o ex-combatente, mas sim apenas como John e a única referência existente ao seu sobrenome clássico ocorre já no final, mas como um indício de paz e não de guerra, porém, é claro, que quando começamos a assistir o filme já sabemos muito bem o que e quem esperar em ação, o que é muito bem ilustrado na tensa, eficiente e dinâmica sequência de resgate realizada embaixo de uma chuva torrencial.
Sem medo da censura e com vilões estereotipados e unidimensionais, a narrativa é perfeita para que Stallone empregue um estilo de direção cruel e brutal que serve para ilustrar uma ação em que se preza a utilização de tiros e explosões com o maior requinte de violência necessário e da maneira mais gráfica e gratuita possível, inclusive utilizando-se de uma bomba de natureza nuclear, mas de alcance limitado e controlável, afinal ela só atinge as pessoas más. E neste filme se há similaridade entre o “modus operandi” do exército da ditadura e da missão de resgate que também conta com a ajuda de rebeldes armados, a discussão não cabe nem mesmo como nota de rodapé, permitindo apenas que eu use uma expressão em latim no texto sobre um filme do Rambo.
Servindo como um leve e tímido exercício de redenção para o personagem central, “Rambo IV” é um filme moralmente vazio, fora de moda e que não tem vergonha de ser violento e gratuito mesmo que utilize o carisma e a boa presença de cena de Sylvester Stallone para fazer com o espectador torça para que John Rambo, literalmente, estoure os miolos dos seus inimigos.
5.5/10
MIB: Homens de Preto 3
3.5 2,0K Assista AgoraMIB - HOMENS DE PRETO 3
O primeiro filme da franquia “MIB – Homens de Preto” foi lançado em 1997 como uma mistura simpática e levemente criativa de comédia e ficção científica, valorizado pela química em cena da dupla Will Smith e Tommy Lee Jones, tornando-o um sucesso inesperado. A continuação estreou em 2002, mas a repetição da fórmula e da dupla deu sinais de desgaste e não garantiu a mesma repercussão entre crítica e público, praticamente enterrando as pretensões da franquia. Bem verdade, no entanto, é que o nível do primeiro filme nunca foi tão alto, assim como o segundo não é tão ruim, o que nos leva ao igualmente inofensivo terceiro filme, lançado em 2012.
Os agentes J (Will Smith) e K (Tommy Lee Jones) continuam protegendo a humanidade de ameaças vindas de outros planetas. A partir da fuga do alienígena Boris (Jermaine Clement) de uma penitenciária de segurança máxima localizada na Lua, ele faz uma viagem de 43 anos no tempo para evitar a sua prisão, mata o agente K e estabelece uma nova cadeia de eventos que culmina em uma invasão que coloca o planeta Terra em perigo. Em função disso, o agente J precisa voltar ao passado para eliminar Boris, salvar a versão mais nova de K (Josh Brolin) e reestabelecer a ordem. A premissa não é tão complexa quanto parece já que tramas que investem em viagens no tempo são corriqueiras no cinema e o roteirista Etan Cohen abraça a convenção de trabalhar a sua narrativa apenas entre passado e presente, ignorando o que acontece nesse intervalo de tempo. Boris, por exemplo, volta no tempo para escapar do seu destino trágico de 43 anos, mas convenientemente só é capaz de executar seu novo plano nesse mesmo intervalo de tempo justamente quando poderia ser impedido através do mesmo artifício que utilizou.
De maneira geral, o roteiro não se revela especialmente inspirado, as piadas envolvendo Andy Warhol e Mick Jagger como seres de outro planeta são corriqueiras e a viagem no tempo de J ocorre na véspera de um momento-chave apenas para dar um senso de urgência artificial, logo os eventos acabam funcionando mesmo apenas em função de Boris e Griffin (Michael Stuhlbarg), um alienígena com dons premonitórios, que dão a dinâmica necessária para levar os personagens de um lugar para o outro. Ambientada em 1969 através de um discreto, mas eficiente trabalho de direção de arte, a narrativa sabe brincar com as versões ultrapassadas das tecnologias modernas utilizadas pelos agentes, mas investe na velha dinâmica de dupla antagonista vista no primeiro filme e reciclada no segundo, logo sem o mesmo apelo e charme.
O carisma de Will Smith já não é mais o mesmo, mas neste aqui ainda funciona, porém o seu status de astro já não permite que piadas de conotação racista lhe caibam de maneira cômica como foi no início de carreira. Tommy Lee Jones está mais do que à vontade ao encarnar o tipo durão e taciturno, porém não dá pra negar que assim como no segundo filme a sua participação é reduzida e limitada, como se o próprio ator estivesse cansado da franquia. Embora Josh Brolin não convença como um personagem de 29 anos, ele realiza um trabalho de composição bastante competente ao referenciar a (falta de) expressividade e os gestuais de Tommy Lee Jones com frescor e certo ar jovial.
O diretor Barry Sonnenfield parece anestesiado, realiza um trabalho pouco vibrante e bastante convencional, o que de certa forma parece justificar o resultado tão morno e indiferente de “MIB – Homens de Preto 3”. O clímax é pouco empolgante, mas oferece um momento de apelo dramático que procura alinhar emocionalmente os agentes J e K, dando uma dimensão coerente e um significado maior à parceria entre os dois e os sacrifícios que K fez ao longo da sua vida, mas o filme é estéril e jamais alcança o nível do primeiro filme que, na verdade, nunca foi tão alto e consegue ser levemente superior ao segundo que, por sua vez, não era tão ruim, mas acho que eu já disse isso antes.
5.0/10
Filth: O Nome da Ambição
3.7 487 Assista AgoraComentário extraído do blog ARGUMENTÁRIO - UM ESPAÇO DE IDÉIAS E REFLEXÕES
FILTH
“Filth” é um filme ultrajante, esquizofrênico e misógino que espelha a natureza do personagem central, Bruce Robertson (James McAvoy), um investigador da polícia escocesa que anseia por uma promoção e que trabalha para desmoralizar os outros concorrentes à vaga durante a investigação de um crime. A partir da obra de Irvine Welsh, autor de “Trainspotting”, o roteirista e diretor Jon S. Baird cria um filme imoral e politicamente incorreto que tenta emular muito mais o estilo e a estética dos filmes comandados por Guy Ritchie do que do excepcional e energético filme de Danny Boyle, resultando em uma produção vazia, sem personalidade e repulsiva assim como a tradução sugere de maneira apropriada, afinal trata-se de sujeira e imundície em formato cinematográfico, um verdadeiro lixo descartável, embora atraente e excitante tecnicamente.
Viciado em cocaína, Bruce é um homem traumatizado pelo passado e com laços familiares em frangalhos que parece viver em uma realidade paralela decorrente do uso incontrolável de entorpecentes que lhe faz perder qualquer tipo de código moral e/ou ética e/ou bom senso, não pensando duas vezes em desqualificar seu parceiro (Jamie Bell) em função do tamanho do seu órgão genital ou traindo seu melhor amigo (Eddie Marsan) ao manter relações sexuais com sua esposa, entre outras atitudes inadequadas. Como dá pra notar, Bruce não é o melhor dos amigos e a trama policial parece uma mera desculpa para que o filme promova o maior número possível de sequências com algum tipo de conotação imprópria ou imoral como se o próprio filme estivesse sob o efeito de algum tipo de droga com a adição de uma fotografia multicolorida, uma trilha sonora psicodélica e uma montagem disléxica que ajudam a construir uma estética apropriada e atraente, mesmo que seja em meio a um vácuo de ideias.
Essa incômoda sensação de esquizofrenia narrativa faz com que Jon S. Baird tenha uma boa resposta na sequência de apresentação dos colegas de trabalho e candidatos à vaga da promoção, mas a partir de então ele só consegue provocar o nojo ou o enjoo com uma verborragia visual descontrolada, fora do tom e muitas vezes sem ritmo, muito bem ilustrada pela alucinação de porco visualizada por Bruce em alguns momentos convenientes e cruciais. James McAvoy não pode ser acusado de passividade já que confere energia e intensidade a um sujeito insano e repulsivo, mas os seus esforços são inúteis já que nada ao seu redor é capaz de colaborar com a mesma competência e dedicação. Os demais integrantes do elenco oscilam entre a inexpressividade e o desperdício, como nos casos de Jim Broadbent e até mesmo da quase sempre irregular Imogen Poots que parece ganhar voz lá pelo terceiro ato quando já é tarde demais.
Contando com uma reviravolta risível até mesmo para os fãs de Alfred Hitchcock e Brian De Palma em seu clímax, “Filth” tenta preencher a sua essência com uma lição de moral bonita e edificante que ajuda a explicar as irracionalidades cometidas por Bruce, mas a tentativa só torna a experiência de acompanhar a sua jornada ainda mais chata e aborrecida, desejando desesperadamente que o filme termine logo em troca de algum tipo de paz de espírito..
NOTA: 4.0
Garotas Inocentes
3.1 230 Assista AgoraGAROTAS INOCENTES
Lilly (Dakota Fanning) e Gerry (Elizabeth Olsen) são duas amigas inseparáveis de 16 anos que estão em vias de ingressar na faculdade, mas que antes desse rito de passagem ainda enfrentarão alguns dilemas de vida, especialmente o relacionado à lealdade da amizade entre as duas a partir do momento que Lily se envolve secretamente com David (Boyd Holbrook), um jovem fotógrafo por quem Gerry é apaixonada. “Garotas Inocentes” marca a estreia na direção da roteirista Naomi Foner Gyllenhaal (mãe dos atores Jake e Maggie Gyllenhaal) e se apresenta com um filme que traz certo frescor quando é simples, mas que se perde quando quer soar pretensioso.
Enquanto Lilly é uma garota mais introspectiva, melancólica e precisa enfrentar a tumultuada crise conjugal dos seus pais (Ellen Barkin e Clark Gregg), Gerry é mais extrovertida, desencanada e com aptidões musicais, mas que mesmo assim se sente deslocada diante dos seus exóticos pais (Richard Dreyfuss e Demi Moore). Dessa forma, embora com personalidades distintas, elas se ajudam e se completam. A narrativa, no entanto, acontece através da perspectiva de Lilly, logo quando ela se envolve com David é natural que haja uma identificação acerca dos benefícios daquela relação em sua vida, apesar de optar por não revelar para a melhor amiga. Nesse ponto, a atuação de Dakota Fanning é um tanto quanto enigmática e irregular já que Lilly se projeta de maneira fria em seu romance que lhe proporciona experiências intensas e inéditas, mas quando está ao lado da amiga compartilha um misto de remorso por Gerry e sofrimento, sugerindo que o seu sentimento por David é verdadeiro.
A atuação de Elizabeth Olsen é mais visceral. Embora Gerry às vezes se comporte de maneira egoísta com a amiga, ela é uma jovem que parece muito mais à vontade para transmitir as suas emoções, logo essa sensibilidade acaba fazendo com que Olsen experiente um alcance dramático muito maior do que Fanning que, por sua vez, tem a missão de conduzir uma incógnita. Quando Gerry, por exemplo, pede que David faça amor com ela por pura carência emocional, ela está sendo transparente em seus defeitos, porém quando Lily afirma que vai sentir a ausência dele, essa falta de conexão emocional a torna uma personagem mais irritante, mesmo que seja decorrente da mesma imaturidade compartilhada por Gerry. Ainda assim a atuação de Dakota Fanning consegue ser sensível e a sua parceira em cena ao lado de Elizabeth Olsen edifica o filme que se dá ao luxo de colocar Richard Dreyfuss, Demi Moore e Peter Sarsgaard como meras participações especiais, sendo que este último se sai um pouco melhor, como o chefe de Lilly, já que consegue construir um personagem levemente dúbio e complexo com pouquíssimo tempo de cena.
Boyd Holbrook não chega a comprometer, mas o seu personagem é extremamente estereotipado e dentro de um universo com duas personagens jovens e femininas tão atraentes, cada qual com o seu perfil, ele acaba empalidecendo e até mesmo enfraquecendo o interesse romântico que ambas nutrem por ele. E aqui Gyllenhaal se sente confortável para explorar um tom mais presunçoso através das fotografias e da alma de artista de David, permitindo até mesmo uma encenação gratuita em um espaço público apenas para que isso se torne alvo da câmera (dela e do personagem). A analogia que o roteiro tenta estabelecer entre a traição entre as amigas e a dos pais de Lilly é bastante óbvia por si só, sendo desnecessário discurso expositivo do pai lá pelo terceiro ato, e o arco dramático decorrente da traição é igualmente previsível, mas felizmente o filme nos priva de uma eventual “narração em off” que poderia nos martelar essas mesmas convicções ao longo do filme todo.
Contando com uma bela seleção de canções melancólicas, inclusive uma belíssima cantada por Gerry, “Garotas Inocentes” acaba oferecendo uma experiência levemente agridoce já que através da sua ótica feminina traz personalidade ao abordar temas que já foram exaustivamente explorados em outras produções, mesmo ocasionalmente escorregando ora em clichês, ora na própria presunção mesmo. Nada que o talento, o carisma e a beleza de Dakota Fanning e Elizabeth Olsen não se encarreguem de consertar.
6.0/10
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Era Uma Vez em Nova York
3.5 295 Assista AgoraESTE COMENTÁRIO COMPLETO E OUTROS PODEM SER LIDOS EM:
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ERA UMA VEZ EM NOVA IORQUE
O diretor James Gray já realizou três pequenos grandes filmes: “Caminho Sem Volta” (2000), “Os Donos da Noite” (2007) e “Amantes” (2008), que se mostraram filmes sóbrios, acima da média e que o colocaram como um dos diretores americanos mais promissores desses últimos anos. Infelizmente, “Era Uma Vez em Nova Iorque” (tradução pretensiosa para “The Immigrant”) é o seu filme menos virtuoso, uma espécie de ponto fora da curva.
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Suite Francesa
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SUÍTE FRANCESA
“Suíte Francesa” é um filme baseado na obra literária de mesmo nome, escrita pela judia Irène Némirovsky, durante a 2ª Guerra Mundial, antes de ser morta em um campo de concentração. O livro carrega por si só um valor histórico e artístico incontestável, pois os manuscritos foram salvos pelas filhas e por uma governanta por acreditarem que se tratava de um diário pessoal e seu conteúdo ficou inédito por 62 anos. Dirigida por Saul Dibb (“A Duquesa”), a partir do roteiro coescrito ao lado de Matt Charman, esta adaptação cinematográfica, no entanto, resulta em um drama sensível, mas de apelo mediano.
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A História Real de um Assassino Falso
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A HISTÓRIA REAL DE UM ASSASSINO FALSO
Apresentada como uma produção original da NETFLIX, mas sem ser tão original assim, “A História Real de Um Assassino Falso” é um filme ocasionalmente divertido bem defendido por Kevin James e que consegue explorar o potencial da piada central que serve de base para a sua premissa, mas que falha em sua missão de oferecer bem mais do que isso, o que pode parece pouco e que, na verdade, realmente é.
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Dois Caras Legais
3.6 641 Assista AgoraDOIS CARAS LEGAIS
Holland March (Ryan Gosling) e Jackson Healy (Russel Crowe) são dois detetives particulares que se esbarram e passam a atuar juntos em um caso em que envolve o desaparecimento de Amelia (Margaret Qualley), filha da chefe do Departamento de Justiça (Kim Bassinger), e que parece potencialmente relacionado com a indústria de cinema pornográfica. Ambientado na década de 70, “Dois Caras Legais” é uma divertida comédia policial em que o roteirista e diretor Shane Black recicla mais uma vez de maneira inspirada a fórmula da dupla de detetives de personalidades opostas, como já tinha se especializado como roteirista da franquia “Máquina Mortífera” e mais recentemente com “Beijos e Tiros”, estrelado por Robert Downey Jr. e Val Kilmer.
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Transformers: A Era da Extinção
3.0 1,4K Assista AgoraTRANSFORMERS: A ERA DA EXTINÇÃO
Em “Transformers: A Era da Extinção” a receita é a mesma vista nos filmes anteriores, logo não há muita esperança de ver algum tipo de evolução substancial, ainda mais que Michael Bay segue na direção comandando um Carnaval de efeitos especiais gratuitos, abusando de tiros e explosões em escalas apoteóticas, ocasionalmente servindo de comercial para algumas marcas famosas e/ou clipe musical para uma trilha ou canções de qualidade discutível, mas é claro, sem deixar de apostar na beleza de um lindo pôr-do-sol como pano de fundo.
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A Vida Secreta de Zoe
2.4 148 Assista AgoraA VIDA SECRETA DE ZOE
Se há algo de positivo que possa despertar algum tipo de interesse em “A Vida Secreta de Zoe” é o elenco, ainda que irregular. Sharon Leal é uma atriz bastante virtuosa que consegue sair ilesa desse filme já que ela consegue explorar com sensibilidade a vulnerabilidade da personagem e mesmo quando Zoe assume uma postura mais controversa e/ou menos inteligente há uma empatia que não se perde totalmente. Boris Kodjoe demonstra bastante segurança e serenidade, representando uma espécie de balança moral dentro da história, mas sem se tornar uma figura estéril e/ou apagada. Já William Levy e Tyson Beckford, que interpreta a outra transa casual de Zoe, tem participações risíveis já que interpretam os amantes e são verdadeiros estereótipos ambulantes, o que de certa forma só justifica o tom piegas desse casto e caótico thriller erótico que mais parece interessado em ser comercial de margarina.
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O Último Capítulo
2.0 340 Assista AgoraO ÚLTIMO CAPÍTULO
“O Último Capítulo” é mais um filme de suspense que explora o potencial do subgênero de casas mal assombradas e, infelizmente, é isso mesmo: apenas mais um filme de suspense.
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Transcendence: A Revolução
3.2 1,1K Assista AgoraTRANSCENDENCE - A REVOLUÇÃO
"Transcendence - A Revolução" tenta explorar através da sua premissa o potencial dos conceitos de inteligência artificial e nanotecnologia, mas o resultado final é bastante limitado e, em seus piores momentos, até banal. Will Caster (Johnny Depp) é um renomado cientista, pesquisador dedicado ao desenvolvimento da tecnologia para que a ciência melhore a vida da humanidade, especialista em Inteligência Artificial, mas que sofre um atentado de um grupo de "hackers" contrário à evolução da Ciência. Antes de morrer, a sua esposa Evelyn (Rebecca Hall), também cientista, resolve armazenar "literalmente" a sua consciência, as suas lembranças e memórias, levando o conceito do uso da inteligência artificial a um nível extraordinário e ainda assim extremamente perigoso.
Marcando a estréia discreta de Wally Pfister na direção, responsável pela fotografia dos filmes do Christopher Nolan, "Transcendence" é um filme que tem um conceito interessante, afinal o tema da inteligência artificial explora vertentes que vão desde a evolução da ciência para a cura de doenças até mesmo questões relacionadas à humanidade e a natureza das emoções. Por mais absurdo que seja a premissa, o apelo central do filme reside muito em função da interpretação da Rebecca Hall que legitima a "sobrevivência" do marido com muito mais propriedade do que qualquer explicação científica. Ainda assim, o filme desenvolve essa ideia de forma que não soa cansativo ou massante e até visualmente aceitável, apesar dos absurdos envolvendo transferência milionária de dinheiro que passa impune e a construção de uma empresa tecnologicamente absurda em uma cidade miserável. A devoção da esposa e essa carga são os principais trunfos do filme até porque a atuação do Johnny Depp é bastante preguiçosa e sem um mínimo de inspiração. Ironicamente, ele parece no piloto automático.
A partir do momento que a narrativa dá um salto de 2 anos, o nível de absurdos passa a se tornar maior e a história começa a escorregar na extensão das suas idéias, justamente ao fazer com que as pessoas se tornem escravos com superpoderes em uma versão extrapolada do uso da tecnologia. Se não bastasse a tal inteligência artificial ter a capacidade de ter o controle da matéria (ela é capaz de reconstruir objetos destruídos por explosões), ou seja, interferindo fisicamente na história. Os furos no roteiro se tornam mais indefensáveis, como quando Evelyn convida dois personagens para visitar as instalações da sua empresa em meio ao deserto, expondo-se de maneira frágil e desnecessária. O grupo de "hackers" que, em determinado momento, é classificado como terroristas, promovendo a morte de muitas pessoas, acaba sendo usado como um parceiro do FBI de maneira inconsequente e desproporcional. Dessa forma, a segunda metade do filme acaba sendo carregando o filme ladeira abaixo, apesar dos esforços já reconhecidos da Rebecca Hall, mas também do Paul Bettany, sendo que Morgan Freeman e Cillian Murphy estão apáticos.
Falhando na sua missão de se tornar uma ficção científica destacável, apesar da sua premissa interessante e dos bons efeitos especiais, "Transcendence - A Revolução" também não funciona na sua tentativa de explorar o seu material no âmbito romântico, apesar dos esforços da Rebeca Hall e por causa do seu desfecho piegas, ou seja, o filme acaba ficando no meio do caminho e acaba não chegando a lugar algum, logo não transcendeu.
5.0/10
A 13ª Emenda
4.6 354 Assista AgoraA 13ª EMENDA
"A 13ª Emenda" é um documentário dirigido por Ava DuVenay que investiga as raízes e a natureza histórica da segregação racial nos EUA desde os primórdios da escravidão, passando pelo crescimento do ativismo civil, pela emenda da Constituição que relativiza a condição de liberdade até devassar o sistema carcerário privado americano, dominado por uma série de corporações com interesses escusos. Do ponto de vista narrativo é um documentário muito bem dirigido, ágil, dinâmico e que possui uma fluidez orgânica como se estivesse sendo apresentado, do início ao fim, em um mesmo "take" já que em nenhum momento a narrativa perde o ritmo, sendo constante e explorando uma coerência cronológica através dos depoimentos fundamental para o painel histórico que pretende relatar.
O documentário é preciso ao retratar como o fim da escravidão foi um evento importante, porém chocante para a população negra já que foram retiradas de um sistema opressor para conviverem em uma sociedade que não estava preparada em aceitá-los, sendo que nem mesmo eles tinham a dimensão do choque de realidade que teriam que enfrentar agora que eram pessoas livres. Deduzir que essa imensa população negra não teria direito as mesmas oportunidades, que seriam marginalizadas, discriminadas e que parte dela viveria na pobreza ou se envolveria com diferentes formas de crime acaba sendo uma condição natural, porém houve uma potencialização que tornou homens e mulheres negros alvos fáceis para qualquer tipo de política repreensiva. Ava DuVenay poderia ter "amarrado" um pouco melhor essa ligação entre a condição social e a repressão já que os elementos para ilustrar essa narrativa surge ocasionalmente ao longo da narrativa.
De qualquer forma, o documentário explora que ao longo da História, a população negra vem sofrendo diversas e diferentes formas de opressão, seja o da discriminação, o da repressão pela luta de direitos iguais ou até mesmo da criminalização já que atualmente, a população negra responde por 6% da população norte-americana, mas corresponde a mais de 40% do total da população carcerária nos EUA, o que é uma estatística assustadora, mas cuja resposta está justamente na maneira como esse assunto foi conduzido com o passar do tempo. Um dos aspectos mais chocantes relatados no documentário é perceber como a maior parte das políticas públicas de segurança adotados pelos governos americanos servem para "atacar" a população mais pobre e carente (e consequentemente negra), como uma forma de eliminar o problema, sem o menor interesse de investigar a causa. E aqui vale o adendo de que não há a menor intenção de alegar que não possam existir criminosos negros que mereçam estar presos (que não é o foco do documentário, mas que convenientemente relata apenas crimes "pequenos"), mas o encarceramento em massa é um fenômeno social que vai muito além do espectro policial. Em qualquer lugar do mundo, a população mais pobre e carente estará mais suscetível às práticas criminosas e o problema não se resolve escondendo-o debaixo do tapete ou colocando-o dentro de uma cela e com isso não estou dizendo que criminosos não devam ser punidos.
Passando pelos registros de algumas personalidades da liderança do movimento negro pela igualdade de direitos, o documentário deixa evidente como essa questão da desigualdade racial é algo enraizado na cultura norte-americana, seja através do cinema ou da televisão, mas sempre sendo representativo no debate político. E nesse ponto, a privatização do sistema carcerário é intimamente relacionado, pois muitas leis adotadas pelos estados americanos ou pelo próprio governo federal buscou ao longo do tempo não a prática da justiça de maneira genuína, mas o que se promoveu foi o atendimento de interesses corporativos interessados em lucrar com uma população carcerária cada vez maior, especialmente a partir da década de 70 com o governo Nixon, crescendo exponencialmente com Reagan, Clinton e até hoje. A maneira escancarada com que as empresas abusam dessa indústria do encarceramento, seja aquelas relacionadas a fornecer alimentos aos presos ou a que garante que os presidiários liguem para suas famílias ou até mesmo aquelas que usam do trabalho gratuito como mão-de-obra, é algo alarmante, afinal um sistema econômico amplo e complexo passa a existir a partir da necessidade que cada vez mais pessoas sejam presas. Estas mesmas empresas tem uma vasta influência na aprovação de projetos de leis que lhe sejam favoráveis (algumas delas criadas por elas mesmas) e, ironicamente, com o discurso hipócrita visam investimentos em tecnologia de tornozeleiras eletrônicas para permitir que certos criminosos possam cumprir suas penas em "liberdade".
Competente e preciso, mesmo sem ser absolutamente perfeito, "A 13ª Emenda" é um documentário contundente que toca uma ferida importante da sociedade norte-americana, mas que apresenta um cenário que pode ser perfeitamente transferido para qualquer país, especialmente no Brasil em que minorias são marginalizadas e criminalizadas à exaustão. É um filme inteligente, envolvente e esclarecedor que certamente traz à luz uma série de elementos que merecem ser discutidos por todo cidadão de bem que pretende viver em uma sociedade mais digna, justa e igualitária, tornando-se uma produção obrigatória, essencial e fundamental.
9.0/10
Lucy
3.3 3,4K Assista AgoraLUCY
"Lucy" é um filme problemático do início ao fim ao explorar de maneira rasteira uma premissa interessante e intrigante que mescla ação e ficção científica através de um fiapo de roteiro. Lucy (Scarlett Johansson) é uma jovem americana em Taiwan que acaba sendo envolvida em uma trama de tráfico de drogas internacional quando é forçada a transportar uma nova e poderosa substância sintética em um pacote que foi cirurgicamente instalada em seu estômago. Acidentalmente, o pacote se rompe, a droga é absorvida pelo seu corpo e ela passa a ter uma capacidade sobre-humana que, segundo a teoria defendida pelo filme, faz com que ela passe a usar cada vez mais a sua capacidade cerebral. Sua missão passa a ser o de recuperar os outros pacotes de drogas injetados nas outras "mulas" para alcançar o 100% de uso de seu cérebro e ajudar a comunidade científica antes que a droga seja recuperada por um sanguinário traficante.
O roteiro escrito pelo diretor Luc Besson é uma colcha de retalhos, um samba do crioulo doido, um queijo suiço de proporções homéricas, analogias não faltam para se equiparar à proposta. Inicialmente, o filme peca pelo excesso de didatismo ao nos apresentar a figura do professor/cientista Norman (Morgan Freeman) dando uma palestra como se estivesse explicando ao próprio espectador a teoria defendida pelo filme com a inserção de imagens excessivamente auto-explicativas, certamente duvidando da capacidade de quem assiste se de fato entende o que está sendo dito. Ora as imagens são totalmente desconexas, apenas para que se estabeleça um paralelo com a situação-limite vivida por Lucy que é de falta de sutileza sem tamanho, afinal um hotel luxuoso serve de esconderijo/laboratório do tal traficante que recruta suas "mulas" para o trabalho forçado sem a menor intenção de parecer discreto. Esteticamente, o filme é desinteressante, sem chamar a atenção para nenhum dos seus aspectos técnicos e Luc Besson decepciona por não ser capaz de criar uma narrativa atraente seja pela forma, pelo ritmo e/ou pela energia, mesmo que seja tão problemática em seu conteúdo.
Os esforços dramáticos de Scarlett Johansson são legítimos já que ela consegue explorar a tensão diante da catarse com bastante intensidade e quando ela precisa se comportar mais como uma "entidade", em função dos efeitos da droga, a sua falta de expressividade, quase robótica, é muito bem utilizada pela atriz. Mas de qualquer forma, o filme abusa da própria incapacidade ao limitar as potencialidades adquiridas pela personagem ou até mesmo subutilizá-las quase que em um exercício desnecessário de tentativa e erro, pois ela é capaz de extrair a bala de um tiro com a própria mão, mas é incapaz de realizar a própria cirurgia para extrair o restante do pacote que permanece em seu corpo. Ela não se comporta como uma heroína, mas também não tem o menor pudor de colocar civis e policiais em risco durante os acidentes que provoca durante uma perseguição automobilística. E se ao longo do filme, ela vai se tornando cada vez mais magnânima ao utilizar o seu cérebro, ela parece medir cada vez menos as consequências dos seus atos, afinal em determinado momento é capaz de adivinhar a cor da caneta que está ao lado de um detetive em um outro país, mas é incapaz de impedir e/ou evitar que professores e cientistas sejam mortos pelos traficantes já que ela mesmo é quem os colocou em risco.
Contando com um clímax que traz uma série de imagens que parecem extraídas de um documentário qualquer e que remetem à Criação, "Lucy" chega ao ápice das suas idéias constrangedoras ao sugerir que o ápice do potencial do conhecimento humano possa ser devidamente armazenado em um pen drive, afinal ninguém é capaz de criar uma tecnologia mais sofisticada do que essa. Em meio ao turbilhão de idéias que poderiam ser usadas para fazer com que o filme se mostrasse mais inteligente ou o mais próximo possível do 100% da sua capacidade, "Lucy" ficou mesmo com aquele 1%.
NOTA: 4.0/10
Os Irmãos Lobo
3.8 51OS IRMÃOS LOBO
O documentário da diretora Crystal Moselle parte de uma premissa interessante e excêntrica, mas que se perde pela falta de foco e o resultado final acaba sendo exótico e bastante irregular. Os tais "Irmãos Lobo" fazem parte de uma família que vive enclausurada em seu apartamento na cidade de Nova Iorque, longe do convívio social, logo a educação dos filhos ficou por conta da mãe e o maior contato que eles tinham com o mundo externo era através dos filmes que eles assistiam, sendo capazes de reconstituir cenas com muita criatividade, realçando ainda mais a natureza escapista do cinema, potencializada pelo estilo de vida da família imposto pelo pai que resolver levar às últimas consequências a distorção de uma filosofia "hippie", anti-capitalista ou seja lá o que for.
Basicamente se sustentando através dos depoimentos dos irmãos, o documentário tem como aspecto positivo um certo distanciamento por parte de Moselle, deixando que os próprios garotos façam uma auto-análise de suas vidas, mas a falta de pulso da diretora faz com que o filme se torne prolixo, repetitivo e até mesmo auto-referencial já que parece encantado com as encenações estreladas pelos irmãos. De qualquer forma, o documentário explora a vertente lúdica da relevância cinematográfica na vida desses garotos, certamente a ponte de salvação que permitiu que eles mantivessem a sanidade (além é claro da dedicação da própria mãe), porém essa paixão pelos filmes só é mais uma distorção da atitude exagerada do pai, afinal ele achava que o mundo lá fora estava perdido, mas se rendeu ao cinema e deixava que a Coca-Cola entrasse dentro do seu lar. E esse "hobby" certamente serviu de inspiração para que os filhos "quebrassem" a ditadura patriarcal que marcou tanto a história daquela família.
Irregular, curioso e bizarro, "Os Irmãos Lobos" acaba sendo um documentário fundamental por trazer em sua essência a importância que a educação promovida pelos pais tem sob os filhos a partir de um exemplo extremista. Cada decisão e a maneira como a educação e os valores são transmitidos são fundamentais para determinar a formação do caráter de uma pessoa e se não fossem os filmes, os filhos certamente seriam condicionados a serem figuras menos humanas se vivessem apenas sob influência do pai, mas a humanidade se manteve presente, muito em função da abertura que tiveram com os filmes, mas também pela participação da mãe que se manteve passiva diante de um relacionamento amoroso opressor com o pais dos seus filhos, mas que ainda assim buscou fazer o melhor com o que tinha a sua disposição. A figura da mãe é trágica, porém a tragédia da sua vida foi compensada pela redenção dos filhos e na capacidade deles de reescrever a sua história, como eles fizeram questão de encenar no ato final deste documentário que de certa forma é uma redentora história de sobrevivência.
6.0/10
The Witness
3.6 9THE WITNESS
Do ponto de vista emocional, "The Witness" é um documentário angustiante e inquietante já que acompanha a saga de Bill Genovese na busca de uma melhor compreensão sobre a morte de sua irmã Kitty, assassinada há 50 anos nos arredores do bairro residencial em que morava em Nova Iorque onde, supostamente, 38 vizinhos testemunharam o ocorrido, de maneira direta ou indireta, sem demonstrar nenhum tipo de solidariedade. Na época o caso ganhou muita repercussão e um artigo publicado pelo New York Times influenciou a opinião público e algumas políticas de segurança até ser desmentido décadas depois através de um novo editorial publicado pelo jornal.
Aqui, neste caso, o responsável pelo crime foi preso cinco dias depois através de uma confissão do próprio assassino após ter cometido um outro crime, porém o que instigou Bill a desenterrar o passado foi a passividade dos vizinhos, conforme relatado, e consequentemente o desmentido do NYT que jogou por terra a teoria que todos tinham sobre o caso até então. O documentário segue um caminho investigativo limitado, resgatando os depoimentos dados na época do crime, inserindo fatos novos apenas através do relato da melhor amiga da irmã (ignorado na investigação inicial), funcionando muito mais como uma espécie de redenção para servir de oportunidade para que a história de vida de Kitty seja contada, mesmo que de maneira superficial, e do próprio Bill que por ter uma afinidade maior com a irmã desde criança sentiu muito a sua perda, o que acabou influenciando diretamente a sua própria vida e as suas escolhas já que decidiu servir o país no Vietnã para não ser apenas um agente passivo durante uma guerra e teve suas duas pernas amputadas como consequência.
Inconclusivo e afetado pela carga emocional, o documentário parece trazer a paz para a vida de Bill muito mais em função da mais nova e afetada declaração feita pelo assassino através de uma carta que só o compromete ainda mais do que propriamente pelas respostas que o próprio procurava (fica claro que mesmo os vizinhos vivos da época não querem se comprometer com a possibilidade de serem considerados "covardes" por não terem feito nada). De qualquer forma não deixa de ser tenso e angustiante, o encontro de Bill com o filho do assassino já que ambos foram afetados pelo ocorrido, mesmo que cada um carregue as suas próprias verdades. Ao final, o documentarista James Solomon parece interessado em uma catarse dramática ao convocar uma atriz para simular os gritos de Kitty no mesmo horário em que o crime ocorreu, quase que como um estudo sociológico, afinal a reação dos vizinhos acaba sendo surpreendentemente triste, mas honestamente o efeito acaba sendo nulo, mórbido e mais uma vez inconclusivo.
6.0/10
Como Eu Era Antes de Você
3.7 2,3K Assista AgoraCOMO EU ERA ANTES DE VOCÊ
"Como Eu Era Antes de Você" é um filme que cativa pela simplicidade em que lida com sua premissa que perigosamente flerta com o melodrama e essa sua aposta simplista torna genuína a experiência emocional promovida pelo filme muito em função também do carisma do seu casal de protagonistas. Louisa Clark (Emilia Clarke) é uma jovem desempregada de uma cidade do interior da Inglaterra que aceita o trabalho de acompanhante do jovem Will Traynor (Sam Clafin) que fica tetraplégico após um atropelamento e a interação entre os dois transformará a vida de ambos.
A partir do roteiro adaptado de Jojo Moyes do seu próprio "best seller", a diretora Thea Sharrock realiza um trabalho praticamente invisível quase que de uma espectadora privilegiada, encarregada de não "estragar" a história já que as suas intervenções são mínimas e tímidas, quase que imperceptíveis. Essa sua postura não chega a ser totalmente um problema, mas revela a falta de ambição do filme assumir uma personalidade própria que vá além do apelo da obra literária por maiores que sejam as "adaptações" que a própria Moyes tenha promovido. A leveza do filme acaba funcionando a favor da condução da história que. se de certa forma deixa de lado a rotina pesada decorrente da limitação física de Will, afinal Louisa não é sua enfermeira ao menos permite uma visão menos pedante da figura da pessoa deficiente já que ele não tem pena de si mesmo, o que de certa forma se assemelha levemente ao protagonista de "Intocáveis".
Emilia Clarke é uma atriz bastante esforçada e mesmo que exagere aqui e ali com uma atuação um tanto quanto careteira em certos momentos, ainda assim consegue trazer na maior parte do tempo uma sensibilidade à flor da pele a uma personagem claramente positiva e que procura agregar à rotina de Will um pouco mais de energia e alegria. Essa generosidade da personagem é uma dádiva à condução da história, afinal ela não se comporta como se estivesse em busca de uma recompensa, nem mesmo emocional, porém a sua interação com Will lhe traz uma vivacidade que ela não tem em seu relacionamento com o atual namorado, por exemplo, que coincidentemente (e não ironicamente) é um corredor que não lhe dá a mínima atenção. Já Will, inicialmente, se apresenta como um sujeito frio, mas que gradativamente vai se mostrando mais receptivo à presença de Louisa e de certa forma, mesmo diante das suas limitações, utiliza da sua condição para permitir que ela viva experiências que naturalmente ela não teria seja pela sua condição social ou até mesmo por certo comodismo ou ignorância intelectual. Certamente é uma relação em que existe uma troca, não necessariamente romântica, mas humanamente admirável e o carismático Sam Clafin realiza um trabalho digno, seguro e preciso, mesmo sem ser absolutamente cativante.
Pontuado por eventos fracos do ponto de vista narrativo (o melhor deles se resume a uma sequência de dança, mas mal ilustrada por Sharrock), "Como Eu Era Antes de Você" pode ser resumido através de alguns termos clichês do tipo "que seja eterno enquanto dure", "viva a vida como se não existisse amanhã", "não importa o quanto se vive, mas como se vive" e muito desse "blábláblá" que se vende em literatura de auto-ajuda, mas a trama tenta se equilibrar entre essa necessidade de deixar uma mensagem sem soar piegas ao mesmo tempo que tem um apelo universal e romântico. Existe um ponto de virada no terceiro ato que de certa forma é previsível, mas não deixa de ser corajoso ao passo que coloca Will como protagonista da sua vida e plenamente responsável pela sua tomada de decisão final, independente do que aconteceu até ali, porém não deixa de ser irônico que o suporte emocional e financeiro dado por ele a ela seja superior ao do próprio enfermeiro, por exemplo, que esteve lá nos melhores e piores momentos de Will, pelo menos, nos últimos 2 anos de sua vida. Ok, é uma história romântica, entre um homem e uma mulher, mas não deixo de ficar curioso sobre o que foi destinado ao leal enfermeiro no testamento de Will, algo que não chega a repercutir no filme.
Com uma trilha sonora cativante e apaixonante, "Como Eu Era Antes de Você" é um filme sensível e carismático que de forma simples e simplista explora o potencial da sua premissa, tornando-se um filme leve, positivo, mesmo quando precisa embarcar em um tom mais pesado e melancólico, e que deixa o seu recado de maneira moderada já que não tem muita ambição, mas também sem exagerar na pieguice, representando o que há de melhor e pior no estilo "água com açúcar".
6.0/10
Amanda Knox
3.6 229 Assista AgoraAMANDA KNOX
Este documentário acompanha o caso controverso de assassinato da jovem britânica Meredith Kercher que ocorreu em 2007 na pequena cidade de Perúgia na Itália e que ganhou repercussão midiática internacional. A jovem americana Amanda Knox e o jovem italiano Raffaele Sollecito foram considerados culpados pelo crime, passaram 4 anos na prisão até serem absolvidos em função do trabalho de uma perícia independente que refutou a qualidade da investigação inicial, porém somente 8 anos após o crime receberam a definitiva absolvição pela Suprema Corte Italiana, mas que ainda assim não foi o bastante para eliminar totalmente as suspeitas e/ou acalmar a opinião pública sobre a verdadeira inocência dos dois.
O aspecto mais curioso deste documentário é que a sua narrativa acompanha a evolução cronológica dos fatos e das investigações, o que de certa forma faz com que a percepção sobre o caso também mude conforme a evolução do que é narrado, mesmo que haja depoimentos recentes de Amanda e Raffaele já em liberdade. Confesso que essa sensação é um tanto quanto incômoda, pois parece que o documentário não tem a mínima intenção de dissipar as dúvidas e/ou tenta se aproveitar da controvérsia para construir um clima de suspense, como uma peça de entretenimento. A maneira irregular como os fatos são apresentados seja antes do crime e até a prisão dos dois jovens, inclusive com destaque para declarações mentirosas e falsas acusações por parte de Amanda e Raffaele que fazem parte do processo, parece ter justamente o interesse de confundir ou deixar a dúvida no ar.
Ao mesmo tempo, o documentário não deixa de funcionar como uma espécie de material de defesa dos dois jovens, afinal há a exposição da precipitação relacionada à investigação policial, inclusive dos peritos, através do depoimento do próprio investigador responsável pelo caso que em determinado se declara fã de Sherlock Holmes, assim como a cobertura sensacionalista da imprensa através de um dos principais jornalistas que acompanhou o caso e que não tem a menor pretensão de esconder que a sua maior preocupação era o de ter o maior número de manchetes, a qualquer custo. Em um primeiro momento é até compreensível que certas deduções e/ou atitudes tenham sido tomadas, mas gradativamente a espontaneidade dos dois em expor diante das câmeras seus juízos e defeitos diante do caso, especialmente em alguns momentos cruciais, beira o constrangimento.
E esse sentimento parece ser mais evidente diante da condenação de um terceiro acusado pelo crime, o marfinês Rudy Guede, com histórico criminal de invasão à residências, cujo DNA também estava presente na cena do crime, que teve um julgamento isolado dos outros dois com condenação de 16 anos e que não recebeu a mesma atenção da mídia. A presença de uma terceira pessoa na cena do crime, diante das circunstâncias, tornou as teorias quanto aos requintes do crime ainda mais chocantes e sensacionalistas. Os diretores Brian McGinn e Rod Blackhurst exploram superficialmente o drama da família de Meredith que provavelmente se reservaram ao direito de não participar diretamente do documentário, afinal o material utilizado se resume às coletivas de imprensa concedidas pelos familiares e uma rápida declaração da mãe de Meredith, quase de supetão.
De qualquer forma, o documentário acaba perdendo uma boa oportunidade de contextualizar esse caso com uma abordagem muito mais profunda e ampla sobre a cobertura midiática de casos chocantes, ao circo de horrores em que se dá mais ênfase à figura dos assassinos, aos detalhes sórdidos e consequentemente a maneira como a sociedade reage diante disso. A conscientização acaba vindo tardiamente, quase no final e, ironicamente, muito mais através do depoimento de Amanda ao invés de buscar opinião de especialistas jurídicos, comportamentais e da própria imprensa para tratar sobre esses temas, seja com relação a este caso ou de maneira geral. E, assim, o sorriso de Amanda para a câmera acaba encerrando o documentário de maneira emblemática.
7.5/10
Audrie & Daisy
4.2 136 Assista AgoraAUDRIE & DAISY
"Audrie & Daisy" é um documentário que serve para dar voz a uma série de adolescentes que sofreram abusos sexuais, mas que não tiveram coragem para denunciar, a partir da narrativa de dois casos chocantes que aconteceram nos EUA: um é o da garota Audrie que foi abusada sexualmente, teve fotos nuas expostas na Internet e cometeu o suicídio; o outro é o da garota Daisy que após ser estuprada e denunciar o caso contra os garotos responsáveis pelo crime teve a sua versão contestada na justiça. Em ambos os casos, as garotas tinham 14 anos e de certa forma não foram devidamente amparadas pela família, pelo Estado e/ou pela sociedade para lidar com a situação.
Na abordagem do documentário chama a atenção que os episódios tinham uma relação com amigos próximos das vítimas, logo faziam parte do círculo de amizades das garotas, o que demonstra que esse tipo de situação é passível de ocorrer com qualquer adolescente. No caso de Audrie, a discrição e a reclusão da garota após o ocorrido fez com que ela simplesmente não tivesse a capacidade emocional de lidar com a situação provocada pelo ostensivo "bullyng", fazendo com que seus pais não conseguissem compreender o drama que ela estava vivendo em sua totalidade, o que só aumenta ainda mais o trauma da tragédia. Com relação a Daisy, o aspecto mais assombroso é que embora os adolescentes envolvidos no casos tenham assumido a participação no ocorrido, uma série de falhas processuais fizeram com que a versão dela se tornasse frágil o suficiente para que as opiniões ficassem divididas e o caso fosse encerrado, passando a ser considerada por muitos como mentirosa.
A influência de políticos locais parece ter sido crucial para a reviravolta do caso ao ponto do próprio xerife, responsável por recolher e registrar as confissões, simplesmente considerar que "nem sempre os garotos são os culpados" nesse tipo de ocorrência. E, se não bastasse a revolta pela desqualificação da denúncia da vítima, o xerife ainda exibe com sarcasmo a sua própria ignorância por não conseguir entender porque Daisy é a única que não superou o ocorrido já que os três garotos seguiram em frente com suas vidas, inclusive ingressando em faculdades (e o depoimento de pelo menos um deles é ultrajante por mostrar que a falta de punição não permitiu que ele tivesse a verdadeira noção do crime que cometeu e das consequências que provocou). Nesse ponto, um grupo de apoio criado e liderado por outra adolescente, também vítima de abuso sexual, mas que não teve coragem de denunciar na época, acaba funcionando como um importante suporte emocional e social para que esse tipo de caso não seja negligenciado pela sociedade, fazendo com que suas vozes sejam ouvidas, possibilitando não apenas a existência desse documentário, mas também pela possibilidade de que o próprio caso de Daisy fosse revisitado, também diante da repercussão nacional tomada pelo caso, mesmo que as penas definitivas não tenham sido muito representativas em função de um processo investigativo claramente comprometido. De qualquer forma é notório como o abuso e a repercussão do caso trouxe marcas para a vida de Daisy decorrentes dos traumas que provocaram mudanças emocionais e físicas e interferiu diretamente na vida da sua mãe e do seu irmão que por sua vez encontrou um importante papel na formação de futuras gerações de garotos.
Um outro aspecto importante que deve ser mencionado com relação aos casos registrados é também a influência direta das drogas e, especialmente, das bebidas alcoólicas, mas que não recebe o tom crítico e responsável que merecia dentro dos contextos abordados. A facilidade com que adolescentes tem acesso a esse tipo de droga, seja legalizada ou não, é alarmante, o que deve chamar a atenção de autoridades, independente do país, e também dos pais no sentido de estarem mais presentes e serem mais responsáveis e atentos nessa relação que os filhos possuem com suas formas de "diversão", embora sob nenhuma circunstâncias justifique os atos criminosos praticados. Funcionando como uma importante plataforma de cooperação para que as vítimas desse tipo de crime não se sintam sozinhas e/ou intimidadas, "Audrie & Daisy" é um documentário que lança um olhar triste e melancólico sobre as vítimas adolescentes de crimes de abuso sexual e de injustiça, mas que também não deixa de ser um alento e um sopro de esperança para que situações como essa não voltem a ocorrer e/ou sejam tratadas impunemente.
NOTA: 8.0/10
Magia ao Luar
3.4 569 Assista AgoraMAGIA AO LUAR
Com "Magia Ao Luar", o roteirista e diretor Woody Allen consegue realizar um filme charmoso, leve e doce, mas que ainda assim traz uma abordagem inteligente, contundente e sarcástica sobre a maneira como o ceticismo e a espiritualidade interferem em nossa vida como uma forma de nos confortar e permitir que lidemos com as adversidades e as imprevisibilidades da vida, cada um a sua maneira e com sua respectiva linha de raciocínio ou de sensibilidade.
Stanley Crawford (Colin Firth) é um experiente, cético e talentoso mágico que é convidado por um amigo para desmascarar a jovem médium Sophie (Emma Stone) e evitar que ela aplique um golpe em uma família ricaça do interior da França de quem ganhou a confiança ao ponto de estar em vias de se casar com o único herdeiro. O roteiro faz questão de estabelecer o mágico como um homem arrogante, esnobe e prepotente através de diálogos deliciosos, incisivos e cortantes, porém isso acaba depondo um pouco contra a própria premissa já que se a ideia inicial era que Sophie não desconfiasse que está sendo investigada, a falta de sutileza na abordagem de Stanley chega a ser imatura e chama facilmente a atenção dela para as suas reais intenções.
E se Sophie desmascara Stanley rapidamente em função da sua abordagem equivocada, mas que valoriza a legitimidade do seu dom mediúnico, o experiente mágico passa a ficar cada vez mais inseguro diante da sua convicção de que ela é uma farsa até que ele finalmente admite o talento sobrenatural da jovem. A grande sacada do roteiro de Allen é fazer com que a partir do encantamento que o mágico passa a ter sobre a médium uma série de questionamentos passe a ser feito sobre convicções científicas e convenções populares relacionadas à vida e a morte, a maneira como nos relacionamos com os imprevistos e as coincidências da vida e até que ponto a ciência e a espiritualidade existem como "pontes de salvação" para conforto e auto-afirmação, dependendo do ponto de vista. E de forma até aliviada é que Stanley encara a possibilidade de que pela primeira vez na vida possa estar errado e por assim dizer livre dos seus dogmas para viver de maneira leve e plena justamente pelo sentimento que nutre por Sophie.
Esse embate e os diálogos travados pelo casal são muito bem defendidos por Colin Firth e Emma Stone que realizam dois trabalhos leves, sensíveis e bastante seguros, ele já demonstrando a elegância que já lhe é característica como ator talentoso que é enquanto ela traz uma doçura para este que certamente é um dos seus melhores e mais sofisticados trabalhos como atriz. Essa legitimidade emocional sustentada pelo carismático casal de atores é fundamental para que o apelo da narrativa se mantenha intacto a partir da segunda metade do filme, mesmo que o ponto de virada estabelecido pelo roteiro que serve de trampolim para o terceiro ato seja frágil e discutível (a ideia da publicidade e de um instituto paranormal prejudicaria os próprios envolvidos na trama). De qualquer forma, o dilema romântico enfrentado por Stanley não abandona a sua natureza racional assim como a postura de Sophie é plenamente defensável pela honestidade da sua natureza romântica.
Contando com um trabalho de fotografia divino e deslumbrante e um desfecho doce e delicado, "Magia Ao Luar" é um filme adorável e encantador que permite mais uma vez que Woody Allen investigue seus próprios demônios, afinal é um homem intelectual que deve viver em constante conflito com sua cada vez mais aperfeiçoada racionalidade e a sua infinita incapacidade de encontrar respostas razoáveis para muitos dos seus questionamentos, especialmente aqueles que cercam a sua apaixonada alma de artista que certamente é inexplicavelmente romântica. Graças a Deus!
8.0/10