Desde que Halloween estreou em 1979 trocentos cineastas tentaram se inspirar na obra-prima cult de John Carpenter e levar sua essência um passo adiante. O problema é que quase ninguém sacou qual era de fato essa essência. Não era o lance do psicopata imortal atacando adolescentes, isso era só o pretexto, nada mais que uma ferramenta que, ao ser usada sem critério, não gerou mais do que imitações sem alma, marcando negativamente boa parte do cinema de horror dos anos 80. A essência mesmo era o estabelecimento de um jogo cênico no qual a tela inteira se torna uma ameaça em potencial, o extracampo em si uma fonte permanente de apreensão, cada canto da imagem, cada movimento de câmera, cada figurante ou elemento da mise en scène são assustadores por princípio. A fonte do mal sequer importa de fato, por isso não precisa (e nem deve) ser explicada, podendo ficar ao sabor das especulações que são prerrogativa do público... o que importa mesmo é o jogo. Isso é "It Follows", de David Robert Mitchell, um dos filmes de horror mais inteligentes e genuinamente assustadores dos últimos anos, e que não deixa de render evidentes tributos ao mestre Carpenter, tanto na trilha sonora como nas citações super explícitas a Halloween. Some-se a isso um elenco jovem hiper simpático (do tipo que você torce pra que vençam, não que morram logo) e temos uma pequena jóia a se conhecer e saborear:
Pistas, Sonhos e (Auto) Ilusões - Uma Defesa do Último Episódio de "Twin Peaks"
(Artigo lotado de spoilers, nem clique no link abaixo se não tiver visto Twin Peaks até o final)
"Queria finalmente fazer por escrito a minha defesa do último episódio da segunda temporada de Twin Peaks como, sim, o final da série. Não um final em aberto fruto de um cancelamento, mas sim como um desfecho definitivo, digno, coerente e, na minha sincera opinião, perfeito para essa série que transformou os paradigmas das séries de TV. Digo mais: independente do que vier a acontecer na nova série prevista para 2016, não alterará o status do "Episódio 29" como o melhor final que Twin Peaks poderia ter tido."
The Babadook é um filme de horror que só poderia ter sido realizado por mulheres. Explora medos intrínsecos a experiências às quais apenas mulheres se vêem submetidas, tanto no sentido biológico quanto no de lugar social. Não por acaso, boa parte do público masculino não está sacando muito bem do que se trata realmente essa produção australiana, por vezes comprometendo uma avaliação crítica. As resenhas em geral falam do livro infantil amaldiçoado, da criatura tipo bicho-papão que espreita no escuro, da criança em perigo e tecem comparações com outros filmes e autores que lidam com "horror para crianças", como Neil Gaiman e Guilermo Del Toro. Esses elementos fazem parte da mistura, com certeza, mas não são o foco, nem os protagonistas. Ironicamente, foi Gaiman que escreveu no clássico conto "Histórias na Areia", em Sandman #09, que "Há histórias que as mulheres contam umas as outras, em uma língua própria que nunca é ensinada aos meninos e que os homens mais velhos são sábios demais para aprender."
The Babadook é uma dessas histórias de mulheres, narrada numa mídia em que quase todos os contadores de histórias são homens. Escrito e dirigido por Jennifer Kent (sua estréia na direção de longas), aborda um tipo de horror que nós meninos podemos até intuir, tentar imaginar, mas jamais compreender: o horror da maternidade. Soa terrível para quem (ainda) acredita no mito do amor incondicional materno ou na balela de que uma mulher só se realiza sendo mãe, e talvez isso explique porque tanta gente tem rejeitado o filme, exorcizando a própria perturbação com críticas negativas, mas mesmo esses não tem como negar a coragem da diretora e da atriz Essie Davis (da excelente série Miss Fisher's Murder Mysteries) em abraçarem um tema tão tabu.
"(...) Pra começo de conversa é uma delícia ver o horror gótico tratado com seriedade e dignidade, sem a menor sombra de humor, a não ser o mais negro (aquele que só causa risos nervosos, se é que me entendem). Nada contra as abordagens mais "irreverentes", eu mesmo admito que me diverti acompanhando True Blood durante esses sete anos, também achei as primeiras temporadas de Supernatural bacaninhas como diversão bocó e morro de rir com o cinismo descarado de American Horror Story e seu nonsense gore over do over... mas, até por esses exemplos, é possível perceber que o mercado está saturado de "terror metido a engraçadinho", ao menos no que se refere ao registro do fantástico (apenas as séries de horror realistas, com seus psicopatas, parecem se levar a sério). Assim, é um deslumbre ver que Penny Dreadful não é um pretexto para uma variação "descoladinha" dos personagens da literatura gótica clássica. Ao contrário, Logan e seus colaboradores parecem de fato compreender algo que o cinema e mesmo a literatura de horror atuais, derivados de tantas tentativas de modernização do gênero, parecem ter esquecido ou ao menos perdido a perspectiva: "dar medo" não é o objetivo primordial do horror (muito menos "dar sustos", obsessão do cinema pipoca americano, como o termo scary movie deixa evidente). "Dar medo" é algo muito vago, muito relativo. Algumas pessoas dizem que um filme de horror é ruim porque "não deu medo" enquanto outras, vendo o mesmo filme, dizem nunca ter sentido tanto medo na vida. Não, "dar medo" é apenas um dos elementos que compõem o coquetel de temas e emoções que o horror explora. O verdadeiro coração do gótico é a melancolia. A angústia perante os mistérios da vida e da morte, da existência ou não de algo além, da condição humana, enfim, encarada em seus aspectos mais sombrios. As matérias primas do horror são a culpa, o arrependimento, o pesar, a carência, a maldade, os sentimentos ruins que machucam, os venenos do espírito. Daí emergem os fantasmas, demônios, vampiros... e, em consequência, o medo. Não o medo dos monstros em si, mas daquilo que representam: o memento mori. O gótico é um coração partido. (...)"
"A Maldição do Sangue de Pantera" é o mais subestimado dos filmes produzidos por Val Lewton para o lendário ciclo de horror da RKO nos anos 40. Embora seja, de fato, uma continuação de "Sangue de Pantera" (tem os mesmos personagens e prossegue com suas trajetórias) não dá continuidade ao tema já devidamente fechado do original, ao invés disso usa os personagens já conhecidos pra trabalhar uma temática completamente diferente: os sonhos e fantasias da infância. Não se trata de um filme de horror, embora tenha muitos elementos góticos, é uma história sobre pais e filhos e as sombras que podem alcançar as crianças de muito antes de seu nascimento. Um filme triste e sensível (alguns corações cínicos poderiam dizer "piegas") que merece ser conhecido sem os inevitáveis preconceitos provocados pelas imposições marketeiras impostas de fora pra dentro pela RKO. Nem Val Lewton e nem os diretores do ciclo tinham qualquer poder de decisão em relação aos títulos, que já eram determinados antes mesmo de qualquer roteiro ser escrito (situação que foi ironizada nos primeiros minutos da obra-prima "I Walked With a Zombie", onde a protagonista diz o título em voz alta e comenta "Estranho de se dizer, não?"). A ideia era facilitar a venda do filme e a captação de recursos usando títulos escalafobéticos, que pouco tinha a ver com os filmes em si, mas que funcionavam bem como chamarizes em tempos pré-marketing viral internético. Toda a história do cinema de horror até pelo menos meados dos anos 80 (e, de certo modo, mesmo hoje) é marcada por esse tipo de prática (vide os títulos exagerados de produtoras como a Hammer, Amicus, etc.). Parafraseando o velho ditado do "Nunca julgue um livro pela capa": "Nunca julgue um filme de horror pelo título". ;)
É preciso uma certa bagagem ou, ao menos, uma certa predisposição para se encantar com "A Mansão da Meia-Noite". Como cinema, analisado fria e criticamente, é um filme morno, simplório até, nada que vá mudar a vida de alguém que topasse com ele por acaso numa madrugada tediosa na TV a cabo ou entre as opções do Netflix. Para que o filme de Pete Walker tenha chance de funcionar é necessário, no mínimo, um espectador que não precise de legenda para reconhecer seus astros principais. Se você não tem ideia de quem eles são, é bem provável que o filme não vá te interessar muito também. Se você os reconhece, mas apenas por suas participações em Star Wars e filmes do Tim Burton, até pode rolar, mas fique avisado: "A Mansão da Meia Noite" não foi feito pra você, mas sim pra quem é (ou está disposto a se tornar) fã de verdade do velho e bom horror gótico old school.
Mais aqui: http://lordevelho.blogspot.com.br/2013/12/cavalheiros-do-horror.html
A poucos dias eu assisti a "Sherlock Holmes: O Jogo das Sombras", segundo filme de uma nova franquia que procura modernizar o personagem no cinema. Como sempre, eu tentei gostar e até consegui mais ou menos. O filme é divertido, tem algumas boas sacadas e até que é acima da média (considerando a mediocridade geral do cinema popular que temos hoje). Só tem um problema: não tem nenhum Sherlock Holmes lá. Aliás, nem Watson, o que temos é uma dupla de heróis genéricos, idênticos (no comportamento, personalidades e ideologias) a quaisquer heróis de filmes de ação atuais. Dos personagens originais, não vi nem sombra, apenas os nomes.
Sempre houve tentativas de modernização de clássicos no cinema, isso não é de hoje, mas costumava-se ao menos tentar preservar aquilo que era essencial dos personagens e seus universos, não por se tratar de algo sagrado, mas porque se você mudar demais a essência você acaba ficando apenas com o nome e mais nada. O personagem se torna outro e, nesse caso, pra que manter o nome? Apenas para explorar uma marca? Melhor seria fazer como David Shore que, usando Holmes como uma inspiração, criou um personagem novo: House M.D. É mais honesto e mais criativo.
Depois de tantos anos sem aparecer no cinema ou na TV (a última versão havia sido um excelente seriado produzido pela TV inglesa nos anos 80) o número de pessoas mais jovens que nunca tinha ouvido falar de Sherlock Holmes aumentou bastante. Nenhum problema com isso, o problema é que se essas pessoas assistirem apenas aos dois filmes novos continuarão sem conhecer Holmes. Ele não está lá. Apenas um Robert Dowley Jr. atuando de forma idêntica ao Tony Stark de "Homem de Ferro" (que já é idêntico à maioria dos heróis atuais).
Eu não tenho nenhum problema com o modelo de herói de hoje, mas acho um grande desperdício quando esse modelo se torna único, homogêneo. Quando todas as novas versões de histórias clássicas jogam fora as idiossincrasias e particularidades de suas fontes originais e as formatam até que nada as diferencie do que nossa época já produz. Repito: pra que manter os nomes, então? Criemos personagens completamente novos, ainda que venham a ser releituras de antigos.
E tudo isso me leva ao brilhante "Assassinato por Decreto" (Murder by Decree, 1979). Assim como na nova franquia, esse filme inglês não é uma adaptação de nenhum texto específico de Arthur Conan Doyle. É uma história original que tenta imaginar como teria sido se Sherlock Holmes investigasse o maior "mistério de assassinato" da Inglaterra: Jack o Estripador. Uma idéia simples e até óbvia, mas executada com maestria, com um roteiro que consegue mesclar e preservar todos os elementos essenciais não apenas das histórias fictícias de Holmes e Watson como também da mitologia que se formou em torno do Estripador e suas inúmeras teorias de conspiração. Se o público de hoje se dispuser a ver esse filme, aí sim estará conhecendo Sherlock Holmes, seja pra adorar ou detestar, mas terá realmente conhecido Holmes e seu universo.
Portanto, super recomendo essa pequena pérola do cinema de entretenimento popular dos anos 70. Tão popular como qualquer blockbuster de hoje. Não apenas para conhecer Holmes, Watson e a Londres do Estripador, mas também sentir o quanto perdemos de lá para cá.
"Meu problema? Meu problema é esse lugar... esse lugar é meu túmulo e estou enterrado aqui... um homem jovem, um rei, um guerreiro, preso para sempre nesse corpo de um velho aleijado. E tudo o que eu preciso é de uma mulher, senhor Burton, uma mulher com olhos verdes de dragão que possa me tornar completo novamente, jovem novamente, para que eu possa governar o universo fora desse túmulo." (Lo-Pan)
O circo chega numa cidade infestada pela peste. Questionada a respeito, a cigana que os acompanha não hesita em responder: "Viemos para roubar as moedas dos olhos dos mortos".
E esse é apenas um dos inúmeros momentos brilhantes de "Vampire Circus", um filme que me surpreendeu de verdade. Mesmo sendo fã incondicional da Hammer Films, eu sempre adiava assistir por puro preconceito (em parte justificado pela péssima escolha da capinha do DVD da London Films: mal sabia que esse se tornaria meu filme favorito do estúdio, embora talvez seja injusto comparar, pois "Vampire Circus" é diferente demais dos outros filmes da Hammer. Ainda que eu ame praticamente todos, aprendi a esperar deles aquela sobriedade inglesa, um certo comedimento e contenção, deixando os delírios e propostas mais escandalosas para as produções italianas e francesas do mesmo período. "Vampire Circus", entretanto, é extravagante, atmosférico, absurdo, carregado com uma sensualidade exuberante que eu nunca tinha visto num filme da Hammer, nem mesmo na trilogia Karnstein e demais produções do ciclo dito como mais "apelativo e decadente" do estúdio nos anos 70. Os vampiros do circo assombrado são, ao mesmo tempo, apaixonantes e perturbadores (o que é a cena da mulher-tigre? Morri!), as cenas envolvendo ataques à crianças assustam e angustiam com sua forte insinuação de pedofilia. O roteiro injeta uma bem vinda ambiguidade nos personagens, onde tanto "vilões" quanto "heróis" alternam-se em momentos de calorosa simpatia e imperdoável malignidade (somente na, já citada, trilogia Karnstein, especialmente em "Twins of Evil", a Hammer ousou ser tão moralmente ambígua). A fotografia e direção são deslumbrantes, repletas de soluções cênicas estranhas e adoráveis (a sala de espelhos, os vôos do casal de gêmeos acróbatas, só pra citar algumas). Datado? Sem dúvida, ainda mais com o divertidíssimo visual glam rock do conde Mitterhaus, porém, por mais que pareça cômico hoje em dia, até isso contribui para a atmosfera exótica do filme e, como todo bom cinéfilo sabe, os filmes só são datados pra quem se deixou prender numa única época e numa única lógica/estética cinematográfica. Para quem se permite derivar, a "pegada" setentista é puro deleite.
Dica: o DVD está fora de catálogo a muito tempo, mas essa pérola pode ser achada na net com qualidade de bluray nos torrents da vida. Vale a pena ;)
Um dos exemplos de como os remakes feitos nos anos 80 (que, embora razoavelmente frequentes, nunca chegaram nem perto de metade dos lançamentos, como acontece hoje) tinham ambições artísticas muito maiores do que a mera administração de franquias. Refilmagem do clássico "Sangue de Pantera" (Cat People, de 1942), o filme tem apenas o ponto de partida do original, toda a sua trama, desenvolvimento, objetivos e estética são diferentes, resultando numa obra marcante e com identidade própria, sendo considerado hoje, se não clássico, com certeza cult. Vale uma sessão dupla, de fato, pois as duas visões se complementam e dialogam. Pessoalmente, é um filme que marcou a minha juventude e meus primeiros passos na compreensão que separa o dito "filme de terror" do conceito de "cinema fantástico". Madrugadas de TV estranhas, sinistras e apaixonantes...
Gente, fiquei meio confuso em relação ao número de episódios: o IMDB diz que são três, mas a maioria dos packs de legendas e torrents lista apenas dois, cada um com uma hora e meia. Deduzi que originalmente eram três episódios de uma hora que depois foram remontados pra dois. É isso mesmo?
O que dizer de um filme no qual um cirurgião, ao descobrir que o cérebro de um cadáver está "liso", deduz que sua memória foi drenada? Ou uma gota de sangue do olho de uma criatura pré-história revela gravuras de dinossauros ao ser vista no microscópio? É de rolar de rir!
Christopher Lee e Peter Cushing parecem estar se divertindo pra valer interpretando paleontólogos britânicos rivais ("Não somos monstros, somos ingleses!") e Telly Savalas arrasa como o cossaco demente. E não é que com tudo isso ainda consegue ter algumas cenas genuinamente sinistras e arrepiantes que deixam muito terrorzinho americano moderno no chinelo? Obra prima às avessas! =)
Pra quem quer saber mais, esse blog acaba de soltar um artigo nostalgico e bem bacana:
Pra não ter mal entendido, deixemos claro uma coisa: o roteiro é fraquíssimo, super óbvio, super previsível, bem estilo "Sexta Feira 13" (o elenco jovem só está lá pra morrer). Mas vale a pena desencanar disso porque o charme do filme está nos detalhes, na fotografia, na atmosfera e, acima de tudo, na mais perfeita bruxa malvada da história do cinema! Haggis reina! Só a presença dela já vale o filme ;)
Gente! Que filme lindo!! E que surpresa... não era absolutamente nada do que eu imaginava a partir da fama e do poster bizonho. Apaixonei!
Lições aprendidas para futura referência: 1) Depois de "Satanico Pandemonium", "Alucarda" e os filmes do Taboada, fica evidente que preciso tirar meu atraso com o cinema de horror mexicano; 2) Quando o tio Tarantino diz que gosta, no mínimo tem que se prestar atenção ;)
Me sinto privilegiado por ter na minha estante a primeira edição em DVD do filme que a Warner lançou, contendo o corte original de 1973, do jeitinho que passou nos cinemas. Esse DVD, infelizmente, é raríssimo hoje, só se encontra por aí a "versão do diretor" que, sinto dizer, não passa de uma grande picaretagem. A prova está no documentário "Fear of God - The MakingOff of the Exorcist", onde o diretor explica detalhadamente porque cortou cada uma das cenas extras. Ele não foi obrigado a cortar nada, ele decidiu eliminar essas cenas porque elas não funcionavam bem e enfraqueciam o filme! Aí, de repente, no aniversário do lançamento, ele muda de idéia e resolve recolocar essas cenas... que continuam não funcionando e enfraquecendo o filme (sem contar os desnecessários efeitinhos digitais que arruínam a ambiguidade de certas cenas). Puro caça-níqueis. Se tiver chance de escolher, escolha a versão original sem pensar duas vezes, pois ela sim é "O Exorcista" em todo o seu explendor (o mesmo vale pra suposta "edição do diretor" de Alien - o Oitavo Passageiro)
1) Sim, infelizmente o seriado não tem final. Foram produzidas duas séries de quatro episódios cada, "Riget" e "Riget II". Aparentemente, havia planos para concluir a série com "Riget III", porém dois dos atores principais, primeiro Ernst-Hugo Järegård e depois Kirsten Rolffes, faleceram antes que as filmagens começassem. Quem assistiu a série sabe que seria inconcebível continuar sem eles.
2) Vale a pena assistir mesmo assim? Sem dúvida!! Simplesmente porque os oito episódios produzidos são muito melhores do que muita série com final por aí. E, pra quem gosta de formular teorias malucas, os ganchos em aberto no último episódio são um prato cheio pra viajar ;)
3) O remake americano "Kingdon Hospital" vale a pena? Não, a produção falha miseravelmente ao tentar reproduzir o estilo bizarro de Von Trier sem de fato acreditar nesse estilo (os comentários em aúdio no primeiro episódio são super desrespeitosos e demonstram um flagrante menosprezo pela série original). Diz a lenda que a produção de "Kingdon Hospital" teve acesso aos roteiros dos últimos episódios não produzidos de "Riget", mas não dá pra perceber isso no produto final.
O texto não é novo, mas como eu só assisti "Melancholia" agora (esperava o momento certo... pra mim) resolvi compartilhar, afinal é tão difícil encontrar na internet algum texto ou crítica que não fale um monte de besteira sobre o filme, seja pra detonar ou pra elogiar, deixando tudo de importante de lado pra ficar especulando se o Von Trier é legal ou babaca, se é marqueteiro ou artista, etc, etc... como se isso importasse. O que importa, como sempre, é a obra, não o artista... e a obra de Von Trier (como dizem o Safatle e o Pichonelli) é terrivelmente necessária no mundo de hoje.
Twin Peaks é uma obra-prima em inúmeros aspectos que não precisam ser resumidos aqui, pois muita gente já escreveu a respeito internet afora, não há necessidade de chover no molhado (só não resisto a dizer que, no mínimo, a série tem o melhor piloto e o melhor "series finale" de todos os tempos). Porém, não é nada incomum o público ficar decepcionado da metade pra frente da segunda temporada, depois que o mistério do assassinato é solucionado. Isso é perfeitamente compreensível, a série perde mesmo o rumo nessa fase e a qualidade geral cai drasticamente. Entretanto eu sempre sugiro que se tenha paciência e mantenha em mente o seguinte: naquela época a lógica da produção de um seriado era muito diferente de hoje. Hoje é perfeitamente concebível que um seriado seja planejado para durar um número pré-definido de temporadas ou mesmo seja produzido por completo antes de ir ao ar (como acontece em canais como HBO, por exemplo) mas na época de Twin Peaks a lógica era que uma série ficasse no ar enquanto tivesse audiência. Seria inconcebível para o estúdio (e mesmo para os autores) sequer cogitar em encerrar a série na solução do assassinato, justamente no momento de maior audiência. Não faz diferença que isso seja melhor para a história ou não. Assim, não havia escolha: a série tinha que forçar um jeito de continuar enquanto o público continuasse interessado, mesmo que não houvesse mais história pra contar. O resultado disso era inevitável. Tem outros problemas que não são exatamente culpa da série, por exemplo o excesso de "atores convidados" na segunda temporada, outra imposição do paradigma de "série de sucesso" que simplesmente não combinava com "Twin Peaks", mas os roteiristas tiveram que lidar com isso de qualquer forma. Twin Peaks mudou paradigmas na produção de séries de TV, mas não teve chance de usufruir de algumas dessas mudanças. Entretanto vale muito a pena compreender e perdoar as falhas da segunda temporada, pois mesmo com inúmeros erros a série ainda tem momentos brilhantes espalhados pelos episódios finais. Mais acima de tudo, vale a pena chegar ao último episódio, que consegue compensar todos os erros anteriores de forma espetacular. O "series finale" de Twin Peaks (dirigido por David Lynch praticamente no improviso, pois vários atores testemunham que o roteiro foi basicamente largado na escrivaninha) não só é o melhor episódio da série inteira, como provavelmente uma das horas mais arrojadas que a TV aberta já teve condições de produzir. Numa palavra: obra-prima.
Um dos filmes mais subestimados de Polanski, renegado até pelo próprio, provavelmente abalado com a exagerada reação da crítica e parte do público. Na verdade é um dos seus trabalhos mais refinados e intrigantes, mas que costuma ser julgado (as vezes até pré-julgado) pela inevitável, porém equivocada, comparação com o "O Bebê de Rosemary". O único ponto em comum é o subtexto satanista, fora isso são filmes de objetivos completamente diferentes. "Nono Portal" é um mistério ocultista, um gênero com grande tradição literária, mas raramente bem transporto para o cinema. Como tudo que se relaciona ao ocultismo, exige que o público "movimente-se" ativamente, não apenas assistindo e esperando que os segredos sejam desvendados diante de seus olhos. Os mistérios estão lá, nas entrelinhas, nas imagens simbólicas, nas conclusões que não são verbalizadas e nem precisam ser. E o filme guarda muitos prazeres e surpresas para quem se dispõe a, como Johnny Depp, tornar-se um detetive de livros e símbolos, só assim percebe-se a fina ironia da abordagem de Polanski e a forma como ele se apropria do ocultismo para tecer uma comédia macabra sobre a eterna busca da superação do humano, com seus súcubos, presságios, eruditos obcecados e, sobretudo, livros. O único ponto realmente fraco do filme é a performance de Emmanuelle Seigner, uma péssima atriz, mas aqui o dano é muito menos grave do que sua passagem por "Lua de Fel", por exemplo. Vale a pena ignorá-la em prol de brilhantismo do filme em si.
Para mais detalhes, um link para uma das raras críticas não superficiais:
Se tivesse esse mesmo roteiro óbvio e cheio de clichês, os mesmos personagens esteriotipados que passam o filme todo agindo de forma estúpida apenas porque é conveniente pra trama simplória andar, as mesmas cenas absurdas cuja função é só chocar e divertir o público através do exagero, e a mesma filosofia de botequim de esquina, mas fosse um filme classe B rodado na Itália nos anos 70 com um orçamento irrisório e não pretendendo ser mais nada além de uma diversão ligeira, aí talvez eu me divertisse bastante e até marcasse como favorito (
a cena do "parto" de Noomi Rapace foi equivalente ao zumbi lutando com o tubarão em "Zombie" do Lucio Fulci, exceto que o zumbi me surpreendeu mais e foi muito mais engraçado
). Agora, sendo um mega-blockbuster que torrou milhões de dólares, tentou se vender como prequel de uma das mais importantes sagas de ficção/terror da história do cinema e com toda a pose de "épico" sobre as origens da humanidade... aí sinto muito! Não dá pra perdoar. Poderia até ser divertido como comédia involuntária, mas ver o cara que já dirigiu "Alien" e "Blade Runner" chegar a esse nível é triste demais pra rir.
Sempre tive paixão pelo cinema de horror italiano, mas confesso que (como muitos) tinha preconceito contra o Lucio Fulci que, junto com o Dario Argento, reinou no gênero no começo dos anos 80. Mas esse preconceito, por incrível que pareça, não era por causa dos malhos da crítica "especializada", mas sim por causa de resenhas dos próprios fãs do Fulci, que tendem a celebrar o gore nos seus filmes de forma meio afetada e infantalóide, causando uma certa má impressão. Foi uma surpresa quando, finalmente, comecei a assistir os seus filmes, começando nos (bem interessantes) giallos dos anos 70 até chegar a essa adorável demência que é "Pavor na Cidade dos Zumbis". Como nos melhores filmes do Argento (Inferno, Suspiria e Phenomena, na minha opinião) não há lógica, explicações, verosimilhança, nada que atrapalhe a liberdade do fluxo de imagens macabras e absurdas onde tudo pode acontecer. É medonho e lindo, grotesco e comovente. Tudo propositalmente exagerado, grandiloquente e deliciosamente sem sentido. Apaixonei! (E, falando em gore, acredito que esse filme tem a cena de gore mais linda e mais nojenta da história do cinema:
Corrente do Mal
3.2 1,8K Assista AgoraDesde que Halloween estreou em 1979 trocentos cineastas tentaram se inspirar na obra-prima cult de John Carpenter e levar sua essência um passo adiante. O problema é que quase ninguém sacou qual era de fato essa essência. Não era o lance do psicopata imortal atacando adolescentes, isso era só o pretexto, nada mais que uma ferramenta que, ao ser usada sem critério, não gerou mais do que imitações sem alma, marcando negativamente boa parte do cinema de horror dos anos 80. A essência mesmo era o estabelecimento de um jogo cênico no qual a tela inteira se torna uma ameaça em potencial, o extracampo em si uma fonte permanente de apreensão, cada canto da imagem, cada movimento de câmera, cada figurante ou elemento da mise en scène são assustadores por princípio. A fonte do mal sequer importa de fato, por isso não precisa (e nem deve) ser explicada, podendo ficar ao sabor das especulações que são prerrogativa do público... o que importa mesmo é o jogo. Isso é "It Follows", de David Robert Mitchell, um dos filmes de horror mais inteligentes e genuinamente assustadores dos últimos anos, e que não deixa de render evidentes tributos ao mestre Carpenter, tanto na trilha sonora como nas citações super explícitas a Halloween. Some-se a isso um elenco jovem hiper simpático (do tipo que você torce pra que vençam, não que morram logo) e temos uma pequena jóia a se conhecer e saborear:
Twin Peaks (2ª Temporada)
4.2 299Pistas, Sonhos e (Auto) Ilusões - Uma Defesa do Último Episódio de "Twin Peaks"
(Artigo lotado de spoilers, nem clique no link abaixo se não tiver visto Twin Peaks até o final)
"Queria finalmente fazer por escrito a minha defesa do último episódio da segunda temporada de Twin Peaks como, sim, o final da série. Não um final em aberto fruto de um cancelamento, mas sim como um desfecho definitivo, digno, coerente e, na minha sincera opinião, perfeito para essa série que transformou os paradigmas das séries de TV. Digo mais: independente do que vier a acontecer na nova série prevista para 2016, não alterará o status do "Episódio 29" como o melhor final que Twin Peaks poderia ter tido."
http://lordevelho.blogspot.com.br/2015/03/pistas-sonhos-e-auto-ilusoes-uma-defesa.html
O Babadook
3.5 2,0KThe Babadook é um filme de horror que só poderia ter sido realizado por mulheres. Explora medos intrínsecos a experiências às quais apenas mulheres se vêem submetidas, tanto no sentido biológico quanto no de lugar social. Não por acaso, boa parte do público masculino não está sacando muito bem do que se trata realmente essa produção australiana, por vezes comprometendo uma avaliação crítica. As resenhas em geral falam do livro infantil amaldiçoado, da criatura tipo bicho-papão que espreita no escuro, da criança em perigo e tecem comparações com outros filmes e autores que lidam com "horror para crianças", como Neil Gaiman e Guilermo Del Toro. Esses elementos fazem parte da mistura, com certeza, mas não são o foco, nem os protagonistas. Ironicamente, foi Gaiman que escreveu no clássico conto "Histórias na Areia", em Sandman #09, que "Há histórias que as mulheres contam umas as outras, em uma língua própria que nunca é ensinada aos meninos e que os homens mais velhos são sábios demais para aprender."
The Babadook é uma dessas histórias de mulheres, narrada numa mídia em que quase todos os contadores de histórias são homens. Escrito e dirigido por Jennifer Kent (sua estréia na direção de longas), aborda um tipo de horror que nós meninos podemos até intuir, tentar imaginar, mas jamais compreender: o horror da maternidade. Soa terrível para quem (ainda) acredita no mito do amor incondicional materno ou na balela de que uma mulher só se realiza sendo mãe, e talvez isso explique porque tanta gente tem rejeitado o filme, exorcizando a própria perturbação com críticas negativas, mas mesmo esses não tem como negar a coragem da diretora e da atriz Essie Davis (da excelente série Miss Fisher's Murder Mysteries) em abraçarem um tema tão tabu.
http://lordevelho.blogspot.com.br/2014/11/the-babadook-o-horror-da-ser-mae.html
Penny Dreadful (1ª Temporada)
4.3 1,0K Assista Agora"(...) Pra começo de conversa é uma delícia ver o horror gótico tratado com seriedade e dignidade, sem a menor sombra de humor, a não ser o mais negro (aquele que só causa risos nervosos, se é que me entendem). Nada contra as abordagens mais "irreverentes", eu mesmo admito que me diverti acompanhando True Blood durante esses sete anos, também achei as primeiras temporadas de Supernatural bacaninhas como diversão bocó e morro de rir com o cinismo descarado de American Horror Story e seu nonsense gore over do over... mas, até por esses exemplos, é possível perceber que o mercado está saturado de "terror metido a engraçadinho", ao menos no que se refere ao registro do fantástico (apenas as séries de horror realistas, com seus psicopatas, parecem se levar a sério). Assim, é um deslumbre ver que Penny Dreadful não é um pretexto para uma variação "descoladinha" dos personagens da literatura gótica clássica. Ao contrário, Logan e seus colaboradores parecem de fato compreender algo que o cinema e mesmo a literatura de horror atuais, derivados de tantas tentativas de modernização do gênero, parecem ter esquecido ou ao menos perdido a perspectiva: "dar medo" não é o objetivo primordial do horror (muito menos "dar sustos", obsessão do cinema pipoca americano, como o termo scary movie deixa evidente). "Dar medo" é algo muito vago, muito relativo. Algumas pessoas dizem que um filme de horror é ruim porque "não deu medo" enquanto outras, vendo o mesmo filme, dizem nunca ter sentido tanto medo na vida. Não, "dar medo" é apenas um dos elementos que compõem o coquetel de temas e emoções que o horror explora. O verdadeiro coração do gótico é a melancolia. A angústia perante os mistérios da vida e da morte, da existência ou não de algo além, da condição humana, enfim, encarada em seus aspectos mais sombrios. As matérias primas do horror são a culpa, o arrependimento, o pesar, a carência, a maldade, os sentimentos ruins que machucam, os venenos do espírito. Daí emergem os fantasmas, demônios, vampiros... e, em consequência, o medo. Não o medo dos monstros em si, mas daquilo que representam: o memento mori. O gótico é um coração partido. (...)"
http://lordevelho.blogspot.com.br/2014/09/penny-dreadful-redescobrindo-o-horror.html
Guerreiros da Atlântida
3.2 14DUVIDO que exista alguém que não pulou do sofá de susto numa determinada cena que quem assistiu sabe muito bem qual é. ;)
A Maldição do Sangue da Pantera
3.6 18"A Maldição do Sangue de Pantera" é o mais subestimado dos filmes produzidos por Val Lewton para o lendário ciclo de horror da RKO nos anos 40. Embora seja, de fato, uma continuação de "Sangue de Pantera" (tem os mesmos personagens e prossegue com suas trajetórias) não dá continuidade ao tema já devidamente fechado do original, ao invés disso usa os personagens já conhecidos pra trabalhar uma temática completamente diferente: os sonhos e fantasias da infância. Não se trata de um filme de horror, embora tenha muitos elementos góticos, é uma história sobre pais e filhos e as sombras que podem alcançar as crianças de muito antes de seu nascimento. Um filme triste e sensível (alguns corações cínicos poderiam dizer "piegas") que merece ser conhecido sem os inevitáveis preconceitos provocados pelas imposições marketeiras impostas de fora pra dentro pela RKO. Nem Val Lewton e nem os diretores do ciclo tinham qualquer poder de decisão em relação aos títulos, que já eram determinados antes mesmo de qualquer roteiro ser escrito (situação que foi ironizada nos primeiros minutos da obra-prima "I Walked With a Zombie", onde a protagonista diz o título em voz alta e comenta "Estranho de se dizer, não?"). A ideia era facilitar a venda do filme e a captação de recursos usando títulos escalafobéticos, que pouco tinha a ver com os filmes em si, mas que funcionavam bem como chamarizes em tempos pré-marketing viral internético. Toda a história do cinema de horror até pelo menos meados dos anos 80 (e, de certo modo, mesmo hoje) é marcada por esse tipo de prática (vide os títulos exagerados de produtoras como a Hammer, Amicus, etc.). Parafraseando o velho ditado do "Nunca julgue um livro pela capa": "Nunca julgue um filme de horror pelo título". ;)
A Mansão da Meia-noite
3.7 45 Assista AgoraÉ preciso uma certa bagagem ou, ao menos, uma certa predisposição para se encantar com "A Mansão da Meia-Noite". Como cinema, analisado fria e criticamente, é um filme morno, simplório até, nada que vá mudar a vida de alguém que topasse com ele por acaso numa madrugada tediosa na TV a cabo ou entre as opções do Netflix. Para que o filme de Pete Walker tenha chance de funcionar é necessário, no mínimo, um espectador que não precise de legenda para reconhecer seus astros principais. Se você não tem ideia de quem eles são, é bem provável que o filme não vá te interessar muito também. Se você os reconhece, mas apenas por suas participações em Star Wars e filmes do Tim Burton, até pode rolar, mas fique avisado: "A Mansão da Meia Noite" não foi feito pra você, mas sim pra quem é (ou está disposto a se tornar) fã de verdade do velho e bom horror gótico old school.
Mais aqui: http://lordevelho.blogspot.com.br/2013/12/cavalheiros-do-horror.html
Assassinato por Decreto
3.7 9A poucos dias eu assisti a "Sherlock Holmes: O Jogo das Sombras", segundo filme de uma nova franquia que procura modernizar o personagem no cinema. Como sempre, eu tentei gostar e até consegui mais ou menos. O filme é divertido, tem algumas boas sacadas e até que é acima da média (considerando a mediocridade geral do cinema popular que temos hoje). Só tem um problema: não tem nenhum Sherlock Holmes lá. Aliás, nem Watson, o que temos é uma dupla de heróis genéricos, idênticos (no comportamento, personalidades e ideologias) a quaisquer heróis de filmes de ação atuais. Dos personagens originais, não vi nem sombra, apenas os nomes.
Sempre houve tentativas de modernização de clássicos no cinema, isso não é de hoje, mas costumava-se ao menos tentar preservar aquilo que era essencial dos personagens e seus universos, não por se tratar de algo sagrado, mas porque se você mudar demais a essência você acaba ficando apenas com o nome e mais nada. O personagem se torna outro e, nesse caso, pra que manter o nome? Apenas para explorar uma marca? Melhor seria fazer como David Shore que, usando Holmes como uma inspiração, criou um personagem novo: House M.D. É mais honesto e mais criativo.
Depois de tantos anos sem aparecer no cinema ou na TV (a última versão havia sido um excelente seriado produzido pela TV inglesa nos anos 80) o número de pessoas mais jovens que nunca tinha ouvido falar de Sherlock Holmes aumentou bastante. Nenhum problema com isso, o problema é que se essas pessoas assistirem apenas aos dois filmes novos continuarão sem conhecer Holmes. Ele não está lá. Apenas um Robert Dowley Jr. atuando de forma idêntica ao Tony Stark de "Homem de Ferro" (que já é idêntico à maioria dos heróis atuais).
Eu não tenho nenhum problema com o modelo de herói de hoje, mas acho um grande desperdício quando esse modelo se torna único, homogêneo. Quando todas as novas versões de histórias clássicas jogam fora as idiossincrasias e particularidades de suas fontes originais e as formatam até que nada as diferencie do que nossa época já produz. Repito: pra que manter os nomes, então? Criemos personagens completamente novos, ainda que venham a ser releituras de antigos.
E tudo isso me leva ao brilhante "Assassinato por Decreto" (Murder by Decree, 1979). Assim como na nova franquia, esse filme inglês não é uma adaptação de nenhum texto específico de Arthur Conan Doyle. É uma história original que tenta imaginar como teria sido se Sherlock Holmes investigasse o maior "mistério de assassinato" da Inglaterra: Jack o Estripador. Uma idéia simples e até óbvia, mas executada com maestria, com um roteiro que consegue mesclar e preservar todos os elementos essenciais não apenas das histórias fictícias de Holmes e Watson como também da mitologia que se formou em torno do Estripador e suas inúmeras teorias de conspiração. Se o público de hoje se dispuser a ver esse filme, aí sim estará conhecendo Sherlock Holmes, seja pra adorar ou detestar, mas terá realmente conhecido Holmes e seu universo.
Portanto, super recomendo essa pequena pérola do cinema de entretenimento popular dos anos 70. Tão popular como qualquer blockbuster de hoje. Não apenas para conhecer Holmes, Watson e a Londres do Estripador, mas também sentir o quanto perdemos de lá para cá.
Os Aventureiros do Bairro Proibido
3.7 568 Assista Agora"Meu problema? Meu problema é esse lugar... esse lugar é meu túmulo e estou enterrado aqui... um homem jovem, um rei, um guerreiro, preso para sempre nesse corpo de um velho aleijado. E tudo o que eu preciso é de uma mulher, senhor Burton, uma mulher com olhos verdes de dragão que possa me tornar completo novamente, jovem novamente, para que eu possa governar o universo fora desse túmulo." (Lo-Pan)
O Vampiro e a Cigana
3.1 27 Assista AgoraO circo chega numa cidade infestada pela peste. Questionada a respeito, a cigana que os acompanha não hesita em responder: "Viemos para roubar as moedas dos olhos dos mortos".
E esse é apenas um dos inúmeros momentos brilhantes de "Vampire Circus", um filme que me surpreendeu de verdade. Mesmo sendo fã incondicional da Hammer Films, eu sempre adiava assistir por puro preconceito (em parte justificado pela péssima escolha da capinha do DVD da London Films: mal sabia que esse se tornaria meu filme favorito do estúdio, embora talvez seja injusto comparar, pois "Vampire Circus" é diferente demais dos outros filmes da Hammer. Ainda que eu ame praticamente todos, aprendi a esperar deles aquela sobriedade inglesa, um certo comedimento e contenção, deixando os delírios e propostas mais escandalosas para as produções italianas e francesas do mesmo período. "Vampire Circus", entretanto, é extravagante, atmosférico, absurdo, carregado com uma sensualidade exuberante que eu nunca tinha visto num filme da Hammer, nem mesmo na trilogia Karnstein e demais produções do ciclo dito como mais "apelativo e decadente" do estúdio nos anos 70. Os vampiros do circo assombrado são, ao mesmo tempo, apaixonantes e perturbadores (o que é a cena da mulher-tigre? Morri!), as cenas envolvendo ataques à crianças assustam e angustiam com sua forte insinuação de pedofilia. O roteiro injeta uma bem vinda ambiguidade nos personagens, onde tanto "vilões" quanto "heróis" alternam-se em momentos de calorosa simpatia e imperdoável malignidade (somente na, já citada, trilogia Karnstein, especialmente em "Twins of Evil", a Hammer ousou ser tão moralmente ambígua). A fotografia e direção são deslumbrantes, repletas de soluções cênicas estranhas e adoráveis (a sala de espelhos, os vôos do casal de gêmeos acróbatas, só pra citar algumas). Datado? Sem dúvida, ainda mais com o divertidíssimo visual glam rock do conde Mitterhaus, porém, por mais que pareça cômico hoje em dia, até isso contribui para a atmosfera exótica do filme e, como todo bom cinéfilo sabe, os filmes só são datados pra quem se deixou prender numa única época e numa única lógica/estética cinematográfica. Para quem se permite derivar, a "pegada" setentista é puro deleite.
Dica: o DVD está fora de catálogo a muito tempo, mas essa pérola pode ser achada na net com qualidade de bluray nos torrents da vida. Vale a pena ;)
Lovecraft: Medo do Desconhecido
4.1 25 Assista AgoraSurgiu uma legenda em português ;)
A Marca da Pantera
3.2 138Um dos exemplos de como os remakes feitos nos anos 80 (que, embora razoavelmente frequentes, nunca chegaram nem perto de metade dos lançamentos, como acontece hoje) tinham ambições artísticas muito maiores do que a mera administração de franquias. Refilmagem do clássico "Sangue de Pantera" (Cat People, de 1942), o filme tem apenas o ponto de partida do original, toda a sua trama, desenvolvimento, objetivos e estética são diferentes, resultando numa obra marcante e com identidade própria, sendo considerado hoje, se não clássico, com certeza cult. Vale uma sessão dupla, de fato, pois as duas visões se complementam e dialogam. Pessoalmente, é um filme que marcou a minha juventude e meus primeiros passos na compreensão que separa o dito "filme de terror" do conceito de "cinema fantástico". Madrugadas de TV estranhas, sinistras e apaixonantes...
Falsas Aparências
4.3 190Gente, fiquei meio confuso em relação ao número de episódios: o IMDB diz que são três, mas a maioria dos packs de legendas e torrents lista apenas dois, cada um com uma hora e meia. Deduzi que originalmente eram três episódios de uma hora que depois foram remontados pra dois. É isso mesmo?
Expresso do Horror
3.5 80 Assista AgoraSem dúvida meu filme ruim favorito, Horror Express (O Expresso do Horror) é irresistível! Todos os seus defeitos são originais e divertidíssimos.
O que dizer de um filme no qual um cirurgião, ao descobrir que o cérebro de um cadáver está "liso", deduz que sua memória foi drenada? Ou uma gota de sangue do olho de uma criatura pré-história revela gravuras de dinossauros ao ser vista no microscópio? É de rolar de rir!
Pra quem quer saber mais, esse blog acaba de soltar um artigo nostalgico e bem bacana:
A Vingança do Diabo
3.3 103Pra não ter mal entendido, deixemos claro uma coisa: o roteiro é fraquíssimo, super óbvio, super previsível, bem estilo "Sexta Feira 13" (o elenco jovem só está lá pra morrer). Mas vale a pena desencanar disso porque o charme do filme está nos detalhes, na fotografia, na atmosfera e, acima de tudo, na mais perfeita bruxa malvada da história do cinema! Haggis reina! Só a presença dela já vale o filme ;)
Satânico Pandemonium
3.3 18Gente! Que filme lindo!! E que surpresa... não era absolutamente nada do que eu imaginava a partir da fama e do poster bizonho. Apaixonei!
Lições aprendidas para futura referência:
1) Depois de "Satanico Pandemonium", "Alucarda" e os filmes do Taboada, fica evidente que preciso tirar meu atraso com o cinema de horror mexicano;
2) Quando o tio Tarantino diz que gosta, no mínimo tem que se prestar atenção ;)
Amor de Vampiros
3.4 9 Assista AgoraDou minha alma em troca de uma legenda em português pra esse filme... e ainda embrulho pra presente =)
O Exorcista
4.1 2,3K Assista AgoraMe sinto privilegiado por ter na minha estante a primeira edição em DVD do filme que a Warner lançou, contendo o corte original de 1973, do jeitinho que passou nos cinemas. Esse DVD, infelizmente, é raríssimo hoje, só se encontra por aí a "versão do diretor" que, sinto dizer, não passa de uma grande picaretagem. A prova está no documentário "Fear of God - The MakingOff of the Exorcist", onde o diretor explica detalhadamente porque cortou cada uma das cenas extras. Ele não foi obrigado a cortar nada, ele decidiu eliminar essas cenas porque elas não funcionavam bem e enfraqueciam o filme! Aí, de repente, no aniversário do lançamento, ele muda de idéia e resolve recolocar essas cenas... que continuam não funcionando e enfraquecendo o filme (sem contar os desnecessários efeitinhos digitais que arruínam a ambiguidade de certas cenas). Puro caça-níqueis. Se tiver chance de escolher, escolha a versão original sem pensar duas vezes, pois ela sim é "O Exorcista" em todo o seu explendor (o mesmo vale pra suposta "edição do diretor" de Alien - o Oitavo Passageiro)
O Reino
4.0 73 Assista AgoraSó pra esclarecer:
1) Sim, infelizmente o seriado não tem final. Foram produzidas duas séries de quatro episódios cada, "Riget" e "Riget II". Aparentemente, havia planos para concluir a série com "Riget III", porém dois dos atores principais, primeiro Ernst-Hugo Järegård e depois Kirsten Rolffes, faleceram antes que as filmagens começassem. Quem assistiu a série sabe que seria inconcebível continuar sem eles.
2) Vale a pena assistir mesmo assim? Sem dúvida!! Simplesmente porque os oito episódios produzidos são muito melhores do que muita série com final por aí. E, pra quem gosta de formular teorias malucas, os ganchos em aberto no último episódio são um prato cheio pra viajar ;)
3) O remake americano "Kingdon Hospital" vale a pena? Não, a produção falha miseravelmente ao tentar reproduzir o estilo bizarro de Von Trier sem de fato acreditar nesse estilo (os comentários em aúdio no primeiro episódio são super desrespeitosos e demonstram um flagrante menosprezo pela série original). Diz a lenda que a produção de "Kingdon Hospital" teve acesso aos roteiros dos últimos episódios não produzidos de "Riget", mas não dá pra perceber isso no produto final.
Melancolia
3.8 3,1K Assista AgoraO texto não é novo, mas como eu só assisti "Melancholia" agora (esperava o momento certo... pra mim) resolvi compartilhar, afinal é tão difícil encontrar na internet algum texto ou crítica que não fale um monte de besteira sobre o filme, seja pra detonar ou pra elogiar, deixando tudo de importante de lado pra ficar especulando se o Von Trier é legal ou babaca, se é marqueteiro ou artista, etc, etc... como se isso importasse. O que importa, como sempre, é a obra, não o artista... e a obra de Von Trier (como dizem o Safatle e o Pichonelli) é terrivelmente necessária no mundo de hoje.
Twin Peaks (2ª Temporada)
4.2 299Twin Peaks é uma obra-prima em inúmeros aspectos que não precisam ser resumidos aqui, pois muita gente já escreveu a respeito internet afora, não há necessidade de chover no molhado (só não resisto a dizer que, no mínimo, a série tem o melhor piloto e o melhor "series finale" de todos os tempos).
Porém, não é nada incomum o público ficar decepcionado da metade pra frente da segunda temporada, depois que o mistério do assassinato é solucionado. Isso é perfeitamente compreensível, a série perde mesmo o rumo nessa fase e a qualidade geral cai drasticamente. Entretanto eu sempre sugiro que se tenha paciência e mantenha em mente o seguinte: naquela época a lógica da produção de um seriado era muito diferente de hoje. Hoje é perfeitamente concebível que um seriado seja planejado para durar um número pré-definido de temporadas ou mesmo seja produzido por completo antes de ir ao ar (como acontece em canais como HBO, por exemplo) mas na época de Twin Peaks a lógica era que uma série ficasse no ar enquanto tivesse audiência. Seria inconcebível para o estúdio (e mesmo para os autores) sequer cogitar em encerrar a série na solução do assassinato, justamente no momento de maior audiência. Não faz diferença que isso seja melhor para a história ou não. Assim, não havia escolha: a série tinha que forçar um jeito de continuar enquanto o público continuasse interessado, mesmo que não houvesse mais história pra contar. O resultado disso era inevitável. Tem outros problemas que não são exatamente culpa da série, por exemplo o excesso de "atores convidados" na segunda temporada, outra imposição do paradigma de "série de sucesso" que simplesmente não combinava com "Twin Peaks", mas os roteiristas tiveram que lidar com isso de qualquer forma. Twin Peaks mudou paradigmas na produção de séries de TV, mas não teve chance de usufruir de algumas dessas mudanças.
Entretanto vale muito a pena compreender e perdoar as falhas da segunda temporada, pois mesmo com inúmeros erros a série ainda tem momentos brilhantes espalhados pelos episódios finais. Mais acima de tudo, vale a pena chegar ao último episódio, que consegue compensar todos os erros anteriores de forma espetacular. O "series finale" de Twin Peaks (dirigido por David Lynch praticamente no improviso, pois vários atores testemunham que o roteiro foi basicamente largado na escrivaninha) não só é o melhor episódio da série inteira, como provavelmente uma das horas mais arrojadas que a TV aberta já teve condições de produzir. Numa palavra: obra-prima.
O Último Portal
3.2 461 Assista AgoraUm dos filmes mais subestimados de Polanski, renegado até pelo próprio, provavelmente abalado com a exagerada reação da crítica e parte do público. Na verdade é um dos seus trabalhos mais refinados e intrigantes, mas que costuma ser julgado (as vezes até pré-julgado) pela inevitável, porém equivocada, comparação com o "O Bebê de Rosemary". O único ponto em comum é o subtexto satanista, fora isso são filmes de objetivos completamente diferentes. "Nono Portal" é um mistério ocultista, um gênero com grande tradição literária, mas raramente bem transporto para o cinema. Como tudo que se relaciona ao ocultismo, exige que o público "movimente-se" ativamente, não apenas assistindo e esperando que os segredos sejam desvendados diante de seus olhos. Os mistérios estão lá, nas entrelinhas, nas imagens simbólicas, nas conclusões que não são verbalizadas e nem precisam ser. E o filme guarda muitos prazeres e surpresas para quem se dispõe a, como Johnny Depp, tornar-se um detetive de livros e símbolos, só assim percebe-se a fina ironia da abordagem de Polanski e a forma como ele se apropria do ocultismo para tecer uma comédia macabra sobre a eterna busca da superação do humano, com seus súcubos, presságios, eruditos obcecados e, sobretudo, livros. O único ponto realmente fraco do filme é a performance de Emmanuelle Seigner, uma péssima atriz, mas aqui o dano é muito menos grave do que sua passagem por "Lua de Fel", por exemplo. Vale a pena ignorá-la em prol de brilhantismo do filme em si.
Para mais detalhes, um link para uma das raras críticas não superficiais:
Prometheus
3.1 3,4K Assista AgoraSe tivesse esse mesmo roteiro óbvio e cheio de clichês, os mesmos personagens esteriotipados que passam o filme todo agindo de forma estúpida apenas porque é conveniente pra trama simplória andar, as mesmas cenas absurdas cuja função é só chocar e divertir o público através do exagero, e a mesma filosofia de botequim de esquina, mas fosse um filme classe B rodado na Itália nos anos 70 com um orçamento irrisório e não pretendendo ser mais nada além de uma diversão ligeira, aí talvez eu me divertisse bastante e até marcasse como favorito (
a cena do "parto" de Noomi Rapace foi equivalente ao zumbi lutando com o tubarão em "Zombie" do Lucio Fulci, exceto que o zumbi me surpreendeu mais e foi muito mais engraçado
Pavor na Cidade dos Zumbis
3.5 105Sempre tive paixão pelo cinema de horror italiano, mas confesso que (como muitos) tinha preconceito contra o Lucio Fulci que, junto com o Dario Argento, reinou no gênero no começo dos anos 80. Mas esse preconceito, por incrível que pareça, não era por causa dos malhos da crítica "especializada", mas sim por causa de resenhas dos próprios fãs do Fulci, que tendem a celebrar o gore nos seus filmes de forma meio afetada e infantalóide, causando uma certa má impressão. Foi uma surpresa quando, finalmente, comecei a assistir os seus filmes, começando nos (bem interessantes) giallos dos anos 70 até chegar a essa adorável demência que é "Pavor na Cidade dos Zumbis". Como nos melhores filmes do Argento (Inferno, Suspiria e Phenomena, na minha opinião) não há lógica, explicações, verosimilhança, nada que atrapalhe a liberdade do fluxo de imagens macabras e absurdas onde tudo pode acontecer. É medonho e lindo, grotesco e comovente. Tudo propositalmente exagerado, grandiloquente e deliciosamente sem sentido. Apaixonei!
(E, falando em gore, acredito que esse filme tem a cena de gore mais linda e mais nojenta da história do cinema:
a garota vomitando as entranhas