Como demonstrou em trabalhos anteriores, Bong Joon Ho é hábil ao transitar pelos diversos gêneros. Aqui não é diferente. Na primeira metade o filme explora comicamente as artimanhas da família Kim para conseguir se infiltrar como serviçais na residência da abastada família Park. Da segunda metade em diante, o registro vai se alterando até desaguar em um clímax de tirar o fôlego.
E, “Parasita”, Bong aborda o abismo entre as classes mostrando o contraste entre duas famílias, sublinhada magistralmente na cenografia e na fotografia. A família Park habita espaços amplos e luminosos enquanto os Kim se espremem em um cubículo abaixo do nível da rua. As diferenças se revelam mais profundas quando ocorre uma tempestade. Enquanto os Park contemplam a chuva no aconchego de sua confortável casa, os Kim perdem quase tudo tendo que ir para um abrigo. No dia seguinte estarão a postos como serviçais, obedientes, tendo que estar dispostos a fazer um extra a fim de satisfazer os caprichos dos patrões.
Uma descoberta provocará uma reviravolta na narrativa, ameaçando os planos dos Kim e instalando uma tensão que vai se exacerbando até o climax mencionado no primeiro parágrafo.
O filme nos leva à reflexão sobre quem são realmente os parasitas em nossa sociedade. Seria quem habita os subterrâneos da sociedade ou é quem explora o trabalho alheio oferecendo migalhas em troca? Joga na cara o espectador que, enquanto haver falta de empatia entre os que estão na parte de cima da pirâmide social e os que estão nos estratos mais inferiores o conflito será inevitável. Não se tem paz com desigualdade. Aqui Bong não põe na alça de mira apenas os abastados, fazendo questão de mostrar que a solidariedade pode faltar também entre os de uma mesma classe e que padecem de problemas semelhantes. Trocando em miúdos e citando o grande Paulinho da Viola: “quando o jeito é se virar, cada um trata de si, irmão desconhece irmão”.
Um senão que aponto nessa impactante obra é sua conclusão, que, em relação a tudo o que nos foi brindado até aquele momento, soa como um balde de água fria. No entanto de modo algum isso empana o brilho de mais essa importante página da história do cinema sul-coreano.
Em "Bacurau" Kleber Mendonça Filho (em parceria com Juliano Dornelles) deixa de lado as tramas urbanas de seus filmes anteriores e volta suas lentes para o interior do Brasil, mais especificamente o sertão de Pernambuco. No entanto essa mudança na ambientação não significou o abandono de um tema recorrente que une os seus trabalhos em longas-metragens: o apagamento da memória do passado. Em "O Som ao Redor" era a especulação imobiliária eliminando os vestïgios do passado. Em "Aquarius" o tema volta a baila com o embate entre uma aposentada que não quer vender seu imóvel e representantes de uma imobiliária. Temos em "Bacurau" o duelo entre a necessidade de preservação da memória e as forças de aniquilamento, representadas aqui pelos forasteiros. De forma alegórica, expressa uma afirmação de identidade cultural frente a uma força massificadora, representada pelos estrangeiros. Essa afirmação vem corporificada na escalação de determinados nomes do elenco. Não é por acaso a escalação de Sônia Braga (que durante muito tempo estrelou sucessos de bilheteria e crítica do cinema nacional) e da cirandeira Lia de Itamaracá (icone cultural do Nordeste). Essa mensagem vem empacotada em um discurso político que é mais explicito. Aqui está presente o político safado que cospe um discurso fingido para manipular o povo, despejando na praça livros velhos e abastecendo o posto de saúde com remédios vencidos. O filme combina elementos de faroeste, ficção científica, thriller político, comédia e "trash movie" com grande habilidade. Embora pareça um tanto descosido e de alguns diálogos sussurrados dificultarem a compreensão do que se está falando, “Bacurau” se revela mais do que um exercício de gêneros. Trata-se ė uma alegoria sobre a resistêcia. Um filme com grande sentido de urgência.
Um filme do incensado Pedro Costa? Oba, não posso perder! Repleto de críticas positivas, prêmios etc. Comprei o ingresso antes de ler mais sobre o filme. Posteriormente li que Pedro é o diretor de “Juventude em Marcha”, que vi em 2006 é achei um suplício de tão letárgico. Odiei o filme. “Ei-me novamente prestes a assistir a mais um soporífero espetáculo”, pensei. Já que comprei o ingresso, só me restou tomar um café forte para encarar os arrastados 124 minutos. A Sala 1 do Estação Net Botafogo estava lotada e Pedro estava presente à sessão e disse algumas palavras antes da projeção.
Então vamos ao filme. A primeira cena nos mostra um muro e acima dele várias cruzes. Na rua pessoas passam no que parece ser um cortejo. O que vem em seguida pode ser descrito como hipnotizante, tal a beleza da fotografia e dos enquadramentos. Cada plano é uma obra de arte pictórica. Os ambientes escuros predominam durante quase todo o tempo. Os personagens circulam como se fossem mortos em vida. São párias, pessoas à margem. As casas são como sepulcros.
Quando Vitalina, a personagem central entra em cena, vemos apenas seus pés descerem do avião. Ela é recebida no aeroporto com um “não há nada para você aqui. Volte para Portugal”. Mas ela persiste porque há algo que precisa fazer e é isso que move o filme. Trata-se de um dos filmes que mais densamente abordaram um processo de luto. Vitalina precisa passar por isso para se libertar e seguir com sua vida. Outro personagem marcante é o Padre (vivido magistralmente por Ventura). Pedro Costa extrai uma intensidade assombrosa do olhar dos dois. A fé de Vitalina contrasta com o desânimo do sacerdote. É cinema sem concessões. A claridade só aparece nos minutos finais e essa opção se mostra perfeitamente coerente.
E vista do exposto aqui, sinto que devo um pedido de desculpas a Pedro por ter prejulgado seu filme. Aliás, estou pensando seriamente em rever “Juventude em Marcha”. Talvez eu tenha assistido esse filme em um mal dia (rs).
O pano de fundo é a convulsão política que agitava o Peru na década de 1980. Em meio a esse caos, dois personagens cruzam seus caminhos. Georgina e Pedro tem em comum o fato de (guardadas as devidas proporções) estarem à margem. Ela procura desesperadamente seu filho que lhe foi roubado ao nascer sem conseguir obter a ajuda que precisa para saber seu paradeiro. Ele, impossibilitado de assumir sua homossexualidade. A opção da diretora Melina León pelo preto e branco e por explorar a silhueta dos personagens de encontro a um cenário nevoento, contribui para compor uma atmosfera triste e sufocante. Soberba em cena, a atriz Pamela Mendoza, sintetiza com sua Georgina a dor e impotência dos desamparados.
É um filme sobre tentativas desesperadas de busca de sentido para a vida após a tragédia da guerra. A instabilidade emocional das duas personagens centrais, gera um vai e vem de sentimentos que vão da ternura à fúria em um duelo exasperante para o espectador. O ritmo lento poderá entendiar alguns espectadores. Direção de arte e fotografia excelentes e as duas intérpretes centrais fazem um trabalho magistral. “Uma Mulher Alta” nos mostra que a guerra acaba mais as marcas que ela deixa perduram.
O título em português é infame mas se considerarmos que até Bergman foi vítima de títulos brazuca desastrosos ("Persona", virou "Quando duas mulheres Pecam", irghhhh) até que esse (vá lá) se torna até passável. Bem, quanto ao filme trata-se de uma comédia dramática que lança poderosas farpas contra o charlatanismo religioso, praga que até hoje infesta o meio religioso. Steve Martin concretiza aqui um de seus melhores desempenhos no cinema.
Um tocante filme que fala sobre ascensão e decadência. Os números músicas em sua maioria são arrebatadores. Bradley Cooper e Lady Gaga demonstram grande química.
"Central do Brasil" narra a trajetória de uma mulher rumo a redenção enquanto expõe um recorte das mazelas do Brasil e enaltece a solidariedade. Fernandona brilha soberba com a sua Dora, onde ainda tem Otávio Augusto e Marília Pera. Vinícius Oliveira foi uma grata revelação na pele do menino Josué. Na tela desfilam diante de Dora vários rostos que são o retrato de um Brasil dos desamparados, carentes mas que buscam na fé um refúgio. Um filme sem pudor de se assumir como melodrama sem com isso diluir a proposta. O final sugere um naco de esperança de felicidade. As sequências finais são de tirar lágrimas de pedra.
O filme é muito mais do que uma história de origem de um vilão famoso. Trata-se de um brutal e cortante estudo de uma personalidade, investigando os eventos que determinam a transformação de um sujeito desprezado e vítima de escárnio em um “vilão” insano e perigoso.
Aqui o vilão não é o Coringa. Há os “vilões” que empurram Arthur na direção da “vilania”. O caos social de Gothan City, o bullying e a indiferença são os vilões que espezinham Arthur. Das feridas que tudo isso cria, surge o Coringa (adaptando Gil).
Joaquin Phoenix entrega esse personagem complexo de forma visceral. Torcemos por suas pequenas vitórias e lamentamos as suas opções extremadas a ponto de gerar empatia.
Parte da polêmica gerada em torno da produção diz respeito a uma suposta exaltação à violência como resposta a uma sociedade desigual e opressora e pela promoção do protagonista a uma espécie de herói dos fracos e oprimidos. O filme apenas aponta o que pode ocorrer, não incorrendo em generalizações.
No aspecto visual, direção de arte e fotografia remetem à Scorcese. Do bem alinhavado roteiro à direção, tudo conflui para um acerto geral.
“Coringa” ultrapassa as fronteiras do filme de gênero para se tornar um drama denso, impactante e transgressor,
Mas que uma simples cinebiografia, o filme mostra a trajetória de um homem rumo a um acerto de contas consigo mesmo e com os que estão a sua volta. O caminho da insegurança à autoaceitação, passando pelo torvelinho dos excessos é mostrado em um roteiro afiado e um visual impactante, sem perder de vista a emoção.
Essa adorável comédia, através de divertidas tiradas, desfecha farpas à cultura pop e exalta a importância de se perpetuar a boa música. A dupla principal esbanja carisma.
Sob esse filme têm pesado algumas críticas negativas, vindas principalmente dos familiares do pianista Don Shirley, que alegam que o filme apresenta “enorme desvios” em relação a realidade. Ainda que tenha tomado mesmo imensa liberdade em relação aos fatos reais, “Green Book” é um filme extremamente sedutor. Repleto de humor, o narra um processo de aprendizado mútuo e nos faz acreditar que a convivência entre pessoas diferentes é possível, bastando entrar no jogo algo chamado empatia. Dá para sair da sessão acreditando mais no ser humano.
As entrevistas que Baldwin concedeu, as imagens da violência policial e o paralelo com fatos presentes (demonstrando que pouco mudou), enfim todos os elementos compõe um todo impactante. Um filme obrigatório.
A presença magnética de Gal Gadot e o subtexto sobre o crescimento de uma mulher são os maiores trunfos desse filme que, no entanto, peca ao final por render-se à tradicional pirotecnia hollywoodiana. No atacado, um bom filme.
O filme tem seus melhores momentos quando se centra na gênese das canções e em alguns números musicais. Sua fraqueza está na abordagem da vida pessoal de Freddie. Tudo é muito clichê, esquemático como uma rotineira minisérie televisiva.
A tônica do filme é a ambiguidade do personagem principal Rubens (vivido com garra por Daniel de Oliveira). O dilema e o incômodo causado no espectador é encarnado por Ana (Malu Gali, estupenda) a diretora do clube em que Rubens trabalha. O maior mérito do filme é o de tirar o espectador da passividade e convidá-lo a tirar suas próprias conclusões. A questão do linchamento virtual é colocada de maneira incisiva.
A leitura da sinopse pode levar a conclusão de que se trata de mais um filme rotineiro a repisar o mesmo tema. Mas nem de longe é o caso desse suspense, cujo diferencial é a forma utilizada pelo diretor Aneesh Chaganty. A história e contada através das telas de computador, celulares e tv, além de câmeras de vigilância. O espectador imerge no mundo virtual junto com o pai da adolescente desaparecida, seguindo os rastros virtuais deixados por ela. Há a tradicional reviravolta e um final surpreendente. A trilha sonora em alguns momentos soa importuna e em outros cumpre bem a função de potencializar a tensão. Vale ressaltar que tudo o que rola nas telas está devidamente traduzido para o português, ficando a legenda para as falas dos personagens. Um trabalho fantástico. “Buscando” entretém e serve como um alerta para que os pais dêem atenção a seus filhos, além de fazer de certa maneira uma crítica a excessiva dependência em relação a tecnologia, que ao mesmo tempo em que agiliza a comunicação, nos tornou mais distantes uns dos outros. Quando se pensa que o filão está esgotado, eis que surge algo original. Que continuem buscando novas formas de revigorar o gênero.
O diretor Stanley R. Jaffe fez um filme que ao mesmo tempo em que acompanha a tenacidade de uma mãe em busca de seu filho desaparecido, lança farpas na exploração midiática do caso. Acompanhamos a inquebrantável persistência de Susan (Kate Nelligan, estupenda) frente a questionamentos e conselhos para desistir e se conformar com a perda. O filme oferece expectativa e emoção dentro de um ótimo roteiro e elenco.
O filme é recheado de cenas impactantes, como as da execução de políticos pelos chamados “sicários”, a tortura a um homem tendo um cão feroz atado às suas costas, as cenas de execução de agentes da lei ou as cenas de bombardeio aéreo em uma aldeia, para citar apenas algumas. Isso e mais o fato de ser predominantemente falado em inglês (com sotaque espanhol) tem obviamente por objetivo facilitar a penetração no mercado americano. O problema é que o diretor Fernando Leon de Aranoa se preocupou mais com o espetáculo do que com uma abordagem original que poderia advir de se fazer o filme sob o ponto de vista da amante de Pablo (vivida por Penélope Cruz). Sob o prisma interpretativo, enquanto Javier Bardem está quase sempre a vontade no papel, Penélope roça constantemente o exagero e a caricatura. As melhores figuras do elenco, Além e Bardem, são os atores que interpretam seus auxiliares e o agente vivido por Peter Sarsgaard. No quesito técnico, fotografia e montagem batem um bolão. Enfim, o filme até merece ser visto, embora eu creia que quem já assistiu “Narcos” e outros vários filmes sobre o personagem não vá encontrar grandes novidades aqui.
Parasita
4.5 3,6K Assista AgoraComo demonstrou em trabalhos anteriores, Bong Joon Ho é hábil ao transitar pelos diversos gêneros. Aqui não é diferente. Na primeira metade o filme explora comicamente as artimanhas da família Kim para conseguir se infiltrar como serviçais na residência da abastada família Park. Da segunda metade em diante, o registro vai se alterando até desaguar em um clímax de tirar o fôlego.
E, “Parasita”, Bong aborda o abismo entre as classes mostrando o contraste entre duas famílias, sublinhada magistralmente na cenografia e na fotografia. A família Park habita espaços amplos e luminosos enquanto os Kim se espremem em um cubículo abaixo do nível da rua. As diferenças se revelam mais profundas quando ocorre uma tempestade. Enquanto os Park contemplam a chuva no aconchego de sua confortável casa, os Kim perdem quase tudo tendo que ir para um abrigo. No dia seguinte estarão a postos como serviçais, obedientes, tendo que estar dispostos a fazer um extra a fim de satisfazer os caprichos dos patrões.
Uma descoberta provocará uma reviravolta na narrativa, ameaçando os planos dos Kim e instalando uma tensão que vai se exacerbando até o climax mencionado no primeiro parágrafo.
O filme nos leva à reflexão sobre quem são realmente os parasitas em nossa sociedade. Seria quem habita os subterrâneos da sociedade ou é quem explora o trabalho alheio oferecendo migalhas em troca? Joga na cara o espectador que, enquanto haver falta de empatia entre os que estão na parte de cima da pirâmide social e os que estão nos estratos mais inferiores o conflito será inevitável. Não se tem paz com desigualdade. Aqui Bong não põe na alça de mira apenas os abastados, fazendo questão de mostrar que a solidariedade pode faltar também entre os de uma mesma classe e que padecem de problemas semelhantes. Trocando em miúdos e citando o grande Paulinho da Viola: “quando o jeito é se virar, cada um trata de si, irmão desconhece irmão”.
Um senão que aponto nessa impactante obra é sua conclusão, que, em relação a tudo o que nos foi brindado até aquele momento, soa como um balde de água fria. No entanto de modo algum isso empana o brilho de mais essa importante página da história do cinema sul-coreano.
Bacurau
4.3 2,7K Assista AgoraEm "Bacurau" Kleber Mendonça Filho (em parceria com Juliano Dornelles) deixa de lado as tramas urbanas de seus filmes anteriores e volta suas lentes para o interior do Brasil, mais especificamente o sertão de Pernambuco. No entanto essa mudança na ambientação não significou o abandono de um tema recorrente que une os seus trabalhos em longas-metragens: o apagamento da memória do passado. Em "O Som ao Redor" era a especulação imobiliária eliminando os vestïgios do passado. Em "Aquarius" o tema volta a baila com o embate entre uma aposentada que não quer vender seu imóvel e representantes de uma imobiliária.
Temos em "Bacurau" o duelo entre a necessidade de preservação da memória e as forças de aniquilamento, representadas aqui pelos forasteiros. De forma alegórica, expressa uma afirmação de identidade cultural frente a uma força massificadora, representada pelos estrangeiros. Essa afirmação vem corporificada na escalação de determinados nomes do elenco. Não é por acaso a escalação de Sônia Braga (que durante muito tempo estrelou sucessos de bilheteria e crítica do cinema nacional) e da cirandeira Lia de Itamaracá (icone cultural do Nordeste).
Essa mensagem vem empacotada em um discurso político que é mais explicito. Aqui está presente o político safado que cospe um discurso fingido para manipular o povo, despejando na praça livros velhos e abastecendo o posto de saúde com remédios vencidos.
O filme combina elementos de faroeste, ficção científica, thriller político, comédia e "trash movie" com grande habilidade.
Embora pareça um tanto descosido e de alguns diálogos sussurrados dificultarem a compreensão do que se está falando, “Bacurau” se revela mais do que um exercício de gêneros. Trata-se ė uma alegoria sobre a resistêcia. Um filme com grande sentido de urgência.
Jojo Rabbit
4.2 1,6K Assista AgoraDeliciosa comédia satírica que discorre sobre aprendizado e amadurecimento, detonando poderosas farpas contra a lavagem cerebral e o ódio.
Vitalina Varela
3.8 24 Assista AgoraUm filme do incensado Pedro Costa? Oba, não posso perder! Repleto de críticas positivas, prêmios etc. Comprei o ingresso antes de ler mais sobre o filme. Posteriormente li que Pedro é o diretor de “Juventude em Marcha”, que vi em 2006 é achei um suplício de tão letárgico. Odiei o filme. “Ei-me novamente prestes a assistir a mais um soporífero espetáculo”, pensei. Já que comprei o ingresso, só me restou tomar um café forte para encarar os arrastados 124 minutos. A Sala 1 do Estação Net Botafogo estava lotada e Pedro estava presente à sessão e disse algumas palavras antes da projeção.
Então vamos ao filme. A primeira cena nos mostra um muro e acima dele várias cruzes. Na rua pessoas passam no que parece ser um cortejo. O que vem em seguida pode ser descrito como hipnotizante, tal a beleza da fotografia e dos enquadramentos. Cada plano é uma obra de arte pictórica. Os ambientes escuros predominam durante quase todo o tempo. Os personagens circulam como se fossem mortos em vida. São párias, pessoas à margem. As casas são como sepulcros.
Quando Vitalina, a personagem central entra em cena, vemos apenas seus pés descerem do avião. Ela é recebida no aeroporto com um “não há nada para você aqui. Volte para Portugal”. Mas ela persiste porque há algo que precisa fazer e é isso que move o filme. Trata-se de um dos filmes que mais densamente abordaram um processo de luto. Vitalina precisa passar por isso para se libertar e seguir com sua vida. Outro personagem marcante é o Padre (vivido magistralmente por Ventura). Pedro Costa extrai uma intensidade assombrosa do olhar dos dois. A fé de Vitalina contrasta com o desânimo do sacerdote. É cinema sem concessões. A claridade só aparece nos minutos finais e essa opção se mostra perfeitamente coerente.
E vista do exposto aqui, sinto que devo um pedido de desculpas a Pedro por ter prejulgado seu filme. Aliás, estou pensando seriamente em rever “Juventude em Marcha”. Talvez eu tenha assistido esse filme em um mal dia (rs).
Canção Sem Nome
3.4 7O pano de fundo é a convulsão política que agitava o Peru na década de 1980. Em meio a esse caos, dois personagens cruzam seus caminhos. Georgina e Pedro tem em comum o fato de (guardadas as devidas proporções) estarem à margem. Ela procura desesperadamente seu filho que lhe foi roubado ao nascer sem conseguir obter a ajuda que precisa para saber seu paradeiro. Ele, impossibilitado de assumir sua homossexualidade. A opção da diretora Melina León pelo preto e branco e por explorar a silhueta dos personagens de encontro a um cenário nevoento, contribui para compor uma atmosfera triste e sufocante. Soberba em cena, a atriz Pamela Mendoza, sintetiza com sua Georgina a dor e impotência dos desamparados.
Uma Mulher Alta
3.8 112É um filme sobre tentativas desesperadas de busca de sentido para a vida após a tragédia da guerra. A instabilidade emocional das duas personagens centrais, gera um vai e vem de sentimentos que vão da ternura à fúria em um duelo exasperante para o espectador. O ritmo lento poderá entendiar alguns espectadores. Direção de arte e fotografia excelentes e as duas intérpretes centrais fazem um trabalho magistral. “Uma Mulher Alta” nos mostra que a guerra acaba mais as marcas que ela deixa perduram.
Fé Demais Não Cheira Bem
3.4 87 Assista AgoraO título em português é infame mas se considerarmos que até Bergman foi vítima de títulos brazuca desastrosos ("Persona", virou "Quando duas mulheres Pecam", irghhhh) até que esse (vá lá) se torna até passável. Bem, quanto ao filme trata-se de uma comédia dramática que lança poderosas farpas contra o charlatanismo religioso, praga que até hoje infesta o meio religioso. Steve Martin concretiza aqui um de seus melhores desempenhos no cinema.
Nasce Uma Estrela
4.0 2,4K Assista AgoraUm tocante filme que fala sobre ascensão e decadência. Os números músicas em sua maioria são arrebatadores. Bradley Cooper e Lady Gaga demonstram grande química.
Vôo United 93
3.4 233 Assista AgoraO diretor Peter Greengrass montou um filme tenso com uma pegada documental.
Central do Brasil
4.1 1,8K Assista Agora"Central do Brasil" narra a trajetória de uma mulher rumo a redenção enquanto expõe um recorte das mazelas do Brasil e enaltece a solidariedade. Fernandona brilha soberba com a sua Dora, onde ainda tem Otávio Augusto e Marília Pera. Vinícius Oliveira foi uma grata revelação na pele do menino Josué. Na tela desfilam diante de Dora vários rostos que são o retrato de um Brasil dos desamparados, carentes mas que buscam na fé um refúgio. Um filme sem pudor de se assumir como melodrama sem com isso diluir a proposta. O final sugere um naco de esperança de felicidade. As sequências finais são de tirar lágrimas de pedra.
Coringa
4.4 4,1K Assista AgoraO filme é muito mais do que uma história de origem de um vilão famoso. Trata-se de um brutal e cortante estudo de uma personalidade, investigando os eventos que determinam a transformação de um sujeito desprezado e vítima de escárnio em um “vilão” insano e perigoso.
Aqui o vilão não é o Coringa. Há os “vilões” que empurram Arthur na direção da “vilania”. O caos social de Gothan City, o bullying e a indiferença são os vilões que espezinham Arthur. Das feridas que tudo isso cria, surge o Coringa (adaptando Gil).
Joaquin Phoenix entrega esse personagem complexo de forma visceral. Torcemos por suas pequenas vitórias e lamentamos as suas opções extremadas a ponto de gerar empatia.
Parte da polêmica gerada em torno da produção diz respeito a uma suposta exaltação à violência como resposta a uma sociedade desigual e opressora e pela promoção do protagonista a uma espécie de herói dos fracos e oprimidos. O filme apenas aponta o que pode ocorrer, não incorrendo em generalizações.
No aspecto visual, direção de arte e fotografia remetem à Scorcese. Do bem alinhavado roteiro à direção, tudo conflui para um acerto geral.
“Coringa” ultrapassa as fronteiras do filme de gênero para se tornar um drama denso, impactante e transgressor,
Dor e Glória
4.2 619 Assista Agora"Dor e Glória" é o "8 e Meio" de Almodovar. É o atentado de maturidade de um cineasta.
Rocketman
4.0 922 Assista AgoraMas que uma simples cinebiografia, o filme mostra a trajetória de um homem rumo a um acerto de contas consigo mesmo e com os que estão a sua volta. O caminho da insegurança à autoaceitação, passando pelo torvelinho dos excessos é mostrado em um roteiro afiado e um visual impactante, sem perder de vista a emoção.
A Música da Minha Vida
3.6 106 Assista AgoraUm filme irresistível, que discorre sobre crescimento e exalta o poder transformador da música.
Yesterday: A Trilha do Sucesso
3.4 1,0KEssa adorável comédia, através de divertidas tiradas, desfecha farpas à cultura pop e exalta a importância de se perpetuar a boa música. A dupla principal esbanja carisma.
Green Book: O Guia
4.1 1,5K Assista AgoraSob esse filme têm pesado algumas críticas negativas, vindas principalmente dos familiares do pianista Don Shirley, que alegam que o filme apresenta “enorme desvios” em relação a realidade. Ainda que tenha tomado mesmo imensa liberdade em relação aos fatos reais, “Green Book” é um filme extremamente sedutor. Repleto de humor, o narra um processo de aprendizado mútuo e nos faz acreditar que a convivência entre pessoas diferentes é possível, bastando entrar no jogo algo chamado empatia. Dá para sair da sessão acreditando mais no ser humano.
Eu Não Sou Seu Negro
4.5 135 Assista AgoraAs entrevistas que Baldwin concedeu, as imagens da violência policial e o paralelo com fatos presentes (demonstrando que pouco mudou), enfim todos os elementos compõe um todo impactante. Um filme obrigatório.
Mulher-Maravilha
4.1 2,9K Assista AgoraA presença magnética de Gal Gadot e o subtexto sobre o crescimento de uma mulher são os maiores trunfos desse filme que, no entanto, peca ao final por render-se à tradicional pirotecnia hollywoodiana. No atacado, um bom filme.
Jumanji: Bem-Vindo à Selva
3.4 1,2K Assista AgoraBom entretenimento. Personagens carismáticos.
Bohemian Rhapsody
4.1 2,2K Assista AgoraO filme tem seus melhores momentos quando se centra na gênese das canções e em alguns números musicais. Sua fraqueza está na abordagem da vida pessoal de Freddie. Tudo é muito clichê, esquemático como uma rotineira minisérie televisiva.
Aos Teus Olhos
3.4 288 Assista AgoraA tônica do filme é a ambiguidade do personagem principal Rubens (vivido com garra por Daniel de Oliveira). O dilema e o incômodo causado no espectador é encarnado por Ana (Malu Gali, estupenda) a diretora do clube em que Rubens trabalha. O maior mérito do filme é o de tirar o espectador da passividade e convidá-lo a tirar suas próprias conclusões. A questão do linchamento virtual é colocada de maneira incisiva.
Buscando...
4.0 1,3K Assista AgoraA leitura da sinopse pode levar a conclusão de que se trata de mais um filme rotineiro a repisar o mesmo tema. Mas nem de longe é o caso desse suspense, cujo diferencial é a forma utilizada pelo diretor Aneesh Chaganty. A história e contada através das telas de computador, celulares e tv, além de câmeras de vigilância. O espectador imerge no mundo virtual junto com o pai da adolescente desaparecida, seguindo os rastros virtuais deixados por ela. Há a tradicional reviravolta e um final surpreendente. A trilha sonora em alguns momentos soa importuna e em outros cumpre bem a função de potencializar a tensão. Vale ressaltar que tudo o que rola nas telas está devidamente traduzido para o português, ficando a legenda para as falas dos personagens. Um trabalho fantástico. “Buscando” entretém e serve como um alerta para que os pais dêem atenção a seus filhos, além de fazer de certa maneira uma crítica a excessiva dependência em relação a tecnologia, que ao mesmo tempo em que agiliza a comunicação, nos tornou mais distantes uns dos outros. Quando se pensa que o filão está esgotado, eis que surge algo original. Que continuem buscando novas formas de revigorar o gênero.
Sequestro sem Pista
3.7 13O diretor Stanley R. Jaffe fez um filme que ao mesmo tempo em que acompanha a tenacidade de uma mãe em busca de seu filho desaparecido, lança farpas na exploração midiática do caso. Acompanhamos a inquebrantável persistência de Susan (Kate Nelligan, estupenda) frente a questionamentos e conselhos para desistir e se conformar com a perda. O filme oferece expectativa e emoção dentro de um ótimo roteiro e elenco.
Escobar: A Traição
3.2 104 Assista AgoraO filme é recheado de cenas impactantes, como as da execução de políticos pelos chamados “sicários”, a tortura a um homem tendo um cão feroz atado às suas costas, as cenas de execução de agentes da lei ou as cenas de bombardeio aéreo em uma aldeia, para citar apenas algumas. Isso e mais o fato de ser predominantemente falado em inglês (com sotaque espanhol) tem obviamente por objetivo facilitar a penetração no mercado americano. O problema é que o diretor Fernando Leon de Aranoa se preocupou mais com o espetáculo do que com uma abordagem original que poderia advir de se fazer o filme sob o ponto de vista da amante de Pablo (vivida por Penélope Cruz). Sob o prisma interpretativo, enquanto Javier Bardem está quase sempre a vontade no papel, Penélope roça constantemente o exagero e a caricatura. As melhores figuras do elenco, Além e Bardem, são os atores que interpretam seus auxiliares e o agente vivido por Peter Sarsgaard. No quesito técnico, fotografia e montagem batem um bolão. Enfim, o filme até merece ser visto, embora eu creia que quem já assistiu “Narcos” e outros vários filmes sobre o personagem não vá encontrar grandes novidades aqui.