Adaptação do livro A Cabana de Michael P. Young (o qual não li). A Cabana utiliza um farto arsenal técnico para explorar todos os recursos e estratégias de composição das imagens: do intenso uso das cores aprofundada pela CGI aos movimentos de câmera, elipses temporais dentro de flashbacks que se fundem para apresentar realidades distintas numa narrativa que exalta o transe pessoal de um pai que sofre a perda da filha que fora assassinada. A representação religiosa tem como parâmetro a crença católica e seus dispositivos.Embora possa parecer tendencioso sob o aspecto da afirmação/legitimação de um determinado meio de fé e o uso de sua simbologia, o filme emociona mais pela trajetória de autoconhecimento do personagem principal que pelo partidarismo espiritual específico. Comovente, mas não apelativo, somos carregados pela tristeza profunda que acompanha o personagem de Mackenzie (Sam Worthinton) em sua trajetória na busca de respostas e de algum conforto. A Cabana, em toda a sua didática (as vezes excessiva), passa ao público ensinamentos de esperança e se apropria do martírio pessoal de Mack para mostrar que por pior que seja a dor há algo maior que nos protege e que se manifesta através de nossa capacidade de perdoar.
Uma mistura de Alien de Ridley Scott com O Enigma do Outro Mundo de John Carpenter. A sensação de 'deja vu' é inevitável. Vida traz uma coleção de nomes famosos e bons efeitos visuais, mas isso apenas não basta para que o filme decole. Diferente dos seus antecessores clássicos, este suspense/terror/ficção dirigida pelo Daniel Espinosa (Crimes Ocultos, Protegendo o Inimigo) pagou o preço da não originalidade temática e pela desaceleração da história em sua primeira metade, tornando-o em grande parte lento, previsível e genérico com o clichês habituais (inclua-se aí a moral embutida com um humor negro repetitivo e ingênuo). Nada de novo ou arrebatador por aqui.
Howard Hawks foi um dos poucos cineastas capazes de transitar na direção de praticamente todos os gêneros cinematográficos. Em Jejum de Amor ele empreende ao roteiro um timing perfeito para diálogos ácidos do seus personagens neste 'screwball', um subgênero da comédia que prosperou na década de 30. Além de dar a Rosalind Russel um dos papeis de sua vida como uma jornalista de personalidade marcante que nao se curva nos embates com as figuras masculinas, Hawks expõe uma nova perspectiva ao papel feminino no cinema clássico hollywoodiano, tradicionalmente mais atrelado ao apelo do glamour visual consumido pelas massas do que pelas atitudes emancipatórias do gênero. Deliciosamente moderno e com suaves toques de transgressão, Jejum de Amor é uma obra que, sob o manto do humor, expõe anseios atemporais.
Um dos grandes clássicos do 'gore', subgênero do terror que efervesceu nos anos oitenta. Enquanto as atuações geralmente beiram o ridículo da afetação, a concepção da arte do filme abraça o pensamento pop-pós punk, de um período histórico marcado por revoluções em múltiplas esferas da sociedade mundial em seu tempo. O medo de um cataclismo, resultado de uma guerra nuclear entre as potências, disseminou uma angústia latente a todos que acompanhavam a corrida armamentista. Este pânico velado no campo cinematográfico foi apropriado por produções que atingiam o subconsciente do espectador nos mais altos patamares do pavor com a construção do escatológico. Nunca antes foram produzidos tantos filmes com monstros, seres sobrenaturais, mortos-vivos e uma gama de aberrações ficcionais, muitas delas inspiradas pelo medo da morte, seus demônios, os efeitos da radiação e a expansão do HIV, pondo em risco a existência da própria raça humana. Em Hellraiser, Clive Barker recrutou elementos diversos dessa galeria de desastres acrescentando, com mais ênfase, a tensão sexual entre os personagens que vai marcando a totalidade das cenas. A Aids, ainda enigmática e avassaladora em 1987 (ano de produção do filme), toma forma no corpo do ser 'renascido do inferno' que mata para sobreviver pelo sangue. E sangue é o que não falta em Hellraiser. Os anjos-demônios 'cenobitas' são os responsáveis por cobrar a alma daqueles que cedem a tentação de viver a liberdade de seus desejos. Através da satisfação sexual de uma pratica masoquista de suspensão por ganchos, Barker dilui os sentidos do prazer corporal e a da fragmentação do espírito que ocorrem simultaneamente. A eterna dicotomia entre o céu e a terra sem que a escolha por um lado signifique que exista a melhor opção. Hellraiser expõe o homem em total desamparo e isolamento numa fórmula alegórica e já classicamente desenhada por cineastas como Pasolini, Antonioni e Kubrick.
Aqui está um exemplo de um filme feito para premiações de cunho mais comercial como o Oscar. Elenco reconhecido, temática comovente baseada em fatos reais e envolvendo crianças, narrativa clássica e objetiva. A produção é extremamente bem cuidada, com uma fotografia que explora os planos abertos (fundamental para intensificar a pequinês do 'Saroo', ainda criança, perdido em um mundo agigantado) e os tons de laranja e sépia que predominam durante todo o filme, numa chamada às lembranças e a melancolia que se mesclam nas memórias do indiano. Lion é sim um bom filme, contudo a simplicidade com que o roteiro resolve os conflitos psicológicos dos personagens e como algumas cenas são solucionadas torna-o, por diversas vezes, moldado por situações improváveis e desfechos assepticamente elaborados. A ausência de ousadia acaba não o singularizando. Lion vai para os arquivos como mais uma história com poder para ser legitimamente 'real' (afinal é baseada em acontecimentos verídicos) e intensa, mas que se contenta em agradar dentro da cartilha previsível do cinema entretenimento.
O filme amadurece juntamente com os protagonistas. Neste quarto momento da epopéia, o Lord Voldemort vai estar mais presente do que nunca e o confronto será inevitável. O nível de entretenimento se mantem em alta qualidade.
A vida de Marilyn Monroe é remontada a partir de pensamentos e notas escritas por ela em diários e blocos que foram reveladas em meados dos anos 2000. Essas anotações renderam um livro chamado Fragmentos que inclusive teve tradução para o português em uma edição similar a que foi lançada nos Estados Unidos. Trechos dos livros são lidos e interpretados por atores e atrizes reconhecidos de Hollywood como Viola Davis, F. Murray Abrahams, Ben Gazarra, Marisa Tomei, Elizabeth Banks entre vários outros. A cada performance da leitura, fotografias e imagens de arquivos (entrevistas dadas por ela e por pessoas de seu círculo íntimo) vão endossando as palavras de Marilyn que, contrariando o pensamento da grande maioria, era uma das mais inteligentes e talentosas atrizes de sua geração. Seu carisma contudo não foi suficiente para que sucumbisse aos transtornos relacionados às suas carências afetivas. Love, Marilyn se distancia da polêmica sobre as circunstancias de sua morte e apenas reconta sua trajetória tendo como suporte seu próprio testemunho.
A unidade do tempo e sua multidimensionalidade provocando o espectador em relação ao significado da finitude da vida. Unindo a ficção com o drama existencial, A Chegada consegue surpreender para algo que vai muito além de uma fábula de invasão extraterrestre, mote tão comum na Hollywood dos ‘blockbusters’. O filme dirigido por Denis Villeneuve apela pouco para o que se convencionou chamar de cinema comercial cujos signos deste tipo de realização são muito mais palatáveis para o grande público. A Chegada embora apresente algumas cenas de ação e efeitos visuais, tais recursos servem fundamentalmente para ilustrar a narrativa cujo cerne passa distante de invasões alienígenas, explosões reiteradas ou a destruição em massa de cidades. Trata-se de uma proposta de edificação e não de extermínio. Quem espera uma obra de ficção recheada de sequencias eletrizantes movidas a base do ‘CGI’ vai se desapontar profundamente. A produção é delineada por um aspecto de melancolia nostálgica em que perdas e esperanças se somam para compor um destino que se move a força das ações humanas. A construção técnica do filme é de primeira linha, com todos os elementos cooperando para o desenvolvimento do discurso fílmico. Amy Adams presenteia o público com uma interpretação contida e sem apelos baseando-se na delicadeza de sua movimentação e expressões faciais. A fotografia por sua vez executa planos fechados nos rostos dos protagonistas, intensificando a tensão e aprofundando os diálogos e as narrações em ‘voice over’. A paleta de cores frias, escolhida pela direção de arte, climatiza o ambiente com tons variados de verde, azul e muitas sombras. A trilha sonora no estilo new age envolve o espectador no ar etéreo, quase divino, que guia o roteiro. Escrito de forma não linear com uso não do ‘flashback’, mas do ‘ flashforward’ ou seja a imagem do futuro. A Chegada torna complexo o papel do ser humano como uma ‘arma’ ou agente de mudanças e o põe no centro de importância universal. Petulante, sem dúvida, porém primorosamente poético.
Ninguém fica incólume às tragédias.Quando estas ocorrem no âmbito do seio familiar as consequências podem ser devastadoras sob vários aspectos. Manchester a Beira Mar dialoga basicamente com isso: a dificuldade de se ajustar a uma nova realidade imposta por uma mutilação da alma e o flagelo das consciencias. Uma produção limpa com uma montagem bem realizada em dois tempos da narrativa se entrecortam através do flashback. Nada surpreendente em termos de estilística narrativa, mas uma visão sensível e objetiva sobre a imprevisibilidade do destino e suas consequencias.
Xuxa no papel de uma jornalista com comportameento retardado, roteiro feito em um dia, uma tiazinha que surge do nada só para tirar a roupa sem mais nem menos. Muita apelação para o consumo popular descerebrado. Não recomendo para adulto, muito menos para crianças.
A série tem uma nítida elevação na qualidade do desenvolvimento dos efeitos especiais neste terceiro filme da epopeia. Sob o aspecto da construção narrativa, o bruxo mirim, já trilhando a adolescência, tem aventuras que se desvencilham para questões mais densas como escolhas entre a vida e a morte e o despertar de relações afetivas. As cenas de ação também se intensificam dando ao filme uma agilidade maior do que os anteriores. Que venha a próxima sequência !
Apostando numa retomada do filme musical em tempos em que a vibe pacífica de temáticas leves dos bons roteiros estão escasseorando, La La Land promove uma festa de cores, sons e emoções partindo das cores das estações (azul, amarelo, verde e vermelho). Assim como O Artista, O Rosa Púrpura do Cairo, Barton Fink e outros filmes que homenageiam a arte de se fazer filmes, La La Land é Hollywood falando sobre Hollywood, seus aspirantes, fantasias e, também, frustrações. Um tour na cultura do cinema, enraizada na cidade de Los Angeles, leva o espectador a um passeio nostálgico não apenas a pontos turísticos da cidade relacionado a cenas de produções famosas, mas também as estratégias e fórmulas 'cliche' de desenvolvimento do romanticismo clássico dos musicais de estúdios realizados pela Warner e MGM em sua época de ouro. A aposta neste gênero, no momento em que o real se mostra mais relevante do que o escapismo aparente de um filme de puro entretenimento, deu certo e a fórmula mistura a memória saudosista no technicolor de tons saturados das décadas de 40, 50 com a cultura pós anos setenta se fundindo num universo contemporâneo imaginário que beira o surreal. Trabalhando com elementos de diversas épocas o roteiro torna indefinível datar um período certo em que o filme se passa uma vez que a cultura de um século ( bem expressa no figurino, no cenários e nãs canções), parece ter sido condensada em detalhes num cenário atemporal. Os planos sequencia implementados cortam o aspecto distanciado da produção e imprime um sentido intimista com a câmera ainda efetuando movimentos de proximidade com o casal central da trama. Mesclar o antigo com o novo é a melhor forma de preservar o interesse pelo passado, diz um dos personagens. Neste choque artificial entre fases diferentes da produção cultural o resultado foi instigante com cenas hilárias e, até mesmo, impensáveis. O centro da ação é o amor que surge entre uma jovem atriz sempre em busca de reconhecimento e de um pianista que quer ter seu próprio bar de Jazz. Ambos lutam pelo seu lugar ao sol na concorrida Tinseltown. Emma Stone e Ryan Gosling são os protagonistas e com boas interpretações e muito esforço nas coreografias de dança, cativam o espectador. Ótimo show de imagens.
A primeira versão adaptada do livro 'Rains' de Somerset Maugham é a melhor. Filmada ainda em 1928, a produção muda é a que mais se mostra fiel a obra literária. O código de moral instituído pelos estúdios decorrente da pressão de organizações religiosas, só estaria a pleno vigor na década de 30, sendo permitidas cenas com conotação sexual mais explícitas e menos glamurizadas do que nas produções de 1932 e 1953. O preto e branco ainda imprime um realismo à fotografia que aliada com a direção de arte expõe as almas em decadência numa ilha do oceano Pacífico e ocupada por um destacamento militar norte-americano.
Filme muito bem produzido e que tem como o escopo principal difundir o pensamento evangélico através de uma cartilha de fé e oração. Embora os temas abordados possam englobar os nichos da vida humana em diversos estratos da sociedade, os conflitos aqui representados refletem de forma mais notória a realidade da classe média negra norte-americana. O roteiro trabalha dentro de uma linearidade e clareza que facilitam o entendimento universal da mensagem em função de reafirmar valores cristãos.
A continuação da trajetória de Harry Potter continua com o bruxo e sua turma apresentando traços mais maduros, mas sem perder o carisma. Todos os ítens da produção mantém-se no mesmo patamar de alta qualidade que o anterior. Que venha a próximo !
O primeiro filme da longa trajetória de Harry Potter no cinema. Ícone para uma geração de crianças e adolescentes que foram enfeitiçadas pela fábula do bruxo mirim surgido da imaginação da escritora escocesa J.K. Rowling. A produção respalda a fantasia do mundo fictício de Hogwarts nos potentes efeitos visuais, na direção de arte exuberante, no carisma dos personagens, no elenco sempre comprometido com boas atuações e na trilha sonora marcante. Novo clássico.
Saddie Thompson apresenta um papel feminino típico de destaque para as estrelas do cinema norte americano. O remake tinha sido interpretado pela primeira vez por Gloria Swanson em 1928 e por Joan Crawford em 1932. Rita Hayworth (a eterna Gilda do filme com o mesmo nome) foi a escolha perfeita para o papel nesta terceira versão que difere das outras por adicionar um tom musical. Miss Sadie Thompson e considerada por críticos e estudiosos com uma das películas que melhor representam o cinema 3D estereoscópico no apogeu do uso deste elemento conhecido como a Era de Ouro do cinema em três dimensões, período que se extende de 1952 até 1954, que faz parte do período de convergência que tem alcance até o ano de 1986. Rita era a ‘pin up’ preferida dos soldados na segunda guerra mundial (no filme Um Sonho de Liberdade de 1994, o personagem de Morgan Freeman fala sobre o poder de Rita Hayworth exercido sobre os contingentes militares) e neste papel aparenta estar bem a vontade cercada pelos marines. Aparentando já os traços fisionômicos da meia idade a época, Hayworth adiciona maturidade ao papel e funciona muito bem. Sadie oferece a Rita Hayworth a oportunidade de fazer uma interpretação tridimensional não apenas pela imagem, mas também pelos diferentes ângulos que acompanham a substancia dramática da personagem título. O roteiro suaviza os traços mais duros de Saddie ao confrontar a malícia inerente a sua vida mundana com a cena lúdica na qual canta com crianças em seu quarto. Esta versão de 1953, embora sofresse restrições quanto as cenas mais explosivas de conotação sexual, devido o código de moral cinematográfico instituído no início da década de 30 nos Estados Unidos, ainda sim apresenta uma cena de estupro que, embora se dê fora da objetiva da câmera, a sugestão do atentado é clara. Para época foi, de uma certa forma, a quebra de um preceito, tornando-se um grande avanço dentro da liberdade criativa após tantos anos de supervisão de censura. O filme rodado em Technicolor, processo em que as cores tendem a uma maior saturação, definem o perfil da personagem sob tons quentes como o vermelho e o laranja. O cenário multicolorido do céu, das águas do mar, da vegetação, da vestimenta dos nativos clamam a uma exuberância sensual fazendo elo com a beleza provocativa e voluptuosa de Sadie. Diferente das versões anteriores, todas em preto e branco, a cor intensifica a clareza, redefinindo o papel para menos mundano dos que os protagonizados pelas antecessoras. Sob a perspectiva da direção de arte as cores em Sadie Thompson tem papel fundamental. Na cena em que Sadie vê-se compelida a aceitar uma ‘mudança’ de vida, as cores chamativas, tão atraentes na maior parte do filme, caem por terra substituídas por cores frias como o branco e o verde, revelando um arrefecimento do espírito voraz e cintilante da protagonista.Trançando conceitos de uma geração anos 50 pós-guerra em que a importância da mulher foi ratificada com os homens em campos de batalha, sua voz começa a ter vez e Sadie Thompson no início da segunda metade do século XX colabora, mesmo que timidamente, com essa nova mentalidade.
O filme de Goddard se vale de uma montagem poderosa e esse controle acaba inflingindo uma dose ficcional de considerável proporção. A participação de atores profissionais e preocupação com a misce-en-scene quase que subjulgam o trabalho documental a uma ficção por excelência, caso todo o aparato não fosse apenas voltado para tornar visível um estado do real. Segundo teóricos, o documentário seria a representação do real, exposto a constrangimentos e imerso nas regras do jogo social. Como o real não é de todo filmável, o que um filme alcança – ele documentário ou ficção – é a representação. Nesse sentido, o documentário só poderia ser construído em fricção com o mundo. Neste âmbito Goddard nos implica a uma força romanticista em um chamado de forças criativas que energiza a memória, dá clareza aos sonhos e substancia as imagens. Neste discurso para dar poder ao real, Goddard explica em uma cena que ‘os judeus são matéria para ficções e os palestinos para documentários.’ Outra dimensão desse realismo é seu aspecto fragmentário, a construção não-linear é uma das marcas de Nossa Música. Algumas cenas do filme não formam um todo coerente, por meio das quais seria possível identificar o encadeamento da “história”. Numa seqüência, somos apresentados a uma biblioteca com aspecto de um prédio em ruínas, onde os livros são amontoados no chão. O lugar é cheio de simbolismo. A biblioteca guarda o lugar da cultura, e o fato de ela estar destruída pode ser visto como o emblema do que uma guerra pode produzir. Outro fato do que nos afasta da ficção e nos aproxima de um texto do real é a reunião de personagens e de discursos beira do surreal, quando um grupo de indígenas norte-americanos aparece para falar sobre as injustiças de sua história. Mais do que a importância de todos esses eventos para o encadeamento totalizante da história, o que é relevante é como o filme constrói uma reflexão, servindo-se de discursos vários sobre a realidade. Segundo Camolli ‘como espectador nunca esqueço que estou separado da cena, também nunca deixo de querer abolir este corte por um transporte fusional que me transportaria na tela para me colocar apesar de tudo no centro da cena. Não estar ali para ali estar. Não acreditar para acreditar ainda um pouco. Esta coisa e seu contrario. Este estado e sua negação. Este lugar e sua ausência.”
Ao que pese o sentido da modalidade documento verdade que impera na costura de Crônica de Um Verão, Jean Rouch e Edgar Morin foram prolíficos em utilizar dentro desse debate comportamental entre pessoas advindas basicamente da classe trabalhadora parisiense, sujeições técnicas clássicas típicas de produções ficcionais com a interferência do autor guiando-o, muitas vezes, ao resultado esperado. Pode-se salientar neste sentido a câmera e a iluminação controlada na maioria das entrevistas, a auto encenação por parte dos próprios personagens que acabavam encenando a si mesmos, a edição que visivelmente promovia cortes no andamento das entrevistas. Uma das mais sutis manipulações em favor de previlegiar o pensamento de Rouch e Morin seria o registro do que seria um ‘papo’ intimo, muito nitidamente encenado, de uma discussão se o filme alcançou os seus objetivos. Aqui é mostrado os realizadores surpresos, a respeito do resultado de seus trabalhos que acabaram por desocortinar comportamentos que pareciam ser impensáveis. Há, portanto, uma interferência explícita dos diretores que, atuando na cena da mesa, perguntam a Landry se ele sabe o que significam aqueles números tatuados no braço daquela. Ele diz não saber e a palavra é passada a Marceline que lhe explica que aqueles números eram gravados nos corpos dos judeus aprisionados, durante a Segunda Guerra Mundial, nos campos de concentração. Ao final dessa cena, que termina com uma imagem de Marceline segurando uma rosa branca, é inserido um dos planos em que ela caminha pelas ruas de Paris. Em seguida vem a cena em que Marceline anda pelas ruas de Paris, tendo a câmera á sua frente que a segue num plano aberto enquanto esta vai divagando sobre a internação de seu pai e sua experiência num campo nazista, numa clara montagem de roteiro e encenação apropriada para dar profundidade ao momento, extraindo, todavia, muito da sua ênfase de documento real da imagem. Desta forma, em Crônica de Um Verão, temos seu desenvolvimento a partir de duas instâncias: uma destinada às pessoas, sobre seu tempo e a outra, destinada ao próprio cinema.
E de repente tudo acontece ! A Maldição da Floresta é asssim, Quando achamos que o espectador ainda está sendo preparado para as grandes revelações, as cartas são postas na mesa de imediato. A tensão que se amplifica na relação formada pela intimidade entre os personagens com o espectador é tardiamente executada dentro do roteiro e isso dificulta uma empatia entre esses pólos. O filme torna-se, por conta disso, distanciado e menos empolgante, mesmo que tecnicamente bem fotografado e com efeitos visuais criativos (que nos remetem às produções de terror da década de oitenta). Falta 'sangue' aqui.
O que se vê nem sempre corresponde a realidade. Como perceber o limite entre a fantasia e o mundo concreto?. Embora existam filmes que narrem, sob infindáveis nuances e gêneros, as formas e consequências de como os transtornos mentais afetam a vida das pessoas, O Abrigo volta a por no centro do debate a esquizofrenia como agente de desequilíbrio de convivência social. O roteiro vai trafegando de acordo com a inquietação do personagem principal. Este leva o espectador a compartilhar seus pensamentos angustiantes, por vezes mórbidos, e sempre acompanhados com uma fotografia sofisticada e de cores predominantemente frias. Evoluindo sob escaladas entre o suspense clássico e o drama familiar O Abrigo está longe de ser um exemplo do melhor, mas a qualidade de sua produção e a proposta simples com qual se compromete o tornam representante de bom entretenimento e, até mesmo, de alguma reflexão.
Tarzan aqui tem sua origem recontada por flashbacks. A trama usa a história passada do Lord de Greystoke de forma subsidiária. O roteiro narra o momento em que o protagonista já encontra-se morando em Londres, com Jane, há cerca de dez anos. Após abandonar a selva e assumir o título de nobreza e os bens deixados de herança pelos seus pais, o homem-macaco retorna ao Congo como emissário do rei a convite do governador do Congo, um britânico a serviço do rei. O sentido do enredo principal parece extrapolar a fantasia da série hollywoodiana clássica do Tarzan guerreiro de John Weissmuller ou do longa com sentido idílico da década de oitenta tendo no papel principal Christopher Lambert. Alexandre Skarsgard interpreta o homem das selvas com um refinamento que provoca desconfiança a quem não espera ver Tarzan 'civilizado' e com consciência política do colonialismo escravocrata praticado em sua terra natal. O tom impetrado pelo roteiro tenta apaziguar essas duas vertentes, a fantasia e ação juntamente com a diretriz política e de denúncia da exploração. Essa tentativa de conciliar duas perspectivas enfraquece a densidade dramática que parece ser exagerada no primeiro intento e débil no segundo.Talvez se Tarzan 2016 tentasse ser menos 'engajado' e assumisse seu motivo unicamente comercial, seria uma aventura muito melhor e mais coerente.
O primeiro filme do ogro mais simpático do cinema que vem cativando crianças e adultos há quase duas gerações.Shrek une o carisma e a espontaneidade dos personagens dos tradicionais contos de fada a uma mensagem positiva de valorização das relações humanas. O filme da DreamWorks desconstrói o estereótipo da estética clássica da beleza física o qual se tem, frequentemente, justificado na poética que legitima o status de superioridade vinculando o mais belo ao 'melhor'. Shrek rompe com essa ditadura da aparência idealizada das animações tradicionais e prova que, embora existam diferenças de costumes, o caráter é a ordem que importa. A trilha sonora é bem legalzinha composta por uma coletânea de músicas pop da época. Icônico.
Abbas Kiarostami tinha uma facilidade absurda de nos presentear com o desconforto em suas obras. Um cineasta de grande extensão de discursos que provoca o espectador a definir leituras. Um sentimento de deslocamento diante de um plano de intenções polarizadas cujo maior objetivo é, inteligentemente, confundir. Em Cópia Fiel ele põe o espectador em um jogo cruzado de verdades dissimuladas e mentiras críveis que se consagram na ambiguidade. Neste jogo de desconfiança entre o real e o falso, discernir o absoluto é impossível. Qual o limite entre o fato e a idealização ?. Cópia Fiel tem ares de filme existencialista europeu focado em análise de relações, mas na verdade a grande sacada de Kiarostami e mostrar ao espectador, no âmbito da intimidade, que os valores afetivos podem validar o que, aparentemente, é apenas uma reprodução técnica da vida em si. Destaque, também, para Juliette Binoche que consegue oscilar os diversos níveis de dificuldade de sua interpretação com toda a suavidade que lhe é peculiar.
A Cabana
3.6 828 Assista AgoraAdaptação do livro A Cabana de Michael P. Young (o qual não li). A Cabana utiliza um farto arsenal técnico para explorar todos os recursos e estratégias de composição das imagens: do intenso uso das cores aprofundada pela CGI aos movimentos de câmera, elipses temporais dentro de flashbacks que se fundem para apresentar realidades distintas numa narrativa que exalta o transe pessoal de um pai que sofre a perda da filha que fora assassinada. A representação religiosa tem como parâmetro a crença católica e seus dispositivos.Embora possa parecer tendencioso sob o aspecto da afirmação/legitimação de um determinado meio de fé e o uso de sua simbologia, o filme emociona mais pela trajetória de autoconhecimento do personagem principal que pelo partidarismo espiritual específico. Comovente, mas não apelativo, somos carregados pela tristeza profunda que acompanha o personagem de Mackenzie (Sam Worthinton) em sua trajetória na busca de respostas e de algum conforto. A Cabana, em toda a sua didática (as vezes excessiva), passa ao público ensinamentos de esperança e se apropria do martírio pessoal de Mack para mostrar que por pior que seja a dor há algo maior que nos protege e que se manifesta através de nossa capacidade de perdoar.
Vida
3.4 1,2K Assista AgoraUma mistura de Alien de Ridley Scott com O Enigma do Outro Mundo de John Carpenter. A sensação de 'deja vu' é inevitável. Vida traz uma coleção de nomes famosos e bons efeitos visuais, mas isso apenas não basta para que o filme decole. Diferente dos seus antecessores clássicos, este suspense/terror/ficção dirigida pelo Daniel Espinosa (Crimes Ocultos, Protegendo o Inimigo) pagou o preço da não originalidade temática e pela desaceleração da história em sua primeira metade, tornando-o em grande parte lento, previsível e genérico com o clichês habituais (inclua-se aí a moral embutida com um humor negro repetitivo e ingênuo). Nada de novo ou arrebatador por aqui.
Jejum de Amor
3.9 90 Assista AgoraHoward Hawks foi um dos poucos cineastas capazes de transitar na direção de praticamente todos os gêneros cinematográficos. Em Jejum de Amor ele empreende ao roteiro um timing perfeito para diálogos ácidos do seus personagens neste 'screwball', um subgênero da comédia que prosperou na década de 30. Além de dar a Rosalind Russel um dos papeis de sua vida como uma jornalista de personalidade marcante que nao se curva nos embates com as figuras masculinas, Hawks expõe uma nova perspectiva ao papel feminino no cinema clássico hollywoodiano, tradicionalmente mais atrelado ao apelo do glamour visual consumido pelas massas do que pelas atitudes emancipatórias do gênero. Deliciosamente moderno e com suaves toques de transgressão, Jejum de Amor é uma obra que, sob o manto do humor, expõe anseios atemporais.
Hellraiser: Renascido do Inferno
3.5 858 Assista AgoraUm dos grandes clássicos do 'gore', subgênero do terror que efervesceu nos anos oitenta. Enquanto as atuações geralmente beiram o ridículo da afetação, a concepção da arte do filme abraça o pensamento pop-pós punk, de um período histórico marcado por revoluções em múltiplas esferas da sociedade mundial em seu tempo. O medo de um cataclismo, resultado de uma guerra nuclear entre as potências, disseminou uma angústia latente a todos que acompanhavam a corrida armamentista. Este pânico velado no campo cinematográfico foi apropriado por produções que atingiam o subconsciente do espectador nos mais altos patamares do pavor com a construção do escatológico. Nunca antes foram produzidos tantos filmes com monstros, seres sobrenaturais, mortos-vivos e uma gama de aberrações ficcionais, muitas delas inspiradas pelo medo da morte, seus demônios, os efeitos da radiação e a expansão do HIV, pondo em risco a existência da própria raça humana. Em Hellraiser, Clive Barker recrutou elementos diversos dessa galeria de desastres acrescentando, com mais ênfase, a tensão sexual entre os personagens que vai marcando a totalidade das cenas. A Aids, ainda enigmática e avassaladora em 1987 (ano de produção do filme), toma forma no corpo do ser 'renascido do inferno' que mata para sobreviver pelo sangue. E sangue é o que não falta em Hellraiser. Os anjos-demônios 'cenobitas' são os responsáveis por cobrar a alma daqueles que cedem a tentação de viver a liberdade de seus desejos. Através da satisfação sexual de uma pratica masoquista de suspensão por ganchos, Barker dilui os sentidos do prazer corporal e a da fragmentação do espírito que ocorrem simultaneamente. A eterna dicotomia entre o céu e a terra sem que a escolha por um lado signifique que exista a melhor opção. Hellraiser expõe o homem em total desamparo e isolamento numa fórmula alegórica e já classicamente desenhada por cineastas como Pasolini, Antonioni e Kubrick.
Lion: Uma Jornada para Casa
4.3 1,9K Assista AgoraAqui está um exemplo de um filme feito para premiações de cunho mais comercial como o Oscar. Elenco reconhecido, temática comovente baseada em fatos reais e envolvendo crianças, narrativa clássica e objetiva. A produção é extremamente bem cuidada, com uma fotografia que explora os planos abertos (fundamental para intensificar a pequinês do 'Saroo', ainda criança, perdido em um mundo agigantado) e os tons de laranja e sépia que predominam durante todo o filme, numa chamada às lembranças e a melancolia que se mesclam nas memórias do indiano. Lion é sim um bom filme, contudo a simplicidade com que o roteiro resolve os conflitos psicológicos dos personagens e como algumas cenas são solucionadas torna-o, por diversas vezes, moldado por situações improváveis e desfechos assepticamente elaborados. A ausência de ousadia acaba não o singularizando. Lion vai para os arquivos como mais uma história com poder para ser legitimamente 'real' (afinal é baseada em acontecimentos verídicos) e intensa, mas que se contenta em agradar dentro da cartilha previsível do cinema entretenimento.
Harry Potter e o Cálice de Fogo
4.1 1,2K Assista AgoraO filme amadurece juntamente com os protagonistas. Neste quarto momento da epopéia, o Lord Voldemort vai estar mais presente do que nunca e o confronto será inevitável. O nível de entretenimento se mantem em alta qualidade.
Com Amor, Marilyn
4.2 106 Assista AgoraA vida de Marilyn Monroe é remontada a partir de pensamentos e notas escritas por ela em diários e blocos que foram reveladas em meados dos anos 2000. Essas anotações renderam um livro chamado Fragmentos que inclusive teve tradução para o português em uma edição similar a que foi lançada nos Estados Unidos. Trechos dos livros são lidos e interpretados por atores e atrizes reconhecidos de Hollywood como Viola Davis, F. Murray Abrahams, Ben Gazarra, Marisa Tomei, Elizabeth Banks entre vários outros. A cada performance da leitura, fotografias e imagens de arquivos (entrevistas dadas por ela e por pessoas de seu círculo íntimo) vão endossando as palavras de Marilyn que, contrariando o pensamento da grande maioria, era uma das mais inteligentes e talentosas atrizes de sua geração. Seu carisma contudo não foi suficiente para que sucumbisse aos transtornos relacionados às suas carências afetivas. Love, Marilyn se distancia da polêmica sobre as circunstancias de sua morte e apenas reconta sua trajetória tendo como suporte seu próprio testemunho.
A Chegada
4.2 3,4K Assista AgoraA unidade do tempo e sua multidimensionalidade provocando o espectador em relação ao significado da finitude da vida. Unindo a ficção com o drama existencial, A Chegada consegue surpreender para algo que vai muito além de uma fábula de invasão extraterrestre, mote tão comum na Hollywood dos ‘blockbusters’. O filme dirigido por Denis Villeneuve apela pouco para o que se convencionou chamar de cinema comercial cujos signos deste tipo de realização são muito mais palatáveis para o grande público. A Chegada embora apresente algumas cenas de ação e efeitos visuais, tais recursos servem fundamentalmente para ilustrar a narrativa cujo cerne passa distante de invasões alienígenas, explosões reiteradas ou a destruição em massa de cidades. Trata-se de uma proposta de edificação e não de extermínio. Quem espera uma obra de ficção recheada de sequencias eletrizantes movidas a base do ‘CGI’ vai se desapontar profundamente. A produção é delineada por um aspecto de melancolia nostálgica em que perdas e esperanças se somam para compor um destino que se move a força das ações humanas. A construção técnica do filme é de primeira linha, com todos os elementos cooperando para o desenvolvimento do discurso fílmico. Amy Adams presenteia o público com uma interpretação contida e sem apelos baseando-se na delicadeza de sua movimentação e expressões faciais. A fotografia por sua vez executa planos fechados nos rostos dos protagonistas, intensificando a tensão e aprofundando os diálogos e as narrações em ‘voice over’. A paleta de cores frias, escolhida pela direção de arte, climatiza o ambiente com tons variados de verde, azul e muitas sombras. A trilha sonora no estilo new age envolve o espectador no ar etéreo, quase divino, que guia o roteiro. Escrito de forma não linear com uso não do ‘flashback’, mas do ‘ flashforward’ ou seja a imagem do futuro. A Chegada torna complexo o papel do ser humano como uma ‘arma’ ou agente de mudanças e o põe no centro de importância universal. Petulante, sem dúvida, porém primorosamente poético.
Manchester à Beira-Mar
3.8 1,4K Assista AgoraNinguém fica incólume às tragédias.Quando estas ocorrem no âmbito do seio familiar as consequências podem ser devastadoras sob vários aspectos. Manchester a Beira Mar dialoga basicamente com isso: a dificuldade de se ajustar a uma nova realidade imposta por uma mutilação da alma e o flagelo das consciencias. Uma produção limpa com uma montagem bem realizada em dois tempos da narrativa se entrecortam através do flashback. Nada surpreendente em termos de estilística narrativa, mas uma visão sensível e objetiva sobre a imprevisibilidade do destino e suas consequencias.
Xuxa Requebra
1.8 295Xuxa no papel de uma jornalista com comportameento retardado, roteiro feito em um dia, uma tiazinha que surge do nada só para tirar a roupa sem mais nem menos. Muita apelação para o consumo popular descerebrado. Não recomendo para adulto, muito menos para crianças.
Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban
4.2 1,6K Assista AgoraA série tem uma nítida elevação na qualidade do desenvolvimento dos efeitos especiais neste terceiro filme da epopeia. Sob o aspecto da construção narrativa, o bruxo mirim, já trilhando a adolescência, tem aventuras que se desvencilham para questões mais densas como escolhas entre a vida e a morte e o despertar de relações afetivas. As cenas de ação também se intensificam dando ao filme uma agilidade maior do que os anteriores. Que venha a próxima sequência !
La La Land: Cantando Estações
4.1 3,6K Assista AgoraApostando numa retomada do filme musical em tempos em que a vibe pacífica de temáticas leves dos bons roteiros estão escasseorando, La La Land promove uma festa de cores, sons e emoções partindo das cores das estações (azul, amarelo, verde e vermelho). Assim como O Artista, O Rosa Púrpura do Cairo, Barton Fink e outros filmes que homenageiam a arte de se fazer filmes, La La Land é Hollywood falando sobre Hollywood, seus aspirantes, fantasias e, também, frustrações. Um tour na cultura do cinema, enraizada na cidade de Los Angeles, leva o espectador a um passeio nostálgico não apenas a pontos turísticos da cidade relacionado a cenas de produções famosas, mas também as estratégias e fórmulas 'cliche' de desenvolvimento do romanticismo clássico dos musicais de estúdios realizados pela Warner e MGM em sua época de ouro. A aposta neste gênero, no momento em que o real se mostra mais relevante do que o escapismo aparente de um filme de puro entretenimento, deu certo e a fórmula mistura a memória saudosista no technicolor de tons saturados das décadas de 40, 50 com a cultura pós anos setenta se fundindo num universo contemporâneo imaginário que beira o surreal. Trabalhando com elementos de diversas épocas o roteiro torna indefinível datar um período certo em que o filme se passa uma vez que a cultura de um século ( bem expressa no figurino, no cenários e nãs canções), parece ter sido condensada em detalhes num cenário atemporal. Os planos sequencia implementados cortam o aspecto distanciado da produção e imprime um sentido intimista com a câmera ainda efetuando movimentos de proximidade com o casal central da trama. Mesclar o antigo com o novo é a melhor forma de preservar o interesse pelo passado, diz um dos personagens. Neste choque artificial entre fases diferentes da produção cultural o resultado foi instigante com cenas hilárias e, até mesmo, impensáveis. O centro da ação é o amor que surge entre uma jovem atriz sempre em busca de reconhecimento e de um pianista que quer ter seu próprio bar de Jazz. Ambos lutam pelo seu lugar ao sol na concorrida Tinseltown. Emma Stone e Ryan Gosling são os protagonistas e com boas interpretações e muito esforço nas coreografias de dança, cativam o espectador. Ótimo show de imagens.
Sedução do Pecado
4.1 9A primeira versão adaptada do livro 'Rains' de Somerset Maugham é a melhor. Filmada ainda em 1928, a produção muda é a que mais se mostra fiel a obra literária. O código de moral instituído pelos estúdios decorrente da pressão de organizações religiosas, só estaria a pleno vigor na década de 30, sendo permitidas cenas com conotação sexual mais explícitas e menos glamurizadas do que nas produções de 1932 e 1953. O preto e branco ainda imprime um realismo à fotografia que aliada com a direção de arte expõe as almas em decadência numa ilha do oceano Pacífico e ocupada por um destacamento militar norte-americano.
Quarto de Guerra
3.8 184Filme muito bem produzido e que tem como o escopo principal difundir o pensamento evangélico através de uma cartilha de fé e oração. Embora os temas abordados possam englobar os nichos da vida humana em diversos estratos da sociedade, os conflitos aqui representados refletem de forma mais notória a realidade da classe média negra norte-americana. O roteiro trabalha dentro de uma linearidade e clareza que facilitam o entendimento universal da mensagem em função de reafirmar valores cristãos.
Harry Potter e a Câmara Secreta
4.1 1,2K Assista AgoraA continuação da trajetória de Harry Potter continua com o bruxo e sua turma apresentando traços mais maduros, mas sem perder o carisma. Todos os ítens da produção mantém-se no mesmo patamar de alta qualidade que o anterior. Que venha a próximo !
Harry Potter e a Pedra Filosofal
4.1 1,7K Assista AgoraO primeiro filme da longa trajetória de Harry Potter no cinema. Ícone para uma geração de crianças e adolescentes que foram enfeitiçadas pela fábula do bruxo mirim surgido da imaginação da escritora escocesa J.K. Rowling. A produção respalda a fantasia do mundo fictício de Hogwarts nos potentes efeitos visuais, na direção de arte exuberante, no carisma dos personagens, no elenco sempre comprometido com boas atuações e na trilha sonora marcante. Novo clássico.
A Mulher de Satã
3.7 7Saddie Thompson apresenta um papel feminino típico de destaque para as estrelas do cinema norte americano. O remake tinha sido interpretado pela primeira vez por Gloria Swanson em 1928 e por Joan Crawford em 1932. Rita Hayworth (a eterna Gilda do filme com o mesmo nome) foi a escolha perfeita para o papel nesta terceira versão que difere das outras por adicionar um tom musical. Miss Sadie Thompson e considerada por críticos e estudiosos com uma das películas que melhor representam o cinema 3D estereoscópico no apogeu do uso deste elemento conhecido como a Era de Ouro do cinema em três dimensões, período que se extende de 1952 até 1954, que faz parte do período de convergência que tem alcance até o ano de 1986. Rita era a ‘pin up’ preferida dos soldados na segunda guerra mundial (no filme Um Sonho de Liberdade de 1994, o personagem de Morgan Freeman fala sobre o poder de Rita Hayworth exercido sobre os contingentes militares) e neste papel aparenta estar bem a vontade cercada pelos marines. Aparentando já os traços fisionômicos da meia idade a época, Hayworth adiciona maturidade ao papel e funciona muito bem. Sadie oferece a Rita Hayworth a oportunidade de fazer uma interpretação tridimensional não apenas pela imagem, mas também pelos diferentes ângulos que acompanham a substancia dramática da personagem título. O roteiro suaviza os traços mais duros de Saddie ao confrontar a malícia inerente a sua vida mundana com a cena lúdica na qual canta com crianças em seu quarto. Esta versão de 1953, embora sofresse restrições quanto as cenas mais explosivas de conotação sexual, devido o código de moral cinematográfico instituído no início da década de 30 nos Estados Unidos, ainda sim apresenta uma cena de estupro que, embora se dê fora da objetiva da câmera, a sugestão do atentado é clara. Para época foi, de uma certa forma, a quebra de um preceito, tornando-se um grande avanço dentro da liberdade criativa após tantos anos de supervisão de censura. O filme rodado em Technicolor, processo em que as cores tendem a uma maior saturação, definem o perfil da personagem sob tons quentes como o vermelho e o laranja. O cenário multicolorido do céu, das águas do mar, da vegetação, da vestimenta dos nativos clamam a uma exuberância sensual fazendo elo com a beleza provocativa e voluptuosa de Sadie. Diferente das versões anteriores, todas em preto e branco, a cor intensifica a clareza, redefinindo o papel para menos mundano dos que os protagonizados pelas antecessoras. Sob a perspectiva da direção de arte as cores em Sadie Thompson tem papel fundamental. Na cena em que Sadie vê-se compelida a aceitar uma ‘mudança’ de vida, as cores chamativas, tão atraentes na maior parte do filme, caem por terra substituídas por cores frias como o branco e o verde, revelando um arrefecimento do espírito voraz e cintilante da protagonista.Trançando conceitos de uma geração anos 50 pós-guerra em que a importância da mulher foi ratificada com os homens em campos de batalha, sua voz começa a ter vez e Sadie Thompson no início da segunda metade do século XX colabora, mesmo que timidamente, com essa nova mentalidade.
Nossa Música
3.8 35O filme de Goddard se vale de uma montagem poderosa e esse controle acaba inflingindo uma dose ficcional de considerável proporção. A participação de atores profissionais e preocupação com a misce-en-scene quase que subjulgam o trabalho documental a uma ficção por excelência, caso todo o aparato não fosse apenas voltado para tornar visível um estado do real. Segundo teóricos, o documentário seria a representação do real, exposto a constrangimentos e imerso nas regras do jogo social. Como o real não é de todo filmável, o que um filme alcança – ele documentário ou ficção – é a representação. Nesse sentido, o documentário só poderia ser construído em fricção com o mundo. Neste âmbito Goddard nos implica a uma força romanticista em um chamado de forças criativas que energiza a memória, dá clareza aos sonhos e substancia as imagens. Neste discurso para dar poder ao real, Goddard explica em uma cena que ‘os judeus são matéria para ficções e os palestinos para documentários.’ Outra dimensão desse realismo é seu aspecto fragmentário, a construção não-linear é uma das marcas de Nossa Música. Algumas cenas do filme não formam um todo coerente, por meio das quais seria possível identificar o encadeamento da “história”. Numa seqüência, somos apresentados a uma biblioteca com aspecto de um prédio em ruínas, onde os livros são amontoados no chão. O lugar é cheio de simbolismo. A biblioteca guarda o lugar da cultura, e o fato de ela estar destruída pode ser visto como o emblema do que uma guerra pode produzir. Outro fato do que nos afasta da ficção e nos aproxima de um texto do real é a reunião de personagens e de discursos beira do surreal, quando um grupo de indígenas norte-americanos aparece para falar sobre as injustiças de sua história. Mais do que a importância de todos esses eventos para o encadeamento totalizante da história, o que é relevante é como o filme constrói uma reflexão, servindo-se de discursos vários sobre a realidade. Segundo Camolli ‘como espectador nunca esqueço que estou separado da cena, também nunca deixo de querer abolir este corte por um transporte fusional que me transportaria na tela para me colocar apesar de tudo no centro da cena. Não estar ali para ali estar. Não acreditar para acreditar ainda um pouco. Esta coisa e seu contrario. Este estado e sua negação. Este lugar e sua ausência.”
Crônica de um Verão
4.2 29 Assista AgoraAo que pese o sentido da modalidade documento verdade que impera na costura de Crônica de Um Verão, Jean Rouch e Edgar Morin foram prolíficos em utilizar dentro desse debate comportamental entre pessoas advindas basicamente da classe trabalhadora parisiense, sujeições técnicas clássicas típicas de produções ficcionais com a interferência do autor guiando-o, muitas vezes, ao resultado esperado. Pode-se salientar neste sentido a câmera e a iluminação controlada na maioria das entrevistas, a auto encenação por parte dos próprios personagens que acabavam encenando a si mesmos, a edição que visivelmente promovia cortes no andamento das entrevistas. Uma das mais sutis manipulações em favor de previlegiar o pensamento de Rouch e Morin seria o registro do que seria um ‘papo’ intimo, muito nitidamente encenado, de uma discussão se o filme alcançou os seus objetivos. Aqui é mostrado os realizadores surpresos, a respeito do resultado de seus trabalhos que acabaram por desocortinar comportamentos que pareciam ser impensáveis. Há, portanto, uma interferência explícita dos diretores que, atuando na cena da mesa, perguntam a Landry se ele sabe o que significam aqueles números tatuados no braço daquela. Ele diz não saber e a palavra é passada a Marceline que lhe explica que aqueles números eram gravados nos corpos dos judeus aprisionados, durante a Segunda Guerra Mundial, nos campos de concentração. Ao final dessa cena, que termina com uma imagem de Marceline segurando uma rosa branca, é inserido um dos planos em que ela caminha pelas ruas de Paris. Em seguida vem a cena em que Marceline anda pelas ruas de Paris, tendo a câmera á sua frente que a segue num plano aberto enquanto esta vai divagando sobre a internação de seu pai e sua experiência num campo nazista, numa clara montagem de roteiro e encenação apropriada para dar profundidade ao momento, extraindo, todavia, muito da sua ênfase de documento real da imagem. Desta forma, em Crônica de Um Verão, temos seu desenvolvimento a partir de duas instâncias: uma destinada às pessoas, sobre seu tempo e a outra, destinada ao próprio cinema.
A Maldição da Floresta
2.6 215 Assista AgoraE de repente tudo acontece ! A Maldição da Floresta é asssim, Quando achamos que o espectador ainda está sendo preparado para as grandes revelações, as cartas são postas na mesa de imediato. A tensão que se amplifica na relação formada pela intimidade entre os personagens com o espectador é tardiamente executada dentro do roteiro e isso dificulta uma empatia entre esses pólos. O filme torna-se, por conta disso, distanciado e menos empolgante, mesmo que tecnicamente bem fotografado e com efeitos visuais criativos (que nos remetem às produções de terror da década de oitenta). Falta 'sangue' aqui.
O Abrigo
3.6 720 Assista AgoraO que se vê nem sempre corresponde a realidade. Como perceber o limite entre a fantasia e o mundo concreto?. Embora existam filmes que narrem, sob infindáveis nuances e gêneros, as formas e consequências de como os transtornos mentais afetam a vida das pessoas, O Abrigo volta a por no centro do debate a esquizofrenia como agente de desequilíbrio de convivência social. O roteiro vai trafegando de acordo com a inquietação do personagem principal. Este leva o espectador a compartilhar seus pensamentos angustiantes, por vezes mórbidos, e sempre acompanhados com uma fotografia sofisticada e de cores predominantemente frias. Evoluindo sob escaladas entre o suspense clássico e o drama familiar O Abrigo está longe de ser um exemplo do melhor, mas a qualidade de sua produção e a proposta simples com qual se compromete o tornam representante de bom entretenimento e, até mesmo, de alguma reflexão.
A Lenda de Tarzan
3.1 793 Assista AgoraTarzan aqui tem sua origem recontada por flashbacks. A trama usa a história passada do Lord de Greystoke de forma subsidiária. O roteiro narra o momento em que o protagonista já encontra-se morando em Londres, com Jane, há cerca de dez anos. Após abandonar a selva e assumir o título de nobreza e os bens deixados de herança pelos seus pais, o homem-macaco retorna ao Congo como emissário do rei a convite do governador do Congo, um britânico a serviço do rei. O sentido do enredo principal parece extrapolar a fantasia da série hollywoodiana clássica do Tarzan guerreiro de John Weissmuller ou do longa com sentido idílico da década de oitenta tendo no papel principal Christopher Lambert. Alexandre Skarsgard interpreta o homem das selvas com um refinamento que provoca desconfiança a quem não espera ver Tarzan 'civilizado' e com consciência política do colonialismo escravocrata praticado em sua terra natal. O tom impetrado pelo roteiro tenta apaziguar essas duas vertentes, a fantasia e ação juntamente com a diretriz política e de denúncia da exploração. Essa tentativa de conciliar duas perspectivas enfraquece a densidade dramática que parece ser exagerada no primeiro intento e débil no segundo.Talvez se Tarzan 2016 tentasse ser menos 'engajado' e assumisse seu motivo unicamente comercial, seria uma aventura muito melhor e mais coerente.
Shrek
4.0 1,1K Assista AgoraO primeiro filme do ogro mais simpático do cinema que vem cativando crianças e adultos há quase duas gerações.Shrek une o carisma e a espontaneidade dos personagens dos tradicionais contos de fada a uma mensagem positiva de valorização das relações humanas. O filme da DreamWorks desconstrói o estereótipo da estética clássica da beleza física o qual se tem, frequentemente, justificado na poética que legitima o status de superioridade vinculando o mais belo ao 'melhor'. Shrek rompe com essa ditadura da aparência idealizada das animações tradicionais e prova que, embora existam diferenças de costumes, o caráter é a ordem que importa. A trilha sonora é bem legalzinha composta por uma coletânea de músicas pop da época. Icônico.
Cópia Fiel
3.9 452 Assista AgoraAbbas Kiarostami tinha uma facilidade absurda de nos presentear com o desconforto em suas obras. Um cineasta de grande extensão de discursos que provoca o espectador a definir leituras. Um sentimento de deslocamento diante de um plano de intenções polarizadas cujo maior objetivo é, inteligentemente, confundir. Em Cópia Fiel ele põe o espectador em um jogo cruzado de verdades dissimuladas e mentiras críveis que se consagram na ambiguidade. Neste jogo de desconfiança entre o real e o falso, discernir o absoluto é impossível. Qual o limite entre o fato e a idealização ?. Cópia Fiel tem ares de filme existencialista europeu focado em análise de relações, mas na verdade a grande sacada de Kiarostami e mostrar ao espectador, no âmbito da intimidade, que os valores afetivos podem validar o que, aparentemente, é apenas uma reprodução técnica da vida em si. Destaque, também, para Juliette Binoche que consegue oscilar os diversos níveis de dificuldade de sua interpretação com toda a suavidade que lhe é peculiar.