Um filme asqueroso, mas com uma sacada político-filosófica genial! Pasolini transportou o exercício reflexivo sobre os delírios de poder e sadismo do Sade, feito para criticar o Antigo Regime francês, para retratar o fascismo. E ó, digo uma coisa que vai parecer bizarra, mas que é verdade: o livro do Marquês de Sade no qual esse filme é inspirado consegue ser ainda mais asqueroso e repugnante.
Apesar do esforço em construir uma explicação didática sobre como funciona o Bitcoin, não dá para dizer que consegue aplainar as dúvidas integralmente. A coisa toda ainda parece muito conceitual, muito abstrata. Isto se deve em parte à construção da narrativa explicativa do documentário, mas também ao assunto, que é hermético e exige uma compreensão bastante densa de conceitos econômicos.
De qualquer modo, o que acho mais interessante, no sentido de curioso mesmo, no documentário é a tentativa de construir uma aura meio política e filosófica ao redor do Bitcoin, como se ele fosse um grito libertário ou um grande projeto utópico coletivo. As pessoas escolhidas para as entrevistas são entusiastas do Bitcoin e ajudam a compôr essa aura romântica ao redor do assunto. Ao mesmo tempo, se verifica que a trajetória do Bitcoin, antes de oferecer uma alternativa à dinâmica de rapina e especulação do capitalismo financeiro, acabou se tornando escopo dele, uma espécie de ferramenta nova para continuar fazendo as mesmas velhas coisas.
Um ótimo filme de tribunal, que vai dando uma angústia tremenda conforme as coisas não param de escalar e escalar, até se estar no meio de um tempestade de m****. Muito bom.
Parece uma versão feminina de 'Sociedade dos poetas mortos' até o estranho e o grotesco entrarem em cena. Demora para engrenar, mas uma vez que se adensa o estranho o filme brilha. A habilidade da diretora de encontrar o equilíbrio ambíguo sobre o qual o filme precisava repousar para ter seu efeito dramático e estético é louvável.
Quase todo o filme corre numa luz baça e crepuscular, servindo perfeitamente como pano de fundo para a condição ambígua com que os padres são retratados. É doloroso ver esses personagens odiosos tornarem-se objeto de pena. Uma proposta ousada, não há dúvida, e sem resolução porque, bem, não sei se há alguma resolução possível: é uma tragédia ida e uma tragédia em devir, sem redenção no horizonte. Seu arco dramático é este mesmo.
Foi difícil. Só segui pela estatura de clássico que o filme ganhou, queria ver qualé. Acho que aquilo que sustenta o filme com essa estatura é não só o bizarro em si, a exploração asquerosa do trash e do B, mas o fato de que constitui uma leitura distorcida, muito tresloucada (em forma e conteúdo), do universo que se costuma chamar pejorativamente de "white trash". É como um "Trailer Park Boys" elevado à última potência. Analogamente à distorção do blaxpoitation, esse filme é uma espécie de white-trash-exploitation'.
O cuidado com que Mike Leigh conduz a gente pela escalada dos acontecimentos é verdadeiramente magistral, extremamente bem documentada e com um apuro histórico invejável. Porém, minha impressão é de que essa força é também sua fraqueza: o filme é quase um documentário. A dimensão histórica ganhou tanto peso que a dimensão dramática ficou rarefeita, e isto faz com que o filme perca um pouco da sua força.
Esse filme, como vários outros mais recentes do Woody Allen (do "late Wood Allen", digamos assim) padecem de uma sensação difícil de nomear, mas que é algo como 'bom-mas-mais-do-mesmo' ou 'tem-a-assinatura-do-Woody-Allen-o-cara-do-Noivo-Neurótico-Noiva-Nervosa-mas-que-perdeu-a-força-e-está-esmaecido'. É a impressão que me dá, por exemplo, em 'Café Society' e 'O homem irracional'.
O David Gilmour, no livro 'O clube do filme', foi quem melhor pôs o dedo em cima disto:
"Atualmente [o livro é de 2007], os filmes de Woody Allen dão uma sensação de dever de casa feito às pressas, como se ele quisesse logo terminá-los e se livrar dele, para passar a outra coisa." (p. 33)
Daí em diante ele pega mais pesado e acho que é difícil concordar com ele ('Meia-noite em Paris' é de 2011):
"Mas acontece que essa coisa, infelizmente, tem sido outro filme. É uma espiral descendente. Mesmo assim, depois de dirigir mais de trinta filmes, talvez ele já tenha completado sua obra" (p. 33)
Filme polêmico, com um personagem controverso e que causa reações muito ambíguas, mas que se sobressai pela visceral interpretação de Lázaro Ramos. Se você excluir todos os aspectos estéticos, técnicos etc. do filme e só sobrar a atuação do Lázaro Ramos, ainda assim será um grande filme. O bicho parecia que tava possuído pela Madame Satã. Impressionante!
Um filme de ambições épicas, que se deixam entrever tanto na reivindicação da vocação odisseica dos gregos quanto pelo entrelaçamento das trajetórias individuais dos personagens como grandes eventos históricos - as longas (e belíssimas) tomadas paisagísticas, com a luminosidade e a fotografia mediterrâneas perfeitas, também contribuem para essa dimensão do épico.
Por conta do cuidado com que se entretecem a dimensão épica com a mais subjetiva, se consegue equilibrar com maestria as porções dramáticas e históricas do filme, de modo que elas estejam organicamente encaixadas uma da outra. O elemento histórico não é só pano de fundo para dramas individuais, nem os dramas individuais são mero escopo para o enredo histórico mais amplo. Eles se alimentam mutuamente. Os personagens não são planos, mas magistralmente redondos, cheios de personalidade e vida.
Os diálogos são econômicos e nos atingem frequentemente com virulência, como numa das mais belas frases do filme:
“Na vida, parece que as coisas que perde são mais valiosas do que as coisas que encontra. As coisas que encontra perdem-se novamente. As coisas que perde, existem para sempre.”
É uma pena que esse filme não ganhe mais espaço. É uma obra-prima.
Esse filme realmente pertence a uma outra época, a uma época mais tenra ou menos cínica do que a nossa. Hoje a gente assiste ele antes como um documento histórico, da Disney, do cinema mesmo, do que como um filme em si. É preciso um esforço muito grande para conseguir reconstruir o prisma da época e poder apreciá-lo nesses termos.
É um filme da Disney, então tem aquele fundo moral puritano que a gente conhece. Calibre suas expectativas a partir daí e vai dar tudo certo. O que incomoda é o Jon Hamm num papel redentório à la Disney. Acho que o Don Draper marcou ele demais. É quase impossível olhar para ele e não esperar ele armanda uma tramoia inescrupulosa e ambiciosa por trás da cortesia e atenção. Nesse filme, é aquela redenção que ocorre, e aí ocorre esse anti-clímax metalinguístico.
Sentimental demais, mesmo considerando-o integrante da categoria "Infantil", "Musical", "Natal". Ah, e tem uns exageros quanto à suspensão de descrença sem os quais poder-se-ia ter passado sem problemas - o cálculo do movimento das pás do ventilador para eles cruzarem, as bolas de neve girando em espiral etc.
Não é ruim, mas também não é bom. Adorei as sequências de ação, com exceção da final. Em termos de enredo e drama, no entanto, o filme é fraquinho que só.
Ver como o filtro individual se aplica sobre a realidade concreta na cabeça do chefão protagonista do filme é ser confrontado com o nível de narcisismo dos ditadores, e quão diabólico ele pode ser.
Não é um grande filme, mas tem uma fineza da parte dos atores e da direção na construção dramática que faz ele valer a pena. Pode parecer, a princípio, um filme sobre relação amorosa ou, então, mais um filme sobre a vacuidade da vida de uma esposa e mãe, mas é, antes disto, um filme sobre a relação pai e filha (a frase inicial já diz isto). Tem algo de detestável e adorável no personagem de Bill Murray, que o torna uma espécie de 'complexo paterno potencial' com pernas. O ar de aparente desfaçatez dele adensa esse caldo, e torna sua espécie de 'tough love' uma canhestra tentativa de redenção.
O filme é muito interessante quanto a tornar material, palpável mesmo, o grotesco processo de criação da territorialidade Índia-Paquistão - separação de objetos, opção de nacionalidade, logística da moeda, delimitação cartográfica da linha separatória etc.
Contudo, o filme é bastante centrada na intriga palaciana do processo, e tem também um olhar que, embora crítico da atuação imperialista britânica, parece nutrir uma certa nostalgia acerca dos tempos desse comando neocolonial. Isto gera um curioso e bamboleante argumento político: é como se a diretora dissesse 'Era ruim no tempo do protetorado britânico, mas pelo menos a Índia era unida'. Essa dimensão política e crítica do filme incomoda um pouco, não tem jeito.
Acho que assisti na época errada, porque não curti apesar de reconhecer os elementos de um filme muito inteligente na digestão da história clássica, de Barrie e da Disney.
Parabéns para o Dustin Hoffman! Não reconheci ele durante o filme. Quase caí da cadeira quando vi o nome dele nos créditos. Uau!
Triste e instrutivo ver como estamos presos em conflitos antigos. Soa como um anacronismo dizer isto, mas a vida política brasileira parece ser, frequentemente, anacrônica. Vide algumas das frases finais:
“A classe média é uma classe perplexa. Não tem um sistema de valores criado por uma ação histórica dela mesma, são multidões de indivíduos solitários, de indivíduos iguais e que, misteriosamente, se julgam diferentes. É este seu problema maior: pensam que têm algo a perder, vivem absortos no melodrama da própria insegurança, e esquecem que estão num país assolado pela tragédia da fome e da miséria. (...) Politicamente, a classe média se movimenta quando pressente mudança social que lhe ameace a estabilidade. Nunca toma a iniciativa do progresso." (c. 55min-57min)
Confesso que eu não tenho muita paciência para o Terrence Malick, apesar de toda a beleza da cinematografia dele. Acho os filmes longos em demasia, às vezes desnecessariamente.
Não é o caso de 'Uma vida oculta'. O filme é longo, sim, mas é sublime, transcendente mesmo. O cuidado com o estabelecimento visual da vida campestre é de uma beleza ímpar, não somente pelo aspecto bucólico e paisagístico (que é maravilhoso), mas é como se as cenas traduzissem qualidades concentuais, como tranquilidade e paz. Todas as sequências da vilazinha austríaca são um bálsamo, cuja qualidade se ressalta pelo contraste oferecido pelas prisões nazistas.
Mesmo se você esquecesse essa dimensão estética estupenda, acho que o filme ainda funcionaria, como drama. O nazismo e a guerra ali são traduzidos na vida cotidiana, não são meras imposições externas, eles se entrelaçam com a dinâmica orgânica da vida que já existia ali. As relações entre os moradores da vila vão repercutindo e recriando dinâmicas de poder no interior da vila, costurando-as com o dia à dia prático. A despeito do conflito espiritual e religioso existente, não há concessões fáceis ao maniqueísmo.
Por fim, é preciso dar relevo à atuação, sobretudo a dos protagonistas: é ela, tão expressiva, que permitiu a economia dos diálogos. Grande parte dos momentos dramáticos se passa em silêncio, estampado nas feições dos personagens. Sutileza é palavra de ordem aqui. Isto adensa o aspecto contemplativo e introspectivo do filme, dando-lhe uma qualidade quase etérea, e ainda assim, profundamente material, concreta, histórica, reconhecível.
Johnny & June
4.0 1,0K Assista AgoraMúsica de primeira e o Joaquin Phoenix visceral na pele do Johnny Cash. É a receita do sucesso.
Ladrão de Casaca
3.7 259Como de se esperar, uma condução narrativa afiada de Hitchcock, e, igualmente, uma atuação classuda do Cary Grant e da Grace Kelly.
Acho que é a direção do Hitchcock é o mais próximo de uma narrativa de livro policial/detetivesco no cinema. Ele é a Agatha Christie do cinema.
Salò, ou os 120 Dias de Sodoma
3.2 1,0KUm filme asqueroso, mas com uma sacada político-filosófica genial! Pasolini transportou o exercício reflexivo sobre os delírios de poder e sadismo do Sade, feito para criticar o Antigo Regime francês, para retratar o fascismo. E ó, digo uma coisa que vai parecer bizarra, mas que é verdade: o livro do Marquês de Sade no qual esse filme é inspirado consegue ser ainda mais asqueroso e repugnante.
The Rise and Rise of Bitcoin
3.9 2Apesar do esforço em construir uma explicação didática sobre como funciona o Bitcoin, não dá para dizer que consegue aplainar as dúvidas integralmente. A coisa toda ainda parece muito conceitual, muito abstrata. Isto se deve em parte à construção da narrativa explicativa do documentário, mas também ao assunto, que é hermético e exige uma compreensão bastante densa de conceitos econômicos.
De qualquer modo, o que acho mais interessante, no sentido de curioso mesmo, no documentário é a tentativa de construir uma aura meio política e filosófica ao redor do Bitcoin, como se ele fosse um grito libertário ou um grande projeto utópico coletivo. As pessoas escolhidas para as entrevistas são entusiastas do Bitcoin e ajudam a compôr essa aura romântica ao redor do assunto. Ao mesmo tempo, se verifica que a trajetória do Bitcoin, antes de oferecer uma alternativa à dinâmica de rapina e especulação do capitalismo financeiro, acabou se tornando escopo dele, uma espécie de ferramenta nova para continuar fazendo as mesmas velhas coisas.
O Insulto
4.1 168Um ótimo filme de tribunal, que vai dando uma angústia tremenda conforme as coisas não param de escalar e escalar, até se estar no meio de um tempestade de m****. Muito bom.
The Falling
2.4 55 Assista AgoraParece uma versão feminina de 'Sociedade dos poetas mortos' até o estranho e o grotesco entrarem em cena. Demora para engrenar, mas uma vez que se adensa o estranho o filme brilha. A habilidade da diretora de encontrar o equilíbrio ambíguo sobre o qual o filme precisava repousar para ter seu efeito dramático e estético é louvável.
O Clube
3.9 146 Assista AgoraQuase todo o filme corre numa luz baça e crepuscular, servindo perfeitamente como pano de fundo para a condição ambígua com que os padres são retratados. É doloroso ver esses personagens odiosos tornarem-se objeto de pena. Uma proposta ousada, não há dúvida, e sem resolução porque, bem, não sei se há alguma resolução possível: é uma tragédia ida e uma tragédia em devir, sem redenção no horizonte. Seu arco dramático é este mesmo.
Pink Flamingos
3.4 878Foi difícil. Só segui pela estatura de clássico que o filme ganhou, queria ver qualé. Acho que aquilo que sustenta o filme com essa estatura é não só o bizarro em si, a exploração asquerosa do trash e do B, mas o fato de que constitui uma leitura distorcida, muito tresloucada (em forma e conteúdo), do universo que se costuma chamar pejorativamente de "white trash". É como um "Trailer Park Boys" elevado à última potência. Analogamente à distorção do blaxpoitation, esse filme é uma espécie de white-trash-exploitation'.
Peterloo
3.4 14 Assista AgoraO cuidado com que Mike Leigh conduz a gente pela escalada dos acontecimentos é verdadeiramente magistral, extremamente bem documentada e com um apuro histórico invejável. Porém, minha impressão é de que essa força é também sua fraqueza: o filme é quase um documentário. A dimensão histórica ganhou tanto peso que a dimensão dramática ficou rarefeita, e isto faz com que o filme perca um pouco da sua força.
Magia ao Luar
3.4 569 Assista AgoraEsse filme, como vários outros mais recentes do Woody Allen (do "late Wood Allen", digamos assim) padecem de uma sensação difícil de nomear, mas que é algo como 'bom-mas-mais-do-mesmo' ou 'tem-a-assinatura-do-Woody-Allen-o-cara-do-Noivo-Neurótico-Noiva-Nervosa-mas-que-perdeu-a-força-e-está-esmaecido'. É a impressão que me dá, por exemplo, em 'Café Society' e 'O homem irracional'.
O David Gilmour, no livro 'O clube do filme', foi quem melhor pôs o dedo em cima disto:
"Atualmente [o livro é de 2007], os filmes de Woody Allen dão uma sensação de dever de casa feito às pressas, como se ele quisesse logo terminá-los e se livrar dele, para passar a outra coisa." (p. 33)
Daí em diante ele pega mais pesado e acho que é difícil concordar com ele ('Meia-noite em Paris' é de 2011):
"Mas acontece que essa coisa, infelizmente, tem sido outro filme. É uma espiral descendente. Mesmo assim, depois de dirigir mais de trinta filmes, talvez ele já tenha completado sua obra" (p. 33)
Madame Satã
3.9 421 Assista AgoraFilme polêmico, com um personagem controverso e que causa reações muito ambíguas, mas que se sobressai pela visceral interpretação de Lázaro Ramos. Se você excluir todos os aspectos estéticos, técnicos etc. do filme e só sobrar a atuação do Lázaro Ramos, ainda assim será um grande filme. O bicho parecia que tava possuído pela Madame Satã. Impressionante!
Little England
3.8 22Um filme de ambições épicas, que se deixam entrever tanto na reivindicação da vocação odisseica dos gregos quanto pelo entrelaçamento das trajetórias individuais dos personagens como grandes eventos históricos - as longas (e belíssimas) tomadas paisagísticas, com a luminosidade e a fotografia mediterrâneas perfeitas, também contribuem para essa dimensão do épico.
Por conta do cuidado com que se entretecem a dimensão épica com a mais subjetiva, se consegue equilibrar com maestria as porções dramáticas e históricas do filme, de modo que elas estejam organicamente encaixadas uma da outra. O elemento histórico não é só pano de fundo para dramas individuais, nem os dramas individuais são mero escopo para o enredo histórico mais amplo. Eles se alimentam mutuamente. Os personagens não são planos, mas magistralmente redondos, cheios de personalidade e vida.
Os diálogos são econômicos e nos atingem frequentemente com virulência, como numa das mais belas frases do filme:
“Na vida, parece que as coisas que perde são mais valiosas do que as coisas que encontra. As coisas que encontra perdem-se novamente. As coisas que perde, existem para sempre.”
É uma pena que esse filme não ganhe mais espaço. É uma obra-prima.
Mary Poppins
4.0 612 Assista AgoraEsse filme realmente pertence a uma outra época, a uma época mais tenra ou menos cínica do que a nossa. Hoje a gente assiste ele antes como um documento histórico, da Disney, do cinema mesmo, do que como um filme em si. É preciso um esforço muito grande para conseguir reconstruir o prisma da época e poder apreciá-lo nesses termos.
Arremesso de Ouro
3.5 60 Assista AgoraÉ um filme da Disney, então tem aquele fundo moral puritano que a gente conhece. Calibre suas expectativas a partir daí e vai dar tudo certo. O que incomoda é o Jon Hamm num papel redentório à la Disney. Acho que o Don Draper marcou ele demais. É quase impossível olhar para ele e não esperar ele armanda uma tramoia inescrupulosa e ambiciosa por trás da cortesia e atenção. Nesse filme, é aquela redenção que ocorre, e aí ocorre esse anti-clímax metalinguístico.
Uma Invenção de Natal
3.5 60 Assista AgoraSentimental demais, mesmo considerando-o integrante da categoria "Infantil", "Musical", "Natal". Ah, e tem uns exageros quanto à suspensão de descrença sem os quais poder-se-ia ter passado sem problemas - o cálculo do movimento das pás do ventilador para eles cruzarem, as bolas de neve girando em espiral etc.
Power
3.0 434 Assista AgoraNão é ruim, mas também não é bom. Adorei as sequências de ação, com exceção da final. Em termos de enredo e drama, no entanto, o filme é fraquinho que só.
Investigação Sobre um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita
4.2 45Filme excelente! É um estudo psicológico sobre a mente e a ideologia fascistas.
A sequência final é estarrecedora!
Ver como o filtro individual se aplica sobre a realidade concreta na cabeça do chefão protagonista do filme é ser confrontado com o nível de narcisismo dos ditadores, e quão diabólico ele pode ser.
Busca Desesperada
2.1 10 Assista AgoraÉ um 'Busca implacável' xumbrega
On the Rocks
3.3 120Não é um grande filme, mas tem uma fineza da parte dos atores e da direção na construção dramática que faz ele valer a pena. Pode parecer, a princípio, um filme sobre relação amorosa ou, então, mais um filme sobre a vacuidade da vida de uma esposa e mãe, mas é, antes disto, um filme sobre a relação pai e filha (a frase inicial já diz isto). Tem algo de detestável e adorável no personagem de Bill Murray, que o torna uma espécie de 'complexo paterno potencial' com pernas. O ar de aparente desfaçatez dele adensa esse caldo, e torna sua espécie de 'tough love' uma canhestra tentativa de redenção.
O Último Vice-Rei
3.7 23 Assista AgoraO filme é muito interessante quanto a tornar material, palpável mesmo, o grotesco processo de criação da territorialidade Índia-Paquistão - separação de objetos, opção de nacionalidade, logística da moeda, delimitação cartográfica da linha separatória etc.
Contudo, o filme é bastante centrada na intriga palaciana do processo, e tem também um olhar que, embora crítico da atuação imperialista britânica, parece nutrir uma certa nostalgia acerca dos tempos desse comando neocolonial. Isto gera um curioso e bamboleante argumento político: é como se a diretora dissesse 'Era ruim no tempo do protetorado britânico, mas pelo menos a Índia era unida'. Essa dimensão política e crítica do filme incomoda um pouco, não tem jeito.
Hook - A Volta do Capitão Gancho
3.4 282 Assista AgoraAcho que assisti na época errada, porque não curti apesar de reconhecer os elementos de um filme muito inteligente na digestão da história clássica, de Barrie e da Disney.
Parabéns para o Dustin Hoffman! Não reconheci ele durante o filme. Quase caí da cadeira quando vi o nome dele nos créditos. Uau!
A Opinião Pública
3.7 32Triste e instrutivo ver como estamos presos em conflitos antigos. Soa como um anacronismo dizer isto, mas a vida política brasileira parece ser, frequentemente, anacrônica. Vide algumas das frases finais:
“A classe média é uma classe perplexa. Não tem um sistema de valores criado por uma ação histórica dela mesma, são multidões de indivíduos solitários, de indivíduos iguais e que, misteriosamente, se julgam diferentes. É este seu problema maior: pensam que têm algo a perder, vivem absortos no melodrama da própria insegurança, e esquecem que estão num país assolado pela tragédia da fome e da miséria. (...) Politicamente, a classe média se movimenta quando pressente mudança social que lhe ameace a estabilidade. Nunca toma a iniciativa do progresso." (c. 55min-57min)
Farol da Solidão
2.8 2 Assista AgoraMuito previsível e verborrágico, mesmo para uma história de romance. As paisagens e a espetacular luz natural oferecem um lenitivo a isto, no entanto.
Uma Vida Oculta
3.9 154Confesso que eu não tenho muita paciência para o Terrence Malick, apesar de toda a beleza da cinematografia dele. Acho os filmes longos em demasia, às vezes desnecessariamente.
Não é o caso de 'Uma vida oculta'. O filme é longo, sim, mas é sublime, transcendente mesmo. O cuidado com o estabelecimento visual da vida campestre é de uma beleza ímpar, não somente pelo aspecto bucólico e paisagístico (que é maravilhoso), mas é como se as cenas traduzissem qualidades concentuais, como tranquilidade e paz. Todas as sequências da vilazinha austríaca são um bálsamo, cuja qualidade se ressalta pelo contraste oferecido pelas prisões nazistas.
Mesmo se você esquecesse essa dimensão estética estupenda, acho que o filme ainda funcionaria, como drama. O nazismo e a guerra ali são traduzidos na vida cotidiana, não são meras imposições externas, eles se entrelaçam com a dinâmica orgânica da vida que já existia ali. As relações entre os moradores da vila vão repercutindo e recriando dinâmicas de poder no interior da vila, costurando-as com o dia à dia prático. A despeito do conflito espiritual e religioso existente, não há concessões fáceis ao maniqueísmo.
Por fim, é preciso dar relevo à atuação, sobretudo a dos protagonistas: é ela, tão expressiva, que permitiu a economia dos diálogos. Grande parte dos momentos dramáticos se passa em silêncio, estampado nas feições dos personagens. Sutileza é palavra de ordem aqui. Isto adensa o aspecto contemplativo e introspectivo do filme, dando-lhe uma qualidade quase etérea, e ainda assim, profundamente material, concreta, histórica, reconhecível.