E Christopher Nolan nos deu um ótimo filme de guerra, diferente dos convencionais. Não há grandes protagonistas, heróis ou vilões, embora no elenco haja nomes conhecidos (Cillian Murphy, Kenneth Branagh), mas sim vários personagens que em algum momento se destacam, além de uma multidão que se destaca sempre. A história é de uma fuga de soldados aliados sob bombardeios alemães, mais precisamente a "Retirada de Dunquerque", um dos episódios mais tensos e comoventes da Segunda Guerra Mundial e que rendeu a frase de Churchill "Nunca antes no campo dos conflitos humanos, tantos deveram tanto a tão poucos." É provável que esse tipo de narrativa (sem figuras incontestavelmente centrais e situações que só aos poucos passam a se completar) seja rejeitada por espectadores que preferem uma trama mais "convencional" (e eu entendo perfeitamente). Quanto a mim, consegui me envolver com a dinâmica do filme, a bela fotografia, os momentos de suspense e o desespero de jovens jogados ao "tudo ou nada". Há várias cenas memoráveis. E o caminho entre a vida e a morte nunca pareceu tão curto.
Para quem não leu o romance no qual o filme se baseia ou mesmo assistiu versões cinematográficas anteriores da história, "Adoráveis mulheres" pode parecer confuso, ainda mais porque a trama não é linear. Aliás, são várias tramas envolvendo irmãs que se amam mas tem suas crises pessoais envolvendo dilemas como a escolha entre estabilidade financeira, vocação profissional ou investimento em relação amorosa. Desse modo a história, que faz menção à guerra civil americana, revela que as lutas e dissabores enfrentados pelas mulheres de outrora (sem dúvida mais amargos) ainda são fantasmas na vida das mulheres de agora.
Visualmente "Adoráveis Mulheres" me pareceu impecável em sua fotografia, cenários e figurinos. E há uma agilidade na narrativa que vi como uma faca de dois gumes: se, por um lado, pode provocar empatia nos amantes da velocidade, ao mostrar personagens que muitas vezes agem como se estivessem atrasados para a prova do enem, por outro lado esse ritmo pode comprometer ainda mais o entendimento da(s) história(s). E eu, mesmo reconhecendo a grande dedicação da Greta Gerwig ao dar personalidade à sua obra (e foi bem sucedida), não consegui apreciar o filme por inteiro. E a extraordinária Meryl Streep pra mim ficou a dever.
Adaptado do romance de Christine Leunens, "Jojo Rabbit" é mais um filme que nos leva diretamente às insanidades da Alemanha nazista próxima do final da Segunda Guerra. Acontece que o filme não segue a linha do ótimo e pesado drama "A Queda! As últimas horas de Hitler", optando pelo humor e deboche a contrastarem com momentos de dor e pânico, tendo como protagonista um menino que passará por um angustiante amadurecimento. Aliás, palmas para o ator mirim Roman Griffin Davis e sua atuação intensa e supercarismática. E aí vem a ironia: o pequeno ator dá vida a um garoto fanático pelas ideias nazistas, pertencente à Juventude Hitlerista, vítima de lavagem e "ensaboagem" cerebral e treinado para odiar e matar judeus. Mesmo assim é um personagem que nos encanta pois também mostra fragilidade, ingenuidade, desconhecimento de fatos e um coração sensível revelado durante a trama. MAS... há muitos cachorros doidos adultos que também começaram assim.
Scarlett Johansson, como a mãe de Jojo, plenamente consciente da estupidez que assolava seu país, tem uma participação memorável, encarnando aquele tipo de pessoa que tanto desejaríamos conhecer. Também não posso deixar de mencionar outro atorzinho promissor, Archie Yates, o York, com uma simpatia fenomenal (até desejei vê-lo no papel de protagonista). O que me deixou um tanto cabreiro foi o personagem do Hitler como o amigo imaginário de Jojo. Entendo que o líder nazista tinha que parecer patético, caricatural, afinal era produto da imaginação de um menino. Porém, em nenhum momento, achei que Taiki Waititi (que também dirige o filme) conseguiu criar um personagem com o peso que deveria ter na história. Se fosse um dos grandes atores da atualidade...
Gostei muito de assistir "Jojo Rabbit". Não vejo como obra-prima, possui suas irregularidades, mas é do tipo que dificilmente se esquece. Além do que é mais do que necessário em um mundo que não se cansa de regredir à barbárie.
Lembrei do universo do Woody Allen diversas vezes ao assistir este filme: pessoas intelectualizadas, "civilizadas", ligadas ao meio artístico, às voltas com seus fracassos amorosos e, principalmente, consigo mesmas. "História de um casamento" usa um humor entre o leve e o cáustico como contraponto para suas passagens "mais pesadas" sobre a elaboração de um luto matrimonial em que cada parte envolvida vai ao inferno e tenta retornar de lá, não sem profundas feridas no amor próprio. E é nesses momentos de conflito e dor que o filme me pareceu mais autêntico pois os momentos mais cômicos, apesar de reforçarem o desejo do espectador de ir até o fim da jornada, pra mim algumas vezes pareceram como um outro filme sobre a mesma história.
O elenco está afiado, interagindo muito bem. Mesmo assim destaco a excelente performance do Adam Driver, dando uma perfeita caracterização ao seu Charlie, com alterações que vão do perfeccionismo à dependência, da dominação ao desalento... A dor e confusão do personagem são quase palpáveis e me fizeram esquecer completamente que eu estava diante de um filme, tal a forma como ele agoniza diante da brusca mudança.
"Frozen" é uma animação baseada no conto "A Rainha da Neve" de Hans Christian Andersen. O esmero na computação gráfica, certamente, contribui para a histórica qualidade visual das produções Disney, porém mesmo assim não achei que esta animação supera em beleza visual alguns clássicos antigos e mais "artesanais".
A história prende a atenção mas não chega a ser tão empolgante como aquelas que fizeram pessoas de qualquer idade soluçar no cinema ou roer as unhas de ansiedade. Foi bom ver que as protagonistas são duas irmãs e o aspecto romance tenha ficado em segundo plano. Contudo não achei nenhum personagem com força suficiente para promover um envolvimento emocional mais intenso do espectador. Nem há um daqueles vilões da Disney que se sobressaíram tanto que se tornaram ícones (como Malévola, a Rainha Má, Scar ou o fantástico Capitão Gancho).
Há um personagem tipo "lobo em pele de cordeiro" porém, quando se revela, é muito pouco desenvolvido em termos dramáticos.
Para mim Elza é a personagem mais interessante e bem que poderia ser mais explorada em sua complexidade e contradições, dando mais densidade à trama.
As tentativas de fazer humor não renderam momentos impagáveis. Os Trolls, a rena Sven e o boneco de neve Olaf, como "alívios cômicos", mostram-se interessantes/engraçadinhos, mas estão longe de rivalizar com personagens secundários de outras animações que "roubaram a cena" dos protagonistas.
"Frozen" é legal de se assistir, garante diversão. Mas me deixou com saudades das incríveis e inesquecíveis animações da Disney que sacolejaram a alma de crianças dos 5 aos 80 anos.
Faz tempo que li o livro que serviu de adaptação a este filme mas lembro que gostei muito da resolução do mistério. Quanto ao filme me pareceu que fizeram questão em caprichar na suntuosidade dos cenários (e realmente são de encher os olhos) e na escalação do elenco. Contudo o filme para mim teve falhas ao mostrar o ir e vir de vários personagens (com seus problemas particulares rapidamente expostos) e que deixavam no ar aquela sensação de que aquele ator ou atriz poderia render muito mais além de proferir frases afetadas. "A casa torta" exigiu do espectador, além da vocação detetivesca, uma boa memória pra não esquecer "quem é quem" naquele xadrez familiar doentio.
Uma história da "dama do crime" sem sua maior criação, Hercule Poirot, precisaria de substitutos suficientemente interessantes com os quais o espectador se apegasse. E "A casa torta" (pelo menos essa foi minha constatação) perde-se em subtramas que mais confundem o espectador por sua própria existência do que o instigam a desvendar o mistério. E há um "personagem crucial" na história (mal representado) que mostra a que veio cedo demais.
Como ponto muito positivo vi a reta final da história, mostrada de modo muito bom e eletrizante. E também (é claro!), a excelente presença da veterana Glenn Close que eleva a qualidade de qualquer filme.
Não deixa de ser curioso assistir a uma trama estilo Agatha Christie fazer diversas menções à internet, instagram, emails... para reforçar a atualidade da história. Como também instalar (às vezes um tanto forçadamente) questões sempre efervescentes como a imigração, o racismo e o eterno fantasma do nazismo. Contudo a história é verdadeiramente mais uma daquelas "quem é o assassino?", com suspeitas que se revezam entre os parentes do defunto. Se não tem o brilho das melhores histórias da "dama do crime" também não compromete, fazendo o espectador ter ansiedade pra desvendar o enigma.
Infelizmente, como geralmente acontece em histórias assim, vários personagens são apresentados apressadamente, quase caricaturas, sem dar tempo ao espectador para criar empatias (não achei o personagem de Daniel Craig absolutamente marcante). E lamentei muito porque a ótima atriz Jamie Lee Curtis não foi mais explorada. Mas, no geral, achei o saldo positivo.
Mais um (bom) filme sul-coreano com plot twists que fazem de nossos neurônios gato e sapato. Quase sempre ágil, fluido, tenso, sem excessos de violência (que aqui foi uma virtude pois o que predomina é o mistério) e que apresenta e desconstrói personagens só pra duvidarmos de nossas certezas. Um daqueles filmes em que a maior parte do tempo nos perguntamos: "afinal, que p... é que tá acontecendo?" Entretenimento e unhas roídas garantidos.
Existimos quando o Outro reconhece nossa existência.
Um marido que não tem outra alternativa a não ser contemplar sua esposa se reconstruindo enquanto ele já não sabe o que fazer de si mesmo. Dor, solidão e angústia na vida de um... fantasma tão ligado ao que tinha em vida que não consegue se desapegar e "dar a volta por cima". Do riso que inicialmente pode nos contagiar ao ver um "fantasma de lençol" (tal como imaginávamos na infância) à surpresa e tristeza de observar aquele ser desesperado por reconhecimento e resgate do passado.
A esposa enlutada que vai descobrindo nova vontade de viver me fez lembrar do ótimo "A liberdade é azul" de Kieslowski. Porém o que realmente perturba é a "teimosia" do nosso protagonista em negar a grande perda que sofreu. E isso nos remete diretamente às nossas próprias perdas e a dificuldade em superá-las. Quanta gente há no mundo que se recusa a aceitar que determinada fase da vida acabou e jamais retornará ?
"A Ghost Story" é um filme bem lento, até causa desconforto por isso. E é um belo retrato das contradições humanas, do medo do novo, da insistência no passado, da busca por respostas, da rapidez e fragilidade da existência...
A certa altura da história aparece o fantasma de uma mulher. Porém esta não servirá como companheira do fantasma sofredor (este filme não tem vocações hollywoodianas) pois já carrega sua própria dor. O momento em que ela descobre que sua espera é inútil é uma das cenas mais dolorosas do filme.
É alentador constatar que, para transmitir sua mensagem, um bom filme não necessita de pirotecnias nem efeitos especiais de última geração. Basta honestidade e boa vontade do espectador em mergulhar na amarga fantasia.
Esse filme é tão badalado que não pude evitar de começar a assisti-lo com boas expectativas. Ao término achei-o superestimado. Pra mim funcionou como cinema-diversão, criando certa dose de ansiedade diante das ações de seu protagonista (por sinal, o ator James McAvoy tem uma performance bem interessante) porém não mais que isso. O roteiro me pareceu frágil, guiando-se através de situações exaustivamente usadas em outras produções. Não vejo problema em se utilizar soluções já antes usadas, contudo aqui os acontecimentos são muito previsíveis e pouco convincentes. Foram tentadas análises do universo psicológico dos personagens a fim de justificar seu comportamento porém, infelizmente, achei de um reducionismo pueril. Talvez ficasse melhor se fossem evitados "aprofundamentos" e a história se concentrasse apenas no suspense (há bons filmes assim). Mas parece que seus realizadores quiseram criar uma carga "mais densa".
"Fragmentado" garante seus momentos de tensão no espectador, agradou a muita gente, e isso não deve ser desconsiderado. Mas tinha uma boa premissa para ser um filme bem melhor.
Filme que começa de um jeito que parece comédia mas vai se tornando cada vez mais tarantinesco. Uma espécie de caça ao tesouro sanguinolenta, caricatural (como o personagem de Chris Hemsworth) e por vezes piegas. Não é um tipo de filme do qual devemos esperar muito realismo, melhor se entregar a uma fantasiosa orgia de surpresas, sangue e bizarrices, assim dá pra curtir a trama. Apesar da longa duração, a história de alguns personagens ficou a dever. Ótima fotografia e grandes momentos musicais com Cynthia Erivo.
A versatilidade de Barbra Streisand a fez obter muito sucesso como cantora, atriz de comédias e dramas. Neste "Querem Me Enlouquecer" ela mostra seu talento dramático entremeado de cinismo, com uma incrível expressividade na face. O filme traz subtemas que provavelmente já vimos em muitas outras produções, há inegáveis clichês e elementos que achei exagerados (um juiz teria mesmo tanta paciência com uma ré?) mas achei o tema principal inusitado: uma mulher que recusa uma "solução" mais segura para enfrentar a incerteza de um julgamento bem mais severo. Um "filme de tribunal" dificilmente deixa de prender a atenção do espectador, além do que Dona Barbra sequestra sempre nosso interesse quando aparece em cena. E foi bom rever o Leslie Nielsen em papel oposto aos que o consagraram.
Das tensões de um filme com serial killer às "profundezas" das reflexões verborrágicas sobre os significados da arte na vida humana, a indiferença social ao sofrimento individual, a matança de animais apenas por esporte, etc. Só que, neste segundo caso, não vi nada de extraordinário para surgir portentosamente como uma espécie de "núcleo filosófico" da história. Pra mim o filme foi até mais bem sucedido em mostrar as ações criminosas de seu protagonista do que na exibição de suas elucubrações.
Foi interessante a fomentação da antipatia do espectador pela primeira vítima (e sempre é bom ver a Uma Thurman) ao ponto de "podermos aceitar" seu assassinato.
Vejo "A Casa Que Jack Construiu" como um bom filme do polêmico diretor dinamarquês porém bem distante dos ótimos "Dançando no escuro" e, principalmente, "Dogville".
Em termos de mistério esse filme espanhol é um dos melhores que já vi. Ótimo pra quem gosta de enigmas e, mais do que torcer o nariz para os exageros da história, quer mesmo é assistir a um filme com uma trama que nos obriga a prestar muita atenção o tempo inteiro. O elenco está muito bem e o final traz uma grata surpresa.
E Jordan Peele transitou de simbolismos menos obscuros (em "Corra!") para um contorcionismo de metáforas mais fugidias neste "Nós", um filme que, contraditoriamente, tanto atiçou minha curiosidade quanto me causou enfado. Aliás, é de dualidades que o filme trata (assim me pareceu) com o sangramento (explícito na tela ou invisível) que a divisão acarreta.
“Somos americanos” - uma das principais falas ecoa em certo momento da trama. E "us" é "nós" em inglês e também a abreviação de United States. É o duplo em cada um de nós, nossa "cara limpinha" que mal esconde a diabólica - e sofrida - fera que nunca pode ser completamente anulada. E também é um sintoma manifestado pela paranoica sociedade norte-americana e seu esforço em separar ridiculamente os homens bons dos maus (estamos já carecas de tanto ver isso estampado em toneladas de filmes simploriamente maniqueístas), o Bem contra o Mal, ou o Superhomem contra um psicopata qualquer (como se o "doente" se reduzisse a isto). Um velho modo de acreditar numa superioridade demonizando (e, em certos casos, discriminando, caluniando, torturando e assassinando) os "inferiores", reduzindo-os a inimigos que devem ser odiados e destruídos ("nós somos melhores do que eles"). Ou seja, ações que pelo jeito continuarão ainda por muito tempo. Assim, "Nós" ultrapassa a questão do racismo, abrangendo um universo muito maior.
Jordan Peele optou por descascar as feridas em um filme de terror e suspense, gêneros que geralmente pedem diversão descompromissada e poucas reflexões. Ele acertou? De certo modo sim pois este filme tem levantado discussões e polêmicas. Eu, particularmente, gostaria de ter visto a crítica social mais bem amalgamada às tentativas de causar medo. Mas isso é um ponto de vista muito pessoal. Como destaques no elenco, claro, tem a ótima Lupita Nyong'o, porém fiquei muito impressionado com a participação (infelizmente pequena) da Elisabeth Moss.
O jovem fotógrafo Chris pergunta à namorada branca Rose se os pais dela sabem que ele é negro. E "Corra!" mostra uma de suas caras indicando que o tema do racismo está em pauta.
Vemos bem isso quando entram em cena os pais de Rose, amáveis demais, e que presumimos logo ser uma gentileza fingida.
É muito interessante que "Corra!" exponha esse preconceito disfarçado - e muitas vezes mais abrangente e perigoso - e, assim, poderia ter optado por um drama dos bons abordando um tema sempre atual.
Contudo "Corra!" mergulha nas águas do mistério e do suspense. Não abandona a crítica social (aliás a mancha da escravidão me veio à cabeça diversas vezes enquanto o assistia, e não foi à toa, basta ficar atento aos personagens secundários) porém vai nos conduzindo a uma daquelas histórias mindfuck, que fornece pistas e, ao mesmo tempo, tenta nos deixar com as expressões de medo do personagem do Daniel Kaluuya. Achei criativa, foge de lugares-comuns, de sustos aleatórios e convencionais cachoeiras de sangue. Porém o "casamento" do terror com o drama não me deixou plenamente satisfeito, talvez por causa das "explicações místicas" da trama. Eu teria apreciado mais se o aspecto terror fosse mais centrado na realidade (que, no tema em questão, supera qualquer pesadelo).
"Corra!" é um bom filme? Eu penso que sim, mas não o vejo como excepcional. Daniel Kaluuya transmitiu bem suas dúvidas e medos. Lamentei pelos personagens não terem maior aprofundamento psicológico (por exemplo, Jeremy e Missy Armitage), mas aí o filme poderia se estender por demais. Destaque para Betty Gabriel (a incrível Georgina).
Mais do que o assunto Holocausto e câmaras de gás, "Negação" trata de alterações de fatos históricos para satisfazer desejos pessoais (e este assunto não nos é estranho, aliás, é amedrontador). A necessidade de pertencer a um "grupo superior" (agredindo aos outros grupos) como tentativa ridícula de se sentir importante e elevar a autoestima. E assim caminha a humanidade, preferindo repetir seus erros a ter que aprender com eles.
O filme "Negação" é necessário. Sempre. Costumo gostar de "filmes de tribunal" e este trata de uma polêmica que insiste em se perpetuar. Em alguns momentos me pareceu estar assistindo a um documentário. Achei Timothy Spall excelente na pele do maquiavélico David Irving, e gostei da atuação do elenco em geral. Em relação a Rachel Weisz penso que sua interpretação seria nota 10 se ela tivesse um pouco mais de tempo para se preparar para vestir a pele de sua personagem. E algumas "falas catárticas" me pareceram destoar da sisudez da história. Mas nada que estragasse um filme que merece ser visto e discutido sempre mais e mais.
Adaptado de um livro que, por sua vez, foi inspirado em um sequestro real, "A Fortaleza" é um surpreendente filme australiano dos anos 80 que cumpre sua proposta de terror e aventura (e também é um coming of age) e que, se fosse produzido atualmente, dificilmente poderia exercitar certos atrevimentos, como a carga erótica vista em algumas cenas e uma relatividade moralista diferente das simplificações toscas dos nossos dias. Achei o final ótimo. A história possui algumas obviedades, os vilões não são bem explorados e o elenco mirim nem sempre convence, porém o filme mantém um ótimo ritmo se saindo muito bem na criação de uma tensão crescente. Gostei muito de ter assistido.
"As Fábulas Negras" é um filme que deve ser bem-vindo por ser mais uma tentativa de dar fôlego a um gênero que, inexplicavelmente, foi tão pouco explorado nas terras tupiniquins. Porém achei que o filme, apesar de algumas qualidades, deixou a desejar. Vi como positivo a "simplicidade" da produção que lembrou os antigos filmes gore, com muito sangue e a presença da sexualidade (atrevida ou reprimida). Ainda bem que não tentaram enfiar no filme recursos tecnológicos que o tornariam artificial, asséptico, descaracterizando-o. Assim, o filme pode exibir um clima mais condizente com os assuntos tratados.
Porém as histórias em si, mesmo com alguns bons momentos, pouco me cativaram. Achei-as pouco criativas, apressadas (em vez de cinco episódios poderiam ser três mais bem desenvolvidos) e econômicas no quesito "provocar tensão crescente". Em “O Monstro do Esgoto” há até uma interessante sátira aos políticos ambiciosos e desumanos (e este é um "terror brasileiro" bem real em qualquer época da nossa história). O episódio do lobisomem (um monstro bem popular) prometia mas achei o "mistério" bem previsível. Não me agradei de “O Saci” (mesmo tendo uma necessária crítica ao imbecil e perigoso fanatismo religioso tão presente em nossos dias, o personagem em questão é importante demais para ser tão pouco valorizado). E não sei porque incluíram a lenda urbana “A Loira do Banheiro”, já que o Brasil é um manancial de personagens folclóricos mais tradicionais (a mula sem cabeça, o boitatá, o boto, o curupira e outros). E “A Casa de Iara”, história de vingança, funcionou como um clipe.
Porém o que me desagradou mais foram as atuações fracas do elenco. Em nenhum momento os atores me ajudaram a imergir nas histórias pois mostravam uma dramaticidade nas falas que beiravam ao ridículo. E não consegui sentir nenhuma empatia pelos "garotos contadores das histórias" (na verdade, achei-os irritantes e sua presença foi desnecessária).
Como tentativa de dinamizar o gênero terror no Brasil, "As fábulas negras" tenta cumprir seu papel, e isso é louvável. Contudo lamento por nosso riquíssimo folclore não ter sido bem melhor aproveitado.
Excelentes filmes de terror são realmente raros mas, para quem curte esse gênero, mesmo um filme que não é lá grande coisa traz alguma diversão em forma de medo. Por isso certamente esse "Lobos" tem seus admiradores. Um filme que tenta agradar ao público mais jovem, com cenas de ação e lutas (em alguns momentos até me pareceu uma história de artes marciais) e que não tem pudores em abusar de clichês já tão abusados em obras semelhantes. Há aqueles momentos em que alguém explica mistérios do passado, há um romance improvisado entre jovens, há bobagens ditas com voz dramática, etc, tudo regado a uma dicotomia moralista rasa (afinal, o público "precisava" ter empatia pelos protagonistas). Não chega a ser um "filme de sustos", tentaram criar uma história com reviravolta porém, pra mim, "Lobos" não funcionou bem nem como diversão descompromissada.
O silêncio é um personagem nesse drama/thriller de John Krasinski e a linguagem gestual dos participantes da trama nos faz sentir uma estranheza diante daquela micro-sociedade. Há tensão em algumas cenas e o espectador pode até ter a sensação de que não deve fazer barulho para se solidarizar com aquela família à beira do desespero. Isso o filme consegue transmitir bem. Quanto à história em si (econômica em explicar certos porquês, mas isso não atrapalha seu desfrute), achei-a interessante mas não arrebatadora.
Talvez ficasse melhor se o "monstro" fosse mais insinuado do que mostrado, ou se as relações familiares recebessem um tratamento mais detalhado.
E a tentativa de fusão entre drama e thriller (provavelmente para seduzir um público mais amplo) pode resultar em uma costura mal feita se for realizada por mãos não muito hábeis. Não achei "Um Lugar Silencioso" um grande filme, e sim uma experiência razoável com seus pontos altos e baixos.
Animação com traços e cores que transmitem agilidade e leveza num filme que certamente agradaria a muitas crianças. Também possui algo de nostálgico e bucólico que pode cativar gente de qualquer idade. Quanto às histórias gostei bem mais da primeira pois acerta melhor no aspecto diversão e riso. A segunda (que trabalha o tema redenção) também é boa porém achei mais longa do que é necessário. A terceira, para mim, ficou a desejar. Mas acredito que o aspecto mais negativo do filme tenha sido as tentativas de provocar enternecimento em quem o assiste, nesse ponto vi uma simplificação pouco criativa. Mas o saldo final foi positivo.
Difícil ter contato com o universo de Agatha Christie e não gostar pelo menos um pouco. Nesta versão cinematográfica do famoso romance "Assassinato no Expresso do Oriente", o clima da história vai da puerilidade (na "apresentação" simplista do detetive Hercule Poirot) à angústia claustrofóbica (prejudicada provavelmente pelas "agitações" para dar uma sacudida na sequência da trama). Imagino que Kenneth Branagh tinha em mente o público atual com sua "necessidade" de ver momentos de ação e lutas. Só que, no contexto em que isso foi apresentado, esses momentos me pareceram um enfeite inadequado numa árvore de Natal que dispensaria essas coisas.
Kenneth Branagh cria um Poirot por vezes impetuoso (é um direito dele mas achei bastante estranho) e com um dilema moral que merecia um tratamento mais cuidadoso. O elenco é salpicado de grandes talentos (Judi Dench, Michelle Pfeiffer, Willem Dafoe e outros) que mostraram pouco de sua força porque, obviamente, a trama não poderia se dar ao luxo de se fixar em demasia em algum personagem. Mas sempre é bom ver grandes atores juntos. As imagens do trem visto como algo frágil em meio a toda aquela neve são belíssimas porém eu as senti mais como um contraponto forçado do que como uma transição enriquecedora.
"Assassinato do Expresso do Oriente" possui méritos, logicamente. Histórias como essa sempre valem a pena ser vistas. Contudo, essa adaptação me causou a impressão de um trem que não desliza com naturalidade sobre seus trilhos.
Mais do que o crocodilo, o grande vilão é uma piscina... vazia. Pois é, quando se quer qualquer coisa pode render um filme. "The pool" estende-se além da conta, tem personagens com atitudes não muito sábias, situações pra lá de forçadas, mas consegue muito bem criar um clima angustiante envolvendo a luta pela sobrevivência e o desespero diante do fracasso das ações para se livrar daquele terror. Alguns momentos são incrivelmente tensos e me fizeram imaginar naquele inferno sem fogo. O final não me agradou tanto
Dunkirk
3.8 2,0K Assista AgoraE Christopher Nolan nos deu um ótimo filme de guerra, diferente dos convencionais. Não há grandes protagonistas, heróis ou vilões, embora no elenco haja nomes conhecidos (Cillian Murphy, Kenneth Branagh), mas sim vários personagens que em algum momento se destacam, além de uma multidão que se destaca sempre. A história é de uma fuga de soldados aliados sob bombardeios alemães, mais precisamente a "Retirada de Dunquerque", um dos episódios mais tensos e comoventes da Segunda Guerra Mundial e que rendeu a frase de Churchill "Nunca antes no campo dos conflitos humanos, tantos deveram tanto a tão poucos." É provável que esse tipo de narrativa (sem figuras incontestavelmente centrais e situações que só aos poucos passam a se completar) seja rejeitada por espectadores que preferem uma trama mais "convencional" (e eu entendo perfeitamente). Quanto a mim, consegui me envolver com a dinâmica do filme, a bela fotografia, os momentos de suspense e o desespero de jovens jogados ao "tudo ou nada". Há várias cenas memoráveis. E o caminho entre a vida e a morte nunca pareceu tão curto.
Adoráveis Mulheres
4.0 975 Assista AgoraPara quem não leu o romance no qual o filme se baseia ou mesmo assistiu versões cinematográficas anteriores da história, "Adoráveis mulheres" pode parecer confuso, ainda mais porque a trama não é linear. Aliás, são várias tramas envolvendo irmãs que se amam mas tem suas crises pessoais envolvendo dilemas como a escolha entre estabilidade financeira, vocação profissional ou investimento em relação amorosa. Desse modo a história, que faz menção à guerra civil americana, revela que as lutas e dissabores enfrentados pelas mulheres de outrora (sem dúvida mais amargos) ainda são fantasmas na vida das mulheres de agora.
Visualmente "Adoráveis Mulheres" me pareceu impecável em sua fotografia, cenários e figurinos. E há uma agilidade na narrativa que vi como uma faca de dois gumes: se, por um lado, pode provocar empatia nos amantes da velocidade, ao mostrar personagens que muitas vezes agem como se estivessem atrasados para a prova do enem, por outro lado esse ritmo pode comprometer ainda mais o entendimento da(s) história(s). E eu, mesmo reconhecendo a grande dedicação da Greta Gerwig ao dar personalidade à sua obra (e foi bem sucedida), não consegui apreciar o filme por inteiro. E a extraordinária Meryl Streep pra mim ficou a dever.
Jojo Rabbit
4.2 1,6K Assista AgoraAdaptado do romance de Christine Leunens, "Jojo Rabbit" é mais um filme que nos leva diretamente às insanidades da Alemanha nazista próxima do final da Segunda Guerra. Acontece que o filme não segue a linha do ótimo e pesado drama "A Queda! As últimas horas de Hitler", optando pelo humor e deboche a contrastarem com momentos de dor e pânico, tendo como protagonista um menino que passará por um angustiante amadurecimento. Aliás, palmas para o ator mirim Roman Griffin Davis e sua atuação intensa e supercarismática. E aí vem a ironia: o pequeno ator dá vida a um garoto fanático pelas ideias nazistas, pertencente à Juventude Hitlerista, vítima de lavagem e "ensaboagem" cerebral e treinado para odiar e matar judeus. Mesmo assim é um personagem que nos encanta pois também mostra fragilidade, ingenuidade, desconhecimento de fatos e um coração sensível revelado durante a trama. MAS... há muitos cachorros doidos adultos que também começaram assim.
Scarlett Johansson, como a mãe de Jojo, plenamente consciente da estupidez que assolava seu país, tem uma participação memorável, encarnando aquele tipo de pessoa que tanto desejaríamos conhecer. Também não posso deixar de mencionar outro atorzinho promissor, Archie Yates, o York, com uma simpatia fenomenal (até desejei vê-lo no papel de protagonista). O que me deixou um tanto cabreiro foi o personagem do Hitler como o amigo imaginário de Jojo. Entendo que o líder nazista tinha que parecer patético, caricatural, afinal era produto da imaginação de um menino. Porém, em nenhum momento, achei que Taiki Waititi (que também dirige o filme) conseguiu criar um personagem com o peso que deveria ter na história. Se fosse um dos grandes atores da atualidade...
Gostei muito de assistir "Jojo Rabbit". Não vejo como obra-prima, possui suas irregularidades, mas é do tipo que dificilmente se esquece. Além do que é mais do que necessário em um mundo que não se cansa de regredir à barbárie.
História de um Casamento
4.0 1,9K Assista AgoraLembrei do universo do Woody Allen diversas vezes ao assistir este filme: pessoas intelectualizadas, "civilizadas", ligadas ao meio artístico, às voltas com seus fracassos amorosos e, principalmente, consigo mesmas. "História de um casamento" usa um humor entre o leve e o cáustico como contraponto para suas passagens "mais pesadas" sobre a elaboração de um luto matrimonial em que cada parte envolvida vai ao inferno e tenta retornar de lá, não sem profundas feridas no amor próprio. E é nesses momentos de conflito e dor que o filme me pareceu mais autêntico pois os momentos mais cômicos, apesar de reforçarem o desejo do espectador de ir até o fim da jornada, pra mim algumas vezes pareceram como um outro filme sobre a mesma história.
O elenco está afiado, interagindo muito bem. Mesmo assim destaco a excelente performance do Adam Driver, dando uma perfeita caracterização ao seu Charlie, com alterações que vão do perfeccionismo à dependência, da dominação ao desalento... A dor e confusão do personagem são quase palpáveis e me fizeram esquecer completamente que eu estava diante de um filme, tal a forma como ele agoniza diante da brusca mudança.
Bom filme.
Frozen: Uma Aventura Congelante
3.9 3,0K Assista Agora"Frozen" é uma animação baseada no conto "A Rainha da Neve" de Hans Christian Andersen. O esmero na computação gráfica, certamente, contribui para a histórica qualidade visual das produções Disney, porém mesmo assim não achei que esta animação supera em beleza visual alguns clássicos antigos e mais "artesanais".
A história prende a atenção mas não chega a ser tão empolgante como aquelas que fizeram pessoas de qualquer idade soluçar no cinema ou roer as unhas de ansiedade. Foi bom ver que as protagonistas são duas irmãs e o aspecto romance tenha ficado em segundo plano. Contudo não achei nenhum personagem com força suficiente para promover um envolvimento emocional mais intenso do espectador. Nem há um daqueles vilões da Disney que se sobressaíram tanto que se tornaram ícones (como Malévola, a Rainha Má, Scar ou o fantástico Capitão Gancho).
Há um personagem tipo "lobo em pele de cordeiro" porém, quando se revela, é muito pouco desenvolvido em termos dramáticos.
As tentativas de fazer humor não renderam momentos impagáveis. Os Trolls, a rena Sven e o boneco de neve Olaf, como "alívios cômicos", mostram-se interessantes/engraçadinhos, mas estão longe de rivalizar com personagens secundários de outras animações que "roubaram a cena" dos protagonistas.
"Frozen" é legal de se assistir, garante diversão. Mas me deixou com saudades das incríveis e inesquecíveis animações da Disney que sacolejaram a alma de crianças dos 5 aos 80 anos.
A Casa Torta
3.3 70 Assista AgoraFaz tempo que li o livro que serviu de adaptação a este filme mas lembro que gostei muito da resolução do mistério. Quanto ao filme me pareceu que fizeram questão em caprichar na suntuosidade dos cenários (e realmente são de encher os olhos) e na escalação do elenco. Contudo o filme para mim teve falhas ao mostrar o ir e vir de vários personagens (com seus problemas particulares rapidamente expostos) e que deixavam no ar aquela sensação de que aquele ator ou atriz poderia render muito mais além de proferir frases afetadas. "A casa torta" exigiu do espectador, além da vocação detetivesca, uma boa memória pra não esquecer "quem é quem" naquele xadrez familiar doentio.
Uma história da "dama do crime" sem sua maior criação, Hercule Poirot, precisaria de substitutos suficientemente interessantes com os quais o espectador se apegasse. E "A casa torta" (pelo menos essa foi minha constatação) perde-se em subtramas que mais confundem o espectador por sua própria existência do que o instigam a desvendar o mistério. E há um "personagem crucial" na história (mal representado) que mostra a que veio cedo demais.
Como ponto muito positivo vi a reta final da história, mostrada de modo muito bom e eletrizante. E também (é claro!), a excelente presença da veterana Glenn Close que eleva a qualidade de qualquer filme.
Entre Facas e Segredos
4.0 1,5K Assista AgoraNão deixa de ser curioso assistir a uma trama estilo Agatha Christie fazer diversas menções à internet, instagram, emails... para reforçar a atualidade da história. Como também instalar (às vezes um tanto forçadamente) questões sempre efervescentes como a imigração, o racismo e o eterno fantasma do nazismo. Contudo a história é verdadeiramente mais uma daquelas "quem é o assassino?", com suspeitas que se revezam entre os parentes do defunto. Se não tem o brilho das melhores histórias da "dama do crime" também não compromete, fazendo o espectador ter ansiedade pra desvendar o enigma.
Infelizmente, como geralmente acontece em histórias assim, vários personagens são apresentados apressadamente, quase caricaturas, sem dar tempo ao espectador para criar empatias (não achei o personagem de Daniel Craig absolutamente marcante). E lamentei muito porque a ótima atriz Jamie Lee Curtis não foi mais explorada. Mas, no geral, achei o saldo positivo.
Rastros de um Sequestro
3.8 563 Assista AgoraMais um (bom) filme sul-coreano com plot twists que fazem de nossos neurônios gato e sapato. Quase sempre ágil, fluido, tenso, sem excessos de violência (que aqui foi uma virtude pois o que predomina é o mistério) e que apresenta e desconstrói personagens só pra duvidarmos de nossas certezas. Um daqueles filmes em que a maior parte do tempo nos perguntamos: "afinal, que p... é que tá acontecendo?" Entretenimento e unhas roídas garantidos.
Sombras da Vida
3.8 1,3K Assista AgoraExistimos quando o Outro reconhece nossa existência.
Um marido que não tem outra alternativa a não ser contemplar sua esposa se reconstruindo enquanto ele já não sabe o que fazer de si mesmo. Dor, solidão e angústia na vida de um... fantasma tão ligado ao que tinha em vida que não consegue se desapegar e "dar a volta por cima". Do riso que inicialmente pode nos contagiar ao ver um "fantasma de lençol" (tal como imaginávamos na infância) à surpresa e tristeza de observar aquele ser desesperado por reconhecimento e resgate do passado.
A esposa enlutada que vai descobrindo nova vontade de viver me fez lembrar do ótimo "A liberdade é azul" de Kieslowski. Porém o que realmente perturba é a "teimosia" do nosso protagonista em negar a grande perda que sofreu. E isso nos remete diretamente às nossas próprias perdas e a dificuldade em superá-las. Quanta gente há no mundo que se recusa a aceitar que determinada fase da vida acabou e jamais retornará ?
"A Ghost Story" é um filme bem lento, até causa desconforto por isso. E é um belo retrato das contradições humanas, do medo do novo, da insistência no passado, da busca por respostas, da rapidez e fragilidade da existência...
A certa altura da história aparece o fantasma de uma mulher. Porém esta não servirá como companheira do fantasma sofredor (este filme não tem vocações hollywoodianas) pois já carrega sua própria dor. O momento em que ela descobre que sua espera é inútil é uma das cenas mais dolorosas do filme.
É alentador constatar que, para transmitir sua mensagem, um bom filme não necessita de pirotecnias nem efeitos especiais de última geração. Basta honestidade e boa vontade do espectador em mergulhar na amarga fantasia.
Fragmentado
3.9 2,9K Assista AgoraEsse filme é tão badalado que não pude evitar de começar a assisti-lo com boas expectativas. Ao término achei-o superestimado. Pra mim funcionou como cinema-diversão, criando certa dose de ansiedade diante das ações de seu protagonista (por sinal, o ator James McAvoy tem uma performance bem interessante) porém não mais que isso. O roteiro me pareceu frágil, guiando-se através de situações exaustivamente usadas em outras produções. Não vejo problema em se utilizar soluções já antes usadas, contudo aqui os acontecimentos são muito previsíveis e pouco convincentes. Foram tentadas análises do universo psicológico dos personagens a fim de justificar seu comportamento porém, infelizmente, achei de um reducionismo pueril. Talvez ficasse melhor se fossem evitados "aprofundamentos" e a história se concentrasse apenas no suspense (há bons filmes assim). Mas parece que seus realizadores quiseram criar uma carga "mais densa".
"Fragmentado" garante seus momentos de tensão no espectador, agradou a muita gente, e isso não deve ser desconsiderado. Mas tinha uma boa premissa para ser um filme bem melhor.
Maus Momentos no Hotel Royale
3.6 339 Assista AgoraFilme que começa de um jeito que parece comédia mas vai se tornando cada vez mais tarantinesco. Uma espécie de caça ao tesouro sanguinolenta, caricatural (como o personagem de Chris Hemsworth) e por vezes piegas. Não é um tipo de filme do qual devemos esperar muito realismo, melhor se entregar a uma fantasiosa orgia de surpresas, sangue e bizarrices, assim dá pra curtir a trama. Apesar da longa duração, a história de alguns personagens ficou a dever. Ótima fotografia e grandes momentos musicais com Cynthia Erivo.
Querem Me Enlouquecer
3.7 26 Assista AgoraA versatilidade de Barbra Streisand a fez obter muito sucesso como cantora, atriz de comédias e dramas. Neste "Querem Me Enlouquecer" ela mostra seu talento dramático entremeado de cinismo, com uma incrível expressividade na face. O filme traz subtemas que provavelmente já vimos em muitas outras produções, há inegáveis clichês e elementos que achei exagerados (um juiz teria mesmo tanta paciência com uma ré?) mas achei o tema principal inusitado: uma mulher que recusa uma "solução" mais segura para enfrentar a incerteza de um julgamento bem mais severo. Um "filme de tribunal" dificilmente deixa de prender a atenção do espectador, além do que Dona Barbra sequestra sempre nosso interesse quando aparece em cena. E foi bom rever o Leslie Nielsen em papel oposto aos que o consagraram.
A Casa Que Jack Construiu
3.5 788 Assista AgoraDas tensões de um filme com serial killer às "profundezas" das reflexões verborrágicas sobre os significados da arte na vida humana, a indiferença social ao sofrimento individual, a matança de animais apenas por esporte, etc. Só que, neste segundo caso, não vi nada de extraordinário para surgir portentosamente como uma espécie de "núcleo filosófico" da história. Pra mim o filme foi até mais bem sucedido em mostrar as ações criminosas de seu protagonista do que na exibição de suas elucubrações.
Foi interessante a fomentação da antipatia do espectador pela primeira vítima (e sempre é bom ver a Uma Thurman) ao ponto de "podermos aceitar" seu assassinato.
Vejo "A Casa Que Jack Construiu" como um bom filme do polêmico diretor dinamarquês porém bem distante dos ótimos "Dançando no escuro" e, principalmente, "Dogville".
Um Contratempo
4.2 2,0KEm termos de mistério esse filme espanhol é um dos melhores que já vi. Ótimo pra quem gosta de enigmas e, mais do que torcer o nariz para os exageros da história, quer mesmo é assistir a um filme com uma trama que nos obriga a prestar muita atenção o tempo inteiro. O elenco está muito bem e o final traz uma grata surpresa.
Nós
3.8 2,3K Assista AgoraE Jordan Peele transitou de simbolismos menos obscuros (em "Corra!") para um contorcionismo de metáforas mais fugidias neste "Nós", um filme que, contraditoriamente, tanto atiçou minha curiosidade quanto me causou enfado. Aliás, é de dualidades que o filme trata (assim me pareceu) com o sangramento (explícito na tela ou invisível) que a divisão acarreta.
“Somos americanos” - uma das principais falas ecoa em certo momento da trama. E "us" é "nós" em inglês e também a abreviação de United States. É o duplo em cada um de nós, nossa "cara limpinha" que mal esconde a diabólica - e sofrida - fera que nunca pode ser completamente anulada. E também é um sintoma manifestado pela paranoica sociedade norte-americana e seu esforço em separar ridiculamente os homens bons dos maus (estamos já carecas de tanto ver isso estampado em toneladas de filmes simploriamente maniqueístas), o Bem contra o Mal, ou o Superhomem contra um psicopata qualquer (como se o "doente" se reduzisse a isto). Um velho modo de acreditar numa superioridade demonizando (e, em certos casos, discriminando, caluniando, torturando e assassinando) os "inferiores", reduzindo-os a inimigos que devem ser odiados e destruídos ("nós somos melhores do que eles"). Ou seja, ações que pelo jeito continuarão ainda por muito tempo. Assim, "Nós" ultrapassa a questão do racismo, abrangendo um universo muito maior.
Jordan Peele optou por descascar as feridas em um filme de terror e suspense, gêneros que geralmente pedem diversão descompromissada e poucas reflexões. Ele acertou? De certo modo sim pois este filme tem levantado discussões e polêmicas. Eu, particularmente, gostaria de ter visto a crítica social mais bem amalgamada às tentativas de causar medo. Mas isso é um ponto de vista muito pessoal. Como destaques no elenco, claro, tem a ótima Lupita Nyong'o, porém fiquei muito impressionado com a participação (infelizmente pequena) da Elisabeth Moss.
Corra!
4.2 3,6K Assista AgoraO jovem fotógrafo Chris pergunta à namorada branca Rose se os pais dela sabem que ele é negro. E "Corra!" mostra uma de suas caras indicando que o tema do racismo está em pauta.
Vemos bem isso quando entram em cena os pais de Rose, amáveis demais, e que presumimos logo ser uma gentileza fingida.
Contudo "Corra!" mergulha nas águas do mistério e do suspense. Não abandona a crítica social (aliás a mancha da escravidão me veio à cabeça diversas vezes enquanto o assistia, e não foi à toa, basta ficar atento aos personagens secundários) porém vai nos conduzindo a uma daquelas histórias mindfuck, que fornece pistas e, ao mesmo tempo, tenta nos deixar com as expressões de medo do personagem do Daniel Kaluuya. Achei criativa, foge de lugares-comuns, de sustos aleatórios e convencionais cachoeiras de sangue. Porém o "casamento" do terror com o drama não me deixou plenamente satisfeito, talvez por causa das "explicações místicas" da trama. Eu teria apreciado mais se o aspecto terror fosse mais centrado na realidade (que, no tema em questão, supera qualquer pesadelo).
"Corra!" é um bom filme? Eu penso que sim, mas não o vejo como excepcional. Daniel Kaluuya transmitiu bem suas dúvidas e medos. Lamentei pelos personagens não terem maior aprofundamento psicológico (por exemplo, Jeremy e Missy Armitage), mas aí o filme poderia se estender por demais. Destaque para Betty Gabriel (a incrível Georgina).
Negação
3.8 132 Assista AgoraMais do que o assunto Holocausto e câmaras de gás, "Negação" trata de alterações de fatos históricos para satisfazer desejos pessoais (e este assunto não nos é estranho, aliás, é amedrontador). A necessidade de pertencer a um "grupo superior" (agredindo aos outros grupos) como tentativa ridícula de se sentir importante e elevar a autoestima. E assim caminha a humanidade, preferindo repetir seus erros a ter que aprender com eles.
O filme "Negação" é necessário. Sempre. Costumo gostar de "filmes de tribunal" e este trata de uma polêmica que insiste em se perpetuar. Em alguns momentos me pareceu estar assistindo a um documentário. Achei Timothy Spall excelente na pele do maquiavélico David Irving, e gostei da atuação do elenco em geral. Em relação a Rachel Weisz penso que sua interpretação seria nota 10 se ela tivesse um pouco mais de tempo para se preparar para vestir a pele de sua personagem. E algumas "falas catárticas" me pareceram destoar da sisudez da história. Mas nada que estragasse um filme que merece ser visto e discutido sempre mais e mais.
A Fortaleza
3.8 424Adaptado de um livro que, por sua vez, foi inspirado em um sequestro real, "A Fortaleza" é um surpreendente filme australiano dos anos 80 que cumpre sua proposta de terror e aventura (e também é um coming of age) e que, se fosse produzido atualmente, dificilmente poderia exercitar certos atrevimentos, como a carga erótica vista em algumas cenas e uma relatividade moralista diferente das simplificações toscas dos nossos dias. Achei o final ótimo. A história possui algumas obviedades, os vilões não são bem explorados e o elenco mirim nem sempre convence, porém o filme mantém um ótimo ritmo se saindo muito bem na criação de uma tensão crescente. Gostei muito de ter assistido.
As Fábulas Negras
3.4 60 Assista Agora"As Fábulas Negras" é um filme que deve ser bem-vindo por ser mais uma tentativa de dar fôlego a um gênero que, inexplicavelmente, foi tão pouco explorado nas terras tupiniquins. Porém achei que o filme, apesar de algumas qualidades, deixou a desejar. Vi como positivo a "simplicidade" da produção que lembrou os antigos filmes gore, com muito sangue e a presença da sexualidade (atrevida ou reprimida). Ainda bem que não tentaram enfiar no filme recursos tecnológicos que o tornariam artificial, asséptico, descaracterizando-o. Assim, o filme pode exibir um clima mais condizente com os assuntos tratados.
Porém as histórias em si, mesmo com alguns bons momentos, pouco me cativaram. Achei-as pouco criativas, apressadas (em vez de cinco episódios poderiam ser três mais bem desenvolvidos) e econômicas no quesito "provocar tensão crescente". Em “O Monstro do Esgoto” há até uma interessante sátira aos políticos ambiciosos e desumanos (e este é um "terror brasileiro" bem real em qualquer época da nossa história). O episódio do lobisomem (um monstro bem popular) prometia mas achei o "mistério" bem previsível. Não me agradei de “O Saci” (mesmo tendo uma necessária crítica ao imbecil e perigoso fanatismo religioso tão presente em nossos dias, o personagem em questão é importante demais para ser tão pouco valorizado). E não sei porque incluíram a lenda urbana “A Loira do Banheiro”, já que o Brasil é um manancial de personagens folclóricos mais tradicionais (a mula sem cabeça, o boitatá, o boto, o curupira e outros). E “A Casa de Iara”, história de vingança, funcionou como um clipe.
Porém o que me desagradou mais foram as atuações fracas do elenco. Em nenhum momento os atores me ajudaram a imergir nas histórias pois mostravam uma dramaticidade nas falas que beiravam ao ridículo. E não consegui sentir nenhuma empatia pelos "garotos contadores das histórias" (na verdade, achei-os irritantes e sua presença foi desnecessária).
Como tentativa de dinamizar o gênero terror no Brasil, "As fábulas negras" tenta cumprir seu papel, e isso é louvável. Contudo lamento por nosso riquíssimo folclore não ter sido bem melhor aproveitado.
Lobos
2.3 111Excelentes filmes de terror são realmente raros mas, para quem curte esse gênero, mesmo um filme que não é lá grande coisa traz alguma diversão em forma de medo. Por isso certamente esse "Lobos" tem seus admiradores. Um filme que tenta agradar ao público mais jovem, com cenas de ação e lutas (em alguns momentos até me pareceu uma história de artes marciais) e que não tem pudores em abusar de clichês já tão abusados em obras semelhantes. Há aqueles momentos em que alguém explica mistérios do passado, há um romance improvisado entre jovens, há bobagens ditas com voz dramática, etc, tudo regado a uma dicotomia moralista rasa (afinal, o público "precisava" ter empatia pelos protagonistas). Não chega a ser um "filme de sustos", tentaram criar uma história com reviravolta porém, pra mim, "Lobos" não funcionou bem nem como diversão descompromissada.
Um Lugar Silencioso
4.0 3,0K Assista AgoraO silêncio é um personagem nesse drama/thriller de John Krasinski e a linguagem gestual dos participantes da trama nos faz sentir uma estranheza diante daquela micro-sociedade. Há tensão em algumas cenas e o espectador pode até ter a sensação de que não deve fazer barulho para se solidarizar com aquela família à beira do desespero. Isso o filme consegue transmitir bem. Quanto à história em si (econômica em explicar certos porquês, mas isso não atrapalha seu desfrute), achei-a interessante mas não arrebatadora.
Talvez ficasse melhor se o "monstro" fosse mais insinuado do que mostrado, ou se as relações familiares recebessem um tratamento mais detalhado.
A Raposa Má
3.8 23Animação com traços e cores que transmitem agilidade e leveza num filme que certamente agradaria a muitas crianças. Também possui algo de nostálgico e bucólico que pode cativar gente de qualquer idade. Quanto às histórias gostei bem mais da primeira pois acerta melhor no aspecto diversão e riso. A segunda (que trabalha o tema redenção) também é boa porém achei mais longa do que é necessário. A terceira, para mim, ficou a desejar. Mas acredito que o aspecto mais negativo do filme tenha sido as tentativas de provocar enternecimento em quem o assiste, nesse ponto vi uma simplificação pouco criativa. Mas o saldo final foi positivo.
Assassinato no Expresso do Oriente
3.4 938 Assista AgoraDifícil ter contato com o universo de Agatha Christie e não gostar pelo menos um pouco. Nesta versão cinematográfica do famoso romance "Assassinato no Expresso do Oriente", o clima da história vai da puerilidade (na "apresentação" simplista do detetive Hercule Poirot) à angústia claustrofóbica (prejudicada provavelmente pelas "agitações" para dar uma sacudida na sequência da trama). Imagino que Kenneth Branagh tinha em mente o público atual com sua "necessidade" de ver momentos de ação e lutas. Só que, no contexto em que isso foi apresentado, esses momentos me pareceram um enfeite inadequado numa árvore de Natal que dispensaria essas coisas.
Kenneth Branagh cria um Poirot por vezes impetuoso (é um direito dele mas achei bastante estranho) e com um dilema moral que merecia um tratamento mais cuidadoso. O elenco é salpicado de grandes talentos (Judi Dench, Michelle Pfeiffer, Willem Dafoe e outros) que mostraram pouco de sua força porque, obviamente, a trama não poderia se dar ao luxo de se fixar em demasia em algum personagem. Mas sempre é bom ver grandes atores juntos. As imagens do trem visto como algo frágil em meio a toda aquela neve são belíssimas porém eu as senti mais como um contraponto forçado do que como uma transição enriquecedora.
"Assassinato do Expresso do Oriente" possui méritos, logicamente. Histórias como essa sempre valem a pena ser vistas. Contudo, essa adaptação me causou a impressão de um trem que não desliza com naturalidade sobre seus trilhos.
A Piscina
2.3 132Mais do que o crocodilo, o grande vilão é uma piscina... vazia. Pois é, quando se quer qualquer coisa pode render um filme. "The pool" estende-se além da conta, tem personagens com atitudes não muito sábias, situações pra lá de forçadas, mas consegue muito bem criar um clima angustiante envolvendo a luta pela sobrevivência e o desespero diante do fracasso das ações para se livrar daquele terror. Alguns momentos são incrivelmente tensos e me fizeram imaginar naquele inferno sem fogo. O final não me agradou tanto
(eu acharia melhor sem um happy end)