Já se pode considerar como um clássico por diversos motivos e um deles por dar respeito, dignidade e viabilidade ao povo do sertão. Não apenas o seu povo, mas também seus falares, costumes, anseios, peculiaridades que só- é somente só- atores de fato nordestinos poderiam encarnar. Ou seja, estava mais do que na hora de a Globo colocar atores gabaritados e nascidos no Nordeste (conforme se viu em boa parte do elenco) para estrelar novelas ambientadas lá.
Também destaco, somado a escolha do casting, a atuação de atores como a Titina Medeiros e Welder Rodrigues, responsáveis pelo alívio cômico central de uma trama com uma espinha dorsal pesada, revisitando o coronelismo com sarcasmo. Destaque também para Giovana Cordeiro que fez crescer sua Xaviera, esbanjando talento, sensibilidade, sensualidade e despertando todo tipo de afeto! Ao contrário da ótima construção de Débora Bloch que nos deixava cada vez mais abismados com tamanha maldade e frieza.
E por falar em Deodora, José de Abreu comoveu demais, principalmente no período da depressão de Tertúlio. Torci muito pela recuperação do coronel! E Caio Blat, outro cônjuge da vilã, fez bonito e mostrou como consolidou uma carreira repleta de tipos e arquétipos.
No entanto, os dois grandes nomes dessa novela, ao meu ver, são Enrique Diaz e Sérgio Guizé. O primeiro, ator veterano, conhecido no cinema e no teatro, porém com pouco espaço na tv, passeou por todos os núcleos e gêneros (da comédia ao drama) com uma leveza, esperteza e grandeza. Enrique é um dos nossos maiores atores! E o Guizé interpretou o melhor personagem de sua carreira e tomou pra si de verdade a alcunha de protagonista. A dobradinha com Timbó e o seu par com a também talentosa Isadora Cruz o enriqueceu bastante: personagem cheio de nuances mesmo com pouco apelo popular.
Enfim, já estou com saudades dessa viagem ao sertão todos os dias às 18:30. Como é rico é gostoso o nosso Nordeste! Viva à brasilidade!
Há 20 anos , Sheron Menezes fazia uma empregada doméstica em Celebridade. Fazia parte do núcleo principal, trabalhava na casa de Maria Clara Diniz (Malu Mader) e tinha um caso com Marcos (Márcio Garcia). Era quase uma figurante, assim como os poucos negros daquele núcleo. O de maior destaque, talvez, era o do Sérgio Menezes, vivendo o fotógrafo bem-sucedido e melhor amigo da “musa do verão”. Hoje, em Vai na fé, parece-me que há uma preocupação em mostrar que no subúrbio do Rio de Janeiro sobrevivem pessoas comuns, evangélicos, negros, trabalhadores. Há também personagens pretos em situação privilegiada, como Ben; há o vilão Orfeu, também vivido um ator negro de outros bons trabalhos como em Da cor do pecado - Jonathan Haagensen. As excelentes Kate e sua mãe trazendo um alívio cômico necessário. Jean Paulo Campos, encarando um homossexual em uma relação inter-racial (e quão talentoso ele é também!
Ou seja, a Iara poderia ser além de uma secretária do lar. Sempre pôde! Mas somente 20 anos depois a teledramaturgia brasileira entendeu que o espaço do homem negro e da mulher negra vai além da senzala, da cozinha do patrão e do tráfico no morro: podemos ocupar qualquer lugar!
Mariana Lima, ao meu ver, deveria ter mais visibilidade e respeito no Brasil. Muito já se falou sobre o trabalho da Letícia, mas essa mãe incansável que aquela interpreta é de uma dignidade ímpar. Eu tô pra ver alguém com tamanha carga emocional impressa em cena como Mariana Lima na atualidade. Talvez somente ela e Marjorie Estiano entregam tanto dessa forma que a gente se sufoca.
Tripalium ou Quem diria, Greta foi parar no Ceará.
Uma das melhores produções nos últimos cinco anos. Eu assisti ao texto/produção no teatro e essa adaptação para o cinema foi louvável. Dentro de um contexto de solidão, abandono e múltiplos preconceitos existem três forças: a da sobrevivência vital da trans Daniela; a sobrevivência existencial de Pedro; e a sobrevivência social de Jean. A primeira encontra como evasão os shows na boate. O segundo, em uma personagem quem idolatra: Greta Garbo. O terceiro em Pedro. Os três condenados: à morte, à solidão, à cadeia. O escapismo, pois, é a resolução dos problemas como um poeta romântico do século XIX. Um salve para a direção envolvente com cenas singelas como a da famigerada nudez aos 70 de Pedro (grande Nanini, um dos maiores atores do Brasil- lenda viva!) e do banho que ele dá em Daniela (gigante Denise, atriz pouco requisitada na televisão, pouco falada, porém de uma competência que há muito não se vê numa atriz do porte e gabarito e comprometimento e longevidade, no que tange à carreira, como ela e Regina Braga, por exemplo, a qual fez uma dobradinha impecável na série Alice da HBO).
Logo, “Greta” - com toda licença para explorar o sentido amplo da palavra- é um trabalho de três pontas que se unem: roteiro, direção e produção; Daniela, Pedro e Jean.
Aqui no Brasil precisávamos não só de um filme como esse, assim como que, se tivesse sido feito justiça, a fim de respeitar a memória de quem foi perseguido, torturado e morto pelos militares, quando eles estavam no poder. 1985, por sua vez, toca em uma ferida a qual, mesmo aparentemente não aberta, ainda não está cicatrizada. O excelente texto combinado à direção quase documental, que extrapola a sisudez de uma projeção marcada por um ambiente predominante masculino e violento, emociona em vários trechos como no depoimento dolorido de uma mãe e o veredicto lido ao final pelo promotor seguido da retirada dos lenços das mães da praça de maio. Um globo de ouro não é suficiente para representar a importância da discussão que esse filme evoca.
Pureza é luta, resistência, resiliência… Todo respeito às Purezas desse vasto país que ainda sofre com mazelas como escravidão, trabalho forçado, miséria, exploração etc. As Purezas desta nação , infelizmente, estão morrendo por seus filhos ou lutando para que seja feita justiça pelo desaparecimento e, eventualmente, a morte de sua prole. É uma mistura de tristeza que desemboca na satisfação final. Lindo!
Continuo achando um novelaço! Como sempre, o núcleo principal do JEC sempre é a força-motriz e carrega quase todas as novelas nas costas, bem como suas protagonistas e antagonistas. Só que muito se fala da Donatela e da Flora, principalmente, e eu acho as duas bem interessantes. Só que para mim essa novela é sobre a falta de amor próprio. Isso vai se descortinando, por exemplo, quando, na minha opinião, uma das melhores fases da trama é quando a mocinha na pele de Rosana/Diva vai viver no rancho do Augusto César (e eu já cansei de falar que, ao meu ver, esse é o melhor personagem do Zé Mayer). Ela redescobre as diversas formas de amar: um filho que lhe foi roubado, o marido que nunca teve e uma vida marital com idolatria, a vida que lhe foi ceifada… Eu gosto dessa parte justamente porque é nesse momento que a Donatela encontra-se vulnerável. Sua Rosana é amada, idolatrada por um homem que ela nunca havia visto na vida, porém a ama com uma devoção quase sagrada. Assim como canta a música de James Blunt, ele faz com que Donatela “retorne para casa”, para um seio familiar, o protótipo de família aparentemente desajustada, no entanto feliz: o pai lunático, o filho desajeitado e rejeitado pela mãe… É tudo muito bem delineado!
Eu me rendo e estou novamente apaixonado por A favorita.
Apesar de um exagero na quantidade de minutos da projeção, é um filme que não fica chato. Gostei bastante! Destaco que a Gaga foi bem dirigida, apesar de que a direção pecou no fato de deixar algumas partes corridas quando deveriam ser mais bem desenvolvidas (a sequência do assassinato, por exemplo) e as partes que poderiam ser mais rápidas, ficaram modorrentas e arrastadas (a disputa judicial, que mais parecia pilhéria e a mudança no perfil de Maurizio, um grande babaca!). Com um texto que deu conta de uma trajetória de sucesso de uma mulher por detrás de um homem banana, rivalizando com um personagem excêntrico e estranhamente construído pelo Jared Leto. Por fim, levanto a elegância do figurino e da arquitetura italiana a qual, por si só, já é um charme!
É um filme esquisito, mal dirigido. Sou levado a crer que, pela falta de uma boa direção, Kirsten não rendeu tanto. Se o roteiro fosse mais instigante e a direção fosse por um caminho mais do drama do que do suspense, talvez o filme tivesse rendido mais e melhor. Faltou alma! Faltou coração! Faltou EMOÇÃO. O bacana é que o recorte é bem diferenciado de tudo o que a gente espera quando se trata da história de Diana. Ela realmente é protagonista absoluta do filme, por isso mesmo que a atriz merecia um texto e uma direção mais esmeradas. E, para mim, o ponto alto é a revelação inusitada da funcionária da princesa. A trama poderia ter girado em torno daquilo ali. Seria mais bonito, mais tocante e mais diferenciado.
Filme necessário e, diria, tudo na medida certa. Com boas doses de humor em meio a tanta densidade no roteiro, numa sociedade carregada de racismo, o personagem de Seu Jorge se destaca! Ao passo que Alfie Enoch vai crescendo, costurando aos poucos um personagem cheio de nuances e costurando a tensão necessária para o drama com que o Lázaro nos presenteou. Eu saio com sensação de que precisamos lutar e ir às ruas sim! Medida provisória é motivador, aliás, mostra a urgência de uma revolução em todos os âmbitos sociais.
Uma história bonita e que serve de inspiração a muitos, sem sombra de dúvidas! No entanto, considero que houve muito tempo de projeção até chegar no ápice da carreira das irmãs Williams. Afora isso, é uma trama que vai além de superação de limites, é sobre perseverança, autoestima e combate ao racismo. Em tempo, a luta de Richard era para que as filhas e a família fossem respeitados e tivessem consciência de onde vieram e aonde querem chegar, sem jamais esquecerem suas origens e suas projeções, não perdendo a humildade e a essência. Personagem controverso, Richard pode ser o grande momento para que o Will Smith ganhe todos os prêmios de melhor ator da temporada. Destaco também o trabalho de Aunjanus Ellis, com toda fibra e força de uma mãe presente e também de grande gestora e mantenedora do sonho coletivo dos Williams.
É inegável a qualidade do texto é incontestável o talento e construção que Denzel e Francis fizeram do casal Macbeth. A fotografia também é linda, porém a direção de Coen (aqui em carreira solo), ao meu ver, geralmente, é cansativa e nada dinâmica.
Um filme bastante sensível sobre o entre-lugar do artista de rua/informal e a classe lgbtqi. O pano de fundo sócio-histórico da Ditadura Militar casa bem com toda castração a qual sofria o personagem Fininha. Eu destaco também o romance tórrido, intenso é tão verossimilhante com daquele com Clécio, mostrando que os problemas de um casal gay são análogos a de um casal hétero, pelos quais todos nós estamos sujeitos a passar.
“Ao vencedor, as batatas”. A máxima do humanitismo em Quincas Borba, celebrado romance de Machado de Assis, faz muito sentido aqui, no contexto desse documentário. Em uma Geórgia assolada em miséria e devastada depois da dissolução da URSS, nota-se que quem tem mais batatas, possui mais poder. Não chega a ser assim tão raso e simplista, mas precisamos extrair de um sistema tão complexo algo lúdico - e por que não dizer paradoxal, pois provoca escapismo e reflexão - que resulte em um filme o qual, em poucos minutos, retrata tipos e vivências tão fortemente demarcadas, tão densamente “vivas, vãs, vulcanizadas”.
Drama familiar com dilemas críveis, bem delineados pelo enredo de forma sensível, capaz de promover um relevante merchandising social. Aliás, o grande trunfo da direção foi trabalhar com um elenco de surdos-mudos e mostrar a dificuldade real não só da família em se estabelecer, como também em se adaptar e fazer com que a única componente oralizada não sofra com a falta de traquejo e o preconceito que toda a sociedade perpetra contra a comunidade. O comportamento dos colegas de escola de Ruby, os problemas referentes ao ofício da família e a criação da cooperativa, a cena do dueto de Ruby e Miles no musical apresentado na escola revelam perfeitamente bem a visão que tive supracitada. Para mim, sem sombra de dúvidas, uma das grandes apostas para as premiações e um dos melhores filmes da temporada.
Muitos arrumam um subterfúgio, uma desculpa, uma válvula de escape na bebida e isso pode tornar-se um mal irreversível. Com os professores de Druk não foi diferente, pois cada um deles estava absorto em seus dilemas pessoais, conjugais e profissionais e viram no alcoolismo a união e o refúgio. Em um país como a Dinamarca, essa doença me parece ser uma triste realidade e o longa-metragem estabelece sua crítica de forma bem-humorada e inteligente, mostrando o quão devastador pode ser uma vida mergulhada no álcool.
Excelente reconstituição de uma época sombria e, em meio a tanta tristeza e à falta de esperança, dona Aracy oferecia um alento, como uma luz no fim do túnel, ao possibilitar a essa gente perseguida e oprimida o passaporte para a liberdade. Sobre o elenco, a escolha foi bastante acertada. Sophie, se não me engano, é descendente próximo de germânicos/austríacos. Ela soube imprimir a resiliência e a força necessárias para dar verossimilhança a uma mulher de fibra e ao mesmo tempo tão sensível e cheia de empatia. Ela foi mãe não só de Eduardo: sua maternidade acolhia as prostitutas, os degenerados, os refugiados e os semitas desesperados pela salvação. Destaco também a ficcionalização do personagem célebre da história da nossa literatura: o grandioso João Guimarães Rosa. Importante mostrar essa outra face da biografia dele, quem, além de escritor fundamental das nossas letras, foi um diplomata importante na Alemanha na gestão nazista de Hitler. Lombardi deu o tom certo para a seriedade do cargo que possuía sem abrir mão da generosidade peculiar do povo brasileiro naquele ambiente hostil. E o intérprete do coronel Zumkle foi impecável em sua construção. Vimos nele a representação de tudo o que abominamos: o egoísmo, o assédio moral e sexual e a personificação do totalitarismo maléfico e assombroso.
O talento de MJ Rodriguez precisa de mais espaço e visibilidade. Andrew Garfield mostrou o quão é versátil e que vai muito além de um ator de filmes blockbuster. O roteiro é bom e bem dirigido, inclusive a parte dos musicais. Porém, essa última parte foi a que menos me cativou.
Uma contundente crítica ao negacionismo científico. Nada mais atual que isso, mais incisivo e objetivo impossível! As mais de duas horas de duração não são necessárias. Tudo poderia ser resolvido em 1 hora e meia. E, para finalizar, a cena do senhor atirando para o alto, como se fosse conter o meteoro, é emblemática. Inclusive, acho que é o símbolo do totalitarismo contemporâneo.
É um filme que demora a ganhar forma e, talvez, por isso, as duas horas de projeção foram muito mal aproveitadas. Acho que as partes obscenas (fora de cena) dizem muito mais do que as que são mostradas nas divisões em atos. Ainda assim, vale a pena pela excelente atuação de Kirsten Dunst em um tipo perturbado e assombrada pelo suicídio do marido, trazendo o medo de perder seu único filho e acometida pelo alcoolismo. A construção dúbia do personagem Phil também merece destaque para o bom trabalho de Cumberbatch. De resto, mais do mesmo.
Mar do Sertão
3.9 10Já se pode considerar como um clássico por diversos motivos e um deles por dar respeito, dignidade e viabilidade ao povo do sertão. Não apenas o seu povo, mas também seus falares, costumes, anseios, peculiaridades que só- é somente só- atores de fato nordestinos poderiam encarnar. Ou seja, estava mais do que na hora de a Globo colocar atores gabaritados e nascidos no Nordeste (conforme se viu em boa parte do elenco) para estrelar novelas ambientadas lá.
Também destaco, somado a escolha do casting, a atuação de atores como a Titina Medeiros e Welder Rodrigues, responsáveis pelo alívio cômico central de uma trama com uma espinha dorsal pesada, revisitando o coronelismo com sarcasmo.
Destaque também para Giovana Cordeiro que fez crescer sua Xaviera, esbanjando talento, sensibilidade, sensualidade e despertando todo tipo de afeto! Ao contrário da ótima construção de Débora Bloch que nos deixava cada vez mais abismados com tamanha maldade e frieza.
E por falar em Deodora, José de Abreu comoveu demais, principalmente no período da depressão de Tertúlio. Torci muito pela recuperação do coronel! E Caio Blat, outro cônjuge da vilã, fez bonito e mostrou como consolidou uma carreira repleta de tipos e arquétipos.
No entanto, os dois grandes nomes dessa novela, ao meu ver, são Enrique Diaz e Sérgio Guizé. O primeiro, ator veterano, conhecido no cinema e no teatro, porém com pouco espaço na tv, passeou por todos os núcleos e gêneros (da comédia ao drama) com uma leveza, esperteza e grandeza. Enrique é um dos nossos maiores atores!
E o Guizé interpretou o melhor personagem de sua carreira e tomou pra si de verdade a alcunha de protagonista. A dobradinha com Timbó e o seu par com a também talentosa Isadora Cruz o enriqueceu bastante: personagem cheio de nuances mesmo com pouco apelo popular.
Enfim, já estou com saudades dessa viagem ao sertão todos os dias às 18:30. Como é rico é gostoso o nosso Nordeste! Viva à brasilidade!
Vai na Fé
3.8 23Há 20 anos , Sheron Menezes fazia uma empregada doméstica em Celebridade. Fazia parte do núcleo principal, trabalhava na casa de Maria Clara Diniz (Malu Mader) e tinha um caso com Marcos (Márcio Garcia). Era quase uma figurante, assim como os poucos negros daquele núcleo. O de maior destaque, talvez, era o do Sérgio Menezes, vivendo o fotógrafo bem-sucedido e melhor amigo da “musa do verão”. Hoje, em Vai na fé, parece-me que há uma preocupação em mostrar que no subúrbio do Rio de Janeiro sobrevivem pessoas comuns, evangélicos, negros, trabalhadores. Há também personagens pretos em situação privilegiada, como Ben; há o vilão Orfeu, também vivido um ator negro de outros bons trabalhos como em Da cor do pecado - Jonathan Haagensen. As excelentes Kate e sua mãe trazendo um alívio cômico necessário. Jean Paulo Campos, encarando um homossexual em uma relação inter-racial (e quão talentoso ele é também!
Ou seja, a Iara poderia ser além de uma secretária do lar. Sempre pôde! Mas somente 20 anos depois a teledramaturgia brasileira entendeu que o espaço do homem negro e da mulher negra vai além da senzala, da cozinha do patrão e do tráfico no morro: podemos ocupar qualquer lugar!
Onde Está Meu Coração
4.1 112Mariana Lima, ao meu ver, deveria ter mais visibilidade e respeito no Brasil. Muito já se falou sobre o trabalho da Letícia, mas essa mãe incansável que aquela interpreta é de uma dignidade ímpar. Eu tô pra ver alguém com tamanha carga emocional impressa em cena como Mariana Lima na atualidade. Talvez somente ela e Marjorie Estiano entregam tanto dessa forma que a gente se sufoca.
Greta
3.5 74Tripalium ou Quem diria, Greta foi parar no Ceará.
Uma das melhores produções nos últimos cinco anos. Eu assisti ao texto/produção no teatro e essa adaptação para o cinema foi louvável. Dentro de um contexto de solidão, abandono e múltiplos preconceitos existem três forças: a da sobrevivência vital da trans Daniela; a sobrevivência existencial de Pedro; e a sobrevivência social de Jean. A primeira encontra como evasão os shows na boate. O segundo, em uma personagem quem idolatra: Greta Garbo. O terceiro em Pedro. Os três condenados: à morte, à solidão, à cadeia. O escapismo, pois, é a resolução dos problemas como um poeta romântico do século XIX.
Um salve para a direção envolvente com cenas singelas como a da famigerada nudez aos 70 de Pedro (grande Nanini, um dos maiores atores do Brasil- lenda viva!) e do banho que ele dá em Daniela (gigante Denise, atriz pouco requisitada na televisão, pouco falada, porém de uma competência que há muito não se vê numa atriz do porte e gabarito e comprometimento e longevidade, no que tange à carreira, como ela e Regina Braga, por exemplo, a qual fez uma dobradinha impecável na série Alice da HBO).
Logo, “Greta” - com toda licença para explorar o sentido amplo da palavra- é um trabalho de três pontas que se unem: roteiro, direção e produção; Daniela, Pedro e Jean.
Argentina, 1985
4.3 336Aqui no Brasil precisávamos não só de um filme como esse, assim como que, se tivesse sido feito justiça, a fim de respeitar a memória de quem foi perseguido, torturado e morto pelos militares, quando eles estavam no poder.
1985, por sua vez, toca em uma ferida a qual, mesmo aparentemente não aberta, ainda não está cicatrizada. O excelente texto combinado à direção quase documental, que extrapola a sisudez de uma projeção marcada por um ambiente predominante masculino e violento, emociona em vários trechos como no depoimento dolorido de uma mãe e o veredicto lido ao final pelo promotor seguido da retirada dos lenços das mães da praça de maio. Um globo de ouro não é suficiente para representar a importância da discussão que esse filme evoca.
Celebridade
3.6 138Jairo aparece em Celebridade e é resgatado em Paraíso Tropical (como Jader) São trambiqueiros e moram em Copacabana. Não seria mera coincidência…
Pureza
4.0 95Pureza é luta, resistência, resiliência… Todo respeito às Purezas desse vasto país que ainda sofre com mazelas como escravidão, trabalho forçado, miséria, exploração etc. As Purezas desta nação , infelizmente, estão morrendo por seus filhos ou lutando para que seja feita justiça pelo desaparecimento e, eventualmente, a morte de sua prole. É uma mistura de tristeza que desemboca na satisfação final. Lindo!
A Favorita
3.9 348Continuo achando um novelaço! Como sempre, o núcleo principal do JEC sempre é a força-motriz e carrega quase todas as novelas nas costas, bem como suas protagonistas e antagonistas. Só que muito se fala da Donatela e da Flora, principalmente, e eu acho as duas bem interessantes. Só que para mim essa novela é sobre a falta de amor próprio. Isso vai se descortinando, por exemplo, quando, na minha opinião, uma das melhores fases da trama é quando a mocinha na pele de Rosana/Diva vai viver no rancho do Augusto César (e eu já cansei de falar que, ao meu ver, esse é o melhor personagem do Zé Mayer). Ela redescobre as diversas formas de amar: um filho que lhe foi roubado, o marido que nunca teve e uma vida marital com idolatria, a vida que lhe foi ceifada…
Eu gosto dessa parte justamente porque é nesse momento que a Donatela encontra-se vulnerável. Sua Rosana é amada, idolatrada por um homem que ela nunca havia visto na vida, porém a ama com uma devoção quase sagrada. Assim como canta a música de James Blunt, ele faz com que Donatela “retorne para casa”, para um seio familiar, o protótipo de família aparentemente desajustada, no entanto feliz: o pai lunático, o filho desajeitado e rejeitado pela mãe… É tudo muito bem delineado!
Eu me rendo e estou novamente apaixonado por A favorita.
Casa Gucci
3.2 708Apesar de um exagero na quantidade de minutos da projeção, é um filme que não fica chato. Gostei bastante! Destaco que a Gaga foi bem dirigida, apesar de que a direção pecou no fato de deixar algumas partes corridas quando deveriam ser mais bem desenvolvidas (a sequência do assassinato, por exemplo) e as partes que poderiam ser mais rápidas, ficaram modorrentas e arrastadas (a disputa judicial, que mais parecia pilhéria e a mudança no perfil de Maurizio, um grande babaca!).
Com um texto que deu conta de uma trajetória de sucesso de uma mulher por detrás de um homem banana, rivalizando com um personagem excêntrico e estranhamente construído pelo Jared Leto. Por fim, levanto a elegância do figurino e da arquitetura italiana a qual, por si só, já é um charme!
Eduardo e Mônica
3.6 372Mediano, previsível. No entanto, Alice Braga consegue fazer tudo sempre com maestria e beirando a perfeição.
Spencer
3.7 569É um filme esquisito, mal dirigido. Sou levado a crer que, pela falta de uma boa direção, Kirsten não rendeu tanto. Se o roteiro fosse mais instigante e a direção fosse por um caminho mais do drama do que do suspense, talvez o filme tivesse rendido mais e melhor. Faltou alma! Faltou coração! Faltou EMOÇÃO. O bacana é que o recorte é bem diferenciado de tudo o que a gente espera quando se trata da história de Diana. Ela realmente é protagonista absoluta do filme, por isso mesmo que a atriz merecia um texto e uma direção mais esmeradas. E, para mim, o ponto alto é a revelação inusitada da funcionária da princesa. A trama poderia ter girado em torno daquilo ali. Seria mais bonito, mais tocante e mais diferenciado.
Medida Provisória
3.6 432Filme necessário e, diria, tudo na medida certa. Com boas doses de humor em meio a tanta densidade no roteiro, numa sociedade carregada de racismo, o personagem de Seu Jorge se destaca! Ao passo que Alfie Enoch vai crescendo, costurando aos poucos um personagem cheio de nuances e costurando a tensão necessária para o drama com que o Lázaro nos presenteou. Eu saio com sensação de que precisamos lutar e ir às ruas sim! Medida provisória é motivador, aliás, mostra a urgência de uma revolução em todos os âmbitos sociais.
King Richard: Criando Campeãs
3.8 409Uma história bonita e que serve de inspiração a muitos, sem sombra de dúvidas! No entanto, considero que houve muito tempo de projeção até chegar no ápice da carreira das irmãs Williams. Afora isso, é uma trama que vai além de superação de limites, é sobre perseverança, autoestima e combate ao racismo. Em tempo, a luta de Richard era para que as filhas e a família fossem respeitados e tivessem consciência de onde vieram e aonde querem chegar, sem jamais esquecerem suas origens e suas projeções, não perdendo a humildade e a essência. Personagem controverso, Richard pode ser o grande momento para que o Will Smith ganhe todos os prêmios de melhor ator da temporada. Destaco também o trabalho de Aunjanus Ellis, com toda fibra e força de uma mãe presente e também de grande gestora e mantenedora do sonho coletivo dos Williams.
A Tragédia de Macbeth
3.7 192É inegável a qualidade do texto é incontestável o talento e construção que Denzel e Francis fizeram do casal Macbeth. A fotografia também é linda, porém a direção de Coen (aqui em carreira solo), ao meu ver, geralmente, é cansativa e nada dinâmica.
Tatuagem
4.2 923Um filme bastante sensível sobre o entre-lugar do artista de rua/informal e a classe lgbtqi. O pano de fundo sócio-histórico da Ditadura Militar casa bem com toda castração a qual sofria o personagem Fininha. Eu destaco também o romance tórrido, intenso é tão verossimilhante com daquele com Clécio, mostrando que os problemas de um casal gay são análogos a de um casal hétero, pelos quais todos nós estamos sujeitos a passar.
Sovdagari - O Mercador
3.5 66“Ao vencedor, as batatas”. A máxima do humanitismo em Quincas Borba, celebrado romance de Machado de Assis, faz muito sentido aqui, no contexto desse documentário. Em uma Geórgia assolada em miséria e devastada depois da dissolução da URSS, nota-se que quem tem mais batatas, possui mais poder. Não chega a ser assim tão raso e simplista, mas precisamos extrair de um sistema tão complexo algo lúdico - e por que não dizer paradoxal, pois provoca escapismo e reflexão - que resulte em um filme o qual, em poucos minutos, retrata tipos e vivências tão fortemente demarcadas, tão densamente “vivas, vãs, vulcanizadas”.
No Ritmo do Coração
4.1 754Drama familiar com dilemas críveis, bem delineados pelo enredo de forma sensível, capaz de promover um relevante merchandising social. Aliás, o grande trunfo da direção foi trabalhar com um elenco de surdos-mudos e mostrar a dificuldade real não só da família em se estabelecer, como também em se adaptar e fazer com que a única componente oralizada não sofra com a falta de traquejo e o preconceito que toda a sociedade perpetra contra a comunidade.
O comportamento dos colegas de escola de Ruby, os problemas referentes ao ofício da família e a criação da cooperativa, a cena do dueto de Ruby e Miles no musical apresentado na escola revelam perfeitamente bem a visão que tive supracitada.
Para mim, sem sombra de dúvidas, uma das grandes apostas para as premiações e um dos melhores filmes da temporada.
Druk: Mais Uma Rodada
3.9 799Muitos arrumam um subterfúgio, uma desculpa, uma válvula de escape na bebida e isso pode tornar-se um mal irreversível. Com os professores de Druk não foi diferente, pois cada um deles estava absorto em seus dilemas pessoais, conjugais e profissionais e viram no alcoolismo a união e o refúgio. Em um país como a Dinamarca, essa doença me parece ser uma triste realidade e o longa-metragem estabelece sua crítica de forma bem-humorada e inteligente, mostrando o quão devastador pode ser uma vida mergulhada no álcool.
Passaporte para Liberdade
4.0 20Excelente reconstituição de uma época sombria e, em meio a tanta tristeza e à falta de esperança, dona Aracy oferecia um alento, como uma luz no fim do túnel, ao possibilitar a essa gente perseguida e oprimida o passaporte para a liberdade.
Sobre o elenco, a escolha foi bastante acertada. Sophie, se não me engano, é descendente próximo de germânicos/austríacos. Ela soube imprimir a resiliência e a força necessárias para dar verossimilhança a uma mulher de fibra e ao mesmo tempo tão sensível e cheia de empatia. Ela foi mãe não só de Eduardo: sua maternidade acolhia as prostitutas, os degenerados, os refugiados e os semitas desesperados pela salvação.
Destaco também a ficcionalização do personagem célebre da história da nossa literatura: o grandioso João Guimarães Rosa. Importante mostrar essa outra face da biografia dele, quem, além de escritor fundamental das nossas letras, foi um diplomata importante na Alemanha na gestão nazista de Hitler. Lombardi deu o tom certo para a seriedade do cargo que possuía sem abrir mão da generosidade peculiar do povo brasileiro naquele ambiente hostil.
E o intérprete do coronel Zumkle foi impecável em sua construção. Vimos nele a representação de tudo o que abominamos: o egoísmo, o assédio moral e sexual e a personificação do totalitarismo maléfico e assombroso.
Mais uma excelente produção de Jayme Monjardim.
tick, tick... BOOM!
3.8 451O talento de MJ Rodriguez precisa de mais espaço e visibilidade.
Andrew Garfield mostrou o quão é versátil e que vai muito além de um ator de filmes blockbuster.
O roteiro é bom e bem dirigido, inclusive a parte dos musicais. Porém, essa última parte foi a que menos me cativou.
A Filha Perdida
3.6 573Olívia Colman carrega o filme nas costas.
Não Olhe para Cima
3.7 1,9KUma contundente crítica ao negacionismo científico. Nada mais atual que isso, mais incisivo e objetivo impossível! As mais de duas horas de duração não são necessárias. Tudo poderia ser resolvido em 1 hora e meia. E, para finalizar, a cena do senhor atirando para o alto, como se fosse conter o meteoro, é emblemática. Inclusive, acho que é o símbolo do totalitarismo contemporâneo.
Identidade
3.4 102“É fácil um negro se passar por branco. Só não sei se é tão fácil um branco se passar por negro”
Ataque dos Cães
3.7 933É um filme que demora a ganhar forma e, talvez, por isso, as duas horas de projeção foram muito mal aproveitadas. Acho que as partes obscenas (fora de cena) dizem muito mais do que as que são mostradas nas divisões em atos. Ainda assim, vale a pena pela excelente atuação de Kirsten Dunst em um tipo perturbado e assombrada pelo suicídio do marido, trazendo o medo de perder seu único filho e acometida pelo alcoolismo. A construção dúbia do personagem Phil também merece destaque para o bom trabalho de Cumberbatch. De resto, mais do mesmo.