Me faz ter vontade de viajar e conhecer todos os lugares que eu ainda não conheço. É um tratado de como o mundo é grande e bonito e como nós somos insignificantes perto dessa grandeza.
Apesar da extrema liberdade com que Carlos Reygadas dirige "Post Tenebras Lux", é possível notar um certo modelo de condução, expresso principalmente na dualidade entre bem e mal, clara desde o título e estendida até seus personagens e sua própria estrutura. O expectador permeia o filme dividido entre inocência (que pode ser representada pelos animais e pelas crianças) e malícia (os adultos); extremidades da tela distorcidas e desfocadas em ambientes abertos ou nítidas em ambientes fechados (quase sempre); e o próprio uso da fotografia (uma das mais eloquentes e bem executadas que eu já vi), alternando frequentemente entre luz e sombra. O conflito, então, se dá de forma incessante e constante, às vezes de maneira brutal (como na cena em que Juan espanca uma de suas cadelas), mas normalmente de uma forma sutil e bonita - tal qual na excelente abertura do filme, com o sonho da menina Rut, que viria a funcionar como metáfora da principal linha narrativa da obra, a degradação de sua família, representada pela tempestade que chega em meio à calma pastoril.
Com tantas camadas e significados, "Post Tenebras Lux" é filmado à maneira de Malick e Weerasethakul, porém com um pé a menos no chão e um a mais no onirismo e surrealismo (mas ainda assim falando de assuntos bastante terrenos).
O menos legal do Tarantino ainda é muito bom. Só podia ser mais enxuto e falta um pouco de rigor com o visual que é possível de ver nos filmes seguintes dele.
Em "A Montanha Sagrada", Jodorowsky se vale de um sem-número de metáforas visuais e narrativas que permeiam todo o filme para lançar críticas a diversos setores da sociedade, instituições e modos de vida - como em El Topo, mas de maneira mais abrangente. Da Igreja à política, passando por práticas de consumismo e vaidade, sempre em tom de sátira e até mesmo auto-crítica, nada escapa aos olhos do diretor, que promove sua ideologia esotérico-alquímico-budista através de um rico simbolismo constante. Ao final, o autor-protagonista ousa quebrar a quarta parede para dar aos seus personagens o que ele havia prometido que seria conquistado no cume da montanha: a imortalidade (através do registro em câmera).
Aqui tem um link que procura dar explicação ao surrealismo do filme. Vale a pena pra quem tem pouco (ou nenhum) conhecimento de símbolos (como eu) e quer estender a experiência de "A Montanha Sagrada" para além do mero choque de culturas: http://thestygianport.blogspot.com.br/2009/10/holy-mountain-nigredo.html
Filme pra quem gosta ou, pelo menos, conhece Beatles. Quem não sabe muita coisa (como eu) vai perder metade das sacadas da história, como nomes dos personagens e algumas quotes.
Tecnicamente, "Stoker" é bem feito, especialmente em se tratando da fotografia. Mas o roteiro deixa a desejar - aparentemente é muito fácil matar alguém no filme sem levantar muitas suspeitas. As atuações estão na média (não é difícil pra Mia Wasikowska fazer uma personagem quase-psicopata que permeia a obra sem esboçar muitas emoções), mas a Nicole Kidman já esteve melhor. Esperava mais do cara que dirigiu "Oldboy".
Wes Anderson sempre tem uma maneira bastante peculiar de expor as fragilidades do ser humano e levantar críticas à sociedade. "The Royal Tenenbaums", com toda essa aura "indie" aparenta ser raso, mas oscila entre emoções bastante paradoxais, sem precisar se carregar em densidade. Não bastasse só isso, o filme ainda conta com ótimas atuações (nunca pensei que eu fosse gostar do Ben Stiler num filme) e uma direção de arte bem apurada, como de praxe.
Em termos sensoriais e técnicos, o filme beira a perfeição - excelente fotografia, desenho de som, soluções visuais bastante aprimoradas, edição arrojada. Em questão de roteiro ele é, às vezes, meio redundante e rara, mas incomodamente, superficial. Nada que não permita se sentir tocado por Colleen e sua comovente busca de paz através do abandono do passado e da superação da solidão.
Chamar "Sozinho Contra Todos" de "autoral" ou "pessimista" é chover no molhado em se tratando de Gaspar Noé. É interessante, porém, notar como o estilo do diretor mudou desse primeiro longa para o seguinte, especialmente no que diz respeito ao uso da câmera (aqui estática e lá completamente livre). A denúncia de uma Paris corrompida e decadente, diferente do que é normalmente retratado no cinema é original - já o roteiro, claramente inspirado em Taxi Driver, nem tanto (e nesse caso a maneira com a qual Noé dirige a obra, principalmente no que concerne à edição e à predileção pela violência gráfica e sexo). Se o objetivo principal é condenar a forma como a máquina do Estado cria monstros e exemplificar como o ódio e a paranoia podem somatizar-se em loucura, assusta a forma como algumas pessoas (inclusive eu) se identificam com o protagonista - intepretado competentemente pelo Philippe Nahon.
No começo as performances são mais poderosas, Anne Hathaway dá um show e você tá mais receptivo às músicas. À medida que o filme avança, a repetição das mesmas melodias começa a cansar e o restante do elenco não tem um desempenho tão excepcional quanto o de Anne (exceto pelo Hugh Jackman, que não segura um filme sozinho). Mas é bom no geral.
"Na Srebrnym Globie" é uma tentativa assustadora e caótica de perseguição da essência de várias questões que atormentam o ser humano, e que traz consigo conclusões bastante pessimistas. Num filme onde tudo rasteja, grita, convulsa e enloquece, onde a estrutura dispensa qualquer ortodoxia, onde a beleza fotográfica reside na escuridão das imagens, há tanta liberdade - e ela é tão intensa - que o espectador é tomado de assalto, ao mesmo tempo em que não alcança o que é dito. Fica o que há de explícito e mais lúcido: é uma obra sobre ciclos (que expõe a religiosidade como vetor de sofrimento e a busca pela razão como uma missão enlouquecedora) e um triunfo de técnica (fotografia, edição, montagem, direção, roteiro, figurino), interpretação e originalidade.
Kiki é uma garota que veio de um lugar distante e quer se estabelecer na nova cidade cativando seus habitantes (tal qual em "Dogville", de Lars von Trier, só que numa abordagem muito mais positiva). Interessante como Miyazaki, apesar de designar a protagonista como uma bruxa, não faz dessa característica um fator para deslocá-la do meio. O que a separa dos outros, além do fato de não ser uma nativa, são sua aparência, seus pensamentos e suas ideologias - e aí mora uma mensagem interessante. Ainda que falte um pouco da riqueza que se verifica em "A Viagem de Chihiro" e "Princesa Mononoke", é um filme cativante.
Meu primeiro Takashi Miike e é um filme que perturba como poucos. A sucessão de bizarrices é, em certos pontos, tão terrível e improvável que chega a ser surreal (que dizer da cena em que Keiko provoca uma chuva de leite na cozinha?). Em contrapartida, o estilo de filmagem e a entrega dos atores aos personagens causam uma sensação paradóxica de realidade, e nesse sentido a obra divide o espectador. Se há alguma coisa de aproveitável é a possível crítica à reprimida família japonesa e ao sistema midiático agressivo, evocando uma radical mudança e abandono total de parâmetros (o que talvez possa se equiparar à pancada na cabeça com uma pedra - amnésia?). A não ser por isso, "Visitor Q" é completamente entretenimento, e de um gosto bastante peculiar, pra não dizer duvidoso.
Interpretações masculinas brilhantes e aspectos técnicos que beiram o irretocável são características de se esperar num filme do PTA. A novidade fica por conta da enorme sutileza com que ele levou essa história (talvez por medo do polêmico assunto - cientologia - que ela tocava, o que não evitou boicotes do filme por parte de quem se sentiu ofendido). Há as críticas às relações de poder, à obcessão e à enorme influência da religião, como se verificava em Sangue Negro, mas elas se desenvolvem com calma, por vezes quase em uníssono, se manifestando em uma lágrima que desenha o contorno de uma bochecha ou um grito que irrompe uma discussão "civilizada".
O aspecto mais estranho à primeira vista, em Mekong Hotel, é a trilha sonora incessante, coisa que não se verifica na filmografia de Weerasethakul, marcada por obras silenciosas. Mas ela está lá a serviço de duas caracterísitcas que são bem marcantes do cineasta: a quebra da barreira entre o místico (os fantasmas-vampiros) e o cotidiano; e a melancolização do ambiente como um todo, boa parte devido ao mal-estar causado pelo choque entre tradição e modernidade - outra peculiaridade retradada pelo diretor e que pode ser sentida com mais intensidade tanto no longuíssimo plano final, que contrapõe diversos jet skis e uma solitária jangada ao longo do Rio Mekong, e no discurso da jovem garota que, provavelmente enunciando a voz do diretor, demonstra desprezo pelas estrelas de cinema e por pessoas que valorizam cirurgias plásticas.
O roteiro tinha tudo para gerar um thriller, mas nas mãos de Apichatpong se torna um exercício interessante de quebra de gêneros filmícos com uma dose de apatia como nunca se viu em qualquer um de seus outros filmes (que se verifica tanto na característica predileção por planos fixos, quanto pela luz crepuscular constante - o que não necessariamente quer dizer que todos os eventos são vivenciados em um breve espaço de tempo - e pelo tom de voz abatido dos personagens).
Uma tragédia sobre como o amor pode se expressar de maneiras bem distintas, mas ainda assim genuínas, e sobre os atuais tempos céticos e sombrios nos quais a Igreja se encontra. Como bem disse a J. abaixo, "O 'bem' que pensamos estar fazendo aos outros pode ser o 'mal' que eles não querem receber."
Excelente roteiro, que fazem 2h30 serem aproveitadas ao máximo; ótima fotografia, sempre contrastando o branco da neve com o negro da vestimenta dos personagens, quando não os mergulha nas sombras de um ambiente hostil que nem sequer possui eletricidade; uma eficiente direção de Mungiu, sempre enquadrando os personagens à distância, em plano médio, submetendo-os ao espaço esmagador, mas sem apagar suas aflições diante da câmera; e atuações magistrais do elenco em geral, em especial da Cosmina Stratan e da Cristina Flutur. Um dos meus favoritos de 2012.
Gravidade
3.9 5,1K Assista AgoraTecnicamente o filme é muito bem feito, mas o roteiro é bem fraco e os personagens são rasos.
Laurence Anyways
4.1 551 Assista Agoradeu vontade de andar montado por aí
A Caça
4.2 2,0K Assista AgoraPorque não há nada mais kafkiano do que ser acusado injustamente de um crime e não ter (quase) ninguém do seu lado.
"Se você encostar na minha filha de novo, te meto uma bala na cabeça."
Baraka - Um Mundo Além das Palavras
4.5 136Me faz ter vontade de viajar e conhecer todos os lugares que eu ainda não conheço. É um tratado de como o mundo é grande e bonito e como nós somos insignificantes perto dessa grandeza.
Luz Depois das Trevas
3.6 52"Post Tenebras Lux is a landscape of possibility" - Tom Hall, Hammer to Nail
Apesar da extrema liberdade com que Carlos Reygadas dirige "Post Tenebras Lux", é possível notar um certo modelo de condução, expresso principalmente na dualidade entre bem e mal, clara desde o título e estendida até seus personagens e sua própria estrutura. O expectador permeia o filme dividido entre inocência (que pode ser representada pelos animais e pelas crianças) e malícia (os adultos); extremidades da tela distorcidas e desfocadas em ambientes abertos ou nítidas em ambientes fechados (quase sempre); e o próprio uso da fotografia (uma das mais eloquentes e bem executadas que eu já vi), alternando frequentemente entre luz e sombra. O conflito, então, se dá de forma incessante e constante, às vezes de maneira brutal (como na cena em que Juan espanca uma de suas cadelas), mas normalmente de uma forma sutil e bonita - tal qual na excelente abertura do filme, com o sonho da menina Rut, que viria a funcionar como metáfora da principal linha narrativa da obra, a degradação de sua família, representada pela tempestade que chega em meio à calma pastoril.
Com tantas camadas e significados, "Post Tenebras Lux" é filmado à maneira de Malick e Weerasethakul, porém com um pé a menos no chão e um a mais no onirismo e surrealismo (mas ainda assim falando de assuntos bastante terrenos).
Jackie Brown
3.8 739 Assista AgoraO menos legal do Tarantino ainda é muito bom. Só podia ser mais enxuto e falta um pouco de rigor com o visual que é possível de ver nos filmes seguintes dele.
A Montanha Sagrada
4.3 465Em "A Montanha Sagrada", Jodorowsky se vale de um sem-número de metáforas visuais e narrativas que permeiam todo o filme para lançar críticas a diversos setores da sociedade, instituições e modos de vida - como em El Topo, mas de maneira mais abrangente. Da Igreja à política, passando por práticas de consumismo e vaidade, sempre em tom de sátira e até mesmo auto-crítica, nada escapa aos olhos do diretor, que promove sua ideologia esotérico-alquímico-budista através de um rico simbolismo constante. Ao final, o autor-protagonista ousa quebrar a quarta parede para dar aos seus personagens o que ele havia prometido que seria conquistado no cume da montanha: a imortalidade (através do registro em câmera).
Aqui tem um link que procura dar explicação ao surrealismo do filme. Vale a pena pra quem tem pouco (ou nenhum) conhecimento de símbolos (como eu) e quer estender a experiência de "A Montanha Sagrada" para além do mero choque de culturas:
http://thestygianport.blogspot.com.br/2009/10/holy-mountain-nigredo.html
Across the Universe
4.1 2,2K Assista AgoraFilme pra quem gosta ou, pelo menos, conhece Beatles. Quem não sabe muita coisa (como eu) vai perder metade das sacadas da história, como nomes dos personagens e algumas quotes.
Segredos de Sangue
3.5 1,2K Assista AgoraTecnicamente, "Stoker" é bem feito, especialmente em se tratando da fotografia. Mas o roteiro deixa a desejar - aparentemente é muito fácil matar alguém no filme sem levantar muitas suspeitas. As atuações estão na média (não é difícil pra Mia Wasikowska fazer uma personagem quase-psicopata que permeia a obra sem esboçar muitas emoções), mas a Nicole Kidman já esteve melhor. Esperava mais do cara que dirigiu "Oldboy".
Os Excêntricos Tenenbaums
4.1 856 Assista AgoraWes Anderson sempre tem uma maneira bastante peculiar de expor as fragilidades do ser humano e levantar críticas à sociedade. "The Royal Tenenbaums", com toda essa aura "indie" aparenta ser raso, mas oscila entre emoções bastante paradoxais, sem precisar se carregar em densidade. Não bastasse só isso, o filme ainda conta com ótimas atuações (nunca pensei que eu fosse gostar do Ben Stiler num filme) e uma direção de arte bem apurada, como de praxe.
Sonata de Outono
4.5 491"O sentimento está longe da sentimentalidade".
Shit Year
3.8 8Em termos sensoriais e técnicos, o filme beira a perfeição - excelente fotografia, desenho de som, soluções visuais bastante aprimoradas, edição arrojada. Em questão de roteiro ele é, às vezes, meio redundante e rara, mas incomodamente, superficial. Nada que não permita se sentir tocado por Colleen e sua comovente busca de paz através do abandono do passado e da superação da solidão.
Sozinho Contra Todos
4.0 313Chamar "Sozinho Contra Todos" de "autoral" ou "pessimista" é chover no molhado em se tratando de Gaspar Noé. É interessante, porém, notar como o estilo do diretor mudou desse primeiro longa para o seguinte, especialmente no que diz respeito ao uso da câmera (aqui estática e lá completamente livre). A denúncia de uma Paris corrompida e decadente, diferente do que é normalmente retratado no cinema é original - já o roteiro, claramente inspirado em Taxi Driver, nem tanto (e nesse caso a maneira com a qual Noé dirige a obra, principalmente no que concerne à edição e à predileção pela violência gráfica e sexo). Se o objetivo principal é condenar a forma como a máquina do Estado cria monstros e exemplificar como o ódio e a paranoia podem somatizar-se em loucura, assusta a forma como algumas pessoas (inclusive eu) se identificam com o protagonista - intepretado competentemente pelo Philippe Nahon.
Um Toque de Pecado
3.8 63Trailer lindo <3 http://www.youtube.com/watch?v=eW7ogTTLAQY&feature=youtu.be
Pais e Filhos
4.3 212 Assista AgoraTrailer lindo <3 http://www.youtube.com/watch?v=MK2nTb9U9kE
Os Miseráveis
4.1 4,2K Assista AgoraNo começo as performances são mais poderosas, Anne Hathaway dá um show e você tá mais receptivo às músicas. À medida que o filme avança, a repetição das mesmas melodias começa a cansar e o restante do elenco não tem um desempenho tão excepcional quanto o de Anne (exceto pelo Hugh Jackman, que não segura um filme sozinho). Mas é bom no geral.
A Ira de um Anjo
4.0 281Me faz pensar que não existe gente ruim, só gente muito doente e com medo, o que dispara reações institivas que geram mais medo e dor. É triste.
O Globo de Prata
4.1 59"Na Srebrnym Globie" é uma tentativa assustadora e caótica de perseguição da essência de várias questões que atormentam o ser humano, e que traz consigo conclusões bastante pessimistas. Num filme onde tudo rasteja, grita, convulsa e enloquece, onde a estrutura dispensa qualquer ortodoxia, onde a beleza fotográfica reside na escuridão das imagens, há tanta liberdade - e ela é tão intensa - que o espectador é tomado de assalto, ao mesmo tempo em que não alcança o que é dito. Fica o que há de explícito e mais lúcido: é uma obra sobre ciclos (que expõe a religiosidade como vetor de sofrimento e a busca pela razão como uma missão enlouquecedora) e um triunfo de técnica (fotografia, edição, montagem, direção, roteiro, figurino), interpretação e originalidade.
O Serviço de Entregas da Kiki
4.3 772 Assista AgoraKiki é uma garota que veio de um lugar distante e quer se estabelecer na nova cidade cativando seus habitantes (tal qual em "Dogville", de Lars von Trier, só que numa abordagem muito mais positiva). Interessante como Miyazaki, apesar de designar a protagonista como uma bruxa, não faz dessa característica um fator para deslocá-la do meio. O que a separa dos outros, além do fato de não ser uma nativa, são sua aparência, seus pensamentos e suas ideologias - e aí mora uma mensagem interessante. Ainda que falte um pouco da riqueza que se verifica em "A Viagem de Chihiro" e "Princesa Mononoke", é um filme cativante.
Visitor Q
3.4 166Meu primeiro Takashi Miike e é um filme que perturba como poucos. A sucessão de bizarrices é, em certos pontos, tão terrível e improvável que chega a ser surreal (que dizer da cena em que Keiko provoca uma chuva de leite na cozinha?). Em contrapartida, o estilo de filmagem e a entrega dos atores aos personagens causam uma sensação paradóxica de realidade, e nesse sentido a obra divide o espectador. Se há alguma coisa de aproveitável é a possível crítica à reprimida família japonesa e ao sistema midiático agressivo, evocando uma radical mudança e abandono total de parâmetros (o que talvez possa se equiparar à pancada na cabeça com uma pedra - amnésia?). A não ser por isso, "Visitor Q" é completamente entretenimento, e de um gosto bastante peculiar, pra não dizer duvidoso.
O Mestre
3.7 1,0K Assista AgoraInterpretações masculinas brilhantes e aspectos técnicos que beiram o irretocável são características de se esperar num filme do PTA. A novidade fica por conta da enorme sutileza com que ele levou essa história (talvez por medo do polêmico assunto - cientologia - que ela tocava, o que não evitou boicotes do filme por parte de quem se sentiu ofendido). Há as críticas às relações de poder, à obcessão e à enorme influência da religião, como se verificava em Sangue Negro, mas elas se desenvolvem com calma, por vezes quase em uníssono, se manifestando em uma lágrima que desenha o contorno de uma bochecha ou um grito que irrompe uma discussão "civilizada".
Mekong Hotel
3.3 22O aspecto mais estranho à primeira vista, em Mekong Hotel, é a trilha sonora incessante, coisa que não se verifica na filmografia de Weerasethakul, marcada por obras silenciosas. Mas ela está lá a serviço de duas caracterísitcas que são bem marcantes do cineasta: a quebra da barreira entre o místico (os fantasmas-vampiros) e o cotidiano; e a melancolização do ambiente como um todo, boa parte devido ao mal-estar causado pelo choque entre tradição e modernidade - outra peculiaridade retradada pelo diretor e que pode ser sentida com mais intensidade tanto no longuíssimo plano final, que contrapõe diversos jet skis e uma solitária jangada ao longo do Rio Mekong, e no discurso da jovem garota que, provavelmente enunciando a voz do diretor, demonstra desprezo pelas estrelas de cinema e por pessoas que valorizam cirurgias plásticas.
O roteiro tinha tudo para gerar um thriller, mas nas mãos de Apichatpong se torna um exercício interessante de quebra de gêneros filmícos com uma dose de apatia como nunca se viu em qualquer um de seus outros filmes (que se verifica tanto na característica predileção por planos fixos, quanto pela luz crepuscular constante - o que não necessariamente quer dizer que todos os eventos são vivenciados em um breve espaço de tempo - e pelo tom de voz abatido dos personagens).
Além das Montanhas
3.9 117Uma tragédia sobre como o amor pode se expressar de maneiras bem distintas, mas ainda assim genuínas, e sobre os atuais tempos céticos e sombrios nos quais a Igreja se encontra. Como bem disse a J. abaixo, "O 'bem' que pensamos estar fazendo aos outros pode ser o 'mal' que eles não querem receber."
Excelente roteiro, que fazem 2h30 serem aproveitadas ao máximo; ótima fotografia, sempre contrastando o branco da neve com o negro da vestimenta dos personagens, quando não os mergulha nas sombras de um ambiente hostil que nem sequer possui eletricidade; uma eficiente direção de Mungiu, sempre enquadrando os personagens à distância, em plano médio, submetendo-os ao espaço esmagador, mas sem apagar suas aflições diante da câmera; e atuações magistrais do elenco em geral, em especial da Cosmina Stratan e da Cristina Flutur. Um dos meus favoritos de 2012.
Atriz Milenar
4.3 115Um triunfo de narrativa.