Filme português absolutamente maluco que satiriza a figura do Cristiano Ronaldo ao mesmo tempo que fala da crise dos imigrantes na Europa, brexit, masculinidade tóxica, futebol como ferramenta politica e clonagem de pessoas(?).
Bicho, que filme mais sem propósito. Quem são os protagonistas e por que estão sendo mortos? Não importa. Quem é o assassino e por que ele mata? Não interessa. O filme não faz o minimo esforço pra ter uma história. Não há criatividade no roteiro, nem nos sustos, nem nas mortes. Até a máscara é genérica. A única "inovação" é a Bex Taylor Klaus fazendo papel de hétero.
Existe entre os especialistas em criminologia um semi consenso do que define um assassino em série ou serial killer, se preferir: mais do que três vítimas com perfil semelhante e um método especifico de atuação em suas mortes. Mas esse não é o único tipo de “matador por atacado”, segundo a escritora Ilana Casoy temos também o assassino impulsivo (ou spree killer), que mata de maneira aleatória, movido por uma necessidade de matar, quase por esporte, sem necessariamente fantasiar com as vítimas. Ou o assassino em massa, que faz de seu crime um evento, com várias vítimas em um único local de uma única vez. São várias formas de catalisar o desejo e a necessidade pela violência.
Mas essas categorias não definem o protagonista de O Nome da Morte, talvez por que num país onde 60 mil pessoas são assassinadas num ano, a violência não é um desejo ou um hobby, é um oficio. Oficio no qual Julio Santana foi funcionário do mês todos os meses por mais de trinta anos, contabilizando quase 500 mortes em seu portfólio. Julio não matava por esporte, fetiche ou necessidade, matava por dinheiro e assim se tornou um expoente de uma profissão ainda muito popular nos rincões do Brasil: a Pistolagem.
O filme dirigido por Henrique Goldman é baseado livremente no livro de mesmo nome, escrito por Klester Cavalcanti, e não é exatamente uma biografia, nos moldes que nos acostumamos a ver no cinema nacional, que elenca cronologicamente acontecimentos da vida de seu protagonista para que o público saiba o que aconteceu e como aconteceu. Tampouco é um estudo de personagem que entra na cabeça do biografado tentando entender os porquês de suas atitudes (ainda que flerte com isso em alguns momentos). É mais como um estudo de situação, que tenta apresentar as circunstancias que levam uma pessoa a escolher a vida do crime em nosso país.
Mas tenta – com certo sucesso – fazer isso sem o uso de filosofismo, sem tomar partido sobre a pureza do homem perante a sociedade corrompida e vice e versa. Ele apenas expõe as coisas, a miséria de alguns lugares do país e a falta de perspectivas que ela gera, a insignificância da vida, a sanha por prosperidade acima de tudo de algumas religiões, a banalização completa da violência e principalmente a impunidade que reina por aqui. Ele também trabalha em humanizar cautelosamente a figura monstruosa do matador, expondo-o como a pessoa comum que pode estar bem perto de você.
Como filme, O Nome da Morte tem um quê de western brasileiro, junto de uma aura de filme de gangster, construindo um vilão de forma que não pareça totalmente odioso. Trabalha com um senso de atemporalidade, sem datar os acontecimentos e usando o número de vítimas como marcador de tempo. A trilha sonora, apesar de bem feita, é muito óbvia. Músicas tristes para momentos tristes, músicas tensas para momentos tensos, como se precisássemos de instrução do que devemos sentir em cada cena, mas nada que comprometa a experiência.
No quesito atuação a obra tem seu ponto mais alto. Marco Pigossi representa bem um homem introspectivo, de poucas palavras, que começa bastante emocional e vai ganhando frieza no decorrer do filme. Os coadjuvantes Fabíula Nascimento e André Mattos também entregam personagens sólidos, mesmo com pouco tempo de tela.
O Nome da Morte é um filme nacional interessante, que dá um viés autoral a uma biografia cem por cento brasileira, falando da tragédia marginal que assola o país sem tirar a responsabilidade do indivíduo, nem amenizar a influência da sociedade. Vale o tempo investido.
Se você chegou aqui por acaso, talvez não saiba, mas existe um submundo dos filmes de luta. É um submundo muito produtivo, onde se escondem promissores dublês e artistas marciais, ex lutadores de MMA e membros da WWE que não tem o mesmo carisma do The Rock. Um submundo onde dezenas de películas são lançadas todos os anos, geralmente direto em home vídeo. De onde submergiu um atlético Jean Claude Van Damme lá nos anos 80, por exemplo, na época em que alguns desses filmes de luta iam parar nas tardes da tv aberta. O que não acontece mais, infelizmente, no máximo esses filmes passam nas noites da Band, privando assim nossas crianças da boa e velha pancadaria desenfreada. Privando também Scott Adkins, astro maior desse submundo na atualidade, de seu devido reconhecimento.
Scott Adkins e Jesse V. Johnson, astro e diretor de Accident Man, respectivamente, dão aqui o chamado passo maior do que a perna, o famoso morder mais do que pode mastigar, ou qualquer outra variação desse ditado. Tentam entregar um filme um pouco mais ambicioso do que seus portfólios no submundo dos filmes de luta recomenda e acaba faltando substância para isso. As situações e informações fornecidas no início do filme vem tão redondinhas, tão ajeitadinhas, que fica bem evidente a forma que elas se encaixarão no desenrolar da trama. E não tem reviravolta ou subversão, as coisas acontecem exatamente como elas aparentam que vão acontecer. Mas ok, talvez não devamos exigir tanto de Adkins em sua primeira aventura como escritor.
Accident Man tem um senso de estilo familiar, combinando-o com a trama do filme podemos analisar que é como se o Guy Ritchie tentasse dirigir a sua versão de John Wick, mas sofresse um derrame no processo. A violência estilizada, o sotaque carregado e os humores britânico e politicamente incorreto estão aqui, mas numa versão meio “lesada”, principalmente no que diz respeito ao humor agressivo. As piadas que tentam ser mais ácidas, envolvendo o patriotismo e a fleuma britânica ou pautas como ambientalismo e sexualidade não conseguem fazer rir, na verdade elas não conseguem sequer ofender, só soam meio patéticas.
Mas então o filme é ruim, é isso? Não exatamente, caro leitor. Por incrível que pareça, a experiência de assistir Accident Man é boa no contexto correto. Se você é capaz de acessar aquele espirito de quando via O Grande Dragão Branco na tarde de sábado, da época em que você achava que “tijolo não revida” era um exemplo de diálogo bem escrito e que a cena do Van Damme lutando cego era a expressão máxima da sétima arte, digna de uma indicação ao Oscar, você vai curtir esse filme também. Tem arquétipos de personagens fáceis de simpatizar, um protagonista canastrão bad ass, vários coadjuvantes canastrões e bad ass, cenas de ação limpas e bem executadas e o que importa no fim das contas, uma porradaria honesta, bem coreografada e divertida de se ver.
Não é o filme que transformará Scott Adkins no Jean Claude Van Damme dessa geração, mas com um pouco mais de dedicação e sorte ele pode se tornar pelo menos um novo Jason Statham.
A primeira e a última cena do filme são bem legais, o problema são os oitenta minutos que estão entre esses dois momentos. Sendo muito gentil podemos tirar um ou outro conceito interessante, como o clima retro futurista. Mas a câmera subjetiva confusa, o jogo de luzes e cores exagerado, os personagens sem carisma, o ritmo arrastado e a história sem pé nem cabeça ferram com tudo. Muito ruim.
Em algum momento Charlie Brooker, criador de Black Mirror, e James Wan, diretor e criador da saga Jogos Mortais, entraram juntos em um avião. E essa frase que parece o inicio de uma piada ruim é a síntese da ideia de Panic Button (que em português ganhou o horrendo título de Pânico Virtual), um filme que, como diriam aquelas frases sensacionalistas que estampam pôsteres por aí a fora, “é o encontro de Jogos Mortais com Black Mirror, dentro de um avião (?!?!)”. Sem a genialidade de Brooker ou a inventividade de Wan, mas ainda sim com uma boa dose de entretenimento.
O filme dirigido por Chris Crow foge um pouco da estrutura comum de um terror de baixo orçamento. É claro que a qualidade das atuações é pra lá de questionável e o cenário e a fotografia são bastante chinfrins, mas o projeto não tenta compensar isso com horror gráfico, sangue jorrando, música alta e jump scares. Ele aposta na tensão criada pela dúvida colocada sobre cada um dos personagens, afinal é um filme de terror e sabemos que em algum momento vai dar merda. A diversão está em especular de onde a merda virá, e cada detalhe exposto sobre o grupo muda a coisa de figura.
E fora esse clima de thriller e mistério, temos o fator “isso é muito Black Mirror, mêo”, que nos faz repensar nosso comportamento na internet e o quanto nossa privacidade está em xeque nos dias de hoje. Não só em relação ao que nós compartilhamos, mas com aquilo que assistimos, lemos, a parte mais passiva da interação. Misturando um pouco os conceitos de Shut up and Dance com Hated in the Nation, respectivamente terceiro e sexto episódios da terceira temporada, Panic Button nos coloca aquela pulga atrás da orelha e nos faz olhar com um pouquinho mais de cuidado para aqueles termos de uso que aceitamos sem nem checar se por acaso estamos cedendo nossa alma ao capiroto.
Não dá pra dizer que Panic Button é um grande filme, mas ele serve para aqueles momentos em que você não tem nada melhor para fazer. Quem gosta daqueles suspenses estilo super-cine deve ficar satisfeito. Tem uma ideia bacana, traz uma reflexão interessante e tem umas referências a clássicos do cinema que fazem os fãs esboçar aquele sorrisinho de canto de boca. É um terror barato que não dói, e o melhor (ou não) é que está na Netflix.
Cara, é um filme estranho. A ideia é interessante, toda a metalinguagem que o filme usa pra analisar a relação do autor com a sua obra. Tem uma crítica aos padrões de beleza e tal, mas a execução é meio bizarra. É o tipo de filme que termina e você não sabe dizer se gostou ou não. Acho que pela criatividade vale a pena, mas não é um filme fácil de recomendar.
Acho que o filme fala basicamente sobre incompatibilidade, não há lado certo ou errado. São duas pessoas incompatíveis em suas expectativas e planos, em sua visão sobre o amor e relacionamentos. Acho que esse duelo de pontos de vista tem mais a ver com a insistência em encontrar culpados ou responsáveis por fracassos de qualquer tipo, e não acho que ela caia sempre para o amor, pelo contrário, é sempre jogada para as pessoas, de um lado para o outro.
"A verdade é que ambos são pessoas com ideias completamente erradas sobre o amor." E qual é a certa? Até onde eu sei é a que funciona pra cada casal, não é algo padronizado. Chama-lo de imaturo, chama-la de egoísta, é só a maneira de responsabilizá-los por algo que não é da alçada deles: uma natural incompatibilidade,que não é, ou não precisa ser culpa de alguém.
Não deis lugar ao diabo, pois em qualquer brecha o inimigo faz a festa. Uma frase feita, típica de pregações neopentecostais, mas que numa análise menos teológica pode se referir ás várias concepções a respeito do mal, seja ele filosófico, metafórico, espiritual, ou até mesmo físico.
Com um desenrolar cadenciado, O Lamento nos conta uma história essencialmente folclórica, sobre guardiões, demônios, xamãs e sobre uma parte interessante da cultura oriental que conversa bastante com as noções religiosas ocidentais. Mas indo além dessa leitura, podemos ver as várias maneiras que o mal tem para entrar na vida das pessoas, disfarçado de proteção, disfarçado de boa intenção, de conexão com o divino. Quando você olha muito tempo para um abismo, o abismo olha para você, dizia Friedrich Nietzsche. Dependendo de como você combate o mal, acaba se tornando o mal, ou abrindo a porta para ele. É um dos recados que esse filme passa.
Ele fala sobre o pecado, não exatamente numa concepção religiosa, mas humana, mostrando como é tênue a linha que separa a culpa da inocência, questionando onde a busca por justiça se transforma em vingança. Nesse sentido podemos sentir uma forte crítica ao uso que as pessoas dão á religião e a fé e o poder destrutivo de falsos guias e profetas.
O roteiro brinca com as expectativas, contando uma história relativamente simples de uma forma complexa, mas não indecifrável ou inacessível. Ele apresenta seus personagens e vai os construindo de maneira dúbia, sem explicar quem é quem e quais são suas reais intenções, nos dizendo muito em cenas que aparentemente não tem grande propósito. E é nesse ponto que o filme dá uma leve derrapada, ele exige atenção aos detalhes, o que não seria um problema não fossem as duas horas e quarenta de duração. Em alguns momentos o desenvolvimento fica um pouco enfadonho, mas não é nada que chega a comprometer.
O conjunto fotografia + trilha sonora funciona bem demais, é uma combinação imersiva, que nos coloca no meio daquela vila e ao mesmo tempo nos dá a impressão de que tem alguém ou algo na espreita. Nesse ponto a gente se lembra que é um filme de terror, que aliás, caminha entre alguns subgêneros, como o de possessão e o de contágio, chegando a flertar com os zumbis em alguns momentos. E o filme consegue construir uma atmosfera de horror sem apelar aos truques típicos do gênero, como jump scares e alterações de volume.
Enfim, O Lamento é um grande filme, horror atmosférico, repleto de mistério e com muita a coisa a dizer em suas entrelinhas. Um dos belos exemplares do gênero nos últimos anos.
O atual vencedor do Oscar de melhor filme, Spotlight – Segredos Revelados abordou um tema bastante polêmico: o abuso sexual cometido por sacerdotes e o encobrimento realizado pelos altos níveis da igreja católica. Um filme incrível, mas que tratou do assunto pelo viés jornalístico e investigativo, tendo como protagonista a equipe de repórteres do The Boston Globe que trouxe a história a público. No mesmo ano, porém, foi lançado um filme bem menos badalado, mas não menos relevante sobre esse assunto.
El Bosque de Karadima, do diretor Matias Lira, conta a história de um dos maiores escândalos envolvendo sacerdotes na América Latina. Escândalo protagonizado por Fernando Karadima, famoso pároco e personalidade chilena, amigo das elites politicas, formador de algumas dezenas de padres e condenado a uma vida de penitência pelo Vaticano por suas décadas de abuso sexual e psicológico cometidos contra vários seminaristas e até fiéis de sua paróquia. Mas diferente de Spotlight, a abordagem do filme de Lira é bem menos jornalística e muito mais pessoal, quase patológica, deixando de lado os melindres burocráticos a respeito dos mecanismos de defesa dessa instituição poderosíssima.
O foco aqui é a vitima, e é do ponto de vista dela que a história é contada. Thomas Leyton, vivido brilhantemente por Benjamín Vicuña, é um jovem com suas inseguranças e confusões, em relação a sua função, a uma provável vocação religiosa, a sua família e a sua sexualidade. Um jovem que vê no Padre Karadima (Luis Gnecco), uma mistura de figura paterna e guia espiritual. Uma figura que se aproveita de todas as fraquezas e incertezas de Leyton para iniciar uma história de abuso que durará até sua vida adulta. De certa forma, o filme nos mostra um caso de dependência psicológica causada por uma vida de abusos, quase como uma síndrome de Estocolmo. O histórico de Leyton, a sua experiência familiar, tudo isso o faz desenvolver uma espécie de incapacidade de reagir, de responder as situações pelo qual ele passa. O tipo de quadro que vemos em casos de assédio moral, de violência doméstica. É uma situação que fica bem clara em alguns diálogos entre Leyton e o Padre para quem ele conta sua história. Por qual razão ele não consegue se livrar dessa situação? O que o faz ainda nutrir um tipo bizarro de afeto ou respeito pela figura que lhe causa tanto mal? É uma tentativa inconsciente de amenizar essa situação terrível? É algo que a psicologia talvez consiga responder, mas que o roteiro apenas especula.
El Bosque de Karadima acaba sendo um filme incomodo, por vários motivos, primeiro pela forma lenta que a narrativa encontra para desenvolver esse trauma, o que acaba “traumatizando” o espectador também. Segundo por que ele testa nossa capacidade de ter empatia, apresentando uma história que caminha do limite da culpabilização da vitima. E uma culpabilização que não vem apenas de terceiros, mas da própria vitima. Algo que reforça o quão profunda é a cicatriz emocional que um caso desses pode causar. Vale dizer que esse incomodo parece proposital, na intenção de botar o dedo na ferida, nos fazer refletir sobre as figuras em quem depositamos confiança, tenha motivação religiosa ou não, ou nos julgamentos que realizamos, ao responsabilizar as pessoas por coisas sobre as quais elas não tem o menor controle.
É um filme relevante em várias esferas, na de denúncia, na de análise psicológica e até na de crítica comportamental e estudo social. Aborda a relação das pessoas com a fé e com as instituições que a “representam” e a força devastadora de um trauma. É um filme forte, que não deve agradar a todo tipo de público, mas que vale a pena ser visto. Tem no Netflix.
Há 130 anos o escritor escocês Robert Louis Stevenson publicou um dos romances mais influentes da história da literatura mundial, Strange Case of Dr Jekyll and Mr Hyde, ou O médico e o monstro, em bom português. Umas das primeiras obras populares a tratar da teoria de que o mal habita em todos nós e que a nossa principal habilidade é mantê-lo escondido. Entre as notáveis figuras que leram esse romance está o Dr. Philip Zimbardo, renomado psicólogo que se dedicou a estudar esse estranho fenômeno que faz pessoas boas cruzarem a linha e cometer atrocidades, fenômeno que ele chamou de Efeito Lúcifer. Fenômeno que além de chamar a atenção de estudiosos do comportamento humano, inspira obras artísticas de todo tipo, como o thriller alemão Die dunkle Seite des Mondes, um filme um tanto quanto curioso que adapta o romance homônimo de Martin Suter.
Um dos desdobramentos curiosos do Efeito Lúcifer é a facilidade em encontrar “boas desculpas”. Sempre vai ter uma, foi por um bom motivo, foi por que a situação pediu, foi por que era a única saída, foi por que eu estava sob o efeito de um cogumelo alucinógeno. Atos de maldade raramente vêm sem uma justificativa plausível (pra quem o comete, é claro). E o poder de achar a desculpa para a violência talvez seja o que nos diferencie de um animal. Violência na natureza selvagem tem a ver com sobrevivência, não com maldade. Talvez isso explique a relação de Urs com a floresta e a importância que ela tem na trama.
Aliás, que floresta bem capturada. Um dos grandes méritos de Die dunkle Seite des Mondes é sua beleza. O filme é esteticamente incrível, sua fotografia, a iluminação e as paisagens escolhidas também. Tudo colabora pra criação do clima de suspense psicodélico, quase chegando na fantasia. Outra grande qualidade está nas atuações, até então só tinha visto Moritz Bleibtreu como coadjuvante em filmes americanos, mas seu trabalho é incrível aqui. Ele consegue transmitir a transição da segurança do grande executivo, para a fraqueza do animal violento e descontrolado.
No entanto, apesar de abordar um tema interessante, ter uma produção impecável e contar com um elenco inspirado, é na convergência desses fatores que o filme dá uma pequena derrapada. Como filme, o resultado é estranho, meio instável, mas não ruim. Só é um resultado diferente. No fim, o filme acaba sendo mesmo como uma viagem ao lado escuro da lua, mas que para alguns pode ser uma bela bad trip.
O filme é barato, tanto que alguns aspectos remetem a produções quase amadoras. Cenários, trilha sonora, figurinos, fotografia, é tudo bem “estranho”. Mas um bom texto, o carisma e esforço dos atores e o conhecimento dos gêneros abordados, transformam o projeto em um filme divertidíssimo, com uma história derivada, mas que é bem contada com seus diálogos debochados e suas ótimas piadas.
A estreia de Nguyen é um belo cartão de visitas, pois aqui ele demonstra saber trabalhar com poucos recursos, além de coordenar muito bem dois gêneros que só funcionam juntos em mãos extremamente talentosas. O filme é inteligente, constrói bem seus momentos de tensão, mas o ponto forte é no senso de humor. Ele brinca com estereótipos, acerta a mão no humor negro e subverte os clichês, se rendendo a alguns, é verdade, mas de maneira bem coerente, num filme interessante e divertido. Ele ainda apresenta aos amantes do gênero três nomes promissores: Nguyen como diretor e roteirista, Chris Dinh como ator e roteirista e a belíssima Katie Savoy como atriz. Vale a pena ver e observar o que vem por aí para esse pessoal.
O projeto tem uma aura de filme de sobrevivência, mas tem muito mais a dizer. É um filme que explora os limites do ser humano, analisando as circunstâncias que podem fazê-lo colapsar. E também pode ser encarado como uma análise interna, dos dois lados que todos temos, o impulsivo e o controlado, o sonhador e o sóbrio e como um acaba matando o outro, tornando quase impossível um “meio-termo”. Lembra, de forma um pouco menos metafórica, o ótimo “O Homem Duplicado”. É um filme ágil e interessante, que mistura comédia com drama, conta com uma ótima atuação de Josh Duhamel e um final um tanto quanto enigmático.
Sua vida é um livro aberto? Você não tem nada a esconder? E as pessoas que estão com você, também são assim? Seus amigos, seu parceiro (a), sua família, você os conhece realmente?É pouco provável, eu diria. Você conhece a versão que eles decidiram te mostrar. E o inverso é verdadeiro, mesmo que inconscientemente, somos multifacetados e multidimensionais, como um cubo mágico. Pequenas partes que formam um todo, que nunca pode ser visto de uma só vez. O todo está dentro de nós, só nós o conhecemos, ou pelo menos estava, até termos a nossa disposição ferramentas de exposição. Facebook, Twitter, Instagram. Mas mesmo assim, apenas o que decidimos tornar público está lá. Mas existe uma maneira de montar – ou pelo menos tentar - esse quebra cabeça. O contato mais particular, nossa caixa de entrada e saída, mensagens instantâneas, ligações. A soma de quem somos com cada um é o mais perto de quem somos de verdade. É onde anulamos a maior parte dos segredos e omissões.
Tem coisas que você não diz a sua esposa ou esposo, tem coisas que você não diz aos seus filhos ou seus pais, tem coisas que você não diz nem aos seus melhores amigos. E não apenas grandes segredos, como casos extraconjugais ou uma carreira secreta na máfia, pequenas informações também. Opiniões que você prefere guardar pra não gerar desgaste. Todos temos. E ás vezes o que deixamos de dizer diz mais sobre nós do que o que aquilo que dizemos. É claro que o que antes ficava apenas em nossa mente agora está ali, na nossa caixa preta particular. Nosso telefone. Por isso ele é tratado como um bem incrivelmente valioso, protegido por senha e tudo o mais. Cada um de nós tem três vidas: uma pública, uma privada e uma em segredo, é o que diz o cartaz desse filme.
Perfetti Sconosciuti é um filme que se constrói com diálogos bem estruturados, revelações bombásticas, informações sutis e muitos segredos. Mistura drama familiar com humor negro, momentos de descontração, em uma narrativa ágil e envolvente. Tem um ótimo elenco e oferece incríveis momentos de reflexão, como até que ponto vale a pena conhecer todos os segredos de uma pessoa? Ou até onde nossa privacidade está resguardada? Tem uma pegada meio Coherence misturada com Deus da Carnificina. Um filmaço.
“Do it yourself” ou “Faça você mesmo”, lema original do movimento punk, pautado pela rebeldia, subversão e até algumas boas doses de delinquência. Lema que os integrantes do The Ain’t Rights vão conhecer da maneira mais brutal possível. Os jovens que fazem parte da banda de punk rock até ostentam o estilo, mas é só a capa que esconde uma rebeldia de mentirinha, típica de jovens chafurdados na normalidade e no status quo.
Green Room é o segundo acerto do cineasta independente Jeremy Saulnier. É um pouco mais polido do que Blue Ruin, mas mantém o clima sujo, escuro e brutal de seu primeiro filme. Traz nuances de horror e suspense em um típico filme de confinamento e sobrevivência. Seu diferencial está em seus personagens, não são super inteligentes e sagazes, mas também não são burros como a maioria dos protagonistas de filmes de terror atuais. Eles dançam conforme a música, lidam com o desespero da situação de forma crua e realista e reagem de maneira coerente, tanto para o bem quanto para o mal.
Os antagonistas também apresentam um contraponto interessante, pois não são simples vilões unidimensionais, ou caipiras psicopatas. Eles têm sua motivação, seu método e seu “embasamento ideológico” (é desprezível, mas existe). Essa organização é refletida na figura de Darcy, o líder dos neo-nazis, vivido pelo sempre competente Patrick Stewart. Uma figura assustadoramente sóbria, com ecos de um Walter White – Heisenberg, pra ser mais preciso.
O ponto forte de Green Room está na tensão criada, uma espécie de confronto entre a frieza organizada e o caos desesperado, que gera explosões de violência em situações construídas para deixar o espectador na ponta da poltrona. É um dos belos suspenses desse ano, tenso, brutal, violento e catártico. Um filme que vale a pena. Infelizmente é uma das últimas atuações de Anton Yelchin, ator falecido recentemente e que ainda tinha muito a oferecer.
Todo mundo deseja ter sucesso na vida. Não é uma afirmação das mais arriscadas. Sucesso é praticamente uma demanda universal. O que não é universal é o que é o sucesso. Seu conceito, sua essência. Todo mundo sabe que quer, mas a maioria não saberia explicar o que é. Por quê? Talvez porque assim como a felicidade, o conceito de sucesso é interno, pessoal e intransferível. E talvez, também um pouco como a felicidade, porque somos confundidos pelo bombardeio de conceitos pré-definidos do que seria sucesso, do que seria uma vida desejável. É uma lógica simples, quanto mais opções forem mostradas, maiores as chances de você escolher a errada.
E o segredo é esse. Você sempre escolhera a errada. Ou pelo menos é o que te farão acreditar. Se você tiver um bom emprego, uma família bem estruturada e uma rotina, por mais que se sinta á vontade com isso, te farão acreditar que você não é realmente feliz. Surgirão dezenas de exemplos de “larguei tudo e recomecei, fui viajar o mundo e encontrei a felicidade”. E o inverso também é verdadeiro. Se levar uma vida um pouco fora dos padrões é o que você escolheu para si, não faltarão casos de jovens empreendedores que alcançaram seu primeiro milhão aos 20 anos e são a personificação do sucesso. Aquela incerteza. A comparação. É o que causa a insatisfação e que faz milhares de pessoas acreditarem em fórmulas do sucesso. E isso tudo alimenta um mercado gigantesco, que cria um problema para vender uma solução. Um mercado que vai de empresas de marketing multinível até o universo das palestras motivacionais, do empreendedorismo de palanque até clubes, cultos e seitas.
É sobre isso que fala Rebirth, longa original da Netflix que entrou no catálogo há algumas semanas. Embalado como um suspense psicológico de baixo orçamento, o filme levanta questões que são bem mais interessantes do que o próprio projeto escrito e dirigido por Karl Mueller. Em uma narrativa meio atrapalhada, o roteiro consegue pincelar alguns temas complexos, como a relação do consumo e do sexo com os ideais de sucesso e felicidade, e como o mundo atual é cheio de armadilhas pautadas pela força da sugestão e das dúvidas. As perguntas que são respondidas com outras perguntas passam bem essa mensagem, de como colocar uma pulga atrás da orelha de alguém é o suficiente para deixa-lo suscetível a suas próprias respostas.
Como filme, Rebirth tem alguns problemas. O andamento é um pouco estranho e o elenco é assustadoramente canastrão. Em alguns momentos parece que a história não tem muito pra onde ir e você se sente tão enrolado quanto o protagonista. Mas a força de Rebirth reside em sua mensagem, apesar do trailer e da própria sinopse venderem um thriller escapista comum, Rebirth não é o tipo de filme que se assiste no piloto automático. Se você o fizer, pode ficar bem desapontado. Assim como Circle, é um longa que apesar de seus problemas, tem bastante relevância em seu subtexto e por isso merece atenção.
Oito de agosto, dia nternacional do gato. Sim, os bichinhos fofinhos e cultuados no mundo todo, principalmente nos gifs na internet, tem um dia especialmente dedicado a sua existência - mais de um, na verdade. Então, que tal curtir esse dia com um filme que prova por A + B que nem o mais sanguinário dos seres humanos é capaz de resistir aos encantos de um bichano fofinho?
Keanu é uma comédia despretensiosa, que se apoia na curiosidade pela sua premissa absurda (pelo menos em teoria) e principalmente no carisma e talento de sua dupla de protagonistas. Peele e Key já são nomes conhecidos por seu histórico na TV americana, mas confesso nunca ter visto nenhum de seus trabalhos anteriores. Keanu me pegou pelos trailers e pela última boa experiência de filme onde a motivação principal é a perda de um bichinho de estimação, sim estou falando de John Wick, que aliás, é estrelado por KEANU Reeves. Sacou a referência?
Pois é, e referência é um dos pontos fortes de Keanu. Rell é um cinéfilo de carteirinha, então não faltam citações e homenagens a filmes, séries e principalmente músicas. As cenas envolvendo George Michael são impagáveis. O longa também brinca ironicamente com os estereótipos raciais no cinema, onde os protagonistas tem que se transformar praticamente em clichês ambulantes para levar sua missão adiante.
O filme ainda conta com ótimas participações especiais, como as de Will Forte, Luiz Guzmán e da sempre hilária Anna Faris. É uma peça que mistura gags de um humor mais bobinho, com algumas piadas bem inteligentes e momentos completamente fora da casinha. Mistura ação com humor, fazendo piada com convenções de gênero e com a indústria do cinema em si, é um filme agradável e fofinho, e assim como sua co-estrela, deve fazer sorrir até o mais durão dos espectadores.
Encontros e desencontros. A vida é feita deles, afinal. Amizades, romances, planos destruídos, mudanças de perspectiva, sentimentos não descobertos e não ditos. Intimidades e medos que são compartilhados sem usar palavras, apenas com a clareza e a sinceridade de um olhar. Um beijo quase acidental que foi esquecido depois de um porre, alguns casos rápidos e uma espécie de sexo por vingança que termina com uma gravidez indesejada. Uma viagem sonhada e a busca por libertação.
É assim a história de Rose (Lily Collins) e Alex (Sam Claflin), amigos inseparáveis desde a infância, acostumados a compartilhar praticamente tudo, desde desavenças familiares e paixões mal resolvidas, até os mais banais acontecimentos cotidianos. Uma relação que desde o primeiro minuto nos cativa e faz torcer. Separados por alguns quilômetros de oceano e por algumas palavras reprimidas vemos suas vidas seguindo por caminhos igualmente distintos, mas que acabam por encontrar várias intersecções toda vez que o inegável sentimento vem a tona.
Nem tudo são flores, em alguns pontos as coisas parecem não andar e os momentos que antes divertiam agora parecem repetitivos. É a vida. Nessas horas é bom curtir a música, que se encaixa perfeitamente em cada momento que passamos. Aproveite as belíssimas paisagens, também, enquanto aguardamos pelo final que já conhecemos, é verdade, mas pelo qual aguardamos ansiosamente.
Clichê? Um pouco. Excessivamente redondinho? Talvez. Mas despretensioso. Romanticamente faz ás vezes de criar uma utopia realista, de um mundo em que existem sentimentos a rodo e onde eles agem mais positiva do que negativamente. É pra isso que servem as comédias românticas, não é? Nos fazer acreditar que por mais que o os caminhos e as escolhas calhem de não acontecer como sonhamos, ás vezes vem o destino e… puff: Simplesmente Acontece.
A narrativa se desenrola de maneira não linear e esse é um dos poucos pontos bacanas do filme, por que funciona bem, sem ficar confuso e resguardando as várias reviravoltas que o roteiro traz. Claramente emulando o estilo Guy Ritchie de fazer cinema, o diretor abusa da violência e de tentativas frustradas de criar momentos de humor negro para mascarar a pobreza de sua história.
O roteiro conta com diálogos rasos que não conseguem criar o clima de comédia de erros que o diretor pretende, além de não nos fazer se importar com os personagens. Depois do primeiro plot twist você já nem se interessa com o que pode rolar com os protagonistas. Esse texto fraco acaba minando os esforços do elenco, que se esforça, mas não tem com o que trabalhar. Simon Pegg, Alice Braga, Teresa Palmer e o experiente Bryan Brown estão operantes, mas visivelmente desperdiçados.
Enfim, ‘Kill me three times’ é absolutamente derivado e fica muito, mas muito aquém de todos os filmes que ele “homenageia” meio que sem querer. Tem um elenco esforçado, uma fotografia bonita e ótimas locações, mas o roteiro é ruim e a trilha sonora terrivelmente genérica e irritante. Decepcionante.
Ousadia. Palavra de uso recorrente na hora de relembrarmos a construção do maior e mais consolidado universo cinematográfico da atualidade. Se aplica a sua origem em ‘Homem de Ferro’, a sua montagem dos ‘Vingadores’ e ao inesperado sucesso (por assim dizer) de ‘Guardiões da Galáxia’. Ousado, em termos comerciais e estratégicos é impossível não cunhar esse elogio ao estúdio. Me pergunto quando (ou se) poderemos estender esse elogio aos aspectos narrativos da casa.
As piadas e o humor do filme funcionam exatamente por se manter rigorosamente alinhados aos outros filmes do estúdio. A trama aqui é bem menor do que o habitual, sua relevância começa e termina nos conflitos e interesses de seus próprios personagens, mantendo uma relação bem sútil com os acontecimentos principais do Universo Cinematográfico Marvel. Os personagens principais e suas relações estão entre os pontos positivos do longa, a dinâmica de aprendiz e mestre que existe entre Pym e Lang funciona bem graças ao bom desempenho dos atores, além do roteiro eficiente. Scott também vai bem quando interage com Hope (Evangeline Lilly), filha de Pym e com o grupo de estereótipos raciais que compõe sua mini-quadrilha, encabeçado pelo ótimo Michael Peña, que rouba cada cena em que aparece.
O principal problema, recorrente nos filmes solo do estúdio, aliás, está no vilão. Corey Stoll é um bom ator, mas ele tem pouquíssimo material para trabalhar aqui. Darren Cross é um personagem excessivamente caricato e unidimensional, seu rancor contra o ex-parceiro e suas nuances de insanidade não funcionam em meio as frases de efeito supostamente amedrontadoras que ele profere.
Nas cenas de ação é que começamos a sentir o peso da conturbada produção. Peyton Reed se esforça, consegue agradar com as primeiras sequências envolvendo as habilidades do herói, mas falta identidade e dinamismo. As cenas passam a ficar repetitivas, principalmente com a insistência em fazer a mesma piada visual com as proporções dos combates. Aspectos que sofreram diretamente com a saída de Edgar Wright. Difícil não pensar no quão diferente seria se tivéssemos a inventividade do diretor britânico, tanto nas cenas de ação, quanto na construção narrativa, como nos momentos de explicação e treinamento do herói, que seguem fielmente a cartilha hollywoodiana.
Enfim, ‘Homem Formiga’ é leve, indolor e diverte, mas é esquecível dentro do universo em que se encontra. Repete a fórmula de sucesso da casa adicionando pitadas de inovação com sua trama de assalto, mas deixa ainda mais claro que dentro da Marvel, ousadia tem limites.
Diamantino
3.2 33Filme português absolutamente maluco que satiriza a figura do Cristiano Ronaldo ao mesmo tempo que fala da crise dos imigrantes na Europa, brexit, masculinidade tóxica, futebol como ferramenta politica e clonagem de pessoas(?).
Um Dia de Caos
3.0 121Meu novo gênero de cinema favorito é 'filmes com a Samara Weaving toda ensanguentada fumando um cigarro'.
68 Kill
3.3 21Trashzão divertido. Meio Rob Zombie, meio Robert Rodriguez. Fica registrado que o Matthew Gray Gubler é idêntico ao Rodrigo Caio do Flamengo.
Parque do Inferno
2.6 311 Assista AgoraBicho, que filme mais sem propósito.
Quem são os protagonistas e por que estão sendo mortos? Não importa.
Quem é o assassino e por que ele mata? Não interessa.
O filme não faz o minimo esforço pra ter uma história. Não há criatividade no roteiro, nem nos sustos, nem nas mortes. Até a máscara é genérica. A única "inovação" é a Bex Taylor Klaus fazendo papel de hétero.
Falcons em Jogo
1.6 50O filme conseguiu falhar em ser propositalmente ruim. Isso é um feito e tanto.
Departamento Q: Em Busca de Vingança
3.9 31 Assista AgoraÉ o mais fraco dos quatro, mas ainda assim tem seu valor. Carl Mørck mais rabugento do que nunca.
O Nome da Morte
3.4 156Existe entre os especialistas em criminologia um semi consenso do que define um assassino em série ou serial killer, se preferir: mais do que três vítimas com perfil semelhante e um método especifico de atuação em suas mortes. Mas esse não é o único tipo de “matador por atacado”, segundo a escritora Ilana Casoy temos também o assassino impulsivo (ou spree killer), que mata de maneira aleatória, movido por uma necessidade de matar, quase por esporte, sem necessariamente fantasiar com as vítimas. Ou o assassino em massa, que faz de seu crime um evento, com várias vítimas em um único local de uma única vez. São várias formas de catalisar o desejo e a necessidade pela violência.
Mas essas categorias não definem o protagonista de O Nome da Morte, talvez por que num país onde 60 mil pessoas são assassinadas num ano, a violência não é um desejo ou um hobby, é um oficio. Oficio no qual Julio Santana foi funcionário do mês todos os meses por mais de trinta anos, contabilizando quase 500 mortes em seu portfólio. Julio não matava por esporte, fetiche ou necessidade, matava por dinheiro e assim se tornou um expoente de uma profissão ainda muito popular nos rincões do Brasil: a Pistolagem.
O filme dirigido por Henrique Goldman é baseado livremente no livro de mesmo nome, escrito por Klester Cavalcanti, e não é exatamente uma biografia, nos moldes que nos acostumamos a ver no cinema nacional, que elenca cronologicamente acontecimentos da vida de seu protagonista para que o público saiba o que aconteceu e como aconteceu. Tampouco é um estudo de personagem que entra na cabeça do biografado tentando entender os porquês de suas atitudes (ainda que flerte com isso em alguns momentos). É mais como um estudo de situação, que tenta apresentar as circunstancias que levam uma pessoa a escolher a vida do crime em nosso país.
Mas tenta – com certo sucesso – fazer isso sem o uso de filosofismo, sem tomar partido sobre a pureza do homem perante a sociedade corrompida e vice e versa. Ele apenas expõe as coisas, a miséria de alguns lugares do país e a falta de perspectivas que ela gera, a insignificância da vida, a sanha por prosperidade acima de tudo de algumas religiões, a banalização completa da violência e principalmente a impunidade que reina por aqui. Ele também trabalha em humanizar cautelosamente a figura monstruosa do matador, expondo-o como a pessoa comum que pode estar bem perto de você.
Como filme, O Nome da Morte tem um quê de western brasileiro, junto de uma aura de filme de gangster, construindo um vilão de forma que não pareça totalmente odioso. Trabalha com um senso de atemporalidade, sem datar os acontecimentos e usando o número de vítimas como marcador de tempo. A trilha sonora, apesar de bem feita, é muito óbvia. Músicas tristes para momentos tristes, músicas tensas para momentos tensos, como se precisássemos de instrução do que devemos sentir em cada cena, mas nada que comprometa a experiência.
No quesito atuação a obra tem seu ponto mais alto. Marco Pigossi representa bem um homem introspectivo, de poucas palavras, que começa bastante emocional e vai ganhando frieza no decorrer do filme. Os coadjuvantes Fabíula Nascimento e André Mattos também entregam personagens sólidos, mesmo com pouco tempo de tela.
O Nome da Morte é um filme nacional interessante, que dá um viés autoral a uma biografia cem por cento brasileira, falando da tragédia marginal que assola o país sem tirar a responsabilidade do indivíduo, nem amenizar a influência da sociedade. Vale o tempo investido.
O Carma de um Assassino
3.1 53Se você chegou aqui por acaso, talvez não saiba, mas existe um submundo dos filmes de luta. É um submundo muito produtivo, onde se escondem promissores dublês e artistas marciais, ex lutadores de MMA e membros da WWE que não tem o mesmo carisma do The Rock. Um submundo onde dezenas de películas são lançadas todos os anos, geralmente direto em home vídeo. De onde submergiu um atlético Jean Claude Van Damme lá nos anos 80, por exemplo, na época em que alguns desses filmes de luta iam parar nas tardes da tv aberta. O que não acontece mais, infelizmente, no máximo esses filmes passam nas noites da Band, privando assim nossas crianças da boa e velha pancadaria desenfreada. Privando também Scott Adkins, astro maior desse submundo na atualidade, de seu devido reconhecimento.
Scott Adkins e Jesse V. Johnson, astro e diretor de Accident Man, respectivamente, dão aqui o chamado passo maior do que a perna, o famoso morder mais do que pode mastigar, ou qualquer outra variação desse ditado. Tentam entregar um filme um pouco mais ambicioso do que seus portfólios no submundo dos filmes de luta recomenda e acaba faltando substância para isso. As situações e informações fornecidas no início do filme vem tão redondinhas, tão ajeitadinhas, que fica bem evidente a forma que elas se encaixarão no desenrolar da trama. E não tem reviravolta ou subversão, as coisas acontecem exatamente como elas aparentam que vão acontecer. Mas ok, talvez não devamos exigir tanto de Adkins em sua primeira aventura como escritor.
Accident Man tem um senso de estilo familiar, combinando-o com a trama do filme podemos analisar que é como se o Guy Ritchie tentasse dirigir a sua versão de John Wick, mas sofresse um derrame no processo. A violência estilizada, o sotaque carregado e os humores britânico e politicamente incorreto estão aqui, mas numa versão meio “lesada”, principalmente no que diz respeito ao humor agressivo. As piadas que tentam ser mais ácidas, envolvendo o patriotismo e a fleuma britânica ou pautas como ambientalismo e sexualidade não conseguem fazer rir, na verdade elas não conseguem sequer ofender, só soam meio patéticas.
Mas então o filme é ruim, é isso? Não exatamente, caro leitor. Por incrível que pareça, a experiência de assistir Accident Man é boa no contexto correto. Se você é capaz de acessar aquele espirito de quando via O Grande Dragão Branco na tarde de sábado, da época em que você achava que “tijolo não revida” era um exemplo de diálogo bem escrito e que a cena do Van Damme lutando cego era a expressão máxima da sétima arte, digna de uma indicação ao Oscar, você vai curtir esse filme também. Tem arquétipos de personagens fáceis de simpatizar, um protagonista canastrão bad ass, vários coadjuvantes canastrões e bad ass, cenas de ação limpas e bem executadas e o que importa no fim das contas, uma porradaria honesta, bem coreografada e divertida de se ver.
Não é o filme que transformará Scott Adkins no Jean Claude Van Damme dessa geração, mas com um pouco mais de dedicação e sorte ele pode se tornar pelo menos um novo Jason Statham.
Let's Be Evil
1.7 68A primeira e a última cena do filme são bem legais, o problema são os oitenta minutos que estão entre esses dois momentos. Sendo muito gentil podemos tirar um ou outro conceito interessante, como o clima retro futurista. Mas a câmera subjetiva confusa, o jogo de luzes e cores exagerado, os personagens sem carisma, o ritmo arrastado e a história sem pé nem cabeça ferram com tudo. Muito ruim.
Pânico Virtual
2.4 97 Assista AgoraEm algum momento Charlie Brooker, criador de Black Mirror, e James Wan, diretor e criador da saga Jogos Mortais, entraram juntos em um avião. E essa frase que parece o inicio de uma piada ruim é a síntese da ideia de Panic Button (que em português ganhou o horrendo título de Pânico Virtual), um filme que, como diriam aquelas frases sensacionalistas que estampam pôsteres por aí a fora, “é o encontro de Jogos Mortais com Black Mirror, dentro de um avião (?!?!)”. Sem a genialidade de Brooker ou a inventividade de Wan, mas ainda sim com uma boa dose de entretenimento.
O filme dirigido por Chris Crow foge um pouco da estrutura comum de um terror de baixo orçamento. É claro que a qualidade das atuações é pra lá de questionável e o cenário e a fotografia são bastante chinfrins, mas o projeto não tenta compensar isso com horror gráfico, sangue jorrando, música alta e jump scares. Ele aposta na tensão criada pela dúvida colocada sobre cada um dos personagens, afinal é um filme de terror e sabemos que em algum momento vai dar merda. A diversão está em especular de onde a merda virá, e cada detalhe exposto sobre o grupo muda a coisa de figura.
E fora esse clima de thriller e mistério, temos o fator “isso é muito Black Mirror, mêo”, que nos faz repensar nosso comportamento na internet e o quanto nossa privacidade está em xeque nos dias de hoje. Não só em relação ao que nós compartilhamos, mas com aquilo que assistimos, lemos, a parte mais passiva da interação. Misturando um pouco os conceitos de Shut up and Dance com Hated in the Nation, respectivamente terceiro e sexto episódios da terceira temporada, Panic Button nos coloca aquela pulga atrás da orelha e nos faz olhar com um pouquinho mais de cuidado para aqueles termos de uso que aceitamos sem nem checar se por acaso estamos cedendo nossa alma ao capiroto.
Não dá pra dizer que Panic Button é um grande filme, mas ele serve para aqueles momentos em que você não tem nada melhor para fazer. Quem gosta daqueles suspenses estilo super-cine deve ficar satisfeito. Tem uma ideia bacana, traz uma reflexão interessante e tem umas referências a clássicos do cinema que fazem os fãs esboçar aquele sorrisinho de canto de boca. É um terror barato que não dói, e o melhor (ou não) é que está na Netflix.
Zoom
3.3 127Cara, é um filme estranho. A ideia é interessante, toda a metalinguagem que o filme usa pra analisar a relação do autor com a sua obra. Tem uma crítica aos padrões de beleza e tal, mas a execução é meio bizarra. É o tipo de filme que termina e você não sabe dizer se gostou ou não. Acho que pela criatividade vale a pena, mas não é um filme fácil de recomendar.
(500) Dias com Ela
4.0 5,7K Assista AgoraAcho que o filme fala basicamente sobre incompatibilidade, não há lado certo ou errado. São duas pessoas incompatíveis em suas expectativas e planos, em sua visão sobre o amor e relacionamentos. Acho que esse duelo de pontos de vista tem mais a ver com a insistência em encontrar culpados ou responsáveis por fracassos de qualquer tipo, e não acho que ela caia sempre para o amor, pelo contrário, é sempre jogada para as pessoas, de um lado para o outro.
"A verdade é que ambos são pessoas com ideias completamente erradas sobre o amor." E qual é a certa? Até onde eu sei é a que funciona pra cada casal, não é algo padronizado. Chama-lo de imaturo, chama-la de egoísta, é só a maneira de responsabilizá-los por algo que não é da alçada deles: uma natural incompatibilidade,que não é, ou não precisa ser culpa de alguém.
O Lamento
3.9 431 Assista AgoraNão deis lugar ao diabo, pois em qualquer brecha o inimigo faz a festa. Uma frase feita, típica de pregações neopentecostais, mas que numa análise menos teológica pode se referir ás várias concepções a respeito do mal, seja ele filosófico, metafórico, espiritual, ou até mesmo físico.
Com um desenrolar cadenciado, O Lamento nos conta uma história essencialmente folclórica, sobre guardiões, demônios, xamãs e sobre uma parte interessante da cultura oriental que conversa bastante com as noções religiosas ocidentais. Mas indo além dessa leitura, podemos ver as várias maneiras que o mal tem para entrar na vida das pessoas, disfarçado de proteção, disfarçado de boa intenção, de conexão com o divino. Quando você olha muito tempo para um abismo, o abismo olha para você, dizia Friedrich Nietzsche. Dependendo de como você combate o mal, acaba se tornando o mal, ou abrindo a porta para ele. É um dos recados que esse filme passa.
Ele fala sobre o pecado, não exatamente numa concepção religiosa, mas humana, mostrando como é tênue a linha que separa a culpa da inocência, questionando onde a busca por justiça se transforma em vingança. Nesse sentido podemos sentir uma forte crítica ao uso que as pessoas dão á religião e a fé e o poder destrutivo de falsos guias e profetas.
O roteiro brinca com as expectativas, contando uma história relativamente simples de uma forma complexa, mas não indecifrável ou inacessível. Ele apresenta seus personagens e vai os construindo de maneira dúbia, sem explicar quem é quem e quais são suas reais intenções, nos dizendo muito em cenas que aparentemente não tem grande propósito. E é nesse ponto que o filme dá uma leve derrapada, ele exige atenção aos detalhes, o que não seria um problema não fossem as duas horas e quarenta de duração. Em alguns momentos o desenvolvimento fica um pouco enfadonho, mas não é nada que chega a comprometer.
O conjunto fotografia + trilha sonora funciona bem demais, é uma combinação imersiva, que nos coloca no meio daquela vila e ao mesmo tempo nos dá a impressão de que tem alguém ou algo na espreita. Nesse ponto a gente se lembra que é um filme de terror, que aliás, caminha entre alguns subgêneros, como o de possessão e o de contágio, chegando a flertar com os zumbis em alguns momentos. E o filme consegue construir uma atmosfera de horror sem apelar aos truques típicos do gênero, como jump scares e alterações de volume.
Enfim, O Lamento é um grande filme, horror atmosférico, repleto de mistério e com muita a coisa a dizer em suas entrelinhas. Um dos belos exemplares do gênero nos últimos anos.
O Bosque de Karadima
3.4 10O atual vencedor do Oscar de melhor filme, Spotlight – Segredos Revelados abordou um tema bastante polêmico: o abuso sexual cometido por sacerdotes e o encobrimento realizado pelos altos níveis da igreja católica. Um filme incrível, mas que tratou do assunto pelo viés jornalístico e investigativo, tendo como protagonista a equipe de repórteres do The Boston Globe que trouxe a história a público. No mesmo ano, porém, foi lançado um filme bem menos badalado, mas não menos relevante sobre esse assunto.
El Bosque de Karadima, do diretor Matias Lira, conta a história de um dos maiores escândalos envolvendo sacerdotes na América Latina. Escândalo protagonizado por Fernando Karadima, famoso pároco e personalidade chilena, amigo das elites politicas, formador de algumas dezenas de padres e condenado a uma vida de penitência pelo Vaticano por suas décadas de abuso sexual e psicológico cometidos contra vários seminaristas e até fiéis de sua paróquia. Mas diferente de Spotlight, a abordagem do filme de Lira é bem menos jornalística e muito mais pessoal, quase patológica, deixando de lado os melindres burocráticos a respeito dos mecanismos de defesa dessa instituição poderosíssima.
O foco aqui é a vitima, e é do ponto de vista dela que a história é contada. Thomas Leyton, vivido brilhantemente por Benjamín Vicuña, é um jovem com suas inseguranças e confusões, em relação a sua função, a uma provável vocação religiosa, a sua família e a sua sexualidade. Um jovem que vê no Padre Karadima (Luis Gnecco), uma mistura de figura paterna e guia espiritual. Uma figura que se aproveita de todas as fraquezas e incertezas de Leyton para iniciar uma história de abuso que durará até sua vida adulta.
De certa forma, o filme nos mostra um caso de dependência psicológica causada por uma vida de abusos, quase como uma síndrome de Estocolmo. O histórico de Leyton, a sua experiência familiar, tudo isso o faz desenvolver uma espécie de incapacidade de reagir, de responder as situações pelo qual ele passa. O tipo de quadro que vemos em casos de assédio moral, de violência doméstica. É uma situação que fica bem clara em alguns diálogos entre Leyton e o Padre para quem ele conta sua história. Por qual razão ele não consegue se livrar dessa situação? O que o faz ainda nutrir um tipo bizarro de afeto ou respeito pela figura que lhe causa tanto mal? É uma tentativa inconsciente de amenizar essa situação terrível? É algo que a psicologia talvez consiga responder, mas que o roteiro apenas especula.
El Bosque de Karadima acaba sendo um filme incomodo, por vários motivos, primeiro pela forma lenta que a narrativa encontra para desenvolver esse trauma, o que acaba “traumatizando” o espectador também. Segundo por que ele testa nossa capacidade de ter empatia, apresentando uma história que caminha do limite da culpabilização da vitima. E uma culpabilização que não vem apenas de terceiros, mas da própria vitima. Algo que reforça o quão profunda é a cicatriz emocional que um caso desses pode causar. Vale dizer que esse incomodo parece proposital, na intenção de botar o dedo na ferida, nos fazer refletir sobre as figuras em quem depositamos confiança, tenha motivação religiosa ou não, ou nos julgamentos que realizamos, ao responsabilizar as pessoas por coisas sobre as quais elas não tem o menor controle.
É um filme relevante em várias esferas, na de denúncia, na de análise psicológica e até na de crítica comportamental e estudo social. Aborda a relação das pessoas com a fé e com as instituições que a “representam” e a força devastadora de um trauma. É um filme forte, que não deve agradar a todo tipo de público, mas que vale a pena ser visto. Tem no Netflix.
The Dark Side of The Moon
3.0 3Há 130 anos o escritor escocês Robert Louis Stevenson publicou um dos romances mais influentes da história da literatura mundial, Strange Case of Dr Jekyll and Mr Hyde, ou O médico e o monstro, em bom português. Umas das primeiras obras populares a tratar da teoria de que o mal habita em todos nós e que a nossa principal habilidade é mantê-lo escondido. Entre as notáveis figuras que leram esse romance está o Dr. Philip Zimbardo, renomado psicólogo que se dedicou a estudar esse estranho fenômeno que faz pessoas boas cruzarem a linha e cometer atrocidades, fenômeno que ele chamou de Efeito Lúcifer. Fenômeno que além de chamar a atenção de estudiosos do comportamento humano, inspira obras artísticas de todo tipo, como o thriller alemão Die dunkle Seite des Mondes, um filme um tanto quanto curioso que adapta o romance homônimo de Martin Suter.
Um dos desdobramentos curiosos do Efeito Lúcifer é a facilidade em encontrar “boas desculpas”. Sempre vai ter uma, foi por um bom motivo, foi por que a situação pediu, foi por que era a única saída, foi por que eu estava sob o efeito de um cogumelo alucinógeno. Atos de maldade raramente vêm sem uma justificativa plausível (pra quem o comete, é claro). E o poder de achar a desculpa para a violência talvez seja o que nos diferencie de um animal. Violência na natureza selvagem tem a ver com sobrevivência, não com maldade. Talvez isso explique a relação de Urs com a floresta e a importância que ela tem na trama.
Aliás, que floresta bem capturada. Um dos grandes méritos de Die dunkle Seite des Mondes é sua beleza. O filme é esteticamente incrível, sua fotografia, a iluminação e as paisagens escolhidas também. Tudo colabora pra criação do clima de suspense psicodélico, quase chegando na fantasia. Outra grande qualidade está nas atuações, até então só tinha visto Moritz Bleibtreu como coadjuvante em filmes americanos, mas seu trabalho é incrível aqui. Ele consegue transmitir a transição da segurança do grande executivo, para a fraqueza do animal violento e descontrolado.
No entanto, apesar de abordar um tema interessante, ter uma produção impecável e contar com um elenco inspirado, é na convergência desses fatores que o filme dá uma pequena derrapada. Como filme, o resultado é estranho, meio instável, mas não ruim. Só é um resultado diferente. No fim, o filme acaba sendo mesmo como uma viagem ao lado escuro da lua, mas que para alguns pode ser uma bela bad trip.
Crush the Skull
2.8 13O filme é barato, tanto que alguns aspectos remetem a produções quase amadoras. Cenários, trilha sonora, figurinos, fotografia, é tudo bem “estranho”. Mas um bom texto, o carisma e esforço dos atores e o conhecimento dos gêneros abordados, transformam o projeto em um filme divertidíssimo, com uma história derivada, mas que é bem contada com seus diálogos debochados e suas ótimas piadas.
A estreia de Nguyen é um belo cartão de visitas, pois aqui ele demonstra saber trabalhar com poucos recursos, além de coordenar muito bem dois gêneros que só funcionam juntos em mãos extremamente talentosas. O filme é inteligente, constrói bem seus momentos de tensão, mas o ponto forte é no senso de humor. Ele brinca com estereótipos, acerta a mão no humor negro e subverte os clichês, se rendendo a alguns, é verdade, mas de maneira bem coerente, num filme interessante e divertido. Ele ainda apresenta aos amantes do gênero três nomes promissores: Nguyen como diretor e roteirista, Chris Dinh como ator e roteirista e a belíssima Katie Savoy como atriz. Vale a pena ver e observar o que vem por aí para esse pessoal.
E não se esqueça, CRUSH THE SKULL ALWAYS!
A Rota de Colisão
3.3 101 Assista AgoraO projeto tem uma aura de filme de sobrevivência, mas tem muito mais a dizer. É um filme que explora os limites do ser humano, analisando as circunstâncias que podem fazê-lo colapsar. E também pode ser encarado como uma análise interna, dos dois lados que todos temos, o impulsivo e o controlado, o sonhador e o sóbrio e como um acaba matando o outro, tornando quase impossível um “meio-termo”. Lembra, de forma um pouco menos metafórica, o ótimo “O Homem Duplicado”. É um filme ágil e interessante, que mistura comédia com drama, conta com uma ótima atuação de Josh Duhamel e um final um tanto quanto enigmático.
Perfeitos Desconhecidos
4.2 99 Assista AgoraSua vida é um livro aberto? Você não tem nada a esconder? E as pessoas que estão com você, também são assim? Seus amigos, seu parceiro (a), sua família, você os conhece realmente?É pouco provável, eu diria. Você conhece a versão que eles decidiram te mostrar. E o inverso é verdadeiro, mesmo que inconscientemente, somos multifacetados e multidimensionais, como um cubo mágico. Pequenas partes que formam um todo, que nunca pode ser visto de uma só vez. O todo está dentro de nós, só nós o conhecemos, ou pelo menos estava, até termos a nossa disposição ferramentas de exposição. Facebook, Twitter, Instagram. Mas mesmo assim, apenas o que decidimos tornar público está lá. Mas existe uma maneira de montar – ou pelo menos tentar - esse quebra cabeça. O contato mais particular, nossa caixa de entrada e saída, mensagens instantâneas, ligações. A soma de quem somos com cada um é o mais perto de quem somos de verdade. É onde anulamos a maior parte dos segredos e omissões.
Tem coisas que você não diz a sua esposa ou esposo, tem coisas que você não diz aos seus filhos ou seus pais, tem coisas que você não diz nem aos seus melhores amigos. E não apenas grandes segredos, como casos extraconjugais ou uma carreira secreta na máfia, pequenas informações também. Opiniões que você prefere guardar pra não gerar desgaste. Todos temos. E ás vezes o que deixamos de dizer diz mais sobre nós do que o que aquilo que dizemos. É claro que o que antes ficava apenas em nossa mente agora está ali, na nossa caixa preta particular. Nosso telefone. Por isso ele é tratado como um bem incrivelmente valioso, protegido por senha e tudo o mais. Cada um de nós tem três vidas: uma pública, uma privada e uma em segredo, é o que diz o cartaz desse filme.
Perfetti Sconosciuti é um filme que se constrói com diálogos bem estruturados, revelações bombásticas, informações sutis e muitos segredos. Mistura drama familiar com humor negro, momentos de descontração, em uma narrativa ágil e envolvente. Tem um ótimo elenco e oferece incríveis momentos de reflexão, como até que ponto vale a pena conhecer todos os segredos de uma pessoa? Ou até onde nossa privacidade está resguardada? Tem uma pegada meio Coherence misturada com Deus da Carnificina. Um filmaço.
Sala Verde
3.3 546 Assista Agora“Do it yourself” ou “Faça você mesmo”, lema original do movimento punk, pautado pela rebeldia, subversão e até algumas boas doses de delinquência. Lema que os integrantes do The Ain’t Rights vão conhecer da maneira mais brutal possível. Os jovens que fazem parte da banda de punk rock até ostentam o estilo, mas é só a capa que esconde uma rebeldia de mentirinha, típica de jovens chafurdados na normalidade e no status quo.
Green Room é o segundo acerto do cineasta independente Jeremy Saulnier. É um pouco mais polido do que Blue Ruin, mas mantém o clima sujo, escuro e brutal de seu primeiro filme. Traz nuances de horror e suspense em um típico filme de confinamento e sobrevivência. Seu diferencial está em seus personagens, não são super inteligentes e sagazes, mas também não são burros como a maioria dos protagonistas de filmes de terror atuais. Eles dançam conforme a música, lidam com o desespero da situação de forma crua e realista e reagem de maneira coerente, tanto para o bem quanto para o mal.
Os antagonistas também apresentam um contraponto interessante, pois não são simples vilões unidimensionais, ou caipiras psicopatas. Eles têm sua motivação, seu método e seu “embasamento ideológico” (é desprezível, mas existe). Essa organização é refletida na figura de Darcy, o líder dos neo-nazis, vivido pelo sempre competente Patrick Stewart. Uma figura assustadoramente sóbria, com ecos de um Walter White – Heisenberg, pra ser mais preciso.
O ponto forte de Green Room está na tensão criada, uma espécie de confronto entre a frieza organizada e o caos desesperado, que gera explosões de violência em situações construídas para deixar o espectador na ponta da poltrona. É um dos belos suspenses desse ano, tenso, brutal, violento e catártico. Um filme que vale a pena. Infelizmente é uma das últimas atuações de Anton Yelchin, ator falecido recentemente e que ainda tinha muito a oferecer.
Rebirth
2.2 149 Assista AgoraTodo mundo deseja ter sucesso na vida. Não é uma afirmação das mais arriscadas. Sucesso é praticamente uma demanda universal. O que não é universal é o que é o sucesso. Seu conceito, sua essência. Todo mundo sabe que quer, mas a maioria não saberia explicar o que é. Por quê? Talvez porque assim como a felicidade, o conceito de sucesso é interno, pessoal e intransferível. E talvez, também um pouco como a felicidade, porque somos confundidos pelo bombardeio de conceitos pré-definidos do que seria sucesso, do que seria uma vida desejável. É uma lógica simples, quanto mais opções forem mostradas, maiores as chances de você escolher a errada.
E o segredo é esse. Você sempre escolhera a errada. Ou pelo menos é o que te farão acreditar. Se você tiver um bom emprego, uma família bem estruturada e uma rotina, por mais que se sinta á vontade com isso, te farão acreditar que você não é realmente feliz. Surgirão dezenas de exemplos de “larguei tudo e recomecei, fui viajar o mundo e encontrei a felicidade”. E o inverso também é verdadeiro. Se levar uma vida um pouco fora dos padrões é o que você escolheu para si, não faltarão casos de jovens empreendedores que alcançaram seu primeiro milhão aos 20 anos e são a personificação do sucesso. Aquela incerteza. A comparação. É o que causa a insatisfação e que faz milhares de pessoas acreditarem em fórmulas do sucesso. E isso tudo alimenta um mercado gigantesco, que cria um problema para vender uma solução. Um mercado que vai de empresas de marketing multinível até o universo das palestras motivacionais, do empreendedorismo de palanque até clubes, cultos e seitas.
É sobre isso que fala Rebirth, longa original da Netflix que entrou no catálogo há algumas semanas. Embalado como um suspense psicológico de baixo orçamento, o filme levanta questões que são bem mais interessantes do que o próprio projeto escrito e dirigido por Karl Mueller. Em uma narrativa meio atrapalhada, o roteiro consegue pincelar alguns temas complexos, como a relação do consumo e do sexo com os ideais de sucesso e felicidade, e como o mundo atual é cheio de armadilhas pautadas pela força da sugestão e das dúvidas. As perguntas que são respondidas com outras perguntas passam bem essa mensagem, de como colocar uma pulga atrás da orelha de alguém é o suficiente para deixa-lo suscetível a suas próprias respostas.
Como filme, Rebirth tem alguns problemas. O andamento é um pouco estranho e o elenco é assustadoramente canastrão. Em alguns momentos parece que a história não tem muito pra onde ir e você se sente tão enrolado quanto o protagonista. Mas a força de Rebirth reside em sua mensagem, apesar do trailer e da própria sinopse venderem um thriller escapista comum, Rebirth não é o tipo de filme que se assiste no piloto automático. Se você o fizer, pode ficar bem desapontado. Assim como Circle, é um longa que apesar de seus problemas, tem bastante relevância em seu subtexto e por isso merece atenção.
Keanu - Cadê Meu Gato?!
3.1 70Oito de agosto, dia nternacional do gato. Sim, os bichinhos fofinhos e cultuados no mundo todo, principalmente nos gifs na internet, tem um dia especialmente dedicado a sua existência - mais de um, na verdade. Então, que tal curtir esse dia com um filme que prova por A + B que nem o mais sanguinário dos seres humanos é capaz de resistir aos encantos de um bichano fofinho?
Keanu é uma comédia despretensiosa, que se apoia na curiosidade pela sua premissa absurda (pelo menos em teoria) e principalmente no carisma e talento de sua dupla de protagonistas. Peele e Key já são nomes conhecidos por seu histórico na TV americana, mas confesso nunca ter visto nenhum de seus trabalhos anteriores. Keanu me pegou pelos trailers e pela última boa experiência de filme onde a motivação principal é a perda de um bichinho de estimação, sim estou falando de John Wick, que aliás, é estrelado por KEANU Reeves. Sacou a referência?
Pois é, e referência é um dos pontos fortes de Keanu. Rell é um cinéfilo de carteirinha, então não faltam citações e homenagens a filmes, séries e principalmente músicas. As cenas envolvendo George Michael são impagáveis. O longa também brinca ironicamente com os estereótipos raciais no cinema, onde os protagonistas tem que se transformar praticamente em clichês ambulantes para levar sua missão adiante.
O filme ainda conta com ótimas participações especiais, como as de Will Forte, Luiz Guzmán e da sempre hilária Anna Faris. É uma peça que mistura gags de um humor mais bobinho, com algumas piadas bem inteligentes e momentos completamente fora da casinha. Mistura ação com humor, fazendo piada com convenções de gênero e com a indústria do cinema em si, é um filme agradável e fofinho, e assim como sua co-estrela, deve fazer sorrir até o mais durão dos espectadores.
Simplesmente Acontece
3.8 1,8K Assista AgoraEncontros e desencontros. A vida é feita deles, afinal. Amizades, romances, planos destruídos, mudanças de perspectiva, sentimentos não descobertos e não ditos. Intimidades e medos que são compartilhados sem usar palavras, apenas com a clareza e a sinceridade de um olhar. Um beijo quase acidental que foi esquecido depois de um porre, alguns casos rápidos e uma espécie de sexo por vingança que termina com uma gravidez indesejada. Uma viagem sonhada e a busca por libertação.
É assim a história de Rose (Lily Collins) e Alex (Sam Claflin), amigos inseparáveis desde a infância, acostumados a compartilhar praticamente tudo, desde desavenças familiares e paixões mal resolvidas, até os mais banais acontecimentos cotidianos. Uma relação que desde o primeiro minuto nos cativa e faz torcer. Separados por alguns quilômetros de oceano e por algumas palavras reprimidas vemos suas vidas seguindo por caminhos igualmente distintos, mas que acabam por encontrar várias intersecções toda vez que o inegável sentimento vem a tona.
Nem tudo são flores, em alguns pontos as coisas parecem não andar e os momentos que antes divertiam agora parecem repetitivos. É a vida. Nessas horas é bom curtir a música, que se encaixa perfeitamente em cada momento que passamos. Aproveite as belíssimas paisagens, também, enquanto aguardamos pelo final que já conhecemos, é verdade, mas pelo qual aguardamos ansiosamente.
Clichê? Um pouco. Excessivamente redondinho? Talvez. Mas despretensioso. Romanticamente faz ás vezes de criar uma utopia realista, de um mundo em que existem sentimentos a rodo e onde eles agem mais positiva do que negativamente. É pra isso que servem as comédias românticas, não é? Nos fazer acreditar que por mais que o os caminhos e as escolhas calhem de não acontecer como sonhamos, ás vezes vem o destino e… puff: Simplesmente Acontece.
Mate-me Mais Uma Vez
3.0 93A narrativa se desenrola de maneira não linear e esse é um dos poucos pontos bacanas do filme, por que funciona bem, sem ficar confuso e resguardando as várias reviravoltas que o roteiro traz. Claramente emulando o estilo Guy Ritchie de fazer cinema, o diretor abusa da violência e de tentativas frustradas de criar momentos de humor negro para mascarar a pobreza de sua história.
O roteiro conta com diálogos rasos que não conseguem criar o clima de comédia de erros que o diretor pretende, além de não nos fazer se importar com os personagens. Depois do primeiro plot twist você já nem se interessa com o que pode rolar com os protagonistas. Esse texto fraco acaba minando os esforços do elenco, que se esforça, mas não tem com o que trabalhar. Simon Pegg, Alice Braga, Teresa Palmer e o experiente Bryan Brown estão operantes, mas visivelmente desperdiçados.
Enfim, ‘Kill me three times’ é absolutamente derivado e fica muito, mas muito aquém de todos os filmes que ele “homenageia” meio que sem querer. Tem um elenco esforçado, uma fotografia bonita e ótimas locações, mas o roteiro é ruim e a trilha sonora terrivelmente genérica e irritante. Decepcionante.
Homem-Formiga
3.7 2,0K Assista AgoraOusadia. Palavra de uso recorrente na hora de relembrarmos a construção do maior e mais consolidado universo cinematográfico da atualidade. Se aplica a sua origem em ‘Homem de Ferro’, a sua montagem dos ‘Vingadores’ e ao inesperado sucesso (por assim dizer) de ‘Guardiões da Galáxia’. Ousado, em termos comerciais e estratégicos é impossível não cunhar esse elogio ao estúdio. Me pergunto quando (ou se) poderemos estender esse elogio aos aspectos narrativos da casa.
As piadas e o humor do filme funcionam exatamente por se manter rigorosamente alinhados aos outros filmes do estúdio. A trama aqui é bem menor do que o habitual, sua relevância começa e termina nos conflitos e interesses de seus próprios personagens, mantendo uma relação bem sútil com os acontecimentos principais do Universo Cinematográfico Marvel. Os personagens principais e suas relações estão entre os pontos positivos do longa, a dinâmica de aprendiz e mestre que existe entre Pym e Lang funciona bem graças ao bom desempenho dos atores, além do roteiro eficiente. Scott também vai bem quando interage com Hope (Evangeline Lilly), filha de Pym e com o grupo de estereótipos raciais que compõe sua mini-quadrilha, encabeçado pelo ótimo Michael Peña, que rouba cada cena em que aparece.
O principal problema, recorrente nos filmes solo do estúdio, aliás, está no vilão. Corey Stoll é um bom ator, mas ele tem pouquíssimo material para trabalhar aqui. Darren Cross é um personagem excessivamente caricato e unidimensional, seu rancor contra o ex-parceiro e suas nuances de insanidade não funcionam em meio as frases de efeito supostamente amedrontadoras que ele profere.
Nas cenas de ação é que começamos a sentir o peso da conturbada produção. Peyton Reed se esforça, consegue agradar com as primeiras sequências envolvendo as habilidades do herói, mas falta identidade e dinamismo. As cenas passam a ficar repetitivas, principalmente com a insistência em fazer a mesma piada visual com as proporções dos combates. Aspectos que sofreram diretamente com a saída de Edgar Wright. Difícil não pensar no quão diferente seria se tivéssemos a inventividade do diretor britânico, tanto nas cenas de ação, quanto na construção narrativa, como nos momentos de explicação e treinamento do herói, que seguem fielmente a cartilha hollywoodiana.
Enfim, ‘Homem Formiga’ é leve, indolor e diverte, mas é esquecível dentro do universo em que se encontra. Repete a fórmula de sucesso da casa adicionando pitadas de inovação com sua trama de assalto, mas deixa ainda mais claro que dentro da Marvel, ousadia tem limites.