Anaconda é um filme extremamente mal compreendido, afirmar seu caráter trash como peso negativo é como punir uma comédia por sua hilaridade ou dispensar um drama por este se mostrar sensível e tocante. Este é um filme B que retoma tudo aquilo que deu ao gênero tanto prestígio entre adolescentes a procura de uma boa diversão nonsensica; mortes absurdamente sádicas, efeitos especiais decentes o suficiente para causar náuseas e grosseiros o suficiente para provocar risadas e um dos vilões mais impiedosos e repulsivos da história do cinema (e nem estou me referindo à cobra devoradora de homens ainda). Talvez a eficácia inesperada de Anaconda quando comparado a outros filmes de monstros devoradores, é a sua capacidade de transformar seu meio físico (aqui a densa e assustadora floresta Amazônica) em um dos muitos vilões do longa - a floresta respira, mata, seduz e protagoniza esse caos fílmico com a mesma imponência dos dotes físicos de Jennifer Lopez. Empregando uma trilha sonora tensa e pungente e sempre desenvolvendo crescente tensão ao progredir da narrativa, o filme se transforma em mais do que uma simples costura de chacinas, mostrando-se extremamente atmosférico e envolvente, talvez mais do que nosso próprio bom senso gostaria de admitir. Ainda que os vilões reptilianos sejam inquestionavelmente parte essencial da diversão bestial, é John Voight encarnando um dos vilões mais excêntricos e excessivos de todos os tempos quem rouba a cena, em uma atuação tão genial e regada a trejeitos que caso este não fosse um "trash" proclamado, mas um drama psicológico de cara séria, certamente levaria uma estatueta de melhor ator para casa. Negar a diversão de ver rostos conhecidos como J-Lo, Owen Wilson e Eric Stoltz perseguidos por cobras mecânicas de 10 metros é quase blasfêmico, o filme insiste em situações absurdas (Voight encharcando Lopez de sangue de macaco sendo uma de muitas) e insere momentos pseudo-dramáticos com tanta efervescência que o apelo "campy" transborda mais que as margens do rio Amazonas em estação de chuvas. Não obstante, o filme ainda é responsável por uma das gafes mais horrendas e memoráveis de uma grande produção Hollywoodiana - o diretor gostou tanto do plano em que um barco estaciona as margens do rio que resolveu apenas reverter a seqüência para mostrar o barco partindo, ignorando é claro o fato de que ao fundo existia uma imensa cachoeira.
Um melodrama eficiente (senão demasiadamente convencional e piegas) que ganha surpreendente peso emocional graças a uma magistral performance da subestimada Angela Basset.
Não possui sequer vestígios de autenticidade, alternando entre melodrama e frieza de forma descuidada e se estendendo durante maçantes três horas de duração sem o mínimo de coerência e a mercê de atuações estatuescas e presunçosas.
Se há algo que chama atenção no brilhante Tokyo Godfathers à primeira vista, é a belíssima animação e direção de arte, que conferem não só um nível absurdo de detalhes aos belos cenários como também nuances aos seus excêntricos personagens poucas vezes vistas em produções animadas - o filme respira, é vivo, complexo, magnífico. O longa se inicia já de forma criativa, os créditos aparecem na forma de letreiros da grande Tokyo, algo que nos imerge desde o princípio naquele mundo infestado de luzes e carregado de frieza passiva. Miss Hana, Gin e Miyuki são três moradores de rua com passados distintos, porém unidos pela rejeição – o filme expõe a amizade entre um travesti afetado, um vagabundo troglodita e uma adolescente amotinada de forma magnífica, já que explora essa dinâmica enfatizando as diferenças brutais entre tais figuras ao mesmo em que evidencia o amor e a aceitação existentes ali, amor e aceitação que lhes faltava enquanto integrantes infelizes da sociedade. A mercê da árdua vida nas ruas, os três protagonistas surpreendentemente se deparam com um bebê abandonado, que assume para aquelas pessoas a forma simbólica de esperança e de renascença (algo reforçado pelo fato do filme se passar durante as celebrações do Natal), conduzindo nossos heróis a uma série de coincidências improváveis que os forçam a lidar com o próprio passado e a descobrirem mais sobre si mesmos; e é apostando nesse caminho que o filme ganha o aspecto de uma fábula moderna, misturando magia e crueza com admirável sensibilidade. Tokyo Godfathers reafirma não só o poder de personagens multifacetados e da tônica sensível para se criar um grande filme, como também mostra que o anime pode ser tão tocante, tão dramático, tão engraçado e tão visceral quanto filmes de carne e osso.
The Princess Bride é um divertido filme de fantasia que parodia e homenageia o gênero em iguais proporções, criando uma experiência mágica e empolgante sem se levar a sério demais. A trama simplista e típica de contos de fada se faz na idéia do amor verdadeiro; Buttercup é uma bela jovem que faz um pacto de amor com o camponês Westley; mais tarde, quando recebe notícias de que o rapaz está morto, aceita casar-se com um maquiavélico príncipe; dias antes do casamento a moça é raptada e descobre que quem a raptara é justamente Westley, que agora deve lutar contra os mais variados inimigos para mantê-los juntos, contando mais tarde com excêntricos e divertidos personagens coadjuvantes. Extremamente leve e fluído, o filme se inicia contemporaneamente, vemos um garoto jogando vídeo-game e seu avô o propõe para que leia uma estória, o garoto relutantemente escuta e na medida em que esta progride (e assim o verdadeiro filme se inicia), ele se vê encantado - e não demora muito para que o espectador também se renda aos charmes do longa. The Princess Bride é uma verdadeira injeção bucólica de romance e fantasia - temos divertidas lutas de espada, um pântano sinistro e repleto de armadilhas, um gigante simpático e bondoso, um espadachim obstinado a vingar a morte do pai e é claro - a luta pelo irrefutável amor verdadeiro como tema central, cujo princípio nobre dá forças para que os protagonistas enfrentem até os mais inimagináveis obstáculos. A direção de arte merece destaque, desde a maquiagem do caquético e disforme milagreiro da vila até o plano em que os protagonistas cavalgam em verdes campos rumo à aurora, o longa nunca falha em encantar. De duração relativamente curta, o filme jamais se torna cansativo e remanesce na memória como um belo conto de fadas lido antes de dormir, plantando doces memórias e bons valores.
Evocando em tom clássicos dourados Hollywoodianos como “To Catch a Thief” e “Charade”, The Tourist é um filme agradável e inofensivo, que reúne dois dos maiores astros atuais em um jogo de gato e rato pouco crível mas afável em toda sua espumosidade. O diretor alemão Donnersmarck, não habituado a dirigir grandes blockbusters, injeta um humor tipicamente europeu e discreto na trama e desde os primeiros frames parece mais preocupado em explorar os traços lascivos de Jolie (que durante o filme limita-se a caras e bocas) do que com a trama em si, algo não muito condenável, já que esta se mostra extremamente pedestre e forçada. Depp, habituado a interpretar sujeitos excêntricos, encarna o professor de matemática Frank com formidável discrição, apesar que certos trejeitos imediatamente evocam personagens anteriores, é como se no acatado Frank restassem sequelas de Jack Sparrow. Quando não deslumbrado com os milhares de vestidos longos nos quais a bela Jolie desfila com alarde, o filme ocasionalmente foca em cenas de ação de adrenalina dosada - bem filmadas, classudas e moderadamente divertidas; a trilha sonora segue a mesma linha, criando uma atmosfera luxuosa (senão piegas por vezes) e de cativante glamour retrô. Ainda que haja pouca química entre os protagonistas, o romance funciona por este já ser essencialmente distante, e felizmente, o filme abraça seu propósito frívolo, focando exclusivamente na suntuosa Veneza, no apelo de seus astros e na própria finesse. The Tourist é nada mais que um comercial de perfume com duas horas de projeção, belo de se olhar e indulgentemente imerso em sua própria artificialidade.
Anywhere But Here é um drama “mãe e filha” que percorre caminhos familiares do gênero mas acerta ao evitar uma trama burocrática e distribuir seu foco em pequenos clímax ao longo da narrativa, que exploram essa saturada dinâmica familiar não necessariamente de forma única mas com charme e honestidade o suficiente para envolver o espectador. Desde os primeiros minutos de projeção, somos expostos à relação da extravagante e avoada Adele (Sarandon) e sua apática e sagaz filha adolescente Ann; juntas, elas rumam à Beverly Hills, deixando para trás a monotonia de Bay City e buscando um novo início. A premissa do longa é certamente de intenções rasas, mas ainda que o melodrama óbvio surja em pequenas doses ocasionalmente, o filme surpreendentemente se contém em momentos delicados, revelando uma discrição rara em produções Hollywoodianas. Susan Sarandon, como de costume, está excelente, a atriz consegue a proeza de tornar seu personagem simpatizável apesar de toda sua inconveniência fanfarrista, mas é Natalie Portman – com apenas 19 anos - quem realmente brilha aqui; a atriz quebra qualquer estereótipo de adolescente angustiado e apresenta nuances raramente vistas em atrizes tão jovens - seu personagem se torna não só esférico como extremamente real e efetivo, conferindo admirável densidade ao longa. A medida que as protagonistas se envolvem em novos romances, desejos, ilusões e descobertas, elas são confrontadas uma pela outra, porém de forma brutal e egoísta, o que não permite que estas apreciem inteiramente a companhia uma da outra ou mesmo que se levem a sério; é somente quando o valor da independência e dos sacrifícios reais de altruísmo surgem por caminhos estreitos, que ambas passam a valorizar sua relação. Ainda que o roteiro falhe em alguns momentos por certas incongruências (a narração off da personagem de Natalie se mostra desnecessária e pouco acrescenta à trama), o filme ultimamente caminha na direção certa e se conclui com simplicidade, transmitindo sua mensagem formidavelmente e provando que em um nível ou outro, fomos capazes de nos identificar e criar laços com aquelas pessoas.
Dispensável e extremamente satisfeito consigo mesmo, No Strings Attached reúne Ashton Kutcher (em seu milésimo papel de garotão charmoso) e Natalie Portman (mostrando versatilidade após encarnar de forma brilhante a obsessiva bailarina Nina em Black Swan), mas infelizmente não vai muito além. Se o título e a premissa do longa já revelam sua patética previsibilidade, seria indispensável que este ao menos conquistasse o público com personagens interessantes e cenas memoráveis, ao invés disso, somos apresentados as mais velhas “gags” do gênero que só não se tornam um fracasso total graças a alguns excêntricos personagens secundários. Natalie Portman, bela como de costume, é servida com um personagem extremamente raso e sem qualquer indício de bom senso, se comportando como difícil e insensata apenas para que o inevitável e irritante conflito final possa se fazer presente. Kutcher, muito habituado a filmes do tipo, se satisfaz em criar um personagem unidimensional e depende apenas de seu apelo como galã adolescente. O que torna No Strings Attached deplorável, porém, é sua incapacidade de explorar a relação dos protagonistas de forma intrigante; se os personagens se mostram tediosos em suas essências pedestres e se o longa não os oferece oportunidades para crescer e desenvolver, o que nos resta é apenas sexo sem compromisso, ação sem emoção, um filme tão satisfeito com sua própria mediocridade que é difícil evitar o desinteresse total após alguns minutos de projeção. Contando ainda com desfechos implausíveis cujo único objetivo é provocar risadas amarelas ao término da sessão, No String Attached é um fracasso total para todos envolvidos.
Clean é um filme admirável, são muitos os dramas que permeiam a narrativa e ainda assim, ele jamais soa desonesto ou excessivo em suas pretensões, o realismo dos personagens e a forma simples e sensível como as situações são desdobradas, dão ao filme uma dignidade poucas vezes encontrada em dramas que lidam com temas tão saturados. O filme acompanha a trajetória de Emily Wang, cujo marido – um roqueiro famoso nos anos 80 – morre subitamente de overdose no quarto de hotel onde viviam; Emily se vê sozinha no mundo e depois de seis meses na cadeia por posse de heroína, decide se limpar das drogas e recuperar a guarda de seu filho, que há muito tempo mora com os avós. A efetividade do filme depende em grande parte da performance da protagonista Maggie Cheung e ela não decepciona; a atuação de Cheung é contida porém extremamente intensa, a atriz retrata a confusão interna da personagem de forma multifacetada; com pequenos gestos e feições que nem por um instante soam insinceros, ela dá a Emily - uma personagem não necessariamente carismática – uma dignidade que conquista o espectador, nós passamos a torcer com veemência para que essa mulher sofredora encontre seu caminho. Contrabalanceando a frieza de Emily, entra em cena o sensível e complacente avô de seu filho, interpretado de forma magistral e tocante por Nick Nolte (é surpreendente que o ator tenha sido ignorado pelas premiações ao passo que Cheung merecidamente foi premiada com o Cannes), que surge como um inesperado apoio a Emily - através de conselhos honestos e uma entrega de confiança que a toca, ele injeta nela a dose necessária de autoconfiança para que a jovem possa achar dentro de si seu próprio perdão e consequentemente encarar o papel de mãe com dignidade. Ao retratar a luta de Emily contra seus vícios (que vão além das drogas já que ela constantemente mente para si mesmo), o filme consegue a proeza de fugir de clichês e colocar a essência da personagem acima de seus defeitos, de modo que possamos compreender Emily e não condena-la por suas inconseqüências. Talvez os momentos mais triunfais de Clean sejam justamente aqueles de menor importância à trama - o passeio de Emily com seu filho no zoológico, o diálogo terno entre os avós ao refletir sobre a vida e principalmente as cenas em que Cheung e Nolte interagem, acabam se destacando na atmosfera gélida do filme, pois são neles que detectamos a humanidade daquelas pessoas e passamos a torcer não para que determinado personagem faça sua vontade, mas para que todos se encontrem em harmonia, afinal, em meio desse caos não há vilões, apenas fatalidades superáveis e pessoas renováveis.
Knight & Day é - antes de tudo - um projeto de vaidade para suas super estrelas Cruise e Diaz, que aqui abusam de seus trejeitos habituais e recorrem a velhos personagens de seus blockbusters anteriores para criar paródias de si mesmos. O filme, receoso de se entregar a um gênero específico, perambula entre histeria cômica e incessantes perseguições explosivas, envolvendo os protagonistas em cenas que variam entre divertidamente absurdas e extremamente cansativas – aliás, como este é um filme repleto de ação, vale criticar o uso excessivo e incompetente de CGI, que se mostra excepcionalmente fraco na seqüência envolvendo uma tourada. Diaz e Cruise, ainda que interpretando um par romântico em circunstâncias extraordinárias, jamais convencem o espectador de que realmente estão apaixonados; não que falte química ao casal, é apenas que a dinâmica entre os sorridentes protagonistas evoca muito mais uma camaradagem do que a pretendida tensão sexual. Knight and Day poderia até se concluir como um escapismo agradável e passageiro, mas descarta essa possibilidade ao investir em um desnecessário e maçante terceiro ato envolvendo o passado do personagem de Cruise, que para começar, é caricato demais para demonstrar qualquer indício de um ser humano crível.
Riding in Cars with Boys tenta conciliar humor e melodrama a todo tempo durante suas longas duas horas de duração e nem sempre satisfaz tal ambição; este é um filme repleto de momentos charmosos mas que ultimamente soa mais pueril do que o pretendido. Drew Barrymore, como de costume, confere considerável amabilidade a sua personagem; mesmo que a atriz peque em alguns momentos por uma atuação levemente caricata, ela conquista o espectador e mantém o filme na linha, ainda que este insista constantemente em desvios tônicos pouco adequados à narrativa. O destaque aqui, vai surpreendentemente para Steve Zahn, que encarnando um marido alcoólatra e irresponsável, consegue tornar seu personagem esférico ao jamais se entregar a estereótipos, surgindo como o elemento mais humano e tocante da trama. Riding in Cars with Boys é um “água com açúcar” que ocasionalmente incomoda por tentar ser vinho (apesar de sua óbvia coloração transparente), mas que também não deixa de ser eficiente como um agradável (senão esquecível) passatempo.
Jeeper's Creepers é um filme frustrante, não porque é um desastre completo, mas porque este caminha tão irresponsavelmente entre o genial e o estúpido que merece aplausos apenas por conseguir manter tamanha inconsistência. A trama é simples: somos apresentados à um casal de irmãos, que ao viajar pelas desertas estradas do interior sulista, se deparam com uma terrível força maligna, obstinada a matá-los a todo custo. A tônica inicial surpreende justamente pela falta de pretensão, em poucos segundos de projeção o filme já nos brinda com uma imagem aterrorizante (sabiamente filmada do ponto de vista distante dos personagens) de um homem encapuzado livrando-se de um corpo à beirada da estrada. Até a primeira aparição clara da monstruosidade em questão, o filme mantém um admirável nível de tensão e mistério, jamais fornecendo informações precisas sobre a besta, apenas deixando claro o quanto ela é temível (seja através de corpos costurados no teto de uma velha igreja ou da violência em que atinge o veículo dos mocinhos ao dirigir seu terrível caminhão empoeirado). Infelizmente, a partir da segunda metade o filme perde a crença no poder do desconhecido, se limitando a tornar-se um filme de terror genérico - sangrento e violento mas sem qualquer indício de sutileza, dando uma sonora descarga em toda a atmosfera tensa que vinha construindo até então. Se por um lado mérito deve ser dado ao excelente uso da obscura canção de vitrola (de mesmo título do filme) para criar um clima perturbador e angustiante, Jeeper's Creepers ultimamente decepciona por suas bruscas mudanças de tonalidade e por algumas equivocadas escolhas de roteiro.
In the Bedroom é uma obra-prima de intensidade assustadora e admiravelmente contida em suas muitas e pequenas observações, que ressonam no espectador muito após o término da projeção. A trama gira em torno da família Fowler, somos apresentados à Frank, um jovem rapaz desiludido com suas perspectivas de vida e refugiado em um romance inconsequente - a garota é mais velha, mãe e mantém uma relação conturbada com o violento ex-marido. Tal situação gera uma preocupação em Ruth, mãe de Frank, que vê na moça um futuro incerto e indesejado para o jovem, ao passo que o marido Matt, externiza na relação amorosa do filho sua própria fantasia de se ver ao lado de uma mulher jovem e atraente. O elenco todo é magistral e as atuações afinadíssimas, Tomei está fantástica e cria em Natalie uma mulher desequilibrada e naturalmente sensual, que surge ao mesmo tempo amável e preocupada, jamais se tornando unidimensional; o destaque, porém, vai para Sissy Spacek, que aqui dá uma performance digna de louvação, cuja intensidade jamais depende de afetações ou estridências, mas ao invés disso, confia na sutileza e na abdicação de qualquer vaidade, conferindo à personagem uma autenticidade visceral. O longa se torna incrivelmente realista e pungente ao não apontar vilões óbvios e elaborar personagens esféricos, que diante de uma perda inimaginável e abrupta, se vêem presos dentro do próprio luto e – sem saber como lidar com ele – se tornam gradualmente pessoas amarguradas, mortas e iludidas com a possibilidade de uma vingança, que na realidade, pouco importa. Ao investir no silêncio como arma poderosa, Todd Field nos imerge de forma honesta e dolorosa no mundo daqueles personagens, que sem respostas claras ou sem mesmo entender como se sentem (e aí mora o perigo), se afundam em uma angústia apática e reprimida - fugindo de enfrentar o que lhes encara a todo momento. A cicatrização de um dedo, ao final do longa, simboliza não só a efemeridade de um pequeno corte quando comparado a feridas mais profundas, como também indica uma possível epifania por parte dos pais angustiados - os ferimentos externos se curam externamente, já os internos, só começam a se curar quando acendemos à tocha em nossa própria escuridão – buscar fora por uma vingança é fugir de lidar consigo mesmo, afinal, o verdadeiro vilão não morre à facadas como o homem, ele não é personificável, ele não é palpável, ainda que seja o que mais nos machuca. O título do filme evoca a noção de que independente de nosso alheio aos nossos problemas, dos recursos externos que usamos como escapismo ou da culpa que nos livramos ao dependurá-la nos ombros dos outros, no final do dia todos nós nos encontramos entre quatro paredes, forçados a lidar com nós mesmos, cercados de nossas próprias verdades e mentiras – que mesmo camufladas em não aceitação, continuam ali, nos assombrando e nos corroendo.
A grande homenagem de Truffaut à arte de fazer cinema. A tônica do longa vem das dificuldades técnicas e pessoais enfrentadas por uma equipe de cinema durante a produção do longa “Pamela”, um projeto não necessariamente satisfatório em suas ralas ambições artísticas mas que de qualquer maneira é conduzido com paixão visceral por aquelas pessoas. Truffaut brinca com a noção de que o mundo real e o fictício se alimentam um do outro e nenhuma arte está subjugada pela impessoalidade, noção que fica evidente na cena em que a atriz principal do longa em produção – após um sofrido desabafo no camarim - inspira o diretor a mudar as falas da própria personagem baseado no que acabara de dizer. A dinâmica entre os membros da equipe de set e seus problemas pessoais são explorados em diversos âmbitos, acompanhamos desde romances frouxos que se frutificam da carência em meio a tanto stress até o problema alcoólico de uma das atrizes, que em um dos momentos mais inspirados e cômicos do longa, se mostra com dificuldades de executar uma cena corretamente, repetindo-a à exaustão apesar dos esforços da já fadigada equipe (que inclui o complacente diretor interpretado pelo próprio Truffaut). Os desafios técnicos de produção são explorados de forma realista e fascinante, obstáculos novos surgem a todo momento em função de imprevistos e o projeto apenas segue em frente quando cada um se despe de vaidades e se une como um só organismo – chega a ser cativante ver a equipe comemorar a conclusão de uma cena – teoricamente simples – na qual um gatinho deve beber a tigela de leite mas se recusa por várias e frustrantes tomadas. É interessante como Truffaut - além de homenagear os aspectos técnicos do cinema - também faz diversas citações sutis à figuras admiradas do meio cinematográfico, que vão de Lilian Gish à Felinni; o personagem do diretor chega a sonhar com o cinema, resgatando memórias de infância que apenas reforçam a ideia de que, para alguns, o cinema é mais do que um hobbie ou uma profissão, mas uma intrinsecalidade. La Nuit américaine é uma obra indispensável para qualquer amante de cinema, já que foi feito por um e trata-se de vários; o título do longa vem do termo utilizado para descrever a técnica cinematográfica na qual se recria (artificialmente) a atmosfera noturna em plena luz do dia - e título mais perfeito não caberia, afinal, o que é o cinema senão a maior e mais bela das inverdades?
Seguindo a mesma aura romântica e melancólica do clássico Les parapluies de Cherbourg, Les Demoiselles de Rochefort é famoso por reunir a musa francesa Catherine Deneuve com a irmã mais nova Françoise Dorleac; no longa, as belas interpretam versões não muito diferentes de si mesmas, Deneuve – aqui uma professora de balé - surge sempre graciosa e levemente distante, ao passo que Dorleac, se faz mais insinuante e calorosa. A trama é extremamente simplista e se sustenta na noção de um amor ideal; como é de praxe, Jaques Demy introduz seus personagens em um eterno devaneio; para expressarem seus sentimentos mais bucólicos, estes abruptamente se revelam em canções, que vão desde a serelepe e contagiante "Chanson des Jumelles" (um adorável dueto entre as irmãs protagonistas) à idílica “Chanson de Maxence” (um ode à crença em uma alma gêmea), todas compostas pelo genial Michel Legrand. A atmosfera extremamente onírica é enfatizada pela colorida fotografia e pelos longos planos contemplativos, que em determinada cena, se limitam a acompanhar Denéuve – em todo seu encanto imaculado – a saltitar pelas ruas da pitoresca Rochefort. Demy, como de costume, confia no poder de um desfecho incerto - ainda que o desenrolar dos romances beirem a pieguice, o diretor sabe jogar contra a própria doçura, utilizando da imprevisibilidade fílmica para brincar com as esperanças e emoções do espectador. Les Demoiselles de Rochefort - ainda que não possua o impacto devastador do similar Les parapluies de Cherbourg - é um deleite para fãs de musicais e da irresistível moda/cultura francesa sessentista, aqui explorada em sua nota mais alegre.
A seqüência do divertido e despretensioso Charlie’s Angels, soa antes de tudo como uma estúpida redundância; McGee (originalmente diretor de vídeo-clipes, o que explica boa parte das falhas do filme) se entrega ao projeto com a noção equivocada (e muito comum na indústria Hollywodiana) de que mais é sempre melhor e de que como esta é – afinal - uma aguardada seqüência de um bluckbuster, excessos são sempre bem vindos. Já nos primeiros minutos de projeção, o filme explode na tela com uma fantástica seqüência de ação, envolvendo as três charmosas protagonistas em proezas inacreditáveis que conseguem divertir pela própria implausibilidade; até aí, nenhum problema, o tom fantasioso e frenético já fora explorado no primeiro filme com sucesso; o grande erro, aqui, consiste no abuso destes recursos - Charlie’s Angels: Full Throttle jamais dá espaço para o espectador respirar e assimilar a avalanche de informações (fúteis) cuspidas a todo instante, tornando-se logo após a sempre divertida introdução às panteras, um filme abusivamente desgastante. Se no primeiro longa, a atmosfera era regada à nostalgia e o filme fluía deliciosamente, aqui tal charme se perde em meio a tantas (e desnecessárias) referências à cultura pop e pouquíssimo nexo – deslizes que dão ao filme o aspecto de um remendo de vídeo-clipes, que se separados podem até ser admirados pela vibrante fotografia e energia do elenco, mas que juntos formam algo mais semelhante à uma máquina de pinball em curto-circuito que à um filme propriamente dito. Repleto de cameos desnecessárias (das Olsen Twins à pantera original Jaclyn Smith, sirva-se à vontade) e efeitos especiais que se tornam progressivamente mais artificiais e estúpidos, Charlie’s Angels Full Throttle é um passa-tempo acéfalo e cansativo, mas que também não se esvai sem seus méritos - Diaz, Liu e Barrymore - divertidas como sempre - conquistam o público com sua camaradagem, ao passo que Demi Moore (mais bela do que nunca) encarna a possessa ex-pantera com um ar “campy” adeqüadíssimo ao projeto; e vale mencionar que, ocasionalmente, cenas inspiradas provocam algumas risadas – destaque para a confusão que o personagem do sempre ótimo John Cleese faz ao concluir que sua filha (Liu) é uma prostituta. Contando ainda com uma retrô e pegajosa trilha sonora mais preocupada em vender discos do que em moldar o filme de forma coerente, Charlie’s Angels: Full Throttle é como passar tempo demais em uma loja de doces - ainda que o gosto do açúcar instantaneamente cause certo prazer glutônico, uma dor de barriga subseqüente é inevitável.
Working Girl, ainda que superestimado pelas grandes premiações na época de lançamento, é certamente uma das comédias mais prazerosas e charmosas da década de 80. Mike Nichols confere ao longa um tom leve e convidativo, a começar pelo belo grande plano de Manhattan que abre o filme ao som da excelente canção “Let the River Run” de Carly Simon, que aliás, ganhou o Oscar por sua composição. O elenco é formidável, Melanie Griffith (seja com seu “big hair” oitentista ou exibindo o corte discreto que assume mais tarde) está encantadora como a ambiciosa secretária Tess McGill, ainda que sua atuação, por mais charmosa que seja, recebeu uma equivocada indicação pela Academia. Em contrapartida, Sigourney Weaver surge mais engraçada e exuberante do que nunca, encarnando a opulenta e possessiva Katharine Parker de forma genial, uma mulher extremamente poderosa na vida profissional, mas que ainda cai de joelhos quando o assunto é o amor não correspondido do executivo Jack Trainer, interpretado com muito carisma por Harrison Ford. Contando ainda com uma hilária atuação menor de Joan Cusack como a excêntrica amiga de Tess (as tiradas da personagem estão entre as melhores do filme), Working Girl possui muitos charmes, o inevitável romance entre Ford e Tess é desenvolvido em bom ritmo e o casal exibe excelente química. O destaque de Working Girl, porém, vai claramente para Weaver; seja aconselhando Tess e massageando seu ego a cada olhar admirado da jovem ou esbanjando seu carisma requintado com a alta sociedade, a atriz cria um personagem memorável (até esférico considerando as limitações do roteiro) e se prova uma talentosíssima comediante.
Machete, antes apenas um trailer “fake” exibido no projeto “Grindhouse” (uma colaboração entre os aficionados em filmes B setentistas Tarantino e Roriguez), aqui ganha extensas duas horas de projeção em detrimento de boa parte da fisgada original. Assim como pode ser observado em “Grindhouse”, a diferença entre esses cineastas é que Tarantino, independente da origem de suas influências, consegue a proeza de criar filmes originais, que soam mais como arte do que como entretenimento estúpido; já Roriguez, infelizmente, peca por uma irritante falta de tenacidade em seus trabalhos, criando películas que divertem até certo ponto, mas que faltam em consistência, ao ponto de muitas vezes se tornarem até tediosas. Machete conta com um elenco ilustre, é uma pena que boa parte dele surja desperdiçado em cenas pouco inspiradas; é o caso de Deniro como o corrupto senador John McLaughlin, um personagem com potencial para se tornar memorável mas que ultimamente é mal servido pelo roteiro. O protagonista Machete – interpretado pelo ótimo Danny Trejo – é sem dúvidas uma das maiores qualidades do filme, ele surge como um sujeito estranhamente carismático, misturando seu jeito troglodita com uma peculiar dignidade que cativa o espectador. Rodriguez ganha pontos ao utilizar-se de planos inventivos nas divertidas (senão demasiadamente repetitivas) cenas de massacre; o diretor faz questão que presenciemos a ação dos mais variados ângulos, um excesso que, em um filme onde o protagonista faz de corda o intestino de um capanga, é certamente adequado. Recheado de belas mulheres (incluindo Lindsay Lohan em um papel insignificante e desnecessário), órgãos voando pela tela a todo o momento, explosões épicas e todos os exageros possíveis em um filme de Rodriguez, é surpreendente e decepcionante que, ao final da projeção, Machete mal consiga cumprir o mero papel de entretenimento B, já que o diretor como de costume, falha ao criar qualquer tipo de tensão, com a equivocada ilusão de que mais – o tempo todo - é melhor. Talvez esse seja o maior defeito de Rodriguez - ao contrário do colega mais talentoso, o diretor não sabe equilibrar seus excessos, que lá para a metade do filme se tornam extremamente cansativos e plenamente estúpidos; ainda que Machete implore para que ríamos com ele de sua ostensiva frivolidade, acabamos por despreza-lo e torcer para que as duas seqüências anunciadas ao final da projeção, jamais se concretizem.
Um brilhante drama da fase tardia de Truffaut; ainda que filmado em 1980, é alusivo tanto em tom quanto em estética aos trabalhos sessentistas do diretor. O cenário é a tensa Paris da Segunda Guerra, ocupada pelos Alemães e em constante clima de desconfiança. Acompanhamos de forma intimista o cotidiano das pessoas que mantém o teatro Montmartre vivo, que em um período violento e angustiante da vida dos parisienses, se torna mais do que um mero entretenimento, funcionando como fuga da realidade - um abrigo caloroso em tempos difíceis. Lucas Stenier (Jean Poiret), judeu e diretor do teatro, junto a esposa Marion Steiner (Deneuve em uma belíssima atuação premiada com o Cannes), simula sua fuga de Paris, quando na verdade o diretor se refugia na adega do teatro, atento a tudo o que se passa e palpitando nas peças através de sua complacente esposa. Com a chegada de um novo ator a peça (Gerard Depardieu), as relações entre os membros do teatro tomam novos rumos, Marion começa a se sentir cada vez mais distante do marido e incapaz de lidar com seus próprios sentimentos, se reveste de uma frieza alienante, afetando todos ao seu redor mais do que se permite aceitar. Explorando a estreita linha entre a ficção e o real, o filme cria uma genial analogia entre a dissimulação teatral e àquela da vida real - somos apresentados a personagens que tem de representar dentro e fora do palco, seja para escapar do regime nazista ou por conflitos intrínsecos, pelo medo de se colocar sob os holofotes da vida. O triângulo amoroso surge de forma delicada e repleta de nuances, é fascinante como o faz-de-conta do teatro permeia o imaginário e a emoção daquelas pessoas, de forma a torná-las susceptíveis a novas experiências e sentimentos. Le dernier métro é um filme que nos imerge no mundo do teatro de forma meticulosa e sedutora, é palpável a paixão de Truffaut pela temática e o belo desfecho subjetivo apenas deixa claro aquilo que o filme ia explorando brilhantemente até então, realidade e fantasia são parte do mesmo espetáculo, cabe a nós encontrar em nós mesmos a sensibilidade e a coragem necessária para diferenciá-los.
Conhecido como “o melhor filme que Hitchock nunca fez”, Charada é uma divertida mistura de comédia, romance e suspense, que amarra todos esses elementos de forma suave em uma trama repleta de reviravoltas e que tem como protagonistas dois titãs do cinema – Audrey Hepburn e Cary Grant. A comédia aqui fica por conta dos engraçadíssimos diálogos entre Grant e Hepburn, que desenvolvem ao decorrer da narrativa uma clássica relação de amor e ódio; elogios e farpas surgem a todo o momento e apesar da notável diferença de idade – como é de costume nos filmes de Hepburn - o romance é adorável e convincente, culminando em uma bela seqüência que tem como plano de fundo o rio Sena. É surpreendente que, com um romance brotando e um humor levemente excêntrico tomando conta dos diálogos, Charada consiga também a proeza de ser um eficaz e imprevisível thriller - temos quatro vilões terríveis (ou seriam cinco?), cenas de perseguição que nos fazem grudar os olhos na tela e como é de costume nos filmes de Stanley Donen, uma fantástica trilha sonora por Henry Mancini, que inclui a bela canção tema que leva o nome do filme. Com tantos motivos para ser apreciado, seja a beleza clássica de Audrey Hepburn desfilando em figurinos Givenchy ou Cary Grant tomando uma ducha de terno ao som das risadas genuínas da co-estrela, Charade é indiscutivelmente um dos mais charmosos clássicos da década de 60 e um excelente exemplo de uma grande mistura de gêneros que acerta no tom do começo ao fim.
Baseado no sucesso da Broadway de mesmo nome, Bye Bye Birdie simultaneamente critica e homenageia o fenômeno cultural que foi Elvis Presley no final da década de 50, venerado por adolescentes histéricas e envolto por um fascínio coletivo da mídia. Ainda que o filme tenha chegado um pouco tarde para se tornar relevante (em 1963 Elvis já perdera espaço para um ataque de contracultura prestes a explodir), este pedaço de entretenimento “campy” encantou gerações mais novas justamente por fantasiar aquilo que já ia se perdendo naquele começo de década, o fascínio pelos grandes astros, pelo divino e artificial espetáculo que é a cultura Hollywoodiana. Bye Bye Birdie é antes de tudo um veículo de estrelato para a bela Ann-Margret, que com o sucesso do filme se tornou uma sensação instantânea e um dos maiores símbolos sexuais da época - ironicamente, pouco tempo depois ela protagonizaria um musical com o rei do rock em pessoa – aqui ela rouba a atenção sempre que aparece e não é a toa que as melhores cenas sejam justamente a abertura e a reprise, nas quais Margret, banhada em luz dourada contra um telão azul, canta a música tema com tamanha sensualidade que o próprio filme parece não ser capaz de conter. Estrelas a parte, Bye Bye Birdie é um filme antiquado que certamente não envelheceu bem, o roteiro em determinados pontos se torna extremamente absurdo com suas convenções problemáticas – porque todos os personagens (incluindo o astro do rock Conrad Birdie) permanecem na casa dos McAfee? Não existem hotéis na cidade? – e sempre que foca em algo além de Ann-Margret perde boa parte de sua faísca, com exceção de uma ótima cena de dança protagonizada por Janet Leigh. A maior decepção – surpreendentemente – é Dick Van Dyke em sua estréia nos cinemas, que aqui conta com poucos e esquecíveis números musicais; felizmente, ele teria a chance de brilhar mais tarde com o clássico infantil Mary Poppins. Bye Bye Birdie é pura frivolidade e certamente tem seus defeitos, mas graças ao charme indiscutível de Ann-Margret e alguns números musicais inspirados, guarda com honra seu lugar como clássico teen sessentista.
Considerando os caminhos equivocados e fúteis aos quais um filme sobre a criação do Facebook poderia ser levado, The Social Network é surpreendentemente eficiente, mas muito longe de ser uma obra-prima ou até mesmo o "novo Citizen Kane" como algumas questionáveis críticas chegaram a afirmar. Fincher dirigiu The Social Network meticulosamente, é admirável sua atenção ao detalhe e a segurança em que filma longos e complexos planos, que ganham força graças à bela fotografia cinzenta e a perfeita trilha sonora vencedora do Oscar, que confere uma necessária melancolia à trama. Apesar de tecnicamente impressionante, The Social Network pisa em falso ao criar um drama humano interessante em teoria, mas pouco envolvente na prática, já que falha ao explorar a relação dos amigos Eduardo Saverin e Mark Zuckerberg de forma crua, sempre soando frio em suas intenções e só conseguindo funcionar parcialmente graças a algumas excelentes atuações, com destaque claro para Andrew Garfield, um dos poucos elementos pulsantes do filme. Muito se comentou sobre a atuação de Justin Timberlake, e a verdade é que como ator Justin é um ótimo cantor, ainda que o personagem de Sean Parker caia como uma luva em sua persona, falta naturalidade em sua atuação, algo que compromete seu personagem, tornando-o caricato e enfadonho. The Social Newtork é um filme tão brilhantemente calculado quanto o próprio Facebook, infelizmente, também é tão sem vida quanto os números binários que estruturam tal objeto de fascínio.
The King's Speech, ainda que extremamente bem feito, não é merecedor do Oscar de melhor filme, pois mesmo que superior ao superestimado The Social Network (o outro favorito ao prêmio), palidece perto de produções mais triunfantes e ousadas como Black Swan e True Grit. Acompanhamos aqui a trajetória do Rei George VI (Colin Firth) ao enfrentar sua gagueira - reflexo de uma infância reprimida e extrema falta de auto-estima - e quase que simultaneamente assumir o trono abandonado pelo irmão em prol de um casamento mal-visto pela corte. Ao se submeter aos peculiares tratamentos do excêntrico Lionel Logue (Geoffrey Rush), George descobre nele não só uma possível solução para seu agonizante problema, mas um amigo capaz de quebrar suas próprias barreiras internas e torna-lo o grande homem que esconde dentro de si. Filmado em boa parte utilizando-se de uma grande angular e repleto de closes deselegantes, o filme ganha um aspecto um tanto excêntrico, algo que somado ao típico humor britânico de seus peculiares personagens torna The King’s Speech um filme irresistivelmente charmoso. Contando com uma direção de arte impecável que imerge o espectador desde os primeiros minutos na fúnebre Londres pré-Segunda Guerra, The King’s Speech é bem sucedido também porque põe o drama humano em primeiro plano, e graças a grandiosas atuações por todo o elenco (destaque para Firth que cria um sujeito engraçado em seus trejeitos ainda que longe de caricato), é certamente um filme fácil de se apreciado. Vale criticar, porém, que o provável motivo pelo qual a academia premiou The King’s Speech é também o seu maior defeito, o filme peca em determinados momentos por ser demasiadamente convencional, o conflito que antecede a excelente cena que dá título ao longa soa forçado e como mero ajuste de roteiro. Felizmente, o longa é muito cuidadosamente orquestrado e sensível para sofrer com tais falhas e ainda que não seja o melhor filme dos dez indicados este ano, é indiscutivelmente bom cinema.
Em sua estréia como diretor, Antonio Banderas criou um filme único, repleto de charmes e com inspiração clara em clássicos de Almodóvar como Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, diretor que, aliás, propeliu a carreira de Banderas como ator nos anos 80 em diversas colaborações fílmicas. Crazy In Alabama intercala duas narrativas distintas - temos a vaidosa e afetada Lucille, que após matar o marido repressor, sai pelas secas estradas do Alabama em busca de fama carregando a cabeça do falecido, e em um tom mais sério, acompanhamos o sobrinho de Lucille e sua indignação com o racismo, violência e injustiça na pacata cidadezinha sulista onde vive. É fácil condenar Banderas pela forma desarticulada em que cruza suas tramas, e a porção que envolve Lucille – Melanie Griffith em seu melhor papel desde Working Girl – é certamente mais interessante que a envolvendo a segregação racial, já que a última, apesar de bons momentos, peca por uma ingênua artificialidade. Apesar de seus óbvios defeitos, a verdade é que Crazy In Alabama jamais falha em encantar com sua mistura de melodrama extravagante e momentos honestos (até tocantes) - no final da projeção sentimos que testemunhamos algo peculiarmente bonito apesar de uma imensidão de excessos, que na verdade atribuem até certo charme “campy” à produção. A maior surpresa aqui, porém, é o estilo confiante que Banderas assume em seu primeiro longa, desde a brilhante abertura animada ao som de “These Boots Are Made for Walking” até as belas tomadas do cassino em que Lucille entra com semblante onírico, o diretor felizmente não teve medo de ousar, criando planos belos e inspirados; e como de se esperar, faz questão de enaltecer sua esposa e musa Griffith, o que ultimamente torna a protagonista Lucille uma figura memorável, grandiosa e surpreendentemente a verdadeira alma do filme.
Anaconda
2.3 763 Assista AgoraAnaconda é um filme extremamente mal compreendido, afirmar seu caráter trash como peso negativo é como punir uma comédia por sua hilaridade ou dispensar um drama por este se mostrar sensível e tocante. Este é um filme B que retoma tudo aquilo que deu ao gênero tanto prestígio entre adolescentes a procura de uma boa diversão nonsensica; mortes absurdamente sádicas, efeitos especiais decentes o suficiente para causar náuseas e grosseiros o suficiente para provocar risadas e um dos vilões mais impiedosos e repulsivos da história do cinema (e nem estou me referindo à cobra devoradora de homens ainda). Talvez a eficácia inesperada de Anaconda quando comparado a outros filmes de monstros devoradores, é a sua capacidade de transformar seu meio físico (aqui a densa e assustadora floresta Amazônica) em um dos muitos vilões do longa - a floresta respira, mata, seduz e protagoniza esse caos fílmico com a mesma imponência dos dotes físicos de Jennifer Lopez. Empregando uma trilha sonora tensa e pungente e sempre desenvolvendo crescente tensão ao progredir da narrativa, o filme se transforma em mais do que uma simples costura de chacinas, mostrando-se extremamente atmosférico e envolvente, talvez mais do que nosso próprio bom senso gostaria de admitir. Ainda que os vilões reptilianos sejam inquestionavelmente parte essencial da diversão bestial, é John Voight encarnando um dos vilões mais excêntricos e excessivos de todos os tempos quem rouba a cena, em uma atuação tão genial e regada a trejeitos que caso este não fosse um "trash" proclamado, mas um drama psicológico de cara séria, certamente levaria uma estatueta de melhor ator para casa. Negar a diversão de ver rostos conhecidos como J-Lo, Owen Wilson e Eric Stoltz perseguidos por cobras mecânicas de 10 metros é quase blasfêmico, o filme insiste em situações absurdas (Voight encharcando Lopez de sangue de macaco sendo uma de muitas) e insere momentos pseudo-dramáticos com tanta efervescência que o apelo "campy" transborda mais que as margens do rio Amazonas em estação de chuvas. Não obstante, o filme ainda é responsável por uma das gafes mais horrendas e memoráveis de uma grande produção Hollywoodiana - o diretor gostou tanto do plano em que um barco estaciona as margens do rio que resolveu apenas reverter a seqüência para mostrar o barco partindo, ignorando é claro o fato de que ao fundo existia uma imensa cachoeira.
A Nova Paixão de Stella
2.8 9Um melodrama eficiente (senão demasiadamente convencional e piegas) que ganha surpreendente peso emocional graças a uma magistral performance da subestimada Angela Basset.
Alexandre
3.1 582 Assista AgoraNão possui sequer vestígios de autenticidade, alternando entre melodrama e frieza de forma descuidada e se estendendo durante maçantes três horas de duração sem o mínimo de coerência e a mercê de atuações estatuescas e presunçosas.
Padrinhos de Tóquio
4.3 203 Assista AgoraSe há algo que chama atenção no brilhante Tokyo Godfathers à primeira vista, é a belíssima animação e direção de arte, que conferem não só um nível absurdo de detalhes aos belos cenários como também nuances aos seus excêntricos personagens poucas vezes vistas em produções animadas - o filme respira, é vivo, complexo, magnífico. O longa se inicia já de forma criativa, os créditos aparecem na forma de letreiros da grande Tokyo, algo que nos imerge desde o princípio naquele mundo infestado de luzes e carregado de frieza passiva. Miss Hana, Gin e Miyuki são três moradores de rua com passados distintos, porém unidos pela rejeição – o filme expõe a amizade entre um travesti afetado, um vagabundo troglodita e uma adolescente amotinada de forma magnífica, já que explora essa dinâmica enfatizando as diferenças brutais entre tais figuras ao mesmo em que evidencia o amor e a aceitação existentes ali, amor e aceitação que lhes faltava enquanto integrantes infelizes da sociedade. A mercê da árdua vida nas ruas, os três protagonistas surpreendentemente se deparam com um bebê abandonado, que assume para aquelas pessoas a forma simbólica de esperança e de renascença (algo reforçado pelo fato do filme se passar durante as celebrações do Natal), conduzindo nossos heróis a uma série de coincidências improváveis que os forçam a lidar com o próprio passado e a descobrirem mais sobre si mesmos; e é apostando nesse caminho que o filme ganha o aspecto de uma fábula moderna, misturando magia e crueza com admirável sensibilidade. Tokyo Godfathers reafirma não só o poder de personagens multifacetados e da tônica sensível para se criar um grande filme, como também mostra que o anime pode ser tão tocante, tão dramático, tão engraçado e tão visceral quanto filmes de carne e osso.
A Princesa Prometida
3.7 328 Assista AgoraThe Princess Bride é um divertido filme de fantasia que parodia e homenageia o gênero em iguais proporções, criando uma experiência mágica e empolgante sem se levar a sério demais. A trama simplista e típica de contos de fada se faz na idéia do amor verdadeiro; Buttercup é uma bela jovem que faz um pacto de amor com o camponês Westley; mais tarde, quando recebe notícias de que o rapaz está morto, aceita casar-se com um maquiavélico príncipe; dias antes do casamento a moça é raptada e descobre que quem a raptara é justamente Westley, que agora deve lutar contra os mais variados inimigos para mantê-los juntos, contando mais tarde com excêntricos e divertidos personagens coadjuvantes. Extremamente leve e fluído, o filme se inicia contemporaneamente, vemos um garoto jogando vídeo-game e seu avô o propõe para que leia uma estória, o garoto relutantemente escuta e na medida em que esta progride (e assim o verdadeiro filme se inicia), ele se vê encantado - e não demora muito para que o espectador também se renda aos charmes do longa. The Princess Bride é uma verdadeira injeção bucólica de romance e fantasia - temos divertidas lutas de espada, um pântano sinistro e repleto de armadilhas, um gigante simpático e bondoso, um espadachim obstinado a vingar a morte do pai e é claro - a luta pelo irrefutável amor verdadeiro como tema central, cujo princípio nobre dá forças para que os protagonistas enfrentem até os mais inimagináveis obstáculos. A direção de arte merece destaque, desde a maquiagem do caquético e disforme milagreiro da vila até o plano em que os protagonistas cavalgam em verdes campos rumo à aurora, o longa nunca falha em encantar. De duração relativamente curta, o filme jamais se torna cansativo e remanesce na memória como um belo conto de fadas lido antes de dormir, plantando doces memórias e bons valores.
O Turista
3.3 3,3K Assista AgoraEvocando em tom clássicos dourados Hollywoodianos como “To Catch a Thief” e “Charade”, The Tourist é um filme agradável e inofensivo, que reúne dois dos maiores astros atuais em um jogo de gato e rato pouco crível mas afável em toda sua espumosidade. O diretor alemão Donnersmarck, não habituado a dirigir grandes blockbusters, injeta um humor tipicamente europeu e discreto na trama e desde os primeiros frames parece mais preocupado em explorar os traços lascivos de Jolie (que durante o filme limita-se a caras e bocas) do que com a trama em si, algo não muito condenável, já que esta se mostra extremamente pedestre e forçada. Depp, habituado a interpretar sujeitos excêntricos, encarna o professor de matemática Frank com formidável discrição, apesar que certos trejeitos imediatamente evocam personagens anteriores, é como se no acatado Frank restassem sequelas de Jack Sparrow. Quando não deslumbrado com os milhares de vestidos longos nos quais a bela Jolie desfila com alarde, o filme ocasionalmente foca em cenas de ação de adrenalina dosada - bem filmadas, classudas e moderadamente divertidas; a trilha sonora segue a mesma linha, criando uma atmosfera luxuosa (senão piegas por vezes) e de cativante glamour retrô. Ainda que haja pouca química entre os protagonistas, o romance funciona por este já ser essencialmente distante, e felizmente, o filme abraça seu propósito frívolo, focando exclusivamente na suntuosa Veneza, no apelo de seus astros e na própria finesse. The Tourist é nada mais que um comercial de perfume com duas horas de projeção, belo de se olhar e indulgentemente imerso em sua própria artificialidade.
Em Qualquer Outro Lugar
3.4 130 Assista AgoraAnywhere But Here é um drama “mãe e filha” que percorre caminhos familiares do gênero mas acerta ao evitar uma trama burocrática e distribuir seu foco em pequenos clímax ao longo da narrativa, que exploram essa saturada dinâmica familiar não necessariamente de forma única mas com charme e honestidade o suficiente para envolver o espectador. Desde os primeiros minutos de projeção, somos expostos à relação da extravagante e avoada Adele (Sarandon) e sua apática e sagaz filha adolescente Ann; juntas, elas rumam à Beverly Hills, deixando para trás a monotonia de Bay City e buscando um novo início. A premissa do longa é certamente de intenções rasas, mas ainda que o melodrama óbvio surja em pequenas doses ocasionalmente, o filme surpreendentemente se contém em momentos delicados, revelando uma discrição rara em produções Hollywoodianas. Susan Sarandon, como de costume, está excelente, a atriz consegue a proeza de tornar seu personagem simpatizável apesar de toda sua inconveniência fanfarrista, mas é Natalie Portman – com apenas 19 anos - quem realmente brilha aqui; a atriz quebra qualquer estereótipo de adolescente angustiado e apresenta nuances raramente vistas em atrizes tão jovens - seu personagem se torna não só esférico como extremamente real e efetivo, conferindo admirável densidade ao longa. A medida que as protagonistas se envolvem em novos romances, desejos, ilusões e descobertas, elas são confrontadas uma pela outra, porém de forma brutal e egoísta, o que não permite que estas apreciem inteiramente a companhia uma da outra ou mesmo que se levem a sério; é somente quando o valor da independência e dos sacrifícios reais de altruísmo surgem por caminhos estreitos, que ambas passam a valorizar sua relação. Ainda que o roteiro falhe em alguns momentos por certas incongruências (a narração off da personagem de Natalie se mostra desnecessária e pouco acrescenta à trama), o filme ultimamente caminha na direção certa e se conclui com simplicidade, transmitindo sua mensagem formidavelmente e provando que em um nível ou outro, fomos capazes de nos identificar e criar laços com aquelas pessoas.
Sexo Sem Compromisso
3.3 2,2K Assista AgoraDispensável e extremamente satisfeito consigo mesmo, No Strings Attached reúne Ashton Kutcher (em seu milésimo papel de garotão charmoso) e Natalie Portman (mostrando versatilidade após encarnar de forma brilhante a obsessiva bailarina Nina em Black Swan), mas infelizmente não vai muito além. Se o título e a premissa do longa já revelam sua patética previsibilidade, seria indispensável que este ao menos conquistasse o público com personagens interessantes e cenas memoráveis, ao invés disso, somos apresentados as mais velhas “gags” do gênero que só não se tornam um fracasso total graças a alguns excêntricos personagens secundários. Natalie Portman, bela como de costume, é servida com um personagem extremamente raso e sem qualquer indício de bom senso, se comportando como difícil e insensata apenas para que o inevitável e irritante conflito final possa se fazer presente. Kutcher, muito habituado a filmes do tipo, se satisfaz em criar um personagem unidimensional e depende apenas de seu apelo como galã adolescente. O que torna No Strings Attached deplorável, porém, é sua incapacidade de explorar a relação dos protagonistas de forma intrigante; se os personagens se mostram tediosos em suas essências pedestres e se o longa não os oferece oportunidades para crescer e desenvolver, o que nos resta é apenas sexo sem compromisso, ação sem emoção, um filme tão satisfeito com sua própria mediocridade que é difícil evitar o desinteresse total após alguns minutos de projeção. Contando ainda com desfechos implausíveis cujo único objetivo é provocar risadas amarelas ao término da sessão, No String Attached é um fracasso total para todos envolvidos.
Clean
3.6 13Clean é um filme admirável, são muitos os dramas que permeiam a narrativa e ainda assim, ele jamais soa desonesto ou excessivo em suas pretensões, o realismo dos personagens e a forma simples e sensível como as situações são desdobradas, dão ao filme uma dignidade poucas vezes encontrada em dramas que lidam com temas tão saturados. O filme acompanha a trajetória de Emily Wang, cujo marido – um roqueiro famoso nos anos 80 – morre subitamente de overdose no quarto de hotel onde viviam; Emily se vê sozinha no mundo e depois de seis meses na cadeia por posse de heroína, decide se limpar das drogas e recuperar a guarda de seu filho, que há muito tempo mora com os avós. A efetividade do filme depende em grande parte da performance da protagonista Maggie Cheung e ela não decepciona; a atuação de Cheung é contida porém extremamente intensa, a atriz retrata a confusão interna da personagem de forma multifacetada; com pequenos gestos e feições que nem por um instante soam insinceros, ela dá a Emily - uma personagem não necessariamente carismática – uma dignidade que conquista o espectador, nós passamos a torcer com veemência para que essa mulher sofredora encontre seu caminho. Contrabalanceando a frieza de Emily, entra em cena o sensível e complacente avô de seu filho, interpretado de forma magistral e tocante por Nick Nolte (é surpreendente que o ator tenha sido ignorado pelas premiações ao passo que Cheung merecidamente foi premiada com o Cannes), que surge como um inesperado apoio a Emily - através de conselhos honestos e uma entrega de confiança que a toca, ele injeta nela a dose necessária de autoconfiança para que a jovem possa achar dentro de si seu próprio perdão e consequentemente encarar o papel de mãe com dignidade. Ao retratar a luta de Emily contra seus vícios (que vão além das drogas já que ela constantemente mente para si mesmo), o filme consegue a proeza de fugir de clichês e colocar a essência da personagem acima de seus defeitos, de modo que possamos compreender Emily e não condena-la por suas inconseqüências. Talvez os momentos mais triunfais de Clean sejam justamente aqueles de menor importância à trama - o passeio de Emily com seu filho no zoológico, o diálogo terno entre os avós ao refletir sobre a vida e principalmente as cenas em que Cheung e Nolte interagem, acabam se destacando na atmosfera gélida do filme, pois são neles que detectamos a humanidade daquelas pessoas e passamos a torcer não para que determinado personagem faça sua vontade, mas para que todos se encontrem em harmonia, afinal, em meio desse caos não há vilões, apenas fatalidades superáveis e pessoas renováveis.
Encontro Explosivo
3.1 1,5K Assista AgoraKnight & Day é - antes de tudo - um projeto de vaidade para suas super estrelas Cruise e Diaz, que aqui abusam de seus trejeitos habituais e recorrem a velhos personagens de seus blockbusters anteriores para criar paródias de si mesmos. O filme, receoso de se entregar a um gênero específico, perambula entre histeria cômica e incessantes perseguições explosivas, envolvendo os protagonistas em cenas que variam entre divertidamente absurdas e extremamente cansativas – aliás, como este é um filme repleto de ação, vale criticar o uso excessivo e incompetente de CGI, que se mostra excepcionalmente fraco na seqüência envolvendo uma tourada. Diaz e Cruise, ainda que interpretando um par romântico em circunstâncias extraordinárias, jamais convencem o espectador de que realmente estão apaixonados; não que falte química ao casal, é apenas que a dinâmica entre os sorridentes protagonistas evoca muito mais uma camaradagem do que a pretendida tensão sexual. Knight and Day poderia até se concluir como um escapismo agradável e passageiro, mas descarta essa possibilidade ao investir em um desnecessário e maçante terceiro ato envolvendo o passado do personagem de Cruise, que para começar, é caricato demais para demonstrar qualquer indício de um ser humano crível.
Os Garotos da Minha Vida
3.8 408 Assista AgoraRiding in Cars with Boys tenta conciliar humor e melodrama a todo tempo durante suas longas duas horas de duração e nem sempre satisfaz tal ambição; este é um filme repleto de momentos charmosos mas que ultimamente soa mais pueril do que o pretendido. Drew Barrymore, como de costume, confere considerável amabilidade a sua personagem; mesmo que a atriz peque em alguns momentos por uma atuação levemente caricata, ela conquista o espectador e mantém o filme na linha, ainda que este insista constantemente em desvios tônicos pouco adequados à narrativa. O destaque aqui, vai surpreendentemente para Steve Zahn, que encarnando um marido alcoólatra e irresponsável, consegue tornar seu personagem esférico ao jamais se entregar a estereótipos, surgindo como o elemento mais humano e tocante da trama. Riding in Cars with Boys é um “água com açúcar” que ocasionalmente incomoda por tentar ser vinho (apesar de sua óbvia coloração transparente), mas que também não deixa de ser eficiente como um agradável (senão esquecível) passatempo.
Olhos Famintos
3.1 1,0K Assista AgoraJeeper's Creepers é um filme frustrante, não porque é um desastre completo, mas porque este caminha tão irresponsavelmente entre o genial e o estúpido que merece aplausos apenas por conseguir manter tamanha inconsistência. A trama é simples: somos apresentados à um casal de irmãos, que ao viajar pelas desertas estradas do interior sulista, se deparam com uma terrível força maligna, obstinada a matá-los a todo custo. A tônica inicial surpreende justamente pela falta de pretensão, em poucos segundos de projeção o filme já nos brinda com uma imagem aterrorizante (sabiamente filmada do ponto de vista distante dos personagens) de um homem encapuzado livrando-se de um corpo à beirada da estrada. Até a primeira aparição clara da monstruosidade em questão, o filme mantém um admirável nível de tensão e mistério, jamais fornecendo informações precisas sobre a besta, apenas deixando claro o quanto ela é temível (seja através de corpos costurados no teto de uma velha igreja ou da violência em que atinge o veículo dos mocinhos ao dirigir seu terrível caminhão empoeirado). Infelizmente, a partir da segunda metade o filme perde a crença no poder do desconhecido, se limitando a tornar-se um filme de terror genérico - sangrento e violento mas sem qualquer indício de sutileza, dando uma sonora descarga em toda a atmosfera tensa que vinha construindo até então. Se por um lado mérito deve ser dado ao excelente uso da obscura canção de vitrola (de mesmo título do filme) para criar um clima perturbador e angustiante, Jeeper's Creepers ultimamente decepciona por suas bruscas mudanças de tonalidade e por algumas equivocadas escolhas de roteiro.
Entre Quatro Paredes
3.5 86In the Bedroom é uma obra-prima de intensidade assustadora e admiravelmente contida em suas muitas e pequenas observações, que ressonam no espectador muito após o término da projeção. A trama gira em torno da família Fowler, somos apresentados à Frank, um jovem rapaz desiludido com suas perspectivas de vida e refugiado em um romance inconsequente - a garota é mais velha, mãe e mantém uma relação conturbada com o violento ex-marido. Tal situação gera uma preocupação em Ruth, mãe de Frank, que vê na moça um futuro incerto e indesejado para o jovem, ao passo que o marido Matt, externiza na relação amorosa do filho sua própria fantasia de se ver ao lado de uma mulher jovem e atraente. O elenco todo é magistral e as atuações afinadíssimas, Tomei está fantástica e cria em Natalie uma mulher desequilibrada e naturalmente sensual, que surge ao mesmo tempo amável e preocupada, jamais se tornando unidimensional; o destaque, porém, vai para Sissy Spacek, que aqui dá uma performance digna de louvação, cuja intensidade jamais depende de afetações ou estridências, mas ao invés disso, confia na sutileza e na abdicação de qualquer vaidade, conferindo à personagem uma autenticidade visceral. O longa se torna incrivelmente realista e pungente ao não apontar vilões óbvios e elaborar personagens esféricos, que diante de uma perda inimaginável e abrupta, se vêem presos dentro do próprio luto e – sem saber como lidar com ele – se tornam gradualmente pessoas amarguradas, mortas e iludidas com a possibilidade de uma vingança, que na realidade, pouco importa. Ao investir no silêncio como arma poderosa, Todd Field nos imerge de forma honesta e dolorosa no mundo daqueles personagens, que sem respostas claras ou sem mesmo entender como se sentem (e aí mora o perigo), se afundam em uma angústia apática e reprimida - fugindo de enfrentar o que lhes encara a todo momento. A cicatrização de um dedo, ao final do longa, simboliza não só a efemeridade de um pequeno corte quando comparado a feridas mais profundas, como também indica uma possível epifania por parte dos pais angustiados - os ferimentos externos se curam externamente, já os internos, só começam a se curar quando acendemos à tocha em nossa própria escuridão – buscar fora por uma vingança é fugir de lidar consigo mesmo, afinal, o verdadeiro vilão não morre à facadas como o homem, ele não é personificável, ele não é palpável, ainda que seja o que mais nos machuca. O título do filme evoca a noção de que independente de nosso alheio aos nossos problemas, dos recursos externos que usamos como escapismo ou da culpa que nos livramos ao dependurá-la nos ombros dos outros, no final do dia todos nós nos encontramos entre quatro paredes, forçados a lidar com nós mesmos, cercados de nossas próprias verdades e mentiras – que mesmo camufladas em não aceitação, continuam ali, nos assombrando e nos corroendo.
A Noite Americana
4.3 188A grande homenagem de Truffaut à arte de fazer cinema. A tônica do longa vem das dificuldades técnicas e pessoais enfrentadas por uma equipe de cinema durante a produção do longa “Pamela”, um projeto não necessariamente satisfatório em suas ralas ambições artísticas mas que de qualquer maneira é conduzido com paixão visceral por aquelas pessoas. Truffaut brinca com a noção de que o mundo real e o fictício se alimentam um do outro e nenhuma arte está subjugada pela impessoalidade, noção que fica evidente na cena em que a atriz principal do longa em produção – após um sofrido desabafo no camarim - inspira o diretor a mudar as falas da própria personagem baseado no que acabara de dizer. A dinâmica entre os membros da equipe de set e seus problemas pessoais são explorados em diversos âmbitos, acompanhamos desde romances frouxos que se frutificam da carência em meio a tanto stress até o problema alcoólico de uma das atrizes, que em um dos momentos mais inspirados e cômicos do longa, se mostra com dificuldades de executar uma cena corretamente, repetindo-a à exaustão apesar dos esforços da já fadigada equipe (que inclui o complacente diretor interpretado pelo próprio Truffaut). Os desafios técnicos de produção são explorados de forma realista e fascinante, obstáculos novos surgem a todo momento em função de imprevistos e o projeto apenas segue em frente quando cada um se despe de vaidades e se une como um só organismo – chega a ser cativante ver a equipe comemorar a conclusão de uma cena – teoricamente simples – na qual um gatinho deve beber a tigela de leite mas se recusa por várias e frustrantes tomadas. É interessante como Truffaut - além de homenagear os aspectos técnicos do cinema - também faz diversas citações sutis à figuras admiradas do meio cinematográfico, que vão de Lilian Gish à Felinni; o personagem do diretor chega a sonhar com o cinema, resgatando memórias de infância que apenas reforçam a ideia de que, para alguns, o cinema é mais do que um hobbie ou uma profissão, mas uma intrinsecalidade. La Nuit américaine é uma obra indispensável para qualquer amante de cinema, já que foi feito por um e trata-se de vários; o título do longa vem do termo utilizado para descrever a técnica cinematográfica na qual se recria (artificialmente) a atmosfera noturna em plena luz do dia - e título mais perfeito não caberia, afinal, o que é o cinema senão a maior e mais bela das inverdades?
Duas Garotas Românticas
4.1 65 Assista AgoraSeguindo a mesma aura romântica e melancólica do clássico Les parapluies de Cherbourg, Les Demoiselles de Rochefort é famoso por reunir a musa francesa Catherine Deneuve com a irmã mais nova Françoise Dorleac; no longa, as belas interpretam versões não muito diferentes de si mesmas, Deneuve – aqui uma professora de balé - surge sempre graciosa e levemente distante, ao passo que Dorleac, se faz mais insinuante e calorosa. A trama é extremamente simplista e se sustenta na noção de um amor ideal; como é de praxe, Jaques Demy introduz seus personagens em um eterno devaneio; para expressarem seus sentimentos mais bucólicos, estes abruptamente se revelam em canções, que vão desde a serelepe e contagiante "Chanson des Jumelles" (um adorável dueto entre as irmãs protagonistas) à idílica “Chanson de Maxence” (um ode à crença em uma alma gêmea), todas compostas pelo genial Michel Legrand. A atmosfera extremamente onírica é enfatizada pela colorida fotografia e pelos longos planos contemplativos, que em determinada cena, se limitam a acompanhar Denéuve – em todo seu encanto imaculado – a saltitar pelas ruas da pitoresca Rochefort. Demy, como de costume, confia no poder de um desfecho incerto - ainda que o desenrolar dos romances beirem a pieguice, o diretor sabe jogar contra a própria doçura, utilizando da imprevisibilidade fílmica para brincar com as esperanças e emoções do espectador. Les Demoiselles de Rochefort - ainda que não possua o impacto devastador do similar Les parapluies de Cherbourg - é um deleite para fãs de musicais e da irresistível moda/cultura francesa sessentista, aqui explorada em sua nota mais alegre.
As Panteras: Detonando
2.7 676 Assista AgoraA seqüência do divertido e despretensioso Charlie’s Angels, soa antes de tudo como uma estúpida redundância; McGee (originalmente diretor de vídeo-clipes, o que explica boa parte das falhas do filme) se entrega ao projeto com a noção equivocada (e muito comum na indústria Hollywodiana) de que mais é sempre melhor e de que como esta é – afinal - uma aguardada seqüência de um bluckbuster, excessos são sempre bem vindos. Já nos primeiros minutos de projeção, o filme explode na tela com uma fantástica seqüência de ação, envolvendo as três charmosas protagonistas em proezas inacreditáveis que conseguem divertir pela própria implausibilidade; até aí, nenhum problema, o tom fantasioso e frenético já fora explorado no primeiro filme com sucesso; o grande erro, aqui, consiste no abuso destes recursos - Charlie’s Angels: Full Throttle jamais dá espaço para o espectador respirar e assimilar a avalanche de informações (fúteis) cuspidas a todo instante, tornando-se logo após a sempre divertida introdução às panteras, um filme abusivamente desgastante. Se no primeiro longa, a atmosfera era regada à nostalgia e o filme fluía deliciosamente, aqui tal charme se perde em meio a tantas (e desnecessárias) referências à cultura pop e pouquíssimo nexo – deslizes que dão ao filme o aspecto de um remendo de vídeo-clipes, que se separados podem até ser admirados pela vibrante fotografia e energia do elenco, mas que juntos formam algo mais semelhante à uma máquina de pinball em curto-circuito que à um filme propriamente dito. Repleto de cameos desnecessárias (das Olsen Twins à pantera original Jaclyn Smith, sirva-se à vontade) e efeitos especiais que se tornam progressivamente mais artificiais e estúpidos, Charlie’s Angels Full Throttle é um passa-tempo acéfalo e cansativo, mas que também não se esvai sem seus méritos - Diaz, Liu e Barrymore - divertidas como sempre - conquistam o público com sua camaradagem, ao passo que Demi Moore (mais bela do que nunca) encarna a possessa ex-pantera com um ar “campy” adeqüadíssimo ao projeto; e vale mencionar que, ocasionalmente, cenas inspiradas provocam algumas risadas – destaque para a confusão que o personagem do sempre ótimo John Cleese faz ao concluir que sua filha (Liu) é uma prostituta. Contando ainda com uma retrô e pegajosa trilha sonora mais preocupada em vender discos do que em moldar o filme de forma coerente, Charlie’s Angels: Full Throttle é como passar tempo demais em uma loja de doces - ainda que o gosto do açúcar instantaneamente cause certo prazer glutônico, uma dor de barriga subseqüente é inevitável.
Uma Secretária de Futuro
3.4 155Working Girl, ainda que superestimado pelas grandes premiações na época de lançamento, é certamente uma das comédias mais prazerosas e charmosas da década de 80. Mike Nichols confere ao longa um tom leve e convidativo, a começar pelo belo grande plano de Manhattan que abre o filme ao som da excelente canção “Let the River Run” de Carly Simon, que aliás, ganhou o Oscar por sua composição. O elenco é formidável, Melanie Griffith (seja com seu “big hair” oitentista ou exibindo o corte discreto que assume mais tarde) está encantadora como a ambiciosa secretária Tess McGill, ainda que sua atuação, por mais charmosa que seja, recebeu uma equivocada indicação pela Academia. Em contrapartida, Sigourney Weaver surge mais engraçada e exuberante do que nunca, encarnando a opulenta e possessiva Katharine Parker de forma genial, uma mulher extremamente poderosa na vida profissional, mas que ainda cai de joelhos quando o assunto é o amor não correspondido do executivo Jack Trainer, interpretado com muito carisma por Harrison Ford. Contando ainda com uma hilária atuação menor de Joan Cusack como a excêntrica amiga de Tess (as tiradas da personagem estão entre as melhores do filme), Working Girl possui muitos charmes, o inevitável romance entre Ford e Tess é desenvolvido em bom ritmo e o casal exibe excelente química. O destaque de Working Girl, porém, vai claramente para Weaver; seja aconselhando Tess e massageando seu ego a cada olhar admirado da jovem ou esbanjando seu carisma requintado com a alta sociedade, a atriz cria um personagem memorável (até esférico considerando as limitações do roteiro) e se prova uma talentosíssima comediante.
Machete
3.6 1,5K Assista AgoraMachete, antes apenas um trailer “fake” exibido no projeto “Grindhouse” (uma colaboração entre os aficionados em filmes B setentistas Tarantino e Roriguez), aqui ganha extensas duas horas de projeção em detrimento de boa parte da fisgada original. Assim como pode ser observado em “Grindhouse”, a diferença entre esses cineastas é que Tarantino, independente da origem de suas influências, consegue a proeza de criar filmes originais, que soam mais como arte do que como entretenimento estúpido; já Roriguez, infelizmente, peca por uma irritante falta de tenacidade em seus trabalhos, criando películas que divertem até certo ponto, mas que faltam em consistência, ao ponto de muitas vezes se tornarem até tediosas. Machete conta com um elenco ilustre, é uma pena que boa parte dele surja desperdiçado em cenas pouco inspiradas; é o caso de Deniro como o corrupto senador John McLaughlin, um personagem com potencial para se tornar memorável mas que ultimamente é mal servido pelo roteiro. O protagonista Machete – interpretado pelo ótimo Danny Trejo – é sem dúvidas uma das maiores qualidades do filme, ele surge como um sujeito estranhamente carismático, misturando seu jeito troglodita com uma peculiar dignidade que cativa o espectador. Rodriguez ganha pontos ao utilizar-se de planos inventivos nas divertidas (senão demasiadamente repetitivas) cenas de massacre; o diretor faz questão que presenciemos a ação dos mais variados ângulos, um excesso que, em um filme onde o protagonista faz de corda o intestino de um capanga, é certamente adequado. Recheado de belas mulheres (incluindo Lindsay Lohan em um papel insignificante e desnecessário), órgãos voando pela tela a todo o momento, explosões épicas e todos os exageros possíveis em um filme de Rodriguez, é surpreendente e decepcionante que, ao final da projeção, Machete mal consiga cumprir o mero papel de entretenimento B, já que o diretor como de costume, falha ao criar qualquer tipo de tensão, com a equivocada ilusão de que mais – o tempo todo - é melhor. Talvez esse seja o maior defeito de Rodriguez - ao contrário do colega mais talentoso, o diretor não sabe equilibrar seus excessos, que lá para a metade do filme se tornam extremamente cansativos e plenamente estúpidos; ainda que Machete implore para que ríamos com ele de sua ostensiva frivolidade, acabamos por despreza-lo e torcer para que as duas seqüências anunciadas ao final da projeção, jamais se concretizem.
O Último Metrô
3.8 68 Assista AgoraUm brilhante drama da fase tardia de Truffaut; ainda que filmado em 1980, é alusivo tanto em tom quanto em estética aos trabalhos sessentistas do diretor. O cenário é a tensa Paris da Segunda Guerra, ocupada pelos Alemães e em constante clima de desconfiança. Acompanhamos de forma intimista o cotidiano das pessoas que mantém o teatro Montmartre vivo, que em um período violento e angustiante da vida dos parisienses, se torna mais do que um mero entretenimento, funcionando como fuga da realidade - um abrigo caloroso em tempos difíceis. Lucas Stenier (Jean Poiret), judeu e diretor do teatro, junto a esposa Marion Steiner (Deneuve em uma belíssima atuação premiada com o Cannes), simula sua fuga de Paris, quando na verdade o diretor se refugia na adega do teatro, atento a tudo o que se passa e palpitando nas peças através de sua complacente esposa. Com a chegada de um novo ator a peça (Gerard Depardieu), as relações entre os membros do teatro tomam novos rumos, Marion começa a se sentir cada vez mais distante do marido e incapaz de lidar com seus próprios sentimentos, se reveste de uma frieza alienante, afetando todos ao seu redor mais do que se permite aceitar. Explorando a estreita linha entre a ficção e o real, o filme cria uma genial analogia entre a dissimulação teatral e àquela da vida real - somos apresentados a personagens que tem de representar dentro e fora do palco, seja para escapar do regime nazista ou por conflitos intrínsecos, pelo medo de se colocar sob os holofotes da vida. O triângulo amoroso surge de forma delicada e repleta de nuances, é fascinante como o faz-de-conta do teatro permeia o imaginário e a emoção daquelas pessoas, de forma a torná-las susceptíveis a novas experiências e sentimentos. Le dernier métro é um filme que nos imerge no mundo do teatro de forma meticulosa e sedutora, é palpável a paixão de Truffaut pela temática e o belo desfecho subjetivo apenas deixa claro aquilo que o filme ia explorando brilhantemente até então, realidade e fantasia são parte do mesmo espetáculo, cabe a nós encontrar em nós mesmos a sensibilidade e a coragem necessária para diferenciá-los.
Charada
4.1 297 Assista AgoraConhecido como “o melhor filme que Hitchock nunca fez”, Charada é uma divertida mistura de comédia, romance e suspense, que amarra todos esses elementos de forma suave em uma trama repleta de reviravoltas e que tem como protagonistas dois titãs do cinema – Audrey Hepburn e Cary Grant. A comédia aqui fica por conta dos engraçadíssimos diálogos entre Grant e Hepburn, que desenvolvem ao decorrer da narrativa uma clássica relação de amor e ódio; elogios e farpas surgem a todo o momento e apesar da notável diferença de idade – como é de costume nos filmes de Hepburn - o romance é adorável e convincente, culminando em uma bela seqüência que tem como plano de fundo o rio Sena. É surpreendente que, com um romance brotando e um humor levemente excêntrico tomando conta dos diálogos, Charada consiga também a proeza de ser um eficaz e imprevisível thriller - temos quatro vilões terríveis (ou seriam cinco?), cenas de perseguição que nos fazem grudar os olhos na tela e como é de costume nos filmes de Stanley Donen, uma fantástica trilha sonora por Henry Mancini, que inclui a bela canção tema que leva o nome do filme. Com tantos motivos para ser apreciado, seja a beleza clássica de Audrey Hepburn desfilando em figurinos Givenchy ou Cary Grant tomando uma ducha de terno ao som das risadas genuínas da co-estrela, Charade é indiscutivelmente um dos mais charmosos clássicos da década de 60 e um excelente exemplo de uma grande mistura de gêneros que acerta no tom do começo ao fim.
Adeus Amor
3.3 14 Assista AgoraBaseado no sucesso da Broadway de mesmo nome, Bye Bye Birdie simultaneamente critica e homenageia o fenômeno cultural que foi Elvis Presley no final da década de 50, venerado por adolescentes histéricas e envolto por um fascínio coletivo da mídia. Ainda que o filme tenha chegado um pouco tarde para se tornar relevante (em 1963 Elvis já perdera espaço para um ataque de contracultura prestes a explodir), este pedaço de entretenimento “campy” encantou gerações mais novas justamente por fantasiar aquilo que já ia se perdendo naquele começo de década, o fascínio pelos grandes astros, pelo divino e artificial espetáculo que é a cultura Hollywoodiana. Bye Bye Birdie é antes de tudo um veículo de estrelato para a bela Ann-Margret, que com o sucesso do filme se tornou uma sensação instantânea e um dos maiores símbolos sexuais da época - ironicamente, pouco tempo depois ela protagonizaria um musical com o rei do rock em pessoa – aqui ela rouba a atenção sempre que aparece e não é a toa que as melhores cenas sejam justamente a abertura e a reprise, nas quais Margret, banhada em luz dourada contra um telão azul, canta a música tema com tamanha sensualidade que o próprio filme parece não ser capaz de conter. Estrelas a parte, Bye Bye Birdie é um filme antiquado que certamente não envelheceu bem, o roteiro em determinados pontos se torna extremamente absurdo com suas convenções problemáticas – porque todos os personagens (incluindo o astro do rock Conrad Birdie) permanecem na casa dos McAfee? Não existem hotéis na cidade? – e sempre que foca em algo além de Ann-Margret perde boa parte de sua faísca, com exceção de uma ótima cena de dança protagonizada por Janet Leigh. A maior decepção – surpreendentemente – é Dick Van Dyke em sua estréia nos cinemas, que aqui conta com poucos e esquecíveis números musicais; felizmente, ele teria a chance de brilhar mais tarde com o clássico infantil Mary Poppins. Bye Bye Birdie é pura frivolidade e certamente tem seus defeitos, mas graças ao charme indiscutível de Ann-Margret e alguns números musicais inspirados, guarda com honra seu lugar como clássico teen sessentista.
A Rede Social
3.6 3,1K Assista AgoraConsiderando os caminhos equivocados e fúteis aos quais um filme sobre a criação do Facebook poderia ser levado, The Social Network é surpreendentemente eficiente, mas muito longe de ser uma obra-prima ou até mesmo o "novo Citizen Kane" como algumas questionáveis críticas chegaram a afirmar. Fincher dirigiu The Social Network meticulosamente, é admirável sua atenção ao detalhe e a segurança em que filma longos e complexos planos, que ganham força graças à bela fotografia cinzenta e a perfeita trilha sonora vencedora do Oscar, que confere uma necessária melancolia à trama. Apesar de tecnicamente impressionante, The Social Network pisa em falso ao criar um drama humano interessante em teoria, mas pouco envolvente na prática, já que falha ao explorar a relação dos amigos Eduardo Saverin e Mark Zuckerberg de forma crua, sempre soando frio em suas intenções e só conseguindo funcionar parcialmente graças a algumas excelentes atuações, com destaque claro para Andrew Garfield, um dos poucos elementos pulsantes do filme. Muito se comentou sobre a atuação de Justin Timberlake, e a verdade é que como ator Justin é um ótimo cantor, ainda que o personagem de Sean Parker caia como uma luva em sua persona, falta naturalidade em sua atuação, algo que compromete seu personagem, tornando-o caricato e enfadonho. The Social Newtork é um filme tão brilhantemente calculado quanto o próprio Facebook, infelizmente, também é tão sem vida quanto os números binários que estruturam tal objeto de fascínio.
O Discurso do Rei
4.0 2,6K Assista AgoraThe King's Speech, ainda que extremamente bem feito, não é merecedor do Oscar de melhor filme, pois mesmo que superior ao superestimado The Social Network (o outro favorito ao prêmio), palidece perto de produções mais triunfantes e ousadas como Black Swan e True Grit. Acompanhamos aqui a trajetória do Rei George VI (Colin Firth) ao enfrentar sua gagueira - reflexo de uma infância reprimida e extrema falta de auto-estima - e quase que simultaneamente assumir o trono abandonado pelo irmão em prol de um casamento mal-visto pela corte. Ao se submeter aos peculiares tratamentos do excêntrico Lionel Logue (Geoffrey Rush), George descobre nele não só uma possível solução para seu agonizante problema, mas um amigo capaz de quebrar suas próprias barreiras internas e torna-lo o grande homem que esconde dentro de si. Filmado em boa parte utilizando-se de uma grande angular e repleto de closes deselegantes, o filme ganha um aspecto um tanto excêntrico, algo que somado ao típico humor britânico de seus peculiares personagens torna The King’s Speech um filme irresistivelmente charmoso. Contando com uma direção de arte impecável que imerge o espectador desde os primeiros minutos na fúnebre Londres pré-Segunda Guerra, The King’s Speech é bem sucedido também porque põe o drama humano em primeiro plano, e graças a grandiosas atuações por todo o elenco (destaque para Firth que cria um sujeito engraçado em seus trejeitos ainda que longe de caricato), é certamente um filme fácil de se apreciado. Vale criticar, porém, que o provável motivo pelo qual a academia premiou The King’s Speech é também o seu maior defeito, o filme peca em determinados momentos por ser demasiadamente convencional, o conflito que antecede a excelente cena que dá título ao longa soa forçado e como mero ajuste de roteiro. Felizmente, o longa é muito cuidadosamente orquestrado e sensível para sofrer com tais falhas e ainda que não seja o melhor filme dos dez indicados este ano, é indiscutivelmente bom cinema.
Loucos do Alabama
3.5 31 Assista AgoraEm sua estréia como diretor, Antonio Banderas criou um filme único, repleto de charmes e com inspiração clara em clássicos de Almodóvar como Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, diretor que, aliás, propeliu a carreira de Banderas como ator nos anos 80 em diversas colaborações fílmicas. Crazy In Alabama intercala duas narrativas distintas - temos a vaidosa e afetada Lucille, que após matar o marido repressor, sai pelas secas estradas do Alabama em busca de fama carregando a cabeça do falecido, e em um tom mais sério, acompanhamos o sobrinho de Lucille e sua indignação com o racismo, violência e injustiça na pacata cidadezinha sulista onde vive. É fácil condenar Banderas pela forma desarticulada em que cruza suas tramas, e a porção que envolve Lucille – Melanie Griffith em seu melhor papel desde Working Girl – é certamente mais interessante que a envolvendo a segregação racial, já que a última, apesar de bons momentos, peca por uma ingênua artificialidade. Apesar de seus óbvios defeitos, a verdade é que Crazy In Alabama jamais falha em encantar com sua mistura de melodrama extravagante e momentos honestos (até tocantes) - no final da projeção sentimos que testemunhamos algo peculiarmente bonito apesar de uma imensidão de excessos, que na verdade atribuem até certo charme “campy” à produção. A maior surpresa aqui, porém, é o estilo confiante que Banderas assume em seu primeiro longa, desde a brilhante abertura animada ao som de “These Boots Are Made for Walking” até as belas tomadas do cassino em que Lucille entra com semblante onírico, o diretor felizmente não teve medo de ousar, criando planos belos e inspirados; e como de se esperar, faz questão de enaltecer sua esposa e musa Griffith, o que ultimamente torna a protagonista Lucille uma figura memorável, grandiosa e surpreendentemente a verdadeira alma do filme.