"Baseado no curta-metragem que fez muito burburinho tempos passados, Marcel, agora, volta em um falso documentário sobre ele e sua visão de vida, comunidade, companheirismo, amor, mundo, família e dúvidas acerca da inconstância da existência. O protagonista dublado por Jenny Slate é incrivelmente sagaz, inteligente e questionador. Junto ao narrador do filme (Dean Fleischer-Camp, que também dirige) ele mostra que o seu mundo ao lado da avó, Connie (voz de Isabella Rossellini) pode ser tão complexo quanto divertido."
Trecho da minha crítica que pode ser vista no site Cine Set. com. br /critica-marcel-the-shell-with-the-shoes-on-a24/
Baseado na obra de Milton Hatoum, “O Rio do Desejo” é um filme regular, não é ruim, mas também não é excelente, fica nesse meio termo do insosso de quase um retângulo amoroso que já vimos milhares de vezes. Penso que o grande trunfo é justamente a performance de Sophie Charlotte, o grande nome do filme. Ela entrega vulnerabilidade em estado máximo. A cenografia auxilia na construção da narrativa, mas os diálogos e certos dialetos daqui do Amazonas, em tela, me soou meio forçado. Gostei de ver grandes nomes da atuação local em cena, como Adanilo, Isabela Catão e Rosa Malagueta. Extraindo alguma coisa, a obsessão e a inveja que deveria ser um protagonismo ficou meio à deriva. No mais, dá um certo orgulho em ver nosso norte, nosso Amazonas, em tela.
Quando a vida se mostra madrasta das circunstâncias e nada se desenvolve como o que se almejava e o ciclo de pobreza e miséria continuam a girar, não resta outra alternativa senão sonhar. A vida é bruta, difícil e, quase sempre, lhe dá uma rasteira daquelas. Então, um certo devaneio é sempre bem vindo como um sopro de fuga de realidade e tentar viver em meio às turbulências causadas pelas circunstâncias, escolhas e pessoas que aparecem em nosso caminho que não vem para somar, mas para nos regredir cada vez mais.
Me compadeço completamente com a Senhora Ross, interpretada de forma magistral e avassaladora por Edith Evans. Ela é a representação das pessoas que não deram certo em nada na vida, mas para continuar sobrevivendo se prende a uma ilusão. É tão triste quanto crível. Principalmente na sua solidão de uma pessoa já no final da vida sem ninguém por perto senão filho e marido de caráter duvidoso que não acrescentaram em nada em sua vida. Resta a ilusão como melhor amiga e apoio.
Uma pena que o filme se perde na descentralização do protagonismo quando resolvem dar foco em Archie (Eric Portman) o marido malandro da minha velhinha, me pareceu uma forma muito contraditória em justificar o porquê dela ser assim, solitária. Ele não acrescentou em nada tanto na vida, quanto no filme.
E a cena final? Que dorzinha no peito.
Infelizmente, naqueles devaneios que só o Oscar comete, ela perdeu a estatueta de melhor atriz para Katherine Hepburn por “Adivinhe quem vem para jantar” que, sem comparado com o absurdo que Edith Evans entrega em cena, esse prêmio é uma ultrajante.
Tenho minhas ressalvas quanto ao filme no que tange escolhas artísticas, como narração, roteiro, edição e diálogos, aparentam um certo grau de conservadorismo – ok, estamos falando de 1950 – mas, sei lá, a representação dos médicos muito didáticos e pouco convincentes no que estavam fazendo, aliado ao machismo do marido, me soaram penosos.
Portanto, a melhor coisa do filme é realmente Joanne Woodward, muito convincente e hipnótica na pele de Eva White, Eva Black e Jane. Suas mudanças de expressão, o trabalho corporal e de voz deram o tom mais sofisticado e mais interessante a um filme que, num contexto geral, soa regular, mas sua presença é o que lhe fortalece, muito maravilhosa. Uma boa abordagem do que seria a famosa dupla personalidade, aqui, no caso, tripla.
Apesar do título melodramático (eu prefiro o título original), gostei bastante dessa produção que fala do amor enlouquecido até as últimas consequências e as consequências desses atos impulsivos (ou não) em nome de uma paixão.
E que bad bitch é essa Ellen Berent? Que desempenho de Gene Tierney, nunca fazendo a linha enlouquecida e acima do tom, sempre sarcástica e usando de sua educação, sedução e beleza para manipular e destroçar todos à sua volta em nome de um amor desmedido que só ela sentia. E pior que isso não é nem história de filme, viu. Realmente acontece. Achei crível.
E que plot final dela, hein? Que sádica, que bandida sem mais nada a perder... Ou não... Pena que os momentos finais do são meio broxantes.
E que direção de arte e figurinos, viu. Um primor. Essas casas e figurinos belíssimos, gente?
Culpa, remorso, inquietação, frustração e automutilação, dentre tantos termos para classificar “A Baleia”, penso que estes são os que mais resumem esta obra controvérsia de Darren Aronofsky, e qual filme dele não vem recheado de polêmicas, não é mesmo?
Vamos ao fato: “A Baleia” é propositalmente um filme claustrofóbico, em todos os sentidos. Como Charlie (Brendan Fraser) preso ao seu corpo, a sua mente, as suas impulsividades alimentares descontando tudo na comida e o ambiente fechado que imprime esse lugar insalubre.
Por debaixo dos panos, o filme narra, também, a questão do corpo enquanto uma ferramenta de defesa do sujeito (tipo, meu templo, minhas regras) e não uma matéria que está a serviço de Deus e religiosidade e todo aquele papo fundamentalista da repressão ao corpo e se estar preso às artimanhas do homem em nome do Todo Poderoso. Ora, se há um Deus, nossos corpos, nossas vontades, desejos e amores não seriam uma forma de penalização Dele em assumirmos tais paixões, base de um discurso religioso opressivo. Neste sentido, a sexualidade também é contada de uma maneira muito prática, quase didática, dentro do mundo Aronofsky.
O abandono também é uma parte fundamental na rotina de Charlie e na direção de Aronofsky. O abandono por amor: e aqui há duas questões, o abandono de Charlie de sua família por amor ao seu namorado e o abandono do seu corpo, de sua vida e de suas expectativas por conta dessa consequência até ele chegar do jeito que está.
E o abandono têm suas consequências. Como retornar uma relação amistosa e saudável com a filha depois de anos? Logicamente que há dores e traumas e os dois, Charlie e Ellie (Sadie Sink) são duas pessoas completamente destruídas, mas que devem seguir a vida e convivência, pela dor ou por amor, vai saber.
Sim, é um filme problemático que trata a obesidade de uma maneira muito cruel, quase como se fosse uma escolha. A cena dele comendo tudo que encontra pela frente é tão cruel quanto crível. Lembrando sempre que obesidade não é uma escolha, sim, uma doença.
De todo modo, a forma de aberração como Charlie é tratado por si mesmo e pelos demais personagens, somente Liz (Hong Chau) compreende e explora esse lado mais afetivo dele, incomoda bastante. Acho que a contradição reside aí: a aberração como exploração do sofrimento: para causar ou para refletir? Você decide.
No mais, um elenco fantástico, com destaque total para Hong Chau, minha favorita do filme, e Brendan Fraser imprimindo, medo, compaixão, sofrimento, doçura em todas as proporções possíveis. Um trabalho minucioso que, por mais que esteja com próteses, você vê a sua interpretação, sente o ator, ele não usa desse artifício para entregar algo genérico. É realmente tocante.
Se focar nas entrelinhas, onde o filme fala sobre raízes, zelo, memória e identidade na construção do sujeito, é uma boa história. Se deixar de pensar sobre isso, o filme torna-se enfadonho, tendo como único artifício a excelente composição de uma atriz genial e do peso de Geraldine Page. Ela rouba todos os holofotes para ela. É uma composição que poderia cair na caricatura de uma senhora em busca de um sonho (im)possível, mas, em suas mãos, ela imprime, leveza, simpatia e determinação. Não tem como não se encantar por ela e por seus trejeitos escalafobéticos.
"A direção de Michael Morris (conhecido por dirigir séries como “13 Reasons Why”, “House of Cards”, “Brothers & Sisters”, “Kingdom”, “Bloodline”, entre outros) entrega um filme padrão do buraco sem fim das almas atormentadas. “To Leslie” não apresenta nada de novo e extraordinário na jornada do/a herói/protagonista para a sua redenção; já vimos isso em diversas ocasiões para o bem ou mal."
Minha crítica completa no site Cine Set: critica-to-leslie-andrea-riseborough/
Os filhos são as projeções dos seus pais. É um relacionamento bastante louco e nada fácil de conceber no que se trata da relação entre pais e filhos. “O coração que bate fora do peito”, os pais e mães dizem dos seus filhos e filhas. As projeções já começam por aí quando se cria expectativas em torno do futuro do/a rebento/a e de como ele/a será enquanto pessoa. Boa? Ruim? Bem relacionada e bem de vida? Seguindo seus próprios passos ou os passos condicionados pelos pais? Enfim, projeções.
Mas os filhos crescem e resolvem trilhar seus próprios caminhos, ainda que similares aos dos pais, mas apenas seus caminhos. Aí que o coração sai pela boca quando os/as rebentos/as saem do ninho para seguir o seu próprio destino. Mas, e quando destino sai da trilha e se mostra um verdadeiro pesadelo? Onde anda o coração fora do peito perdido na bagunça do seu próprio caos interior? Eis “Onde Está Meu Coração”, minissérie importe sobre o vício de crack e de como a droga não apenas destrói o/a usuário/a, mas todo o seu redor. E, para, além disso, é uma história de amor entre pais e filhos na busca de reparar erros e acertos, conexão, família e união.
Um roteiro bem elaborado e escrito por George Moura e Sérgio Goldenberg, mas incomoda um pouco os longos dez episódios, a sensação é que, depois de quarto ou quinto episódio, a série ficou rodando em círculos em quase um pleonasmo sem fim. Penso que seis ou oito episódios seriam o suficiente.
Outra coisa muito óbvia é quando se trata de relações de drogas na dramaturgia, sempre visto pela ótica branca e rica, já perceberam? O sofrimento podem ser os mesmos, as dores podem ser as mesmas, mas as soluções não. Esse arco burguês e da facilidade do tratamento, dos privilégios jogados no lixo em virtude da droga e tudo mais me pareceu um tanto fundamentalista e até elitista no sentido de: “oh, vejam uma doutora rica, branca e viciada, como pode?”, enfim, vocês entenderam.
E isso fica explícito no episódio sete quando ela vai presa por tentativa de assalto e logo depois liberada... Por motivos óbvios.
No mais, grande elenco em sintonia. Letícia Colin é um talento extraordinário, você sente tudo em seu olhar, seus tiques, suas caras e bocas propositalmente perturbadoras, a angústia. Grandiosa.
Imagino os gatilhos que essa produção foi para Fábio Assunção ou uma maneira de exorcismo dos seus demônios, todos sabem dos seus problemas com bebidas e drogas.
Mas, em minha opinião, o grande nome é de Mariana Lima. Que atriz, meus caros. Que atriz! Está tudo no seu olhar, na sua urgência em proteger sua cria, sua família. Um espetáculo. Cada vez mais amo essa mulher.
Eu estou em estado catártico com esse filme: ao mesmo tempo em que estou arrasado, quero rever novamente e colocar pai e filha em uma caixinha. Uma história muito crua e genuína da relação entre pai e filha, duas pessoas diferentes ao mesmo tempo iguais e jovens descobrindo coisas da vida.
O filme, na minha visão, é como um pedido de desculpas de Charlotte Wells (em uma estreia na direção magistral) e de como ela era inocente, uma criança, afinal, para perceber e compreender o que se passava na cabeça do seu pai. Hoje, adulta, talvez ao longo da vida em uma briga interna entre ela e ela mesma e com o próprio pai, ela percebeu que, talvez, uma possível ausência paterna estava ligada a saúde mental dele.
E ele não estava bem. Era um caos. É angustiante assistir Paul Mescal (FABULOSO é pouco para classificar o que esse cara faz aqui) tentando ser um bom pai, em uma figura padronizada de ser pai ao mesmo tempo sendo jovem e querendo uma liberdade para a filha, algo que nunca teve e também, tendo que lidar com seus demônios internos.
Eu realmente estou devastado com esse filme, pois é muito sensorial também, você sente as dores do pai, sente a energia da descoberta da filha. Mas acaba tomando partido dele porque são dores fundamentadas nos diversos traumas ao longo da vida, falo por experiência própria, que nem filhos ou o maior dos amores pode apagar, sabe?
Por isso que digo que “Aftersun” é uma carta de amor e um pedido de desculpas de Wells por não entende-lo e também é um trabalho de memória, para não apagar a lembrança que ela teve com ele e tem dele. O manter intacto do jeito que ele é. E a cena final, meu Deus. O que é aquilo? É à volta ao caos em seu estado bruto e sem volta. Doloroso.
Olha, sinceramente, por mais que Tár seja um filme excelente e tenha como pano de fundo uma boa história acerca do cancelamento e julgamentos precipitados ou não, e Todd Field foi bem sagaz em não tomar partidos, ele joga na tela para quem assiste tire sua própria conclusão, não dá para falar do filme sem mencionar Cate Blanchett.
O que essa mulher faz em tela é coisa de louco. Ela se transforma de uma cena para outra ou na mesma cena, a medida que sua incrível Lydia Tár é confrontada. Uma personagem extremamente difícil, poderosa, bruta, pragmática e um tanto etérea (aqui, unicamente no seu cuidado e conhecimento com a música, como se fossem unos). Simplesmente não dá para tirar o olho e perder a atenção com ela, Tár te domina e te chama para entrar em seu mundo e em sua mente. Mas, perspicaz que é ela se deixa ver até certo ponto, até onde ela quer ser desvendada. E é aí que mora toda a magnitude do poder de Blanchett em cena, cada atitude sua é como ela tivesse nos testando também.
Assistir Tár é quase que uma experiência sensorial. Pois ela provoca, instiga e sabe de sua força bruta, dos seus conhecimentos e é segura no que faz, para o bem ou para o mal.
E aí, meu amigo realmente não dá para tomar partidos. Ela é uma bitch? Certamente, mas no mundo dos leões e dos homens, uma mulher lésbica assumir todo esse poder, com certeza, vem carregado de muitos problemas e até traumas que nem precisam ser citados, pois está estampado na sua cara e na sua linguagem corporal.
Eu acho que quem dirigiu esse filme, na verdade, foi a Cate Blanchett, pois ela que coordena tudo, todos os outros são totalmente irrelevantes. Eu estou em êxtase com essa performance. Bravíssimo!
Uma comédia romântica fina e cheia de estilo, mas que infelizmente desliza do meio para o fim caindo em um marasmo, perde o timing do início.
Fora isso, ótima protagonista de Glenda Jackson, vencendo o seu segundo Oscar de atriz aqui. Uma personagem madura, segura de si, a frente do seu tempo, empoderada e toda debochada, adoro.
Um encanto de novelão das 18h versão Spielberg. Agora sério, como a arte tem um papel fundamental na construção social e até educacional da pessoa, né? Sem arte a gente não vive. Sem o lúdico para encarar a realidade.
Gosto dessa linguagem nada inovadora de Spielberg para falar da necessidade da arte, aqui, do cinema, na sua construção enquanto pessoa e futuro profissional e como ela salva de diversas dores que temos ao longo da nossa jornada. Aliado, claro, ao incentivo da família em desenvolver essas habilidades e talentos natos.
Mas não apenas isso, é uma ruptura com o padronizado, um mundo novo que se abre ao leque de opções. Achei eficaz.
Gabriel LeBelle é um talento. Paul Dano na melhor atuação do filme, cheio de complexidades e camadas. Michelle Williams, como sempre ótima, mas já esteve melhor em outras ocasiões e Seth Rogen bastante interessante. E que luxo a participação de David Lynch, hein?
Seria “Jezebel” o início da personificação de Bette Davis em papeis de mulheres mal amadas, amarguradas, vingativas e debochadas? Se sim, gostei bastante. Um Oscar de melhor atriz justíssimo e bem melhor que a xurumela da sua primeira vitória.
Aqui, o filme sai de um vindouro romance para um drama sobre a vingança de uma mulher de ego ferido que tem como pano de fundo a escravidão (notem que todos são escravocratas convictos e orgulhosos) e da febre amarela que dizimou meio mundo. Todavia, acho que essa parte mais histórica acontece de forma muito ligeira, deveria ter sido mais bem desenvolvida, pois é muito mais interessante que metade do filme.
O bem da verdade mesmo é que o filme foi feito para Bette Davis brilhar e, como uma grande estrela que é, brilhou. Seja usando branco pueril ou o vermelho profano.
Martin McDonagh nos entrega mais um bom filme no seu currículo, embora se comparado a “Três Anúncios Para Um Crime” haja uma decaída no roteiro e ritmo, ainda assim, acima da média.
Gosto que o filme dialoga sobre uma amizade verdadeira entre dois homens do início do século XX em plena Guerra Civil. É bem raro de vermos em tela o relacionamento afetivo entre dois homens (sim, amizade é um relacionamento afetivo!). E, para além da questão do afeto, há a questão do legado. Quando morremos, quem lembrará gente? Para Pádraic (Colin Farrell) o legado é a bondade, simpatia, empatia e lealdade aos seus. Para Colm (Brendan Gleeson), o legado é a atemporalidade, isto é, fazer algo que entre para história e ser reconhecido para sempre, assim, ele nunca morrerá.
É um conflito existencial e ético aí. Pois, ao final, o que realmente importa? Fama e atemporalidade ou ser esquecido, mas ter sido amado, amou e cuidou dos seus? Polêmico.
Contudo, acho que mesmo usando do humor sarcástico e refinado, McDonagh peca pelo ritmo arrastado no meio da produção que ganha fôlego somente nos últimos 20 minutos de película.
Acho interessante a atitude drástica de Colm, uma metáfora para o total desapego, o desespero e a urgência em ser enxergado, nem que para isso, se desfaça de uma amizade e... Bem, vocês sabem.
Também há uma prepotência dele em achar o amigo, bronco, burro e de poucos saberes. Aí entra uma outra questão da sabedoria que não é tão somente acadêmica e/ou de absorvidas pelo externo, mas os saberes de vida, não são saberes?
O elenco principal é um primor, McDonagh sabe como poucos da atualidade dirigir atores. Colin Farrell excelente e em estado de graça como seu bronco e de pouco estudo Pádraic. Finalmente Brendan Gleeson está tendo o seu devido reconhecimento fora do eixo Europa. Barry Keoghan é um dos melhores de sua geração, grande ator. Mas, em minha opinião, a melhor performance e quem rouba a cena é Kerry Condon com sua preocupada e angustiada irmã de Pádraic, Siobhán, maravilhosa.
Belíssimo, difícil e intenso filme que se aprofunda nas complexidades dos relacionamentos e amores. Amor pela vida, pelo outro, por si mesmo, amor pelo material, enfim, amores. Gosto da tensão sexual entre os rapazes. Acho que mais do que a bissexualidade claramente envolvida, há ali a questão da necessidade de gostar e ser gostado por alguém, não importa o gênero. Precisamos disso de alguma forma para suprir necessidades, rombos ou o que queriam classificar, no sentido existencial. Algumas pessoas lidam bem com isso outras não. E não sei se está tudo bem por motivos de repressão ao próprio sentimento (e por sentimento não falo somente de amor romântico) por conta das convenções sociais que reprimem sentimentos, desejos, corpos. Eu prefiro acreditar que eles tinham um tórrido romance e as mulheres como convenção social para reprimir mais os desejos. Grandiosa performance de todos os envolvidos, especialmente Glenda Jackson em seu primeiro e peculiar Oscar de melhor atriz. No fim, tudo é sobre amor, poder, sexo, cobiça, crise existencial e certa dose de cinismo.
Eu pensava que o filme seria um noir clássico e charmoso, caí do cavalo. “Perigosa” não passa de um drama romântico meia boca onde as coisas acontecem muito rápidas e não sobra tempo para desenvolver melhor a trama e a complexidade dos personagens. O plano dela, por exemplo, só começa a acontecer faltando 20 minutos para o filme terminar, um desperdício de história.
Um filme mediano que se sustenta somente pela força cênica e dramática de uma atriz do calibre de Bette Davis. Se mereceu o Oscar de melhor atriz ou não, como ela mesma costumava dizer que era um prêmio de consolação, o fato é que: mesmo em seu pior momento (ou um momento não tão inspirado como outras atuações fodonas dela), ainda assim, ela está melhor que muitas vencedoras ou indicadas na categoria ao longo desses quase 100 anos de Academy Awards.
Um romance interessante de assistir, nada de extraordinário e memorável. Não é ruim, longe disso, mas um exagero os Oscar vencidos. Com exceção de figurino, direção de arte e até atriz coadjuvante com a deusa Judi Dench em seus dez minutos de tela.
Se não fosse a campanha pesadíssima de Harvey Weinstein, para não dizer outros termos, o filme talvez passasse despercebido, chegando a um no máximo Globo de Ouro? E o que falar de vitória de Gwyneth Paltrow? Ótima em cena? Certamente, mas não para vencer um Oscar, mas o histórico de vitória nessa categoria...melhor nem adentrar.
“Shakespeare Apaixonado” é aquele tipo de filme para assistir em um dia chuvoso, sofrendo de amor ou com seu amor do lado, um chocolate, pipoca e nada mais que isso. É sobre amor e paixão fulminantes, daqueles de uma vez na vida, sobre convenções e comportamentos castradores também. Mas, passados trinta minutos, você esquece quase tudo do filme.
É um filme que causa muito incômodo. Pela distopia que não parece ser tão distante da realidade: o Brasil sofre com o projeto da limpeza social aos fins do século XIX, um fato. Na falta de recursos para enviar os negros de pele retinta, como no filme, o que fazem? Genocídio de sangue negro. O holocausto negro dos escravizados ainda está em vigor, negros no Brasil são os Georges Floyds do cotidiano, não podemos respirar. E a branquitude impera.
Contudo, por mais que o roteiro e a premissa sejam boas, na prática senti algo muito planfetário e muito menos contextualizando ou abusando da complexidade do momento atual do Brasil em paralelo com essa distopia. O grande problema em não explorar a complexidade é justamente isso, parece tudo muito militante para causar. Frases de efeitos, direção de arte óbvia e uma vilania folhetinesca, representada por Adriana Esteves.
O quilombo dos novos tempos foi bem bonito de se ver, mas causou outro desconforto nessa obviedade: a cena do Emicida trocando armas por livros, sério? Isso já não estava explícito nas falas do protagonista Antônio (Alfred Enoch, inclusive, não tão bem em cena como os seus companheiros, comprometeu cenas importantes do filme).
Taís Araújo e Seu Jorge, portanto, carregam o filme nas costas.
Eu, como uma pessoa negra, infelizmente, não consegui me conectar com o filme. Culpa da edição embaraçosa e do querido Lázaro Ramos, penso que na pressa em mostrar um bom serviço em sua estreia na direção, pesou a mão.
No final, é um filme eficaz para quem conseguir compreender o que os corpos negros passam nessa sociedade.
Stephen King realmente é o mestre do terror psicológico e sempre é muito difícil adaptá-lo para o cinema. Com exceção de “O Iluminado”, nunca tinha visto uma obra que fazia jus as suas narrativas. “Misery” é o que mais se aproxima de uma excelente adaptação de seus livros.
O terror brutal já começa com a bondade excessiva e a devoção de Anne Wilkers, em uma excelente performance de Kathy Bates. É um terror gradativo até o seu completo surto, a tensão instaurada nesse seu cuidado excessivo é o que deixa tudo mais perturbador, impressos nas expressões de James Caan. O clima gélido e pouco amistoso, a casa isolada, os móveis e sua decoração deixam tudo ainda mais claustrofóbico.
Mas o filme não seria nada se não fosse Kathy Bates, monstruosa em um papel difícil, complexo e que ela tira de letra, como uma excelente atriz que é. Oscar de melhor atriz merecidíssimo.
O enredo ainda fala da importância da arte na vida da pessoa em como ela consegue nos tirar de um momento ruim para descontrair, ir ao lúdico e se desprender da realidade. Todavia, há aquelas pessoas que não sabem lidar com isso e mergulham na mais completa ilusão e se perdem, no sentido literário aqui.
Só não curti o final, embora seja uma adaptação, penso que seria mais crível ela totalmente louca em uma clínica psiquiátrica e ele sempre nesse estado de alerta por ela ainda estar viva.
Um soft pornô que vai do nada para lugar nenhum e se sustenta somente pelos nudes dos atores. Mas achei interessante essa libertação dela através da arte/nudez.
Ah, como eu amo Alecia Beth Moore! E que energia caótica e ao mesmo tempo acolhedora dessa família que está envolvida e unida pelo sucesso da sua matriarca, P!nk. Confesso que esperava mais dela, dos filhos (como não amar Willow e Jamenson?) e do Carey e das falas dos membros da banda que estão com ela há mais de quinze anos, focou muito nela e é até uma contradição em dar voz para outras pessoas que fizeram essa tour acontecer. No mais, te amo, mama!
Tudo o que se precisa é um lugar de conforto onde menos pensamos existir. E uma grande amizade é um lugar de conforto e acolhedor. Não sabia que o filme é baseado em fatos reais o que o deixa ainda mais interessante. Lógico, têm suas obviedades e um roteiro que escorrega bastante e uma direção correta, mas, ao fim, a mensagem faz todo o sentido.
Um filme fraquíssimo que se embasa única e exclusivamente na atuação de Jessica Lange. Falando nisso, será que aqui que começou a sina da atriz em interpretar mulheres desequilibradas e/ou bêbadas, fora da realidade e com eterna devoção pela aparência e juventude? Só faltaram os cigarros para completar. Achei que ela está bem em cena, mas nada do que ela já vem fazendo, presa esse estereotipo em uma performance nada de extraordinária para vencer um Oscar de melhor atriz.
Gosto do trocadilho do título do filme que se refere às bombas nucleares e como isso é exatamente o que acontece os personagens de Lange e Lee Jones, poderiam se aprofundar mais nessa complexidade, mas foram para o dramalhão pesando a mão. E deu no que deu.
Marcel a Concha de Sapatos
3.8 104 Assista Agora"Baseado no curta-metragem que fez muito burburinho tempos passados, Marcel, agora, volta em um falso documentário sobre ele e sua visão de vida, comunidade, companheirismo, amor, mundo, família e dúvidas acerca da inconstância da existência. O protagonista dublado por Jenny Slate é incrivelmente sagaz, inteligente e questionador. Junto ao narrador do filme (Dean Fleischer-Camp, que também dirige) ele mostra que o seu mundo ao lado da avó, Connie (voz de Isabella Rossellini) pode ser tão complexo quanto divertido."
Trecho da minha crítica que pode ser vista no site Cine Set. com. br /critica-marcel-the-shell-with-the-shoes-on-a24/
O Rio do Desejo
3.4 45Baseado na obra de Milton Hatoum, “O Rio do Desejo” é um filme regular, não é ruim, mas também não é excelente, fica nesse meio termo do insosso de quase um retângulo amoroso que já vimos milhares de vezes. Penso que o grande trunfo é justamente a performance de Sophie Charlotte, o grande nome do filme. Ela entrega vulnerabilidade em estado máximo. A cenografia auxilia na construção da narrativa, mas os diálogos e certos dialetos daqui do Amazonas, em tela, me soou meio forçado. Gostei de ver grandes nomes da atuação local em cena, como Adanilo, Isabela Catão e Rosa Malagueta.
Extraindo alguma coisa, a obsessão e a inveja que deveria ser um protagonismo ficou meio à deriva. No mais, dá um certo orgulho em ver nosso norte, nosso Amazonas, em tela.
The Whisperers
3.6 10Quando a vida se mostra madrasta das circunstâncias e nada se desenvolve como o que se almejava e o ciclo de pobreza e miséria continuam a girar, não resta outra alternativa senão sonhar. A vida é bruta, difícil e, quase sempre, lhe dá uma rasteira daquelas. Então, um certo devaneio é sempre bem vindo como um sopro de fuga de realidade e tentar viver em meio às turbulências causadas pelas circunstâncias, escolhas e pessoas que aparecem em nosso caminho que não vem para somar, mas para nos regredir cada vez mais.
Me compadeço completamente com a Senhora Ross, interpretada de forma magistral e avassaladora por Edith Evans. Ela é a representação das pessoas que não deram certo em nada na vida, mas para continuar sobrevivendo se prende a uma ilusão. É tão triste quanto crível. Principalmente na sua solidão de uma pessoa já no final da vida sem ninguém por perto senão filho e marido de caráter duvidoso que não acrescentaram em nada em sua vida. Resta a ilusão como melhor amiga e apoio.
Uma pena que o filme se perde na descentralização do protagonismo quando resolvem dar foco em Archie (Eric Portman) o marido malandro da minha velhinha, me pareceu uma forma muito contraditória em justificar o porquê dela ser assim, solitária. Ele não acrescentou em nada tanto na vida, quanto no filme.
E a cena final? Que dorzinha no peito.
Infelizmente, naqueles devaneios que só o Oscar comete, ela perdeu a estatueta de melhor atriz para Katherine Hepburn por “Adivinhe quem vem para jantar” que, sem comparado com o absurdo que Edith Evans entrega em cena, esse prêmio é uma ultrajante.
As Três Máscaras de Eva
3.9 114Tenho minhas ressalvas quanto ao filme no que tange escolhas artísticas, como narração, roteiro, edição e diálogos, aparentam um certo grau de conservadorismo – ok, estamos falando de 1950 – mas, sei lá, a representação dos médicos muito didáticos e pouco convincentes no que estavam fazendo, aliado ao machismo do marido, me soaram penosos.
Portanto, a melhor coisa do filme é realmente Joanne Woodward, muito convincente e hipnótica na pele de Eva White, Eva Black e Jane. Suas mudanças de expressão, o trabalho corporal e de voz deram o tom mais sofisticado e mais interessante a um filme que, num contexto geral, soa regular, mas sua presença é o que lhe fortalece, muito maravilhosa. Uma boa abordagem do que seria a famosa dupla personalidade, aqui, no caso, tripla.
Amar Foi Minha Ruína
4.1 122 Assista AgoraApesar do título melodramático (eu prefiro o título original), gostei bastante dessa produção que fala do amor enlouquecido até as últimas consequências e as consequências desses atos impulsivos (ou não) em nome de uma paixão.
E que bad bitch é essa Ellen Berent? Que desempenho de Gene Tierney, nunca fazendo a linha enlouquecida e acima do tom, sempre sarcástica e usando de sua educação, sedução e beleza para manipular e destroçar todos à sua volta em nome de um amor desmedido que só ela sentia. E pior que isso não é nem história de filme, viu. Realmente acontece. Achei crível.
E que plot final dela, hein? Que sádica, que bandida sem mais nada a perder... Ou não...
Pena que os momentos finais do são meio broxantes.
E que direção de arte e figurinos, viu. Um primor. Essas casas e figurinos belíssimos, gente?
E, mais uma vez, que FDP!
A Baleia
4.0 1,0K Assista AgoraCulpa, remorso, inquietação, frustração e automutilação, dentre tantos termos para classificar “A Baleia”, penso que estes são os que mais resumem esta obra controvérsia de Darren Aronofsky, e qual filme dele não vem recheado de polêmicas, não é mesmo?
Vamos ao fato: “A Baleia” é propositalmente um filme claustrofóbico, em todos os sentidos. Como Charlie (Brendan Fraser) preso ao seu corpo, a sua mente, as suas impulsividades alimentares descontando tudo na comida e o ambiente fechado que imprime esse lugar insalubre.
Por debaixo dos panos, o filme narra, também, a questão do corpo enquanto uma ferramenta de defesa do sujeito (tipo, meu templo, minhas regras) e não uma matéria que está a serviço de Deus e religiosidade e todo aquele papo fundamentalista da repressão ao corpo e se estar preso às artimanhas do homem em nome do Todo Poderoso. Ora, se há um Deus, nossos corpos, nossas vontades, desejos e amores não seriam uma forma de penalização Dele em assumirmos tais paixões, base de um discurso religioso opressivo. Neste sentido, a sexualidade também é contada de uma maneira muito prática, quase didática, dentro do mundo Aronofsky.
O abandono também é uma parte fundamental na rotina de Charlie e na direção de Aronofsky. O abandono por amor: e aqui há duas questões, o abandono de Charlie de sua família por amor ao seu namorado e o abandono do seu corpo, de sua vida e de suas expectativas por conta dessa consequência até ele chegar do jeito que está.
E o abandono têm suas consequências. Como retornar uma relação amistosa e saudável com a filha depois de anos? Logicamente que há dores e traumas e os dois, Charlie e Ellie (Sadie Sink) são duas pessoas completamente destruídas, mas que devem seguir a vida e convivência, pela dor ou por amor, vai saber.
Agora o problema:
Sim, é um filme problemático que trata a obesidade de uma maneira muito cruel, quase como se fosse uma escolha. A cena dele comendo tudo que encontra pela frente é tão cruel quanto crível. Lembrando sempre que obesidade não é uma escolha, sim, uma doença.
De todo modo, a forma de aberração como Charlie é tratado por si mesmo e pelos demais personagens, somente Liz (Hong Chau) compreende e explora esse lado mais afetivo dele, incomoda bastante. Acho que a contradição reside aí: a aberração como exploração do sofrimento: para causar ou para refletir? Você decide.
No mais, um elenco fantástico, com destaque total para Hong Chau, minha favorita do filme, e Brendan Fraser imprimindo, medo, compaixão, sofrimento, doçura em todas as proporções possíveis. Um trabalho minucioso que, por mais que esteja com próteses, você vê a sua interpretação, sente o ator, ele não usa desse artifício para entregar algo genérico. É realmente tocante.
O Regresso para Bountiful
3.6 27 Assista AgoraSe focar nas entrelinhas, onde o filme fala sobre raízes, zelo, memória e identidade na construção do sujeito, é uma boa história. Se deixar de pensar sobre isso, o filme torna-se enfadonho, tendo como único artifício a excelente composição de uma atriz genial e do peso de Geraldine Page. Ela rouba todos os holofotes para ela. É uma composição que poderia cair na caricatura de uma senhora em busca de um sonho (im)possível, mas, em suas mãos, ela imprime, leveza, simpatia e determinação. Não tem como não se encantar por ela e por seus trejeitos escalafobéticos.
A Sorte Grande
3.4 89 Assista Agora"A direção de Michael Morris (conhecido por dirigir séries como “13 Reasons Why”, “House of Cards”, “Brothers & Sisters”, “Kingdom”, “Bloodline”, entre outros) entrega um filme padrão do buraco sem fim das almas atormentadas. “To Leslie” não apresenta nada de novo e extraordinário na jornada do/a herói/protagonista para a sua redenção; já vimos isso em diversas ocasiões para o bem ou mal."
Minha crítica completa no site Cine Set: critica-to-leslie-andrea-riseborough/
Onde Está Meu Coração
4.1 112Os filhos são as projeções dos seus pais. É um relacionamento bastante louco e nada fácil de conceber no que se trata da relação entre pais e filhos. “O coração que bate fora do peito”, os pais e mães dizem dos seus filhos e filhas. As projeções já começam por aí quando se cria expectativas em torno do futuro do/a rebento/a e de como ele/a será enquanto pessoa. Boa? Ruim? Bem relacionada e bem de vida? Seguindo seus próprios passos ou os passos condicionados pelos pais? Enfim, projeções.
Mas os filhos crescem e resolvem trilhar seus próprios caminhos, ainda que similares aos dos pais, mas apenas seus caminhos. Aí que o coração sai pela boca quando os/as rebentos/as saem do ninho para seguir o seu próprio destino. Mas, e quando destino sai da trilha e se mostra um verdadeiro pesadelo? Onde anda o coração fora do peito perdido na bagunça do seu próprio caos interior? Eis “Onde Está Meu Coração”, minissérie importe sobre o vício de crack e de como a droga não apenas destrói o/a usuário/a, mas todo o seu redor. E, para, além disso, é uma história de amor entre pais e filhos na busca de reparar erros e acertos, conexão, família e união.
Um roteiro bem elaborado e escrito por George Moura e Sérgio Goldenberg, mas incomoda um pouco os longos dez episódios, a sensação é que, depois de quarto ou quinto episódio, a série ficou rodando em círculos em quase um pleonasmo sem fim. Penso que seis ou oito episódios seriam o suficiente.
Outra coisa muito óbvia é quando se trata de relações de drogas na dramaturgia, sempre visto pela ótica branca e rica, já perceberam? O sofrimento podem ser os mesmos, as dores podem ser as mesmas, mas as soluções não. Esse arco burguês e da facilidade do tratamento, dos privilégios jogados no lixo em virtude da droga e tudo mais me pareceu um tanto fundamentalista e até elitista no sentido de: “oh, vejam uma doutora rica, branca e viciada, como pode?”, enfim, vocês entenderam.
E isso fica explícito no episódio sete quando ela vai presa por tentativa de assalto e logo depois liberada... Por motivos óbvios.
No mais, grande elenco em sintonia. Letícia Colin é um talento extraordinário, você sente tudo em seu olhar, seus tiques, suas caras e bocas propositalmente perturbadoras, a angústia. Grandiosa.
Imagino os gatilhos que essa produção foi para Fábio Assunção ou uma maneira de exorcismo dos seus demônios, todos sabem dos seus problemas com bebidas e drogas.
Mas, em minha opinião, o grande nome é de Mariana Lima. Que atriz, meus caros. Que atriz! Está tudo no seu olhar, na sua urgência em proteger sua cria, sua família. Um espetáculo. Cada vez mais amo essa mulher.
Aftersun
4.1 716Eu estou em estado catártico com esse filme: ao mesmo tempo em que estou arrasado, quero rever novamente e colocar pai e filha em uma caixinha. Uma história muito crua e genuína da relação entre pai e filha, duas pessoas diferentes ao mesmo tempo iguais e jovens descobrindo coisas da vida.
O filme, na minha visão, é como um pedido de desculpas de Charlotte Wells (em uma estreia na direção magistral) e de como ela era inocente, uma criança, afinal, para perceber e compreender o que se passava na cabeça do seu pai. Hoje, adulta, talvez ao longo da vida em uma briga interna entre ela e ela mesma e com o próprio pai, ela percebeu que, talvez, uma possível ausência paterna estava ligada a saúde mental dele.
E ele não estava bem. Era um caos. É angustiante assistir Paul Mescal (FABULOSO é pouco para classificar o que esse cara faz aqui) tentando ser um bom pai, em uma figura padronizada de ser pai ao mesmo tempo sendo jovem e querendo uma liberdade para a filha, algo que nunca teve e também, tendo que lidar com seus demônios internos.
Eu realmente estou devastado com esse filme, pois é muito sensorial também, você sente as dores do pai, sente a energia da descoberta da filha. Mas acaba tomando partido dele porque são dores fundamentadas nos diversos traumas ao longo da vida, falo por experiência própria, que nem filhos ou o maior dos amores pode apagar, sabe?
Por isso que digo que “Aftersun” é uma carta de amor e um pedido de desculpas de Wells por não entende-lo e também é um trabalho de memória, para não apagar a lembrança que ela teve com ele e tem dele. O manter intacto do jeito que ele é.
E a cena final, meu Deus. O que é aquilo? É à volta ao caos em seu estado bruto e sem volta.
Doloroso.
Tár
3.7 396 Assista AgoraOlha, sinceramente, por mais que Tár seja um filme excelente e tenha como pano de fundo uma boa história acerca do cancelamento e julgamentos precipitados ou não, e Todd Field foi bem sagaz em não tomar partidos, ele joga na tela para quem assiste tire sua própria conclusão, não dá para falar do filme sem mencionar Cate Blanchett.
O que essa mulher faz em tela é coisa de louco. Ela se transforma de uma cena para outra ou na mesma cena, a medida que sua incrível Lydia Tár é confrontada. Uma personagem extremamente difícil, poderosa, bruta, pragmática e um tanto etérea (aqui, unicamente no seu cuidado e conhecimento com a música, como se fossem unos). Simplesmente não dá para tirar o olho e perder a atenção com ela, Tár te domina e te chama para entrar em seu mundo e em sua mente. Mas, perspicaz que é ela se deixa ver até certo ponto, até onde ela quer ser desvendada. E é aí que mora toda a magnitude do poder de Blanchett em cena, cada atitude sua é como ela tivesse nos testando também.
Assistir Tár é quase que uma experiência sensorial. Pois ela provoca, instiga e sabe de sua força bruta, dos seus conhecimentos e é segura no que faz, para o bem ou para o mal.
E aí, meu amigo realmente não dá para tomar partidos. Ela é uma bitch? Certamente, mas no mundo dos leões e dos homens, uma mulher lésbica assumir todo esse poder, com certeza, vem carregado de muitos problemas e até traumas que nem precisam ser citados, pois está estampado na sua cara e na sua linguagem corporal.
Eu acho que quem dirigiu esse filme, na verdade, foi a Cate Blanchett, pois ela que coordena tudo, todos os outros são totalmente irrelevantes. Eu estou em êxtase com essa performance. Bravíssimo!
Um Toque de Classe
3.4 12Uma comédia romântica fina e cheia de estilo, mas que infelizmente desliza do meio para o fim caindo em um marasmo, perde o timing do início.
Fora isso, ótima protagonista de Glenda Jackson, vencendo o seu segundo Oscar de atriz aqui. Uma personagem madura, segura de si, a frente do seu tempo, empoderada e toda debochada, adoro.
Os Fabelmans
4.0 389Um encanto de novelão das 18h versão Spielberg.
Agora sério, como a arte tem um papel fundamental na construção social e até educacional da pessoa, né? Sem arte a gente não vive. Sem o lúdico para encarar a realidade.
Gosto dessa linguagem nada inovadora de Spielberg para falar da necessidade da arte, aqui, do cinema, na sua construção enquanto pessoa e futuro profissional e como ela salva de diversas dores que temos ao longo da nossa jornada. Aliado, claro, ao incentivo da família em desenvolver essas habilidades e talentos natos.
Mas não apenas isso, é uma ruptura com o padronizado, um mundo novo que se abre ao leque de opções. Achei eficaz.
Gabriel LeBelle é um talento. Paul Dano na melhor atuação do filme, cheio de complexidades e camadas. Michelle Williams, como sempre ótima, mas já esteve melhor em outras ocasiões e Seth Rogen bastante interessante. E que luxo a participação de David Lynch, hein?
Fora a questão técnica, um deslumbre visual.
Jezebel
3.9 112Seria “Jezebel” o início da personificação de Bette Davis em papeis de mulheres mal amadas, amarguradas, vingativas e debochadas? Se sim, gostei bastante. Um Oscar de melhor atriz justíssimo e bem melhor que a xurumela da sua primeira vitória.
Aqui, o filme sai de um vindouro romance para um drama sobre a vingança de uma mulher de ego ferido que tem como pano de fundo a escravidão (notem que todos são escravocratas convictos e orgulhosos) e da febre amarela que dizimou meio mundo. Todavia, acho que essa parte mais histórica acontece de forma muito ligeira, deveria ter sido mais bem desenvolvida, pois é muito mais interessante que metade do filme.
O bem da verdade mesmo é que o filme foi feito para Bette Davis brilhar e, como uma grande estrela que é, brilhou. Seja usando branco pueril ou o vermelho profano.
Os Banshees de Inisherin
3.9 572 Assista AgoraMartin McDonagh nos entrega mais um bom filme no seu currículo, embora se comparado a “Três Anúncios Para Um Crime” haja uma decaída no roteiro e ritmo, ainda assim, acima da média.
Gosto que o filme dialoga sobre uma amizade verdadeira entre dois homens do início do século XX em plena Guerra Civil. É bem raro de vermos em tela o relacionamento afetivo entre dois homens (sim, amizade é um relacionamento afetivo!). E, para além da questão do afeto, há a questão do legado. Quando morremos, quem lembrará gente? Para Pádraic (Colin Farrell) o legado é a bondade, simpatia, empatia e lealdade aos seus. Para Colm (Brendan Gleeson), o legado é a atemporalidade, isto é, fazer algo que entre para história e ser reconhecido para sempre, assim, ele nunca morrerá.
É um conflito existencial e ético aí. Pois, ao final, o que realmente importa? Fama e atemporalidade ou ser esquecido, mas ter sido amado, amou e cuidou dos seus? Polêmico.
Contudo, acho que mesmo usando do humor sarcástico e refinado, McDonagh peca pelo ritmo arrastado no meio da produção que ganha fôlego somente nos últimos 20 minutos de película.
Acho interessante a atitude drástica de Colm, uma metáfora para o total desapego, o desespero e a urgência em ser enxergado, nem que para isso, se desfaça de uma amizade e... Bem, vocês sabem.
Também há uma prepotência dele em achar o amigo, bronco, burro e de poucos saberes. Aí entra uma outra questão da sabedoria que não é tão somente acadêmica e/ou de absorvidas pelo externo, mas os saberes de vida, não são saberes?
O elenco principal é um primor, McDonagh sabe como poucos da atualidade dirigir atores. Colin Farrell excelente e em estado de graça como seu bronco e de pouco estudo Pádraic. Finalmente Brendan Gleeson está tendo o seu devido reconhecimento fora do eixo Europa. Barry Keoghan é um dos melhores de sua geração, grande ator. Mas, em minha opinião, a melhor performance e quem rouba a cena é Kerry Condon com sua preocupada e angustiada irmã de Pádraic, Siobhán, maravilhosa.
Mulheres Apaixonadas
3.9 32Belíssimo, difícil e intenso filme que se aprofunda nas complexidades dos relacionamentos e amores. Amor pela vida, pelo outro, por si mesmo, amor pelo material, enfim, amores. Gosto da tensão sexual entre os rapazes. Acho que mais do que a bissexualidade claramente envolvida, há ali a questão da necessidade de gostar e ser gostado por alguém, não importa o gênero. Precisamos disso de alguma forma para suprir necessidades, rombos ou o que queriam classificar, no sentido existencial. Algumas pessoas lidam bem com isso outras não. E não sei se está tudo bem por motivos de repressão ao próprio sentimento (e por sentimento não falo somente de amor romântico) por conta das convenções sociais que reprimem sentimentos, desejos, corpos. Eu prefiro acreditar que eles tinham um tórrido romance e as mulheres como convenção social para reprimir mais os desejos.
Grandiosa performance de todos os envolvidos, especialmente Glenda Jackson em seu primeiro e peculiar Oscar de melhor atriz.
No fim, tudo é sobre amor, poder, sexo, cobiça, crise existencial e certa dose de cinismo.
Perigosa
3.8 45Eu pensava que o filme seria um noir clássico e charmoso, caí do cavalo. “Perigosa” não passa de um drama romântico meia boca onde as coisas acontecem muito rápidas e não sobra tempo para desenvolver melhor a trama e a complexidade dos personagens. O plano dela, por exemplo, só começa a acontecer faltando 20 minutos para o filme terminar, um desperdício de história.
Um filme mediano que se sustenta somente pela força cênica e dramática de uma atriz do calibre de Bette Davis. Se mereceu o Oscar de melhor atriz ou não, como ela mesma costumava dizer que era um prêmio de consolação, o fato é que: mesmo em seu pior momento (ou um momento não tão inspirado como outras atuações fodonas dela), ainda assim, ela está melhor que muitas vencedoras ou indicadas na categoria ao longo desses quase 100 anos de Academy Awards.
Shakespeare Apaixonado
3.5 650 Assista AgoraUm romance interessante de assistir, nada de extraordinário e memorável. Não é ruim, longe disso, mas um exagero os Oscar vencidos. Com exceção de figurino, direção de arte e até atriz coadjuvante com a deusa Judi Dench em seus dez minutos de tela.
Se não fosse a campanha pesadíssima de Harvey Weinstein, para não dizer outros termos, o filme talvez passasse despercebido, chegando a um no máximo Globo de Ouro?
E o que falar de vitória de Gwyneth Paltrow? Ótima em cena? Certamente, mas não para vencer um Oscar, mas o histórico de vitória nessa categoria...melhor nem adentrar.
“Shakespeare Apaixonado” é aquele tipo de filme para assistir em um dia chuvoso, sofrendo de amor ou com seu amor do lado, um chocolate, pipoca e nada mais que isso. É sobre amor e paixão fulminantes, daqueles de uma vez na vida, sobre convenções e comportamentos castradores também. Mas, passados trinta minutos, você esquece quase tudo do filme.
Medida Provisória
3.6 432É um filme que causa muito incômodo. Pela distopia que não parece ser tão distante da realidade: o Brasil sofre com o projeto da limpeza social aos fins do século XIX, um fato. Na falta de recursos para enviar os negros de pele retinta, como no filme, o que fazem? Genocídio de sangue negro. O holocausto negro dos escravizados ainda está em vigor, negros no Brasil são os Georges Floyds do cotidiano, não podemos respirar. E a branquitude impera.
Contudo, por mais que o roteiro e a premissa sejam boas, na prática senti algo muito planfetário e muito menos contextualizando ou abusando da complexidade do momento atual do Brasil em paralelo com essa distopia. O grande problema em não explorar a complexidade é justamente isso, parece tudo muito militante para causar. Frases de efeitos, direção de arte óbvia e uma vilania folhetinesca, representada por Adriana Esteves.
O quilombo dos novos tempos foi bem bonito de se ver, mas causou outro desconforto nessa obviedade: a cena do Emicida trocando armas por livros, sério? Isso já não estava explícito nas falas do protagonista Antônio (Alfred Enoch, inclusive, não tão bem em cena como os seus companheiros, comprometeu cenas importantes do filme).
Taís Araújo e Seu Jorge, portanto, carregam o filme nas costas.
Eu, como uma pessoa negra, infelizmente, não consegui me conectar com o filme. Culpa da edição embaraçosa e do querido Lázaro Ramos, penso que na pressa em mostrar um bom serviço em sua estreia na direção, pesou a mão.
No final, é um filme eficaz para quem conseguir compreender o que os corpos negros passam nessa sociedade.
Louca Obsessão
4.1 1,3K Assista AgoraStephen King realmente é o mestre do terror psicológico e sempre é muito difícil adaptá-lo para o cinema. Com exceção de “O Iluminado”, nunca tinha visto uma obra que fazia jus as suas narrativas. “Misery” é o que mais se aproxima de uma excelente adaptação de seus livros.
O terror brutal já começa com a bondade excessiva e a devoção de Anne Wilkers, em uma excelente performance de Kathy Bates. É um terror gradativo até o seu completo surto, a tensão instaurada nesse seu cuidado excessivo é o que deixa tudo mais perturbador, impressos nas expressões de James Caan. O clima gélido e pouco amistoso, a casa isolada, os móveis e sua decoração deixam tudo ainda mais claustrofóbico.
Mas o filme não seria nada se não fosse Kathy Bates, monstruosa em um papel difícil, complexo e que ela tira de letra, como uma excelente atriz que é. Oscar de melhor atriz merecidíssimo.
O enredo ainda fala da importância da arte na vida da pessoa em como ela consegue nos tirar de um momento ruim para descontrair, ir ao lúdico e se desprender da realidade. Todavia, há aquelas pessoas que não sabem lidar com isso e mergulham na mais completa ilusão e se perdem, no sentido literário aqui.
Só não curti o final, embora seja uma adaptação, penso que seria mais crível ela totalmente louca em uma clínica psiquiátrica e ele sempre nesse estado de alerta por ela ainda estar viva.
Os Santos de Kiko
4.0 4Um soft pornô que vai do nada para lugar nenhum e se sustenta somente pelos nudes dos atores. Mas achei interessante essa libertação dela através da arte/nudez.
P!nk: Tudo que Aprendi até Agora
4.2 37 Assista AgoraAh, como eu amo Alecia Beth Moore! E que energia caótica e ao mesmo tempo acolhedora dessa família que está envolvida e unida pelo sucesso da sua matriarca, P!nk.
Confesso que esperava mais dela, dos filhos (como não amar Willow e Jamenson?) e do Carey e das falas dos membros da banda que estão com ela há mais de quinze anos, focou muito nela e é até uma contradição em dar voz para outras pessoas que fizeram essa tour acontecer.
No mais, te amo, mama!
Our Friend
3.8 16Tudo o que se precisa é um lugar de conforto onde menos pensamos existir. E uma grande amizade é um lugar de conforto e acolhedor. Não sabia que o filme é baseado em fatos reais o que o deixa ainda mais interessante. Lógico, têm suas obviedades e um roteiro que escorrega bastante e uma direção correta, mas, ao fim, a mensagem faz todo o sentido.
Céu Azul
3.2 33Um filme fraquíssimo que se embasa única e exclusivamente na atuação de Jessica Lange. Falando nisso, será que aqui que começou a sina da atriz em interpretar mulheres desequilibradas e/ou bêbadas, fora da realidade e com eterna devoção pela aparência e juventude? Só faltaram os cigarros para completar. Achei que ela está bem em cena, mas nada do que ela já vem fazendo, presa esse estereotipo em uma performance nada de extraordinária para vencer um Oscar de melhor atriz.
Gosto do trocadilho do título do filme que se refere às bombas nucleares e como isso é exatamente o que acontece os personagens de Lange e Lee Jones, poderiam se aprofundar mais nessa complexidade, mas foram para o dramalhão pesando a mão. E deu no que deu.