Como o próprio Glauber definiu: Trata-se de um filme delirante, paranóico, visionário, além dos limites do cinema ocidental europeu e norte americano. Trata-se de um filme louco, trata-se de um filme sem pé nem cabeça, trata-se de um filme de adjetivos infinitos.
E o homem falava a verdade Meu texto completo está no insta: @cinemamarginal
O desenrolar típico: quando os personagens descobrem as evidências que solucionam o mistério, fazem o possível pra ir atrás do vilão. Não é o que acontece quando tem um nazi envolvido e a manipulação psicológica por ele realizada impede que outros entendam as evidências e sequer percebam que há um vilão. A Iluminação estilizada não tem o mesmo charme de outros noir, nesse caso lembra mais um Dr. Caligari: é a visão distorcida da realidade que foi enfiada na cabeça da coitada da protagonista.
Tem que ter muita coragem pra usar tantas referências de clássicos e fazer um negócio tão parecido com o padrão recente de terror genérico que depende da burrice dos personagens e de várias conveniências pra andar. Até parece um remake de O Massacre da Serra Elétrica, e por um bom tempo a única tensão construída se baseia nos caminhos que tal filme de 74 elaborou, só os remodelando com um visual mais simples e anulando qualquer tema implícito. Esses dois lados, aquele que segue a lógica dos clássicos e outro que a adapta pra um padrão sem profundidade temática, deixam de parecer limites impostos pelo estúdio ou por um diretor escorado em suas referências a partir do ponto em que a casa de cera finalmente aparece: agora sim, as conveniência meio ridículas que a história necessitava se pagam sobretudo através do visual. As possibilidades do cenário, que por uma parte do filme nem latente chegaram a ficar porque ele não tinha aparecido, são plenamente exploradas.
Antes, na verdade, dava pra perceber que o diretor ainda tentou fazer um negócio diferente, usando a handycam dos personagens e tudo, mas nem se compara ao impacto que a casa de cera permite. Nesse cenário, o ponto mais essencial (os bonecos de cera...são pessoas de verdade, nossa que surpresa!!), que era totalmente previsível, vira um ponto secundário diante da variedade de situações que o diretor tira dele - e, também, aproveitando pontualmente as referências (Slasher como Halloween, e tortune porn como Jogos Mortais) pra criar algo visualmente novo e cada vez mais estimulante. Alguns planos perto do final resumem a essência do filme: um dos plot twists, baseado no contexto extremamente simples que foi colocado pra explicar a existência do cenário, seria tosco em qualquer filme - mas se torna interessante porque o diretor o aproveita pra criar uma metáfora visual super conveniente mas coerente. É o diretor dizendo pra não pensar demais no que levou aquilo a aparecer, pena que esse argumento não sustenta a enrolação que toma parte considerável do filme.
A ótica questionável e de gosto duvidoso com que Lars Von Trier conta suas histórias não tira seus méritos como diretor, mas brincar com o que o público é capaz de digerir e eventualmente ter isso como fim último é uma escolha arriscada. Não que necessariamente esse seja o objetivo dos filmes, mas acaba sendo o efeito mais memorável quando dá certo, como é o caso de Dançando no Escuro. Toda a experimentação com a linguagem, aquele estilo do Dogma, realmente são memoráveis, mas porque funcionam tanto pra destacar sua misantropia. Em Breaking The Waves, os riscos da ótica do diretor ficam evidentes porque tal estilo cru em nada freia as ambiguidades que a história traz, e assim o desconforto gerado vem tanto das situações criadas quanto da falta de uma postura clara do diretor em relação ao que acontece e afeta Bess, a protagonista.
Em outros de seus filmes, as deprimentes e às vezes terríveis situações s que presenciamos parecem absurdas e improváveis em uma visão de mundo normal, mas viram o encaminhamento lógico no universo horrível bem apresentado pelo diretor em que nada nem ninguém conspira a favor das protagonistas, e dá pra sentir fisicamente o processo em que tudo dá errado. Ter assistido alguns de seus filmes fora de ordem pode ter prejudicado minha visão sobre Breaking The Waves, mas, de qualquer modo, esse me parece a apresentação de um estilo inovador que ainda viria a ser aprimorado. Nesse caso, as decisões na história que levam a tentativas de deprimir ou chocar semelhantes são arbitrárias e quase aleatórias, ignorando discussões que por boa parte da longa duração do filme foram desenvolvidas com cuidado, transformando a protagonista só em uma cobaia.
A representação das relações de trabalho através de detalhes (que O Som ao Redor fez de forma quase definitiva) é complementada com o terror, mas cada um parece isolado como se fossem dois filmes diferentes. Quando um desses lados recebe atenção, ela é quase total, e os elementos que deveriam desenvolver ambos simultaneamente ficam dispersos. O suspense tem uma atmosfera própria e a crítica social tem outra diferente, e as metáforas são tão escancaradas que não conseguem misturá-las. A encenação mecânica, em que é óbvio quando cada ator deve aparecer e falar alguma coisa, compromete a sutileza da maioria dos diálogos, mas, já que involuntariamente cada coisa fica em um canto, não compromete os criativos momentos de terror.
Às vezes cineastas se sentem representantes de uma classe a qual não pertencem, e acabam fazendo (sem querer ou não) obras paternalistas. Brasil em Tempo de Cinema, de Jean-Claude Bernardet, que me apresentou essa ideia e acho difícil a partir de então não lembrar dela vendo alguns filmes brasileiros com temas sociais. Bernardet no citado livro se referia à classe média atuante no cinema novo, que faziam filmes para/sobre eles mesmos dizendo que era para/sobre a classe baixa, e por anos não tiveram uma visão crítica dessa sua posição. Caso mais extremo desse distanciamento entre os personagens do filme e seu autor percebo em Santiago, em que o João Moreira Salles é de uma classe infinitamente mais alta. É lógico que isso não impede de jeito nenhum que ele faça um filme maravilhoso (como esse o é, e Central do Brasil, de seu irmão, também), mas vale a discussão sobre até que ponto sua visão sobre questões que não o afetam seria legítima e relevante. Já vi discussão assim sobre Democracia em Vertigem e Bacurau, e poderiam perfeitamente ser feitas sobre vários filmes recentes de qualquer país. Santiago, porém, termina sendo justamente sobre o distanciamento entre o mordomo e o bilionário - e mais: o bilionário artista que, anos antes, quis enquadrar seu personagem segundo uma ideia preconcebida de como ele deveria parecer (Quantos diretores não já fizeram isso?). Anos depois, ele revisita as gravações e novamente sai um filme sobre si mesmo, sobre sua atividade como diretor. Temi que essa autocrítica virasse uma denúncia social paternalista como aquelas que Bernardet criticou, mas isso não acontece: ao deixar como principal tema o próprio diretor independente de quanto tempo Santiago fale sobre si, o diretor não toma as dores dele como se fossem suas É um relato pessoal, e não mais. Há espaço pra criticar a legitimidade desse relato, o caráter do diretor em fazê-lo, a existência de relações como essa e também um sistema baseado nessas relações. Mas, para o bem do cinema, esse documentário não fez nada disso: não assumiu uma importância que poderia ser hipócrita
Vi um vídeo em que sintetizam o trabalho da Claire Denis com uma frase de Chocolat, uma explicação do que é o horizonte: algo que está sempre a vista mas independente do quanto você se aproxime nunca vai alcançar. Às vezes aparentando estar mais distante, às vezes menos, sempre há um limite para o que podemos conhecer das pessoas de seus filmes. Elas tem tal vida própria que tentar entendê-las a fundo, suas intenções, seu caráter, é quase um desrespeito. Nesse filme em específico, a direção parece orientar a desistir disso: a câmera se movimenta mais em função das sensações dos personagens do que de qualquer outra coisa. A própria história por uma parte considerável do filme parece não existir, e acompanhamos a trajetória dos vários personagens sem nenhuma informação, muito menos diálogos. Com esse limite, resta só sentir o que eles sentem. Às vezes isso parece inadequado: os resumir a impulsos dos sentidos, com percursos guiados só por sensações (assim como o filme) sem alguma motivação mais razoável — mas nada impede que sejam só isso.
É engraçado que tenho a mesma impressão com High Life, que poderia ser resumido como sexo no espaço. Pode ser algo a mais? Pode, e lógico que é, mas o jeito que Claire Denis torna todas aquelas situações absolutamente palpáveis é a característica mais incrível, e em Trouble Every Day ela faz algo parecido. Só que, nesse caso, a redução de pessoas a impulsos sexuais ou violentos e ausência de uma caracterização mais elaborada para além desse aspecto é um processo também notável na forma que os personagens se relacionam: Os protagonistas, um casal (na verdade, os dois casais de protagonistas), praticamente não se comunicam, e, quando falam, soa artificial. Se um deles parece confuso em relação a atitudes ambíguas do outro, esse sentimento é o mesmo do espectador porque aquela mesma barreira que existe entre público e personagens, também existe entre os próprios personagens, e a diretora sabe utilizar isso como principal gerador de tensão, e terror eventualmente.
Quando a primeira bizarrice acontece, descobrimos que coisas muito erradas envolvem essas pessoas. Após algumas dicas pontuais e dispersas, nos resta ser atormentados pela insinuação do que pode vir a seguir. Por muito tempo, não passa disso, porque os esclarecimentos são deixados pra depois. E até que eles cheguem, através dessa confusão, da ambiguidade de gestos, do caráter duvidoso de tudo que pode vir a acontecer, há uma antecipação agonizante. Assim como o resto, o suspense também é guiado pelas sensações, até porque diante da citada ausência de comunicação, essa é a única possibilidade de contato e a única forma de atingir alguma proximidade.
Eventualmente, por outro lado, algumas explicações são dadas — em cenas que parecem vindas de outro filme quando comparadas ao resto. Nelas, as características mencionadas acima são interrompidas pra dar lugar a diálogos quase didáticos, e estranhamente filmados de forma tão usual que os deixa deslocados. Mesmo assim, tais momentos de exposição com fins principalmente narrativos continuam ofuscados pelo lado gráfico, sexual, violento, até nas horas em que este está apenas subentendido. E novamente, esse é um processo que se dá através dos personagens: Se os protagonistas tentam algo a mais, se buscam a normalidade e viver um romance padrão independente dos absurdos que ocorram, eles não conseguem. A câmera continua submissa aos seus sentimentos incontroláveis mesmo depois que uma história se delineou mais claramente. Com esse recurso, cria-se uma atmosfera que não depende de propor algo conclusivo (ainda que deixe vários espaços pra interpretações) pra ser imersiva: o terror, o suspense, o sexo e a violência podem não levar a lugar nenhum, mas o importante é que a diretora consegue evitar que isso se torne algo que diminua a experiência.
São muito raros os diretores que dirigem os atores e escrevem tão bem a ponto de representar perfeitamente o jeito que as pessoas falam, e Rohmer é um deles, sendo esse seu maior talento na minha opinião. Talento esse que ainda era pouco apurado nesse filme, e o apelo à narração prova isso.
Todo ano vem o pessoal reclamar que a Academia parou de premiar por mérito e passou a premiar pra satisfazer militância. Quem fala isso deve ser bem desinformado em questão de cinema porque a Academia quase nunca premiou por mérito, e muito menos os melhores filmes de cada ano, e sim os que fazem as melhores campanhas. É só dar uma olhada naquelas listas de maiores filmes da história, entre os 100 não deve ter nem 10 que ganharam o Oscar de melhor filme, e os temas sociais que alguns vencedores recentes tratam não tem nada a ver com isso (Sem falar na ótica com que esses temas sociais são tratados, que às vezes é bem questionável e feita pra satisfazer estadunidense que quer fingir que todo problema é a coisa mais fácil do mundo de resolver, como é o caso de Green Book)
Fiquei meio confuso porque transmite um sentimento de colônia de férias ou comfort movie sei lá sendo que por tratar de pessoas sem casa e trabalho precarizado isso não me parece muito adequado. Visualmente é muito agradável e a trilha é linda, mas é justamente isso que tira o peso das histórias dos personagens: fora algumas cenas bem fortes, várias se limitam a só mostrar como aquelas pessoas vivem e o que fazem, sem se aprofundar no tema principal. E isso não é essencialmente ruim, mas eu particularmente só me senti mais perto do drama quando o filme deixa esse lado social meio raso de lado e ele vira a jornada pessoal da Frances McDormand mesmo, que por acaso está maravilhosa no papel. Tirando a abordagem dos temas (que me pareceu inacabada), sinto que faltou alguma coisa pra tornar as várias situações banais marcantes, coisa que a própria Chloe Zhao fez no primeiro filme dela.
Filmes tão próximos da morte sempre tem um apelo emocional bem específico e até inevitável, e seria impossível não se emocionar com o fim da trajetória do Hector Babenco. Mas ao mesmo tempo é preciso muita sensibilidade da direção pra não fazer algo sensacionalista ou meloso demais. Felizmente, é notável o carinho com que Bárbara Paz trata as imagens de diversas épocas que tem acesso, e o impacto aparentemente inevitável acaba sendo alcançado por caminhos inesperados: em muitos momentos o filme deixa de ser apenas um tributo à obra e ao diretor ou um relato de sua morte e vira uma reflexão quase universal sobre relacionamentos, vida e cinema. Até nos momentos que resgatam a filmografia do Hector Babenco há algo que independe do conhecimento prévio das obras, já que os paralelos traçados entre a vida do diretor e tais cenas, com auxílio do preto e branco, dão todo todo um novo significado a elas, talvez o que maior mérito do documentário. Mas nem sempre é assim, às vezes percebo que a simpatia que tenho pelo o diretor foi a única coisa que evitou que certas cenas de contemplação se tornassem desnecessárias. São os únicos momentos em que a diretora parece sem saber o que fazer das conversas que tem disponível e joga qualquer coisa para preencher as imagens e impressionar simplesmente pela fotografia. E, em um filme que no geral apresenta de forma tão inteligente seus temas, esse tipo de cena quase fetichista fica mais desnecessário ainda.
Não preciso nem citar o resgate do cinema novo na estética e na história, já que esses são os primeiros traços que saltam aos olhos e logo encantam pelo alto nível da homenagem prestada. O mais interessante é que nesse ambiente familiar das obras primas dos anos 60 o diretor introduz questões novas e a referência, que poderia ser uma limitação, na verdade reforça a originalidade que esse filme traz. Talvez longe do calor da hora, feitos os devidos balanços, o diretor conseguiu dar um passo adiante em relação àquelas obras-primas e colocar em questão coisas que na época outros diretores não pensaram em fazer. A metalinguagem, o mergulho na cabeça do protagonista, a narrativa confusa, o anacronismo: tudo aquilo que constantemente desorienta torna a experiência algo muito particular.
Tenta encontrar uma fórmula entre Disney e Studio Ghibli e disso sai um negócio tão padronizado e previsível em todos os sentidos que qualquer envolvimento emocional (essencial nos grandes filmes desses estúdios) é impossível. Padronizado e genérico de uma forma tão tosca que parece querer, pela familiaridade que desperta, disfarçar a pobreza do visual, das piadas, das músicas, de tudo que fica absolutamente insuportável já com 20 minutos de filme. Só me resta pensar que o uso da cultura chinesa, totalmente deslocado nesse estilo sem coesão nenhuma, só serve pra dar algum carisma a um filme que pouco se diferencia de Os Carrinhos e outras cópias baratas da Videobrinquedo. É uma pena, porque dá pra ver que tem boas intenções, mas isso não anula o fracasso.
Comentários sem pretensões, mas acho que se esse filme tivesse saído antes de A Bout de Souffle (Acossado) poderia ser o grande marco da nouvelle vague, ainda que esse movimento não seja tão homogêneo quanto parece. No geral (minha opinião), acho a obra da Agnes desse período muito mais consistente e com muito mais conteúdo que a de Godard, não vejo nada em que ele supere ela a não ser o pioneirismo.
Tem uma cena que mostra patinadoras fazendo acrobacias no gelo. Do nada, vários jogadores de hóquei aparecem e tomam a pista pra eles sem pedir permissão. O contraste entre a agressividade destes e a delicadeza das patinadoras, e também a mudança brusca na cena, resumem o espírito desse filme. Uma história que envolve a música clássica tão sublime, mas de repente torna-se uma agressiva história sobre autoridade e sexualidade que mesmo quando a música é alta ela é a última coisa que chama atenção. Esse espírito não define só a história, mas também é a característica mais marcante da protagonista: uma professora de piano rígida, recatada, de comportamento sutil, e cuja única pessoa que contesta sua autoridade é a mãe. Até que, sem nenhum aviso prévio, com a maior naturalidade do mundo, ela entra em uma locadora de filmes adultos e em uma das cabines cheira o papel usado por outros enquanto assiste cenas de sexo explícito — e a música clássica não para de tocar. Mas, tal como a música, o sexo em si não é o que mais chama atenção nas cenas em que aparece.
Na verdade, tudo que há de explícito no filme sempre é uma insinuação de algo a mais, algo mais difícil de perceber por trás das aparências. As coisas mais evidentes aos sentidos, como a música ou as cenas sexuais, parecem perder seu significado usual quando observadas lado a lado com o principal ponto de interesse: os personagens e seu comportamento. A música clássica toca enquanto a professora de piano está na cabine da locadora, e inclusive as tais cenas explícitas são mostradas: o contraste é tão gritante que ofusca o impacto que poderia vir da música ou do sexo isolados, e assim é revelado um pouco mais da intimidade dessa protagonista tão complexa.
Ela, a professora de piano Erika, na performance genial de Isabelle Huppert, é um enigma — para quem assiste e para os outros personagens. Haneke conduz a narrativa em função dela com tal naturalidade (visualmente, com um tom quase monocromático, e no uso da câmera, geralmente estática, nada parecia indicar que uma história de conflito familiar envolvendo música clássica desembocaria em uma trama de agressivo cunho sexual) que, no começo, assim como as pessoas ao seu redor, passamos a acreditar no que ela aparenta ser. E o diretor vai quebrando essa imagem através de cenas decisivas e repentinas que transformam totalmente o modo de encarar a realidade do filme. Nessas cenas geralmente há algo de chocante, às vezes grotesco e gráfico, algo que traz um apelo sensorial muito forte que mantém quem assiste vidrado — mas nunca é só isso: Haneke dosa o aspecto gráfico pra que sempre o mais chocante seja o comportamento dos personagens naquelas situações, e não as situações em si. Se, como já citado, vemos cenas explícitas na locadora, elas só impactam de alguma forma porque é o absoluto oposto do que era demonstrado pela protagonista até então.
Há várias cenas que tem um efeito similar, e é interessante a partir do ponto em que esse aspecto sexual é revelado, as chocantes viradas de perspectiva dentro desse mesmo aspecto vão tornando a abordagem temática cada vez mais complexa, e sobretudo graças a relação de Erika e seu novo aluno. Mais nuances do tema “sexualidade” vão sendo abordadas à medida em que o relacionamento dos dois evolui, de modo que a impressão gerada por ele vai se revelando outra até ficar irreconhecível em comparação ao que era no começo. Literalmente nada disso seria possível sem a performance de Isabelle Huppert: a oprimida filha que desconta o autoritarismo que é vítima em seus alunos, é outra pessoa quando Walter Klemmer, o novo aluno, chega em sua vida e abala sua realidade, e é outra pessoa quando a tragédia da história é concluída. A princípio a performance de Huppert mantém as insinuações marcantes em outros aspectos do filme e que definem o caráter impenetrável da protagonista: a expressão de suas emoções se dá por uma contração de lábios, um movimento diferente com as mãos, a insinuação de um sorriso quando Klemmer desafia sua autoridade. Quando esses pequenos detalhes que parecem revelar tudo aparecem, alguém toca piano na cena… como se alguém fosse reparar na música: é no detalhe que fica a riqueza do filme. Quando, novamente do nada, Erika e Walter se tocam no banheiro, a imagem da relação sexual (que sem dúvida é bem estruturada pra gerar uma reação sensorial, um incômodo, uma ansiedade nesse caso) importa pouco: porque nesse mesmo instante, a personagem de Huppert acaba de virar outra pessoa, sua autoridade em relação a Walter torna-se outra e o desenrolar da história toma um novo rumo.
Resumindo, esse filme é uma aula de como chocar sem que o choque seja a razão de ser da obra (assim como uma aula de como abordar sexualidade graficamente sem cair no pornográfico como fez Gaspar Noé no miserável Love), muito pelo contrário: é instrumento pra que as nuances temáticas nas relações entre os personagens sejam melhor percebidas.
Pelo bem ou pelo mal, se até hoje Batman vs Superman ainda é muito comentado, isso é porque ele tem algo de especial. Se uma nova versão de Liga da Justiça foi tão pedida ao ponto do estúdio financiar de novo a produção, isso é porque alguma coisa Zack Snyder fez certo — e ele sabe exatamente o que é, e entrega exatamente o que se espera dele. Fato é que o Snydercut acabou se tornando um evento, o que livrou o diretor das limitações que os estúdios sempre impõem aos filmes de herói e permitiu que ele fizesse coisas que normalmente seriam impossíveis, como deixar a história de lado por quase duas horas pra simplesmente impor seu estilo, seu ritmo, e criar o máximo possível de sequências que devem funcionar por si só, sem se prender as convenções do gênero de herói ou dos universos cinematográficos.
Uma das liberdades que o diretor se dá aparece principalmente na primeira hora: ele se escora no fato de que esse filme já foi lançado uma vez e todos os interessados já o assistiram pra optar por não fazer o simples. Ele nem tenta criar suspense em relação a coisas que já vimos acontecer e sabemos que vão acontecer de novo; nem tenta gerar algum efeito a partir dos diálogos mais simples, e filma todos quase do mesmo jeito como se fosse uma novela. O que importa é manter a aura épica que existe sobre o filme, e criar mais momentos que deem solenidade a ele: certas cenas que poderiam se resumir a segundos são alongadas, algumas transformadas em clipes musicais praticamente, outras cenas de batalha são estendidas pra abrir espaço pra mais composições visuais impressionantes e mais momentos grandiosos. Nas próximas horas isso não acontece com menos frequência: a aparição de certos personagens, de certas situações já esperadas, sempre são carregadas com tal ar de importância que o diretor pouco ou nada se importa se essas cenas vão interferir posteriormente no andar da história, ou se tem muita relação com o que veio antes — porque afinal elas devem valer por si só independente se a justificativa pra que esses momentos apareçam faça sentido pro plot principal ou não. É o tipo de cena que deu saudade do cinema, porque certamente seria a hora que o pessoal iria urrar e aplaudir na sala.
A pressa característica da versão anterior absolutamente não existe, muito menos a pretensão de parecer com a Marvel e se afastar o máximo possível do estilo controverso de Batman vs Superman. Aquele estilo colorido, engraçado, que tornava o filme um alívio cômico de duas horas, que rondava a versão anterior inteira e claramente contaminava os personagens mais sombrios, como Batman, Cyborg e o vilão… enfim, esse estilo fica bem mais restrito em meio a enorme duração do filme: ele ainda existe, mas em momentos pontuais. Por outro lado, também não há uma imposição do estilo sombrio de Batman vs Superman. O que acontece é que as quatro horas permitem que os dois estilos apareçam de acordo com os personagens, e na verdade são justamente eles que guiam quase tudo no filme.
Personagens que antes foram atirados na versão anterior simplesmente porque tinham que aparecer, e tiveram suas tramas pessoas ignoradas e desfavorecidas pelo estilo de Joss Whedon, agora tem algum tempo pra significar algo pro filme, pra mostrar suas particularidades sem invadir o tempo de tela do outro (até porque ele é ilimitado no fim das contas). Ainda que Snyder se escore bastante também na relação emocional que já deve existir entre o público e esses personagens clássicos, há espaço pra que eles demonstrem algum carisma, chance que o Cyborg não teve no outro corte, por exemplo; os alívios cômicos com Flash realmente são alívios cômicos porque são pontuais e balanceados em relação ao resto do filme. Nesse sentido, também essas cenas devem funcionar por elas mesmas só que de um jeito diferente: são menos estilizadas, mais simples e permitem passar um tempo com os personagens, sem se preocupar em conectar com o avanço da história ou coisa assim. Não sei se isso é de propósito, mas esse tempo que Snyder dá aos personagens, e o cuidado com que cria cenas especificamente pra eles demonstrarem características nunca antes mostradas nos cinemas e o público vibrar, parece querer desviar o olhar do quão artificiais são muitos dos efeitos especiais, no mal sentido. Em algumas partes chega a ser risível, porque é artificial no pior sentido: de distrair por ser tão mal feito, de tirar a emoção mirada em certas cenas.
A grande virada em relação a tudo isso acontece mais ou menos a partir da segunda hora, quando acontecimentos relevantes especificamente pra história começam a aparecer com mais frequência e o filme se diferencia menos da sua versão anterior. O curioso é que mesmo a história sendo praticamente a mesma, ela agora acaba tendo um impacto bem diferente, porque dessa vez os personagens foram tratados como algo além de instrumentos pra aquela história genérica andar. Se nessa parte (do meio pro final) vemos eles fazerem graça, participarem da ação, usarem seus poderes, entre outras coisas que sempre vemos nos filmes de herói, antes disso pelo menos também vimos vários detalhes que facilmente seriam descartados (sobretudo no que se refere aos personagens introduzidos nesse filme, incluindo os coadjuvantes, e também os que ressurgem. Os veteranos, por outro lado, como Mulher-Maravilha e Batman praticamente não apresentam nada de novo e servem praticamente só pra a ação). Assim, o lado épico, ou engraçado, ou emocionante, que certos momentos trazem, dessa vez não são só insinuação como é na versão de Joss Whedon: a história, na versão de Zack Snyder, tal qual em Batman vs Superman, é simplesmente o instrumento pra que todos esses lados muitos mais relacionados com os personagens do que com qualquer outra coisa, apareçam com grande evidência — e mais, tudo é o instrumento pra que Snyder faça exatamente o que foi chamado pra fazer: fanservice sem limites e sem medo das consequências que poderiam acarretar caso fosse um filme normal, coisa que outro diretor não teria moral pra fazer.
Agora, se todas essas decisões, independente do resultado, são compreensíveis ao perceber os objetivos do diretor, o que não dá pra entender é o formato da tela. Por causa dele, a ação e os momentos épicos ficam menos impressionantes e a aparência de novela dos diálogos fica ainda mais óbvia. Nesse caso, parece querer, mais do que em qualquer outro aspecto, forçar a solenidade que Snyder tanto quer pra tornar seu filme único. As cenas finais são outro exemplo, talvez o melhor, de quando isso passa dos limites: ele obviamente se aproveita de que essa é sua última chance e joga tudo pra galera sem precisar pensar em como aproveitar aquilo no futuro. O Coringa vai voltar? Qual o significado do sonho? O que vai acontecer com Darkseid?
No fim das contas, já era, não tem a menor importância, e o corte de Snyder é isso aí. O homem só aproveitou sua (provável) última oportunidade na DC pra ser feliz e fazer o que sabe fazer, sem a menor preocupação em cativar quem não gosta dele.
Não sei se mais por mérito de Stephen King ou de John Carpenter, visto que esse é seu trabalho menos competente na direção até então, mas fato é que o diretor segue talentoso em tirar o melhor resultado das premissas mais simples, e por vezes das mais idiotas, como é o caso. Já no começo, logo que o lado homicida do carro, os protagonistas imaturos e seus dramas adolescentes, o subtexto sexual, enfim, quando tudo isso é apresentado, as expectativas baixam imensamente. Um filme B em essência e pra piorar com quase duas horas: uma tragédia anunciada. E esta só não se concretizou porque haviam dois mestres tratando dessa história. De fato, Carpenter não entrega sua melhor direção nem seu melhor terror, mas ainda assim demonstra perfeita consciência do material com o qual está lidando, e mais importante, das expectativas seriam criadas em relação a ele. A partir de uma premissa tão boba, personagens tão genéricos e viradas na história previsíveis desde o primeiro ato, seria difícil surpreender positivamente e criar alguma tensão convincente que escapasse da comédia involuntária.
O grande acerto é justamente que esse lado infantil inerente não é negado, todos os desenlaces mais óbvios realmente se concretizam, mas nem por isso o diretor deixa de encontrar caminhos pelas beiradas das expectativas e bolar pequenos detalhes que aos poucos vão se provando como as surpresas que possibilitam a imersão nesse universo. Essencial pra isso é como Carpenter sabe lidar com a inocência por trás de suas histórias. Em comum entre Halloween e The Fog está o fato de que esses filmes partem de medos infantis, de ideias sem explicação e afastadas da realidade, mas que acabam sendo fáceis de empatizar porque o diretor não nega essa característica, e dá consistência àquelas ideias através de uma encenação muito cuidadosa— se, claro, o público aceitar essa falta de explicação. Com Christine - O Carro Assassino é desse mesmo jeito: seu lado bobo e previsível é escancarado logo de cara pra em seguida ser levado às últimas consequências. Seja com o carro conversando através das músicas no rádio, perseguindo por conta própria quem ofendeu seu dono, passando por obstáculos e entrando em espaços que um carro normal sem a força do ódio nunca conseguiria. Enfim, são possibilidades que parecem bestas mas olhando com atenção percebe-se que são de uma criatividade notável, e são mostradas nos momentos exatos, e com certo cuidado técnico, pra gerar determinadas reações que a princípio (pelas expectativas anteriores) seriam inimagináveis.
Entre todas as possiblidades, sem dúvida a mais impressionante se refere às emoções de Christine. Porque, afinal, é um objeto inanimado, sem rosto e sem voz, mas o diretor de alguma forma sobrenatural faz com que o público compreenda perfeitamente quais emoções ela está sentindo. E sem apelação: o recurso do rádio, que poderia ser usado à exaustão pra transmitir o que as imagens não conseguem, é usado apenas em momentos pontuais, nos quais o contraste entre o instrumental da música e o significado que sua letra adquire naquelas situações específicas só reforça a tensão (ou provoca humor em outras cenas… o final é o melhor exemplo). Em outras vezes, nem o rádio é usado: apenas pela posição da câmera e pela antecipação criada percebe-se as intenções de Christine. Parece idiota analisar as emoções do carro, e lendo assim o filme como um todo pode parecer mais idiota ainda… e de certa forma, é mesmo, só que é nessas horas que um diretor talentoso faz a diferença. Se quem assiste não fica de má vontade, acredito que seja fácil perceber como John Carpenter transforma uma possível bomba em uma grata surpresa.
É uma lógica de pesadelo, não tinha notado antes como são as crianças que deixam isso claro (mencionando o bicho papão o tempo todo): não tem nenhuma explicação por trás, é só o Michael Myers, que obviamente é imortal, perseguindo uma galera...
Uma coisa que sempre me encantou nos filmes dos anos 20 de Eisenstein é que mesmo tendo uma montagem muito dinâmica na maior parte do tempo, com um ritmo de deixar quem assiste sem ar, o diretor tinha plena noção de quando deveria dosar mais os cortes. Todos aqueles cortes rápidos não eram só pra fazer experimentos de montagem por fazer ou pra apresentar uma nova técnica, mas eles estavam ali porque (e quando) a cena pedia. Consequentemente, em momentos mais contemplativos em meio a toda àquela confusão, em que fazia muito mais sentido ter outro ritmo, Eisenstein de fato dava um tempo pro público respirar, e a impressão deixada pela maior duração dos planos era muito forte.
E imagine então que não foi nenhuma surpresa ver como essa qualidade de saber adaptar seu estilo pra cada situação ficou explícito em Ivan O Terrível. E faz todo sentido, já que seus objetivos são bem diferentes daqueles dos anos 20. Coisas que antes não apareciam em seus filmes de propaganda, como um roteiro mais elaborado, desenvolvimento de personagens específicos, dessa vez surgem com grande destaque. Acaba sendo uma narrativa clássica de diversas maneiras, de personagens, temas, motivações que já vimos tantas vezes. Ivan com sua megalomania, seus inimigos políticos também buscando o poder, traição, vingança, nada de novo. Mas o grande diferencial é que Eisenstein enfatiza de todos os jeitos a grandeza e o poder do protagonista, e com um grande cuidado consegue fazer o público sentir a escala do que aparece em tela. E não só nos diálogos: tudo no filme reforça que essa grandeza existe. São frequentes os planos em que Ivan ocupa toda a tela, e os mais impressionantes são justamente aqueles em que ele próprio é só um detalhe, mas sua sombra ocupa todo o resto. Ou quando seu rosto está em foco e as várias e várias pessoas atrás dele praticamente não representam nada. Até as roupas, conforme as ambições de Ivan crescem, progressivamente vão fortalecendo sua presença e o destacando entre as pequenas pessoas ao seu redor.
Mas essa característica também é bem dosada: há momentos em que a fragilidade de Ivan é notável, colocam em dúvida se seu poder é instável e sua megalomania algo sem fundamento. Reflexões pontuais, que ficam abertas ao público por um breve momento até que logo o personagem toma de novo o controle da situação, e o curso dos acontecimentos volta ao seu domínio e a cena reconstitui a mística em torno dele. E é muito interessante como tanta coisa tem um lado exagerado (personagens, atuações, cenários, iluminação), mas o filme não chega ao ponto de ser caricatural. Aliás, chega a ser, mas é como se o filme só não assumisse esse lado de forma explícita porque se desenrola em função dos personagens, principalmente Ivan, e é exatamente ele, com suas ambições e mania de grandeza, que nunca assumiria algo que colocasse seu poder em questão. Por isso o filme segue nesse exagero bem calculado, que sem dúvida impressiona por seus cenários majestosos, grande número de pessoas em tela, trilha sonora épica, e principalmente pela enorme presença do protagonista, mas se olharmos a fundo vemos que tem algo de ilusório, algo de crítica política e talvez ironia, por trás de todo o exagero.
Tenet é um filme muito mais aberto a qualquer possibilidade de compreensão do que o normal. Nolan quer ironizar seus próprios vícios ou ele realmente espera que o público pense a fundo sobre cada diálogo, cada explicação e cada conceito? Não dá pra saber, porque não há indícios suficientes pra nada disso. Em um momento uma personagem diz “não tente entender, sinta”, mas em quase todos os intervalos entre uma cena de ação maravilhosa e outra há longas explicações sobre todos os conceitos que o diretor aparentemente tanto tentou aprofundar. Aquela frase então não passou de uma frase de efeito, como diversas outras durante o filme? Ou ela propositalmente insinua que metade do tempo de tela do filme é pura chacota?
Só pode ser, porque não é possível que um vilão seja involuntariamente ridículo assim, e que seus monólogos foram escritos sem um propósito cômico; não é possível que esses atores foram orientados a praticamente ler em voz alta suas falas ao invés de atuar… Pelo contrário: é totalmente possível, porque, por outro lado, muita coisa no filme parece indicar que é. O cuidado técnico da obra em nada se diferencia de qualquer trabalho anterior do Nolan, assim como suas tentativas furadas de transmitir a tristeza de algumas situações; a seriedade na história e na forma como os temas são elaborados, e a atenção dedicada aos dramas individuais de alguns personagens, passam longe da ironia. Se tantas vícios e atributos de Nolan como diretor permanecem iguais, por que exclusivamente nesse sua proposta não seria “séria”? Eu particularmente imagino Lars Von Trier fazendo uma paródia de si mesmo dessa forma (como o fez em A Casa Que Jack Construiu), mas Nolan, não… ou ao menos ele não se preocupou em deixar nada explícito em relação a suas intenções. E não há nada de errado em relação a isso, até chega a ser uma trapaça: você assiste do jeito que quer, ignora o que quer, leva a sério o que quer, e dependendo da sua boa vontade aproveita ou não a experiência. No meu caso, consegui ignorar em parte o que é (ao meu ver) involuntariamente ridículo porque quando o filme vai além disso o que surge é ação de qualidade incontestável.
Isso, também, é o diretor se repetindo: se o que ele já fazia mal dessa vez fez pior, o que ele fazia bem apenas repetiu pra criar uma experiência grandiosa, com momentos tão empolgantes que valem por si só. Todas as ideias que o filme propõe só se justificam porque seu uso nas cenas de ação é perfeito. O que os diálogos tanto desenvolvem, só se concretiza nessas cenas, e da forma mais impressionante possível. Durante a ação, o espetáculo técnico de Nolan e seus efeitos mirabolantes conseguem dar toda a grandiosidade e intensidade que as cenas precisam.
E o que salva o filme é que pouco importa a motivação na história que levou a ação a aparecer, porque quando ela aparece, empolga e contagia independente de qualquer coisa (e funcionaria melhor ainda se não houvessem os vícios típicos do diretor pra atrapalhar). Desde a introdução frenética até quando os efeitos mais elaborados são usados, as sequências de ação mais parecem ótimos videoclipes (principalmente pelo ótimo aproveitamento da música) interrompidos pelo longo desenvolvimento de uma história que melhor seria se fosse desprezada.
A Idade da Terra
3.6 52 Assista AgoraComo o próprio Glauber definiu:
Trata-se de um filme delirante, paranóico, visionário, além dos limites do cinema ocidental europeu e norte americano. Trata-se de um filme louco, trata-se de um filme sem pé nem cabeça, trata-se de um filme de adjetivos infinitos.
E o homem falava a verdade
Meu texto completo está no insta: @cinemamarginal
O Estranho
3.8 122 Assista AgoraO desenrolar típico: quando os personagens descobrem as evidências que solucionam o mistério, fazem o possível pra ir atrás do vilão. Não é o que acontece quando tem um nazi envolvido e a manipulação psicológica por ele realizada impede que outros entendam as evidências e sequer percebam que há um vilão. A Iluminação estilizada não tem o mesmo charme de outros noir, nesse caso lembra mais um Dr. Caligari: é a visão distorcida da realidade que foi enfiada na cabeça da coitada da protagonista.
A Casa de Cera
3.1 2,1K Assista AgoraTem que ter muita coragem pra usar tantas referências de clássicos e fazer um negócio tão parecido com o padrão recente de terror genérico que depende da burrice dos personagens e de várias conveniências pra andar. Até parece um remake de O Massacre da Serra Elétrica, e por um bom tempo a única tensão construída se baseia nos caminhos que tal filme de 74 elaborou, só os remodelando com um visual mais simples e anulando qualquer tema implícito.
Esses dois lados, aquele que segue a lógica dos clássicos e outro que a adapta pra um padrão sem profundidade temática, deixam de parecer limites impostos pelo estúdio ou por um diretor escorado em suas referências a partir do ponto em que a casa de cera finalmente aparece: agora sim, as conveniência meio ridículas que a história necessitava se pagam sobretudo através do visual. As possibilidades do cenário, que por uma parte do filme nem latente chegaram a ficar porque ele não tinha aparecido, são plenamente exploradas.
Antes, na verdade, dava pra perceber que o diretor ainda tentou fazer um negócio diferente, usando a handycam dos personagens e tudo, mas nem se compara ao impacto que a casa de cera permite. Nesse cenário, o ponto mais essencial (os bonecos de cera...são pessoas de verdade, nossa que surpresa!!), que era totalmente previsível, vira um ponto secundário diante da variedade de situações que o diretor tira dele - e, também, aproveitando pontualmente as referências (Slasher como Halloween, e tortune porn como Jogos Mortais) pra criar algo visualmente novo e cada vez mais estimulante.
Alguns planos perto do final resumem a essência do filme: um dos plot twists, baseado no contexto extremamente simples que foi colocado pra explicar a existência do cenário, seria tosco em qualquer filme - mas se torna interessante porque o diretor o aproveita pra criar uma metáfora visual super conveniente mas coerente. É o diretor dizendo pra não pensar demais no que levou aquilo a aparecer, pena que esse argumento não sustenta a enrolação que toma parte considerável do filme.
Ondas do Destino
4.2 335 Assista AgoraA ótica questionável e de gosto duvidoso com que Lars Von Trier conta suas histórias não tira seus méritos como diretor, mas brincar com o que o público é capaz de digerir e eventualmente ter isso como fim último é uma escolha arriscada. Não que necessariamente esse seja o objetivo dos filmes, mas acaba sendo o efeito mais memorável quando dá certo, como é o caso de Dançando no Escuro. Toda a experimentação com a linguagem, aquele estilo do Dogma, realmente são memoráveis, mas porque funcionam tanto pra destacar sua misantropia. Em Breaking The Waves, os riscos da ótica do diretor ficam evidentes porque tal estilo cru em nada freia as ambiguidades que a história traz, e assim o desconforto gerado vem tanto das situações criadas quanto da falta de uma postura clara do diretor em relação ao que acontece e afeta Bess, a protagonista.
Em outros de seus filmes, as deprimentes e às vezes terríveis situações s que presenciamos parecem absurdas e improváveis em uma visão de mundo normal, mas viram o encaminhamento lógico no universo horrível bem apresentado pelo diretor em que nada nem ninguém conspira a favor das protagonistas, e dá pra sentir fisicamente o processo em que tudo dá errado. Ter assistido alguns de seus filmes fora de ordem pode ter prejudicado minha visão sobre Breaking The Waves, mas, de qualquer modo, esse me parece a apresentação de um estilo inovador que ainda viria a ser aprimorado. Nesse caso, as decisões na história que levam a tentativas de deprimir ou chocar semelhantes são arbitrárias e quase aleatórias, ignorando discussões que por boa parte da longa duração do filme foram desenvolvidas com cuidado, transformando a protagonista só em uma cobaia.
Texto completo em: medium.com/@almirbasilio/a-ambiguidade-tosca-de-breaking-the-waves-1996-de-lars-von-trier-87b51df2e942
Trabalhar Cansa
3.6 209A representação das relações de trabalho através de detalhes (que O Som ao Redor fez de forma quase definitiva) é complementada com o terror, mas cada um parece isolado como se fossem dois filmes diferentes. Quando um desses lados recebe atenção, ela é quase total, e os elementos que deveriam desenvolver ambos simultaneamente ficam dispersos. O suspense tem uma atmosfera própria e a crítica social tem outra diferente, e as metáforas são tão escancaradas que não conseguem misturá-las. A encenação mecânica, em que é óbvio quando cada ator deve aparecer e falar alguma coisa, compromete a sutileza da maioria dos diálogos, mas, já que involuntariamente cada coisa fica em um canto, não compromete os criativos momentos de terror.
Santiago
4.1 134Às vezes cineastas se sentem representantes de uma classe a qual não pertencem, e acabam fazendo (sem querer ou não) obras paternalistas. Brasil em Tempo de Cinema, de Jean-Claude Bernardet, que me apresentou essa ideia e acho difícil a partir de então não lembrar dela vendo alguns filmes brasileiros com temas sociais. Bernardet no citado livro se referia à classe média atuante no cinema novo, que faziam filmes para/sobre eles mesmos dizendo que era para/sobre a classe baixa, e por anos não tiveram uma visão crítica dessa sua posição.
Caso mais extremo desse distanciamento entre os personagens do filme e seu autor percebo em Santiago, em que o João Moreira Salles é de uma classe infinitamente mais alta. É lógico que isso não impede de jeito nenhum que ele faça um filme maravilhoso (como esse o é, e Central do Brasil, de seu irmão, também), mas vale a discussão sobre até que ponto sua visão sobre questões que não o afetam seria legítima e relevante. Já vi discussão assim sobre Democracia em Vertigem e Bacurau, e poderiam perfeitamente ser feitas sobre vários filmes recentes de qualquer país. Santiago, porém, termina sendo justamente sobre o distanciamento entre o mordomo e o bilionário - e mais: o bilionário artista que, anos antes, quis enquadrar seu personagem segundo uma ideia preconcebida de como ele deveria parecer (Quantos diretores não já fizeram isso?). Anos depois, ele revisita as gravações e novamente sai um filme sobre si mesmo, sobre sua atividade como diretor.
Temi que essa autocrítica virasse uma denúncia social paternalista como aquelas que Bernardet criticou, mas isso não acontece: ao deixar como principal tema o próprio diretor independente de quanto tempo Santiago fale sobre si, o diretor não toma as dores dele como se fossem suas É um relato pessoal, e não mais. Há espaço pra criticar a legitimidade desse relato, o caráter do diretor em fazê-lo, a existência de relações como essa e também um sistema baseado nessas relações. Mas, para o bem do cinema, esse documentário não fez nada disso: não assumiu uma importância que poderia ser hipócrita
Desejo e Obsessão
3.3 73Vi um vídeo em que sintetizam o trabalho da Claire Denis com uma frase de Chocolat, uma explicação do que é o horizonte: algo que está sempre a vista mas independente do quanto você se aproxime nunca vai alcançar. Às vezes aparentando estar mais distante, às vezes menos, sempre há um limite para o que podemos conhecer das pessoas de seus filmes. Elas tem tal vida própria que tentar entendê-las a fundo, suas intenções, seu caráter, é quase um desrespeito. Nesse filme em específico, a direção parece orientar a desistir disso: a câmera se movimenta mais em função das sensações dos personagens do que de qualquer outra coisa. A própria história por uma parte considerável do filme parece não existir, e acompanhamos a trajetória dos vários personagens sem nenhuma informação, muito menos diálogos. Com esse limite, resta só sentir o que eles sentem. Às vezes isso parece inadequado: os resumir a impulsos dos sentidos, com percursos guiados só por sensações (assim como o filme) sem alguma motivação mais razoável — mas nada impede que sejam só isso.
É engraçado que tenho a mesma impressão com High Life, que poderia ser resumido como sexo no espaço. Pode ser algo a mais? Pode, e lógico que é, mas o jeito que Claire Denis torna todas aquelas situações absolutamente palpáveis é a característica mais incrível, e em Trouble Every Day ela faz algo parecido. Só que, nesse caso, a redução de pessoas a impulsos sexuais ou violentos e ausência de uma caracterização mais elaborada para além desse aspecto é um processo também notável na forma que os personagens se relacionam: Os protagonistas, um casal (na verdade, os dois casais de protagonistas), praticamente não se comunicam, e, quando falam, soa artificial. Se um deles parece confuso em relação a atitudes ambíguas do outro, esse sentimento é o mesmo do espectador porque aquela mesma barreira que existe entre público e personagens, também existe entre os próprios personagens, e a diretora sabe utilizar isso como principal gerador de tensão, e terror eventualmente.
Quando a primeira bizarrice acontece, descobrimos que coisas muito erradas envolvem essas pessoas. Após algumas dicas pontuais e dispersas, nos resta ser atormentados pela insinuação do que pode vir a seguir. Por muito tempo, não passa disso, porque os esclarecimentos são deixados pra depois. E até que eles cheguem, através dessa confusão, da ambiguidade de gestos, do caráter duvidoso de tudo que pode vir a acontecer, há uma antecipação agonizante. Assim como o resto, o suspense também é guiado pelas sensações, até porque diante da citada ausência de comunicação, essa é a única possibilidade de contato e a única forma de atingir alguma proximidade.
Eventualmente, por outro lado, algumas explicações são dadas — em cenas que parecem vindas de outro filme quando comparadas ao resto. Nelas, as características mencionadas acima são interrompidas pra dar lugar a diálogos quase didáticos, e estranhamente filmados de forma tão usual que os deixa deslocados. Mesmo assim, tais momentos de exposição com fins principalmente narrativos continuam ofuscados pelo lado gráfico, sexual, violento, até nas horas em que este está apenas subentendido. E novamente, esse é um processo que se dá através dos personagens: Se os protagonistas tentam algo a mais, se buscam a normalidade e viver um romance padrão independente dos absurdos que ocorram, eles não conseguem. A câmera continua submissa aos seus sentimentos incontroláveis mesmo depois que uma história se delineou mais claramente. Com esse recurso, cria-se uma atmosfera que não depende de propor algo conclusivo (ainda que deixe vários espaços pra interpretações) pra ser imersiva: o terror, o suspense, o sexo e a violência podem não levar a lugar nenhum, mas o importante é que a diretora consegue evitar que isso se torne algo que diminua a experiência.
A Carreira de Suzanne
3.7 15 Assista AgoraSão muito raros os diretores que dirigem os atores e escrevem tão bem a ponto de representar perfeitamente o jeito que as pessoas falam, e Rohmer é um deles, sendo esse seu maior talento na minha opinião. Talento esse que ainda era pouco apurado nesse filme, e o apelo à narração prova isso.
Nomadland
3.9 896Todo ano vem o pessoal reclamar que a Academia parou de premiar por mérito e passou a premiar pra satisfazer militância. Quem fala isso deve ser bem desinformado em questão de cinema porque a Academia quase nunca premiou por mérito, e muito menos os melhores filmes de cada ano, e sim os que fazem as melhores campanhas.
É só dar uma olhada naquelas listas de maiores filmes da história, entre os 100 não deve ter nem 10 que ganharam o Oscar de melhor filme, e os temas sociais que alguns vencedores recentes tratam não tem nada a ver com isso (Sem falar na ótica com que esses temas sociais são tratados, que às vezes é bem questionável e feita pra satisfazer estadunidense que quer fingir que todo problema é a coisa mais fácil do mundo de resolver, como é o caso de Green Book)
Nomadland
3.9 896Fiquei meio confuso porque transmite um sentimento de colônia de férias ou comfort movie sei lá sendo que por tratar de pessoas sem casa e trabalho precarizado isso não me parece muito adequado. Visualmente é muito agradável e a trilha é linda, mas é justamente isso que tira o peso das histórias dos personagens: fora algumas cenas bem fortes, várias se limitam a só mostrar como aquelas pessoas vivem e o que fazem, sem se aprofundar no tema principal.
E isso não é essencialmente ruim, mas eu particularmente só me senti mais perto do drama quando o filme deixa esse lado social meio raso de lado e ele vira a jornada pessoal da Frances McDormand mesmo, que por acaso está maravilhosa no papel.
Tirando a abordagem dos temas (que me pareceu inacabada), sinto que faltou alguma coisa pra tornar as várias situações banais marcantes, coisa que a própria Chloe Zhao fez no primeiro filme dela.
Babenco: Alguém Tem que Ouvir o Coração e Dizer Parou
4.0 64Filmes tão próximos da morte sempre tem um apelo emocional bem específico e até inevitável, e seria impossível não se emocionar com o fim da trajetória do Hector Babenco. Mas ao mesmo tempo é preciso muita sensibilidade da direção pra não fazer algo sensacionalista ou meloso demais. Felizmente, é notável o carinho com que Bárbara Paz trata as imagens de diversas épocas que tem acesso, e o impacto aparentemente inevitável acaba sendo alcançado por caminhos inesperados: em muitos momentos o filme deixa de ser apenas um tributo à obra e ao diretor ou um relato de sua morte e vira uma reflexão quase universal sobre relacionamentos, vida e cinema. Até nos momentos que resgatam a filmografia do Hector Babenco há algo que independe do conhecimento prévio das obras, já que os paralelos traçados entre a vida do diretor e tais cenas, com auxílio do preto e branco, dão todo todo um novo significado a elas, talvez o que maior mérito do documentário.
Mas nem sempre é assim, às vezes percebo que a simpatia que tenho pelo o diretor foi a única coisa que evitou que certas cenas de contemplação se tornassem desnecessárias. São os únicos momentos em que a diretora parece sem saber o que fazer das conversas que tem disponível e joga qualquer coisa para preencher as imagens e impressionar simplesmente pela fotografia. E, em um filme que no geral apresenta de forma tão inteligente seus temas, esse tipo de cena quase fetichista fica mais desnecessário ainda.
Sertânia
3.8 27Não preciso nem citar o resgate do cinema novo na estética e na história, já que esses são os primeiros traços que saltam aos olhos e logo encantam pelo alto nível da homenagem prestada. O mais interessante é que nesse ambiente familiar das obras primas dos anos 60 o diretor introduz questões novas e a referência, que poderia ser uma limitação, na verdade reforça a originalidade que esse filme traz. Talvez longe do calor da hora, feitos os devidos balanços, o diretor conseguiu dar um passo adiante em relação àquelas obras-primas e colocar em questão coisas que na época outros diretores não pensaram em fazer. A metalinguagem, o mergulho na cabeça do protagonista, a narrativa confusa, o anacronismo: tudo aquilo que constantemente desorienta torna a experiência algo muito particular.
A Caminho da Lua
3.4 279Tenta encontrar uma fórmula entre Disney e Studio Ghibli e disso sai um negócio tão padronizado e previsível em todos os sentidos que qualquer envolvimento emocional (essencial nos grandes filmes desses estúdios) é impossível. Padronizado e genérico de uma forma tão tosca que parece querer, pela familiaridade que desperta, disfarçar a pobreza do visual, das piadas, das músicas, de tudo que fica absolutamente insuportável já com 20 minutos de filme. Só me resta pensar que o uso da cultura chinesa, totalmente deslocado nesse estilo sem coesão nenhuma, só serve pra dar algum carisma a um filme que pouco se diferencia de Os Carrinhos e outras cópias baratas da Videobrinquedo.
É uma pena, porque dá pra ver que tem boas intenções, mas isso não anula o fracasso.
Professor Polvo
4.2 387Tão meloso que fui lavar as mãos quando terminei de assistir
Cléo das 5 às 7
4.2 200 Assista AgoraComentários sem pretensões, mas acho que se esse filme tivesse saído antes de A Bout de Souffle (Acossado) poderia ser o grande marco da nouvelle vague, ainda que esse movimento não seja tão homogêneo quanto parece.
No geral (minha opinião), acho a obra da Agnes desse período muito mais consistente e com muito mais conteúdo que a de Godard, não vejo nada em que ele supere ela a não ser o pioneirismo.
O Ano Passado em Marienbad
4.2 156 Assista Agorafalam tanto de como David Lynch capta a essência dos sonhos mas deviam falar mais de como Alain Resnais capta a essência da memória
A Professora de Piano
4.0 685 Assista AgoraTem uma cena que mostra patinadoras fazendo acrobacias no gelo. Do nada, vários jogadores de hóquei aparecem e tomam a pista pra eles sem pedir permissão. O contraste entre a agressividade destes e a delicadeza das patinadoras, e também a mudança brusca na cena, resumem o espírito desse filme. Uma história que envolve a música clássica tão sublime, mas de repente torna-se uma agressiva história sobre autoridade e sexualidade que mesmo quando a música é alta ela é a última coisa que chama atenção. Esse espírito não define só a história, mas também é a característica mais marcante da protagonista: uma professora de piano rígida, recatada, de comportamento sutil, e cuja única pessoa que contesta sua autoridade é a mãe. Até que, sem nenhum aviso prévio, com a maior naturalidade do mundo, ela entra em uma locadora de filmes adultos e em uma das cabines cheira o papel usado por outros enquanto assiste cenas de sexo explícito — e a música clássica não para de tocar. Mas, tal como a música, o sexo em si não é o que mais chama atenção nas cenas em que aparece.
Na verdade, tudo que há de explícito no filme sempre é uma insinuação de algo a mais, algo mais difícil de perceber por trás das aparências. As coisas mais evidentes aos sentidos, como a música ou as cenas sexuais, parecem perder seu significado usual quando observadas lado a lado com o principal ponto de interesse: os personagens e seu comportamento. A música clássica toca enquanto a professora de piano está na cabine da locadora, e inclusive as tais cenas explícitas são mostradas: o contraste é tão gritante que ofusca o impacto que poderia vir da música ou do sexo isolados, e assim é revelado um pouco mais da intimidade dessa protagonista tão complexa.
Ela, a professora de piano Erika, na performance genial de Isabelle Huppert, é um enigma — para quem assiste e para os outros personagens. Haneke conduz a narrativa em função dela com tal naturalidade (visualmente, com um tom quase monocromático, e no uso da câmera, geralmente estática, nada parecia indicar que uma história de conflito familiar envolvendo música clássica desembocaria em uma trama de agressivo cunho sexual) que, no começo, assim como as pessoas ao seu redor, passamos a acreditar no que ela aparenta ser. E o diretor vai quebrando essa imagem através de cenas decisivas e repentinas que transformam totalmente o modo de encarar a realidade do filme. Nessas cenas geralmente há algo de chocante, às vezes grotesco e gráfico, algo que traz um apelo sensorial muito forte que mantém quem assiste vidrado — mas nunca é só isso: Haneke dosa o aspecto gráfico pra que sempre o mais chocante seja o comportamento dos personagens naquelas situações, e não as situações em si. Se, como já citado, vemos cenas explícitas na locadora, elas só impactam de alguma forma porque é o absoluto oposto do que era demonstrado pela protagonista até então.
Há várias cenas que tem um efeito similar, e é interessante a partir do ponto em que esse aspecto sexual é revelado, as chocantes viradas de perspectiva dentro desse mesmo aspecto vão tornando a abordagem temática cada vez mais complexa, e sobretudo graças a relação de Erika e seu novo aluno. Mais nuances do tema “sexualidade” vão sendo abordadas à medida em que o relacionamento dos dois evolui, de modo que a impressão gerada por ele vai se revelando outra até ficar irreconhecível em comparação ao que era no começo. Literalmente nada disso seria possível sem a performance de Isabelle Huppert: a oprimida filha que desconta o autoritarismo que é vítima em seus alunos, é outra pessoa quando Walter Klemmer, o novo aluno, chega em sua vida e abala sua realidade, e é outra pessoa quando a tragédia da história é concluída. A princípio a performance de Huppert mantém as insinuações marcantes em outros aspectos do filme e que definem o caráter impenetrável da protagonista: a expressão de suas emoções se dá por uma contração de lábios, um movimento diferente com as mãos, a insinuação de um sorriso quando Klemmer desafia sua autoridade. Quando esses pequenos detalhes que parecem revelar tudo aparecem, alguém toca piano na cena… como se alguém fosse reparar na música: é no detalhe que fica a riqueza do filme. Quando, novamente do nada, Erika e Walter se tocam no banheiro, a imagem da relação sexual (que sem dúvida é bem estruturada pra gerar uma reação sensorial, um incômodo, uma ansiedade nesse caso) importa pouco: porque nesse mesmo instante, a personagem de Huppert acaba de virar outra pessoa, sua autoridade em relação a Walter torna-se outra e o desenrolar da história toma um novo rumo.
Resumindo, esse filme é uma aula de como chocar sem que o choque seja a razão de ser da obra (assim como uma aula de como abordar sexualidade graficamente sem cair no pornográfico como fez Gaspar Noé no miserável Love), muito pelo contrário: é instrumento pra que as nuances temáticas nas relações entre os personagens sejam melhor percebidas.
Liga da Justiça de Zack Snyder
4.0 1,3KPelo bem ou pelo mal, se até hoje Batman vs Superman ainda é muito comentado, isso é porque ele tem algo de especial. Se uma nova versão de Liga da Justiça foi tão pedida ao ponto do estúdio financiar de novo a produção, isso é porque alguma coisa Zack Snyder fez certo — e ele sabe exatamente o que é, e entrega exatamente o que se espera dele.
Fato é que o Snydercut acabou se tornando um evento, o que livrou o diretor das limitações que os estúdios sempre impõem aos filmes de herói e permitiu que ele fizesse coisas que normalmente seriam impossíveis, como deixar a história de lado por quase duas horas pra simplesmente impor seu estilo, seu ritmo, e criar o máximo possível de sequências que devem funcionar por si só, sem se prender as convenções do gênero de herói ou dos universos cinematográficos.
Uma das liberdades que o diretor se dá aparece principalmente na primeira hora: ele se escora no fato de que esse filme já foi lançado uma vez e todos os interessados já o assistiram pra optar por não fazer o simples. Ele nem tenta criar suspense em relação a coisas que já vimos acontecer e sabemos que vão acontecer de novo; nem tenta gerar algum efeito a partir dos diálogos mais simples, e filma todos quase do mesmo jeito como se fosse uma novela. O que importa é manter a aura épica que existe sobre o filme, e criar mais momentos que deem solenidade a ele: certas cenas que poderiam se resumir a segundos são alongadas, algumas transformadas em clipes musicais praticamente, outras cenas de batalha são estendidas pra abrir espaço pra mais composições visuais impressionantes e mais momentos grandiosos. Nas próximas horas isso não acontece com menos frequência: a aparição de certos personagens, de certas situações já esperadas, sempre são carregadas com tal ar de importância que o diretor pouco ou nada se importa se essas cenas vão interferir posteriormente no andar da história, ou se tem muita relação com o que veio antes — porque afinal elas devem valer por si só independente se a justificativa pra que esses momentos apareçam faça sentido pro plot principal ou não. É o tipo de cena que deu saudade do cinema, porque certamente seria a hora que o pessoal iria urrar e aplaudir na sala.
A pressa característica da versão anterior absolutamente não existe, muito menos a pretensão de parecer com a Marvel e se afastar o máximo possível do estilo controverso de Batman vs Superman. Aquele estilo colorido, engraçado, que tornava o filme um alívio cômico de duas horas, que rondava a versão anterior inteira e claramente contaminava os personagens mais sombrios, como Batman, Cyborg e o vilão… enfim, esse estilo fica bem mais restrito em meio a enorme duração do filme: ele ainda existe, mas em momentos pontuais. Por outro lado, também não há uma imposição do estilo sombrio de Batman vs Superman. O que acontece é que as quatro horas permitem que os dois estilos apareçam de acordo com os personagens, e na verdade são justamente eles que guiam quase tudo no filme.
Personagens que antes foram atirados na versão anterior simplesmente porque tinham que aparecer, e tiveram suas tramas pessoas ignoradas e desfavorecidas pelo estilo de Joss Whedon, agora tem algum tempo pra significar algo pro filme, pra mostrar suas particularidades sem invadir o tempo de tela do outro (até porque ele é ilimitado no fim das contas). Ainda que Snyder se escore bastante também na relação emocional que já deve existir entre o público e esses personagens clássicos, há espaço pra que eles demonstrem algum carisma, chance que o Cyborg não teve no outro corte, por exemplo; os alívios cômicos com Flash realmente são alívios cômicos porque são pontuais e balanceados em relação ao resto do filme. Nesse sentido, também essas cenas devem funcionar por elas mesmas só que de um jeito diferente: são menos estilizadas, mais simples e permitem passar um tempo com os personagens, sem se preocupar em conectar com o avanço da história ou coisa assim.
Não sei se isso é de propósito, mas esse tempo que Snyder dá aos personagens, e o cuidado com que cria cenas especificamente pra eles demonstrarem características nunca antes mostradas nos cinemas e o público vibrar, parece querer desviar o olhar do quão artificiais são muitos dos efeitos especiais, no mal sentido. Em algumas partes chega a ser risível, porque é artificial no pior sentido: de distrair por ser tão mal feito, de tirar a emoção mirada em certas cenas.
A grande virada em relação a tudo isso acontece mais ou menos a partir da segunda hora, quando acontecimentos relevantes especificamente pra história começam a aparecer com mais frequência e o filme se diferencia menos da sua versão anterior. O curioso é que mesmo a história sendo praticamente a mesma, ela agora acaba tendo um impacto bem diferente, porque dessa vez os personagens foram tratados como algo além de instrumentos pra aquela história genérica andar. Se nessa parte (do meio pro final) vemos eles fazerem graça, participarem da ação, usarem seus poderes, entre outras coisas que sempre vemos nos filmes de herói, antes disso pelo menos também vimos vários detalhes que facilmente seriam descartados (sobretudo no que se refere aos personagens introduzidos nesse filme, incluindo os coadjuvantes, e também os que ressurgem. Os veteranos, por outro lado, como Mulher-Maravilha e Batman praticamente não apresentam nada de novo e servem praticamente só pra a ação). Assim, o lado épico, ou engraçado, ou emocionante, que certos momentos trazem, dessa vez não são só insinuação como é na versão de Joss Whedon: a história, na versão de Zack Snyder, tal qual em Batman vs Superman, é simplesmente o instrumento pra que todos esses lados muitos mais relacionados com os personagens do que com qualquer outra coisa, apareçam com grande evidência — e mais, tudo é o instrumento pra que Snyder faça exatamente o que foi chamado pra fazer: fanservice sem limites e sem medo das consequências que poderiam acarretar caso fosse um filme normal, coisa que outro diretor não teria moral pra fazer.
Agora, se todas essas decisões, independente do resultado, são compreensíveis ao perceber os objetivos do diretor, o que não dá pra entender é o formato da tela. Por causa dele, a ação e os momentos épicos ficam menos impressionantes e a aparência de novela dos diálogos fica ainda mais óbvia. Nesse caso, parece querer, mais do que em qualquer outro aspecto, forçar a solenidade que Snyder tanto quer pra tornar seu filme único. As cenas finais são outro exemplo, talvez o melhor, de quando isso passa dos limites: ele obviamente se aproveita de que essa é sua última chance e joga tudo pra galera sem precisar pensar em como aproveitar aquilo no futuro. O Coringa vai voltar? Qual o significado do sonho? O que vai acontecer com Darkseid?
No fim das contas, já era, não tem a menor importância, e o corte de Snyder é isso aí. O homem só aproveitou sua (provável) última oportunidade na DC pra ser feliz e fazer o que sabe fazer, sem a menor preocupação em cativar quem não gosta dele.
À Beira da Loucura
3.6 403 Assista AgoraMais um filme sobre terror do que de terror propriamente
Christine, O Carro Assassino
3.3 671 Assista AgoraNão sei se mais por mérito de Stephen King ou de John Carpenter, visto que esse é seu trabalho menos competente na direção até então, mas fato é que o diretor segue talentoso em tirar o melhor resultado das premissas mais simples, e por vezes das mais idiotas, como é o caso.
Já no começo, logo que o lado homicida do carro, os protagonistas imaturos e seus dramas adolescentes, o subtexto sexual, enfim, quando tudo isso é apresentado, as expectativas baixam imensamente. Um filme B em essência e pra piorar com quase duas horas: uma tragédia anunciada. E esta só não se concretizou porque haviam dois mestres tratando dessa história. De fato, Carpenter não entrega sua melhor direção nem seu melhor terror, mas ainda assim demonstra perfeita consciência do material com o qual está lidando, e mais importante, das expectativas seriam criadas em relação a ele. A partir de uma premissa tão boba, personagens tão genéricos e viradas na história previsíveis desde o primeiro ato, seria difícil surpreender positivamente e criar alguma tensão convincente que escapasse da comédia involuntária.
O grande acerto é justamente que esse lado infantil inerente não é negado, todos os desenlaces mais óbvios realmente se concretizam, mas nem por isso o diretor deixa de encontrar caminhos pelas beiradas das expectativas e bolar pequenos detalhes que aos poucos vão se provando como as surpresas que possibilitam a imersão nesse universo. Essencial pra isso é como Carpenter sabe lidar com a inocência por trás de suas histórias. Em comum entre Halloween e The Fog está o fato de que esses filmes partem de medos infantis, de ideias sem explicação e afastadas da realidade, mas que acabam sendo fáceis de empatizar porque o diretor não nega essa característica, e dá consistência àquelas ideias através de uma encenação muito cuidadosa— se, claro, o público aceitar essa falta de explicação. Com Christine - O Carro Assassino é desse mesmo jeito: seu lado bobo e previsível é escancarado logo de cara pra em seguida ser levado às últimas consequências. Seja com o carro conversando através das músicas no rádio, perseguindo por conta própria quem ofendeu seu dono, passando por obstáculos e entrando em espaços que um carro normal sem a força do ódio nunca conseguiria. Enfim, são possibilidades que parecem bestas mas olhando com atenção percebe-se que são de uma criatividade notável, e são mostradas nos momentos exatos, e com certo cuidado técnico, pra gerar determinadas reações que a princípio (pelas expectativas anteriores) seriam inimagináveis.
Entre todas as possiblidades, sem dúvida a mais impressionante se refere às emoções de Christine. Porque, afinal, é um objeto inanimado, sem rosto e sem voz, mas o diretor de alguma forma sobrenatural faz com que o público compreenda perfeitamente quais emoções ela está sentindo. E sem apelação: o recurso do rádio, que poderia ser usado à exaustão pra transmitir o que as imagens não conseguem, é usado apenas em momentos pontuais, nos quais o contraste entre o instrumental da música e o significado que sua letra adquire naquelas situações específicas só reforça a tensão (ou provoca humor em outras cenas… o final é o melhor exemplo). Em outras vezes, nem o rádio é usado: apenas pela posição da câmera e pela antecipação criada percebe-se as intenções de Christine. Parece idiota analisar as emoções do carro, e lendo assim o filme como um todo pode parecer mais idiota ainda… e de certa forma, é mesmo, só que é nessas horas que um diretor talentoso faz a diferença. Se quem assiste não fica de má vontade, acredito que seja fácil perceber como John Carpenter transforma uma possível bomba em uma grata surpresa.
Halloween: A Noite do Terror
3.7 1,2K Assista AgoraÉ uma lógica de pesadelo, não tinha notado antes como são as crianças que deixam isso claro (mencionando o bicho papão o tempo todo): não tem nenhuma explicação por trás, é só o Michael Myers, que obviamente é imortal, perseguindo uma galera...
Ivan, o Terrível - Parte I
4.1 50 Assista AgoraUma coisa que sempre me encantou nos filmes dos anos 20 de Eisenstein é que mesmo tendo uma montagem muito dinâmica na maior parte do tempo, com um ritmo de deixar quem assiste sem ar, o diretor tinha plena noção de quando deveria dosar mais os cortes. Todos aqueles cortes rápidos não eram só pra fazer experimentos de montagem por fazer ou pra apresentar uma nova técnica, mas eles estavam ali porque (e quando) a cena pedia. Consequentemente, em momentos mais contemplativos em meio a toda àquela confusão, em que fazia muito mais sentido ter outro ritmo, Eisenstein de fato dava um tempo pro público respirar, e a impressão deixada pela maior duração dos planos era muito forte.
E imagine então que não foi nenhuma surpresa ver como essa qualidade de saber adaptar seu estilo pra cada situação ficou explícito em Ivan O Terrível. E faz todo sentido, já que seus objetivos são bem diferentes daqueles dos anos 20. Coisas que antes não apareciam em seus filmes de propaganda, como um roteiro mais elaborado, desenvolvimento de personagens específicos, dessa vez surgem com grande destaque. Acaba sendo uma narrativa clássica de diversas maneiras, de personagens, temas, motivações que já vimos tantas vezes. Ivan com sua megalomania, seus inimigos políticos também buscando o poder, traição, vingança, nada de novo. Mas o grande diferencial é que Eisenstein enfatiza de todos os jeitos a grandeza e o poder do protagonista, e com um grande cuidado consegue fazer o público sentir a escala do que aparece em tela. E não só nos diálogos: tudo no filme reforça que essa grandeza existe. São frequentes os planos em que Ivan ocupa toda a tela, e os mais impressionantes são justamente aqueles em que ele próprio é só um detalhe, mas sua sombra ocupa todo o resto. Ou quando seu rosto está em foco e as várias e várias pessoas atrás dele praticamente não representam nada. Até as roupas, conforme as ambições de Ivan crescem, progressivamente vão fortalecendo sua presença e o destacando entre as pequenas pessoas ao seu redor.
Mas essa característica também é bem dosada: há momentos em que a fragilidade de Ivan é notável, colocam em dúvida se seu poder é instável e sua megalomania algo sem fundamento. Reflexões pontuais, que ficam abertas ao público por um breve momento até que logo o personagem toma de novo o controle da situação, e o curso dos acontecimentos volta ao seu domínio e a cena reconstitui a mística em torno dele. E é muito interessante como tanta coisa tem um lado exagerado (personagens, atuações, cenários, iluminação), mas o filme não chega ao ponto de ser caricatural. Aliás, chega a ser, mas é como se o filme só não assumisse esse lado de forma explícita porque se desenrola em função dos personagens, principalmente Ivan, e é exatamente ele, com suas ambições e mania de grandeza, que nunca assumiria algo que colocasse seu poder em questão. Por isso o filme segue nesse exagero bem calculado, que sem dúvida impressiona por seus cenários majestosos, grande número de pessoas em tela, trilha sonora épica, e principalmente pela enorme presença do protagonista, mas se olharmos a fundo vemos que tem algo de ilusório, algo de crítica política e talvez ironia, por trás de todo o exagero.
A Voz Suprema do Blues
3.5 540Novelão até demais
Tenet
3.4 1,3KTenet é um filme muito mais aberto a qualquer possibilidade de compreensão do que o normal. Nolan quer ironizar seus próprios vícios ou ele realmente espera que o público pense a fundo sobre cada diálogo, cada explicação e cada conceito? Não dá pra saber, porque não há indícios suficientes pra nada disso. Em um momento uma personagem diz “não tente entender, sinta”, mas em quase todos os intervalos entre uma cena de ação maravilhosa e outra há longas explicações sobre todos os conceitos que o diretor aparentemente tanto tentou aprofundar. Aquela frase então não passou de uma frase de efeito, como diversas outras durante o filme? Ou ela propositalmente insinua que metade do tempo de tela do filme é pura chacota?
Só pode ser, porque não é possível que um vilão seja involuntariamente ridículo assim, e que seus monólogos foram escritos sem um propósito cômico; não é possível que esses atores foram orientados a praticamente ler em voz alta suas falas ao invés de atuar… Pelo contrário: é totalmente possível, porque, por outro lado, muita coisa no filme parece indicar que é. O cuidado técnico da obra em nada se diferencia de qualquer trabalho anterior do Nolan, assim como suas tentativas furadas de transmitir a tristeza de algumas situações; a seriedade na história e na forma como os temas são elaborados, e a atenção dedicada aos dramas individuais de alguns personagens, passam longe da ironia. Se tantas vícios e atributos de Nolan como diretor permanecem iguais, por que exclusivamente nesse sua proposta não seria “séria”? Eu particularmente imagino Lars Von Trier fazendo uma paródia de si mesmo dessa forma (como o fez em A Casa Que Jack Construiu), mas Nolan, não… ou ao menos ele não se preocupou em deixar nada explícito em relação a suas intenções. E não há nada de errado em relação a isso, até chega a ser uma trapaça: você assiste do jeito que quer, ignora o que quer, leva a sério o que quer, e dependendo da sua boa vontade aproveita ou não a experiência. No meu caso, consegui ignorar em parte o que é (ao meu ver) involuntariamente ridículo porque quando o filme vai além disso o que surge é ação de qualidade incontestável.
Isso, também, é o diretor se repetindo: se o que ele já fazia mal dessa vez fez pior, o que ele fazia bem apenas repetiu pra criar uma experiência grandiosa, com momentos tão empolgantes que valem por si só. Todas as ideias que o filme propõe só se justificam porque seu uso nas cenas de ação é perfeito. O que os diálogos tanto desenvolvem, só se concretiza nessas cenas, e da forma mais impressionante possível. Durante a ação, o espetáculo técnico de Nolan e seus efeitos mirabolantes conseguem dar toda a grandiosidade e intensidade que as cenas precisam.
E o que salva o filme é que pouco importa a motivação na história que levou a ação a aparecer, porque quando ela aparece, empolga e contagia independente de qualquer coisa (e funcionaria melhor ainda se não houvessem os vícios típicos do diretor pra atrapalhar). Desde a introdução frenética até quando os efeitos mais elaborados são usados, as sequências de ação mais parecem ótimos videoclipes (principalmente pelo ótimo aproveitamento da música) interrompidos pelo longo desenvolvimento de uma história que melhor seria se fosse desprezada.