É quase inacreditável o nível de sagacidade da decupagem de Lubitsch ainda nos anos 1930. Com o seu jeito esperto de filmar e montar as cenas ele eleva o nível de cada uma das piadas e situações cômicas. E o que dizer da trama de Design for Living? Absolutamente descabido para a sua época, até hoje tem pouca coisa tão arrojada e libertária. O trio de protagonistas também é um deleite, especialmente a Miriam Hopkins. Que timing cômico brilhante dessa atriz, merecia ser mais conhecida e celebrada hoje em dia.
Que audácia esse filme. Mil e uma maneiras de insinuar tesão sem torná-lo explícito. É mais que sofisticado para a sua época, mas não só por conta da temática. A abordagem é igualmente à frente do que se fazia na época, com piadas e rimas visuais inteligentes que se repetem sem nunca ficarem cansativas. Só é uma pena que a personagem da Miriam Hopkins, tão divertida, fique escanteada um bom pedaço do filme.
A química entre Humpfrey Bogart e Lauren Bacall - das duplas de protagonistas mais hipnotizantes que eu já vi - é a principal razão para assistir a "To Have and Have Not". No geral, é um filme de narrativa bastante simples mas, ainda assim, satisfatória. A pouca originalidade do texto talvez tenha a ver com a obra original de Ernest Hemingway - o pior livro da carreira do escritor até então, segundo Howard Hawks.
Em suma, não me encantou mas garantiu 1h40 de bons diálogos e o costumeiro apuro técnico de Hawks. Um filme menor deste gênio da era de ouro de Hollywood já vale mais que a filmografia da maioria dos outros diretores.
A mise-en-scène impecável de Preminger, o roteiro cheio de reviravoltas críveis e um dos conjuntos de atuações mais irresistíveis do noir americano formam a tríade que eleva Laura ao patamar de umas das grandes obras do gênero de "murder mystery". Daqueles filmes que te grudam na tela e fazem o espectador prestar um pouco mais de atenção em cada um dos elementos.
Isso sem falar na trilha-sonora (que música tema memorável!), o corajoso subtexto queer e tantos outros detalhes interessantes que agora me escapam. Em pouco menos de uma hora e meia, Laura entrega uma das tramas mais deliciosas da era de ouro hollywoodiana. Pra rever várias vezes.
Não é à toa que O Falcão Maltês (ou Relíquia Macabra, aos que preferirem) tenha sido responsável por popularizar o filme noir. Seu roteiro ágil e inteligente, que sempre deixa o espectador tentando adivinhar as respostas da trama; Humphfrey Bogart e seu irresistível Sam Spade; a tensão construída nos claustrofóbicos ambientes internos; a dubiedade dos personagens, de forma que é impossível classificar com certeza quem é mocinho ou vilão antes dos 45 do segundo tempo...
Tudo isso junto forma uma obra sensual e eletrizante demais para não ser copiada à extensão (e à exaustão, como se provou menos de duas décadas depois). E que bom que O Falcão Maltês gestou todo um novo subgênero. Assim como o faroeste e o filme de gangster, o noir carrega um pouco da síntese do que é o cinema americano.
Vinhas da Ira é fodido. Poucas vezes - ou até nunca - uma mensagem política de esquerda foi tão bem transmitida em um filme. O jeito íntimo com que Ford filma é complexo em sua simplicidade e dá ao espectador toda a informação necessária, sem deliberar pelo público ou oferecer respostas prontas. Talvez o ato final seja mais óbvio para os dias de hoje, mas não em 1940.
Um manifesto que exalta a perseverança humana, o senso de coletividade e o bem-estar que deveria ser direito de todos, em contraste à exploração facínora que o capitalismo tem a oferecer de pior.
O horror, o horror. Coppola e cia. mergulham no abismo de uma guerra sem razão provocada por uma elite política que ceifou o futuro de tantas pessoas, nos Estados Unidos e no Vietnã. Apocalypse Now é talvez o filme de guerra mais contundente já feito, igualmente seduzente e aterrorizante, provoca no espectador uma resposta quase tátil. Podemos sentir o calor, o tédio, o desespero e a sanidade indo embora, pouco a pouco, a cada cena. E se o preço da guerra é esse, nada mais adequado que repetir: o horror, o horror.
A pedra fundamental dos faroestes e, em certa medida, do cinema americano como um todo. Essa obra-prima de John Ford condensa muitas das ideias que perdurariam para sempre e se espalhariam para outros gêneros. A mistura de ação, drama e comédia mais influente da história do cinema.
Um bom faroeste que antecipa muitas das questões dos filmes revisionistas do gênero que viriam na segunda metade dos anos 1960 e nos anos 1970. Marlon Brando conduz bem a coisa toda, mas os destaques estão nas atuações (inclusive do próprio Brando) e na belíssima cinematografia. O filme aproveita muito bem o cenário à beira-mar, incomum para um faroeste. Em algum momento, no entanto, a história se perde e a narrativa fica um tanto enfadonha. Não é um filme tão bem editado, poderia ter mais impacto se fosse mais ligeiro.
Expõe com profundidade e no calor do momento um tema que o cinema americano ainda tinha tratado muito pouco até esse momento. A violência sistêmica nas comunidades negras dos Estados Unidos em plena epidemia do crack e no auge da política de segurança da era Reagan é um dos episódios mais trágicos da dita maior democracia do mundo.
Para além da mensagem pacifista, Boyz N The Hood é um filme que constrói muito bem seu drama por meio de personagens fortes, carismáticos e críveis. A direção e fotografia são sóbrias na maior parte, mas não se escondem quando precisam elevar o tom. Com exceção de alguns momentos talvez mais melodramáticos que o necessário, John Singleton e cia. não pesam a mão demais apesar das várias oportunidades para saídas fáceis e moralistas que esse tipo de história oferece.
Em Profondo Rosso, o assassino ganha uma aura mística e onipresente que livra Argento de dar à história um caráter mais racional, dando espaço a sua loucura visual e sonora. É mesmo um filme que estimula vários sentidos. Seus grandes momentos vão ficar marcados na minha memória por um bom tempo.
O Holocausto. Essa coisa tenebrosa que, de tão terrível, parece saído da cabeça do vilão mais caricaturalmente maquiavélico de uma história em quadrinhos. Mas aconteceu. E se aconteceu, haviam mecanismos que o sustentavam no cotidiano das pessoas que o viviam, e é disso que Zona de interessa trata.
Devastador, Zona de Interesse é diferente. Não é possível (ou muito difícil) avaliá-lo sob a ótica comum em que se avalia um filme. Tudo aqui é construído para depositar no espectador uma angústia desconcertante e a mensagem de que não podemos jamais esquecer.
Exuberante como praticamente todo filme do Miyazaki, O Menino e a Garça é também uma das obras mais filosoficamente profundas do diretor. A jornada de Mahito abandona a necessidade por uma lógica interna do mundo fantástico apresentado em prol de discutir temas como luto, pertencimento e a humanidade no geral. É simbólico que este seja um dos últimos filmes da carreira de Miyazaki, que quanto mais envelhece, mais faz perguntas em troca de poucas ou nenhuma resposta. Não fosse o ritmo inconsistente e o final anticlimático, seria um de seus melhores filmes.
Vidas ao Vento é um veículo pelo qual Miyazaki reflete sobre suas grandes aspirações como ser humano e artista. Na figura de Jiro Horikoshi e no Japão do entreguerras, ele encontra o cenário perfeito para abordar vários dos principais temas de sua obra ao mesmo tempo em que contempla sobre si mesmo. Sabemos que este não foi o último filme de Miyazaki, mas a sensação que Vidas ao Vento passa é de que aqui ele deixou seu testamento.
É uma fábula delirante baseada em um estudo de personagem que depende quase que inteiramente da Emma Stone. A amplitude do arco narrativo exigia uma atriz classe A, e ela não entrega menos que isso. Como de costume, é um filme visualmente imaginativo e cínico do Lanthimos. Se em outras vezes isso funciona como desserviço à obra, aqui acho que encaixou muito bem, pelo menos na maior parte.
No entanto, o que continua me incomodando nos filmes dele - algo menos pronunciado em A Favorita - é sua autoindulgência. Lanthimos filma como se não precisasse de substância para captar a atenção do espectador. Quando o discurso ou a própria história perdem sustentação por si só, a experiência fica um tanto tediosa e eu sinto como se o filme fosse um corpo estranho à minha frente.
Daqueles filmes que nos fazem lembrar do porquê o cinema é um meio artístico e de comunicação tão especial. A mise-en-scène de Anatomia de Uma Queda é desses trabalhos de mestre. Me senti completamente engolido pelo filme e hiperestimulado por todos os seus elementos tão bem construídos e dispostos. É uma obra de muitas camadas, sejam elas visuais, sonoras ou textuais. Sai do cinema com a sensação de ter visto um dos melhores filmes já feitos.
E Sandra Hüller. Uau. Não é todo ano que a gente é agraciado com uma interpretação desse nível.
Um filme que se faz devastador nos detalhes. A singeleza dos pequenos momentos compartilhados pelos dois personagens centrais torna toda a trama tão próxima do espectador ao ponto de nos fazer esquecer da ficção. Na Young e Hae Sung são, de certa forma, pessoas de verdade e a natureza verdadeira do drama pelo qual passam faz da experiência de acompanhá-lo tão dolorosa. E, óbvio, isso só ocorre por conta da habilidade e sensibilidade da Celine Song e dos atores principais. Maravilhoso.
Perdidos no tempo e espaço, os personagens centrais desse singelo filme de Aki Kaurismaki são como mensageiros da narrativa central da história, que é de certa forma uma homenagem ao cinema na maneira em que mostra como até mesmo duas pessoas absolutamente insignificantes podem ser protagonistas de uma história de amor. Não bastasse os vários pôsteres de clássicos do cinema mundial, o nome do cachorro no fim é a cereja do bolo.
Um manifesto feminista da pós-modernidade? Um drama existencial travestido de blockbuster da temporada? Ou só uma desculpa esfarrapada pra vender boneca? Barbie é tudo isso e nada disso ao mesmo tempo, mas é, principalmente, uma baita galhofa. Gostaria que Gerwig, Robbie e cia. tivessem aparado as arestas desnecessárias e focado mais na galhofa.
Um intenso e desconfortável drama que se mascara de novela até revelar ao espectador os fantasmas que seus personagens carregam. Obra de muita visão do Todd Haynes, um verdadeiro filme de autor. E o trio principal de atuação é qualquer coisa. Charles Melton impecável, tem pelo menos umas três cenas memoráveis dele.
Um típico 'feel good movie' muito bem feito. Jamais descamba para o melodrama barato nem pesa a mão em nenhum de seus lados, cômico e dramático. Praticamente não há transição entre eles, de forma que Os Rejeitados se torna um 'dramédia' bem equilibrado e fluído. Outro óbvio destaque é o elenco, em especial Paul Giamatti, cuja ótima atuação serve de âncora para sustentar a ambivalência do roteiro.
Ao mesmo tempo em que o foco narrativo nos dois personagens centrais o auxilia em não tornar a coisa toda um tanto megalomaníaca, sinto que o roteiro poderia ter ido mais fundo em algumas questões. A superficialidade da história acaba por, inclusive, enfraquecer a escolha de ambientação atrelada às opções estéticas para emular uma experiência setentista americana. Comentários sobre a situação política dos EUA à época são deixadas de lado, e mesmo o conflito geracional entre os personagens centrais é subdesenvolvido.
Sociedade da Neve destaca-se em meio a tantos filmes genéricos sobre desastre ao abordar a história na qual se baseia de maneira respeitosa às pessoas envolvidas, mas sem glamourizar o terror pelo qual elas passaram.
Só é uma pena que a estrutura do roteiro seja tão burocrática. E, infelizmente, acaba caindo no clichê de redenção/superação nos minutos finais com um melodrama barato que encerra porcamente o filme.
O auge de Al Pacino é também o auge do cinema americano, e poucos filmes foram capazes de extrair tanto do maior ator da história do cinema quanto Serpico. Há uma simbiose entre direção, atuação e roteiro que consegue criar uma história de moralidade óbvia, mas que em momento nenhum soa moralista.
Frank Serpico é um personagem conturbado e, por mais que sua cruzada seja das mais nobres, é impossível não sentir também pelas pessoas que ele fere no caminho ou questionar se as suas decisões são puro altruísmo.
Primeiro filme do Mann que me desagrada. Tudo parece apressado, da escalação dos atores à construção dos diálogos e desenrolar da trama policial. Não há tempo suficiente para desenvolver o declínio psicológico do personagem principal, tampouco para que o espectador simpatize com a sua vida familiar e, pior ainda, as saídas do roteiro para revelar o assassino são preguiçosas e mal expostas ao espectador. Lembrar esses CSIs da vida que entupiam a programação dos canais fechados nos anos 2000.
Pra piorar, a maior parte das atuações aqui é ruim. Menção honrosa ao Brian Cox, que trabalha bem com o pouco que tem, mas todo o resto vai do medíocre ao extremamente canastrão, o que no fim das contas também diz um bocado sobre a qualidade da direção e do roteiro.
De ponto positivo dá pra citar a habilidade usual do Mann com a câmera. Há vários planos e sequências bem interessantes no filme (mas pra quem já assistiu Heat ou mesmo Thief, anterior à Manhunter, não é nada novo).
Sócios no Amor
4.0 26É quase inacreditável o nível de sagacidade da decupagem de Lubitsch ainda nos anos 1930. Com o seu jeito esperto de filmar e montar as cenas ele eleva o nível de cada uma das piadas e situações cômicas. E o que dizer da trama de Design for Living? Absolutamente descabido para a sua época, até hoje tem pouca coisa tão arrojada e libertária. O trio de protagonistas também é um deleite, especialmente a Miriam Hopkins. Que timing cômico brilhante dessa atriz, merecia ser mais conhecida e celebrada hoje em dia.
Ladrão de Alcova
4.0 34Que audácia esse filme. Mil e uma maneiras de insinuar tesão sem torná-lo explícito. É mais que sofisticado para a sua época, mas não só por conta da temática. A abordagem é igualmente à frente do que se fazia na época, com piadas e rimas visuais inteligentes que se repetem sem nunca ficarem cansativas. Só é uma pena que a personagem da Miriam Hopkins, tão divertida, fique escanteada um bom pedaço do filme.
Uma Aventura na Martinica
3.9 66 Assista AgoraA química entre Humpfrey Bogart e Lauren Bacall - das duplas de protagonistas mais hipnotizantes que eu já vi - é a principal razão para assistir a "To Have and Have Not". No geral, é um filme de narrativa bastante simples mas, ainda assim, satisfatória. A pouca originalidade do texto talvez tenha a ver com a obra original de Ernest Hemingway - o pior livro da carreira do escritor até então, segundo Howard Hawks.
Em suma, não me encantou mas garantiu 1h40 de bons diálogos e o costumeiro apuro técnico de Hawks. Um filme menor deste gênio da era de ouro de Hollywood já vale mais que a filmografia da maioria dos outros diretores.
Laura
4.1 132 Assista AgoraA mise-en-scène impecável de Preminger, o roteiro cheio de reviravoltas críveis e um dos conjuntos de atuações mais irresistíveis do noir americano formam a tríade que eleva Laura ao patamar de umas das grandes obras do gênero de "murder mystery". Daqueles filmes que te grudam na tela e fazem o espectador prestar um pouco mais de atenção em cada um dos elementos.
Isso sem falar na trilha-sonora (que música tema memorável!), o corajoso subtexto queer e tantos outros detalhes interessantes que agora me escapam. Em pouco menos de uma hora e meia, Laura entrega uma das tramas mais deliciosas da era de ouro hollywoodiana. Pra rever várias vezes.
Relíquia Macabra
4.0 182 Assista AgoraNão é à toa que O Falcão Maltês (ou Relíquia Macabra, aos que preferirem) tenha sido responsável por popularizar o filme noir. Seu roteiro ágil e inteligente, que sempre deixa o espectador tentando adivinhar as respostas da trama; Humphfrey Bogart e seu irresistível Sam Spade; a tensão construída nos claustrofóbicos ambientes internos; a dubiedade dos personagens, de forma que é impossível classificar com certeza quem é mocinho ou vilão antes dos 45 do segundo tempo...
Tudo isso junto forma uma obra sensual e eletrizante demais para não ser copiada à extensão (e à exaustão, como se provou menos de duas décadas depois). E que bom que O Falcão Maltês gestou todo um novo subgênero. Assim como o faroeste e o filme de gangster, o noir carrega um pouco da síntese do que é o cinema americano.
Vinhas da Ira
4.4 205Vinhas da Ira é fodido. Poucas vezes - ou até nunca - uma mensagem política de esquerda foi tão bem transmitida em um filme. O jeito íntimo com que Ford filma é complexo em sua simplicidade e dá ao espectador toda a informação necessária, sem deliberar pelo público ou oferecer respostas prontas. Talvez o ato final seja mais óbvio para os dias de hoje, mas não em 1940.
Um manifesto que exalta a perseverança humana, o senso de coletividade e o bem-estar que deveria ser direito de todos, em contraste à exploração facínora que o capitalismo tem a oferecer de pior.
Apocalypse Now
4.3 1,2K Assista AgoraO horror, o horror. Coppola e cia. mergulham no abismo de uma guerra sem razão provocada por uma elite política que ceifou o futuro de tantas pessoas, nos Estados Unidos e no Vietnã. Apocalypse Now é talvez o filme de guerra mais contundente já feito, igualmente seduzente e aterrorizante, provoca no espectador uma resposta quase tátil. Podemos sentir o calor, o tédio, o desespero e a sanidade indo embora, pouco a pouco, a cada cena. E se o preço da guerra é esse, nada mais adequado que repetir: o horror, o horror.
No Tempo das Diligências
4.1 141 Assista AgoraA pedra fundamental dos faroestes e, em certa medida, do cinema americano como um todo. Essa obra-prima de John Ford condensa muitas das ideias que perdurariam para sempre e se espalhariam para outros gêneros. A mistura de ação, drama e comédia mais influente da história do cinema.
A Face Oculta
3.6 54 Assista AgoraUm bom faroeste que antecipa muitas das questões dos filmes revisionistas do gênero que viriam na segunda metade dos anos 1960 e nos anos 1970. Marlon Brando conduz bem a coisa toda, mas os destaques estão nas atuações (inclusive do próprio Brando) e na belíssima cinematografia. O filme aproveita muito bem o cenário à beira-mar, incomum para um faroeste. Em algum momento, no entanto, a história se perde e a narrativa fica um tanto enfadonha. Não é um filme tão bem editado, poderia ter mais impacto se fosse mais ligeiro.
Boyz'n the Hood: Os Donos da Rua
4.0 247 Assista AgoraExpõe com profundidade e no calor do momento um tema que o cinema americano ainda tinha tratado muito pouco até esse momento. A violência sistêmica nas comunidades negras dos Estados Unidos em plena epidemia do crack e no auge da política de segurança da era Reagan é um dos episódios mais trágicos da dita maior democracia do mundo.
Para além da mensagem pacifista, Boyz N The Hood é um filme que constrói muito bem seu drama por meio de personagens fortes, carismáticos e críveis. A direção e fotografia são sóbrias na maior parte, mas não se escondem quando precisam elevar o tom. Com exceção de alguns momentos talvez mais melodramáticos que o necessário, John Singleton e cia. não pesam a mão demais apesar das várias oportunidades para saídas fáceis e moralistas que esse tipo de história oferece.
Prelúdio Para Matar
4.0 255 Assista AgoraEm Profondo Rosso, o assassino ganha uma aura mística e onipresente que livra Argento de dar à história um caráter mais racional, dando espaço a sua loucura visual e sonora. É mesmo um filme que estimula vários sentidos. Seus grandes momentos vão ficar marcados na minha memória por um bom tempo.
Zona de Interesse
3.6 587 Assista AgoraO Holocausto. Essa coisa tenebrosa que, de tão terrível, parece saído da cabeça do vilão mais caricaturalmente maquiavélico de uma história em quadrinhos. Mas aconteceu. E se aconteceu, haviam mecanismos que o sustentavam no cotidiano das pessoas que o viviam, e é disso que Zona de interessa trata.
Devastador, Zona de Interesse é diferente. Não é possível (ou muito difícil) avaliá-lo sob a ótica comum em que se avalia um filme. Tudo aqui é construído para depositar no espectador uma angústia desconcertante e a mensagem de que não podemos jamais esquecer.
O Menino e a Garça
4.0 215Exuberante como praticamente todo filme do Miyazaki, O Menino e a Garça é também uma das obras mais filosoficamente profundas do diretor. A jornada de Mahito abandona a necessidade por uma lógica interna do mundo fantástico apresentado em prol de discutir temas como luto, pertencimento e a humanidade no geral. É simbólico que este seja um dos últimos filmes da carreira de Miyazaki, que quanto mais envelhece, mais faz perguntas em troca de poucas ou nenhuma resposta. Não fosse o ritmo inconsistente e o final anticlimático, seria um de seus melhores filmes.
Vidas ao Vento
4.1 603 Assista AgoraVidas ao Vento é um veículo pelo qual Miyazaki reflete sobre suas grandes aspirações como ser humano e artista. Na figura de Jiro Horikoshi e no Japão do entreguerras, ele encontra o cenário perfeito para abordar vários dos principais temas de sua obra ao mesmo tempo em que contempla sobre si mesmo. Sabemos que este não foi o último filme de Miyazaki, mas a sensação que Vidas ao Vento passa é de que aqui ele deixou seu testamento.
Pobres Criaturas
4.1 1,1K Assista AgoraÉ uma fábula delirante baseada em um estudo de personagem que depende quase que inteiramente da Emma Stone. A amplitude do arco narrativo exigia uma atriz classe A, e ela não entrega menos que isso. Como de costume, é um filme visualmente imaginativo e cínico do Lanthimos. Se em outras vezes isso funciona como desserviço à obra, aqui acho que encaixou muito bem, pelo menos na maior parte.
No entanto, o que continua me incomodando nos filmes dele - algo menos pronunciado em A Favorita - é sua autoindulgência. Lanthimos filma como se não precisasse de substância para captar a atenção do espectador. Quando o discurso ou a própria história perdem sustentação por si só, a experiência fica um tanto tediosa e eu sinto como se o filme fosse um corpo estranho à minha frente.
Anatomia de uma Queda
4.0 799 Assista AgoraDaqueles filmes que nos fazem lembrar do porquê o cinema é um meio artístico e de comunicação tão especial. A mise-en-scène de Anatomia de Uma Queda é desses trabalhos de mestre. Me senti completamente engolido pelo filme e hiperestimulado por todos os seus elementos tão bem construídos e dispostos. É uma obra de muitas camadas, sejam elas visuais, sonoras ou textuais. Sai do cinema com a sensação de ter visto um dos melhores filmes já feitos.
E Sandra Hüller. Uau. Não é todo ano que a gente é agraciado com uma interpretação desse nível.
Vidas Passadas
4.2 737 Assista AgoraUm filme que se faz devastador nos detalhes. A singeleza dos pequenos momentos compartilhados pelos dois personagens centrais torna toda a trama tão próxima do espectador ao ponto de nos fazer esquecer da ficção. Na Young e Hae Sung são, de certa forma, pessoas de verdade e a natureza verdadeira do drama pelo qual passam faz da experiência de acompanhá-lo tão dolorosa. E, óbvio, isso só ocorre por conta da habilidade e sensibilidade da Celine Song e dos atores principais. Maravilhoso.
Folhas de Outono
3.8 99Perdidos no tempo e espaço, os personagens centrais desse singelo filme de Aki Kaurismaki são como mensageiros da narrativa central da história, que é de certa forma uma homenagem ao cinema na maneira em que mostra como até mesmo duas pessoas absolutamente insignificantes podem ser protagonistas de uma história de amor. Não bastasse os vários pôsteres de clássicos do cinema mundial, o nome do cachorro no fim é a cereja do bolo.
Barbie
3.9 1,6K Assista AgoraUm manifesto feminista da pós-modernidade? Um drama existencial travestido de blockbuster da temporada? Ou só uma desculpa esfarrapada pra vender boneca? Barbie é tudo isso e nada disso ao mesmo tempo, mas é, principalmente, uma baita galhofa. Gostaria que Gerwig, Robbie e cia. tivessem aparado as arestas desnecessárias e focado mais na galhofa.
Segredos de um Escândalo
3.5 287 Assista AgoraUm intenso e desconfortável drama que se mascara de novela até revelar ao espectador os fantasmas que seus personagens carregam. Obra de muita visão do Todd Haynes, um verdadeiro filme de autor. E o trio principal de atuação é qualquer coisa. Charles Melton impecável, tem pelo menos umas três cenas memoráveis dele.
Os Rejeitados
4.0 317Um típico 'feel good movie' muito bem feito. Jamais descamba para o melodrama barato nem pesa a mão em nenhum de seus lados, cômico e dramático. Praticamente não há transição entre eles, de forma que Os Rejeitados se torna um 'dramédia' bem equilibrado e fluído. Outro óbvio destaque é o elenco, em especial Paul Giamatti, cuja ótima atuação serve de âncora para sustentar a ambivalência do roteiro.
Ao mesmo tempo em que o foco narrativo nos dois personagens centrais o auxilia em não tornar a coisa toda um tanto megalomaníaca, sinto que o roteiro poderia ter ido mais fundo em algumas questões. A superficialidade da história acaba por, inclusive, enfraquecer a escolha de ambientação atrelada às opções estéticas para emular uma experiência setentista americana. Comentários sobre a situação política dos EUA à época são deixadas de lado, e mesmo o conflito geracional entre os personagens centrais é subdesenvolvido.
A Sociedade da Neve
4.2 715 Assista AgoraSociedade da Neve destaca-se em meio a tantos filmes genéricos sobre desastre ao abordar a história na qual se baseia de maneira respeitosa às pessoas envolvidas, mas sem glamourizar o terror pelo qual elas passaram.
Só é uma pena que a estrutura do roteiro seja tão burocrática. E, infelizmente, acaba caindo no clichê de redenção/superação nos minutos finais com um melodrama barato que encerra porcamente o filme.
Serpico
4.1 276 Assista AgoraO auge de Al Pacino é também o auge do cinema americano, e poucos filmes foram capazes de extrair tanto do maior ator da história do cinema quanto Serpico. Há uma simbiose entre direção, atuação e roteiro que consegue criar uma história de moralidade óbvia, mas que em momento nenhum soa moralista.
Frank Serpico é um personagem conturbado e, por mais que sua cruzada seja das mais nobres, é impossível não sentir também pelas pessoas que ele fere no caminho ou questionar se as suas decisões são puro altruísmo.
Caçador de Assassinos
3.5 158 Assista AgoraPrimeiro filme do Mann que me desagrada. Tudo parece apressado, da escalação dos atores à construção dos diálogos e desenrolar da trama policial. Não há tempo suficiente para desenvolver o declínio psicológico do personagem principal, tampouco para que o espectador simpatize com a sua vida familiar e, pior ainda, as saídas do roteiro para revelar o assassino são preguiçosas e mal expostas ao espectador. Lembrar esses CSIs da vida que entupiam a programação dos canais fechados nos anos 2000.
Pra piorar, a maior parte das atuações aqui é ruim. Menção honrosa ao Brian Cox, que trabalha bem com o pouco que tem, mas todo o resto vai do medíocre ao extremamente canastrão, o que no fim das contas também diz um bocado sobre a qualidade da direção e do roteiro.
De ponto positivo dá pra citar a habilidade usual do Mann com a câmera. Há vários planos e sequências bem interessantes no filme (mas pra quem já assistiu Heat ou mesmo Thief, anterior à Manhunter, não é nada novo).