Revi por acaso, e senti quase a mesma coisa da primeira vez: o incômodo relacionado ao auto-deslumbramento narrativo irrita, mas as interpretações são tão boas, a direção é tão segura e inteligente, o erotismo subjacente é tão profundo, que, neste segundo contato, aderi à curiosidade irrestrita, acompanhei com empolgação o avançar dos capítulos, não obstante lembrar como tudo terminava. O que só confirma o mantra de que "rever é ainda melhor do que ver". Apaixonei-me por Emmanuelle Seigner, mais uma vez, e estabeleci uma identificação torpe com o personagem de Fabrice Luchini. O uso da trilha musical de suspense é de uma sagacidade estupenda. Ozon sabe o que faz: brinca com diversos gênios de maneira inteligentíssima. Mas o chiste narratológico não segura o roteiro até o fim: tem horas que aquelas conversas entre professor e aluno sobre "as motivações dos personagens" forçam a barra ao extremo, aff! (WPC>)
É um crime que este filme não seja mais conhecido. Como alguém que trabalhou quatro anos no telemarketing, identifiquei-me de imediato (se bem que, na Coréia do Sul, a fila de ligações parece bem mais pacata do que aqui, ainda que as cobranças sejam as mesmas). Logo na primeira seqüência, um baque: ao fundo, uma operadora chora, porque foi maltratada por um cliente. Em primeiro plano, uma extraordinária atriz, que brilha até a última aparição em cena. Quando surge a garota novata, tem-se a impressão que o filme render-se-á às convenções típicas de encontros intergeracionais, em comédias românticas. Mas não: o registro dramática é pesadíssimo, a despeito da leveza no tratamento. Identificação total. Surpreendente, Amei! (WPC>)
Como a maior parte das pessoas, conheci este filme por causa das breves participações de um jovem Pedro Almodóvar, mas é um impressionante José Sacristán quem brilha, num papel extremamente bem escrito e motivador. A primeira hora de filme beira a excelência, sendo muito mais contemporâneo em suas questões e reivindicações que uma reconstituição de época, mas, infelizmente, o terço final, ao focalizar as conseqüências problemáticas de uma subtrama de vingança (verossímeis, entretanto), perde um pouco de seu impacto discursivo, não obstante não prejudicar a qualidade extraordinária do filme, que merece ser bem mais conhecido e divulgado. Os números musicais são esplendorosos, bem como os diálogos entre o personagem-título e a sua mãe. Lindo! (WPC>)
A voz de Denise Weinberg impressiona desde o primeiro instante, bem como a ternura de Cacá Amaral. Os dois atores estão ótimos em cada aparição na tela, mas o roteiro modesto torna-se um pouco dispersivo quando focaliza nas intenções vingativas da mulher ou nas experiências sexuais do idoso. Nada que atrapalhe a nossa imersão emocional ou o nosso carinho pelos personagens. Torcemos para que eles superem o luto, que eles voltem a morar juntos, que eles conheçam efetivamente o filho falecido... A seqüência final é magnífica! (WPC>)
Que diretora impressionante: realizar um trabalho tão brilhante logo na estréia! Suas marcas registradas estão evidentes em cada filigrana: a maravilhosa condição de atores não experientes (principalmente, os infantis), a abordagem social, a quebra de expectativas de gêneros... Só melhora a cada instante, culminando num momento epifânico, em seu desfecho de simultânea ode e criticidade ao poder congregador da fé. Expõe as contradições, claro, mas não rejeita as vantagens do gregarismo. As interações familiares são ótimas. Lindo demais! (
Trata-se de um filme que, até algumas semanas, eu sequer ouvira falar e, de repente, descubro que é um dos favoritos das novas gerações macmahonianas. É uma evocação tardia do neo-realismo, em chave um tanto televisiva, mas não menos contundente ou discursivamente genial: o garoto protagonista é muito expressivo em sua aparente inexpressivo e as situações que ele vivencia são carregadas de dramaticidade, na condução quase anticlimática da narrativa. Extraordinário: valida o fuzuê crítico e espectatorial através de seus próprios méritos! (WPC>)
Sou apaixonado pela Helena Ignez, claro, e admito que, mesmo quando ela se repete ou resvala em obviedades "marginais", ela contorna as arestas defeituosas de suas obras com uma entrega intensa à temática e numa legítima celebração da amizade e do amor. Aqui, entretanto, parece que ela não se esforça muito: sabe que será elogiada e aplaudida por seus pares e, como tal, despeja uma série de vinhetas - ora engraçadas, ora reflexivas - que trazem à tona temas que ela já abordara em seus longas-metragens anteriores. Gosto do primeiro segmento e do "cemitério de memórias" que explica o trocadilho sobrenominal com a Agnès Varda e achei interessante a entrada em cena do palestino virgem. Mas o terceiro segmento soou-me como uma piada de mau gosto, exacerbando as contradições classistas de sociológicos holísticos que se deliciam tomando champanha em 'resorts' praianos enquanto lamentam haver tanta fome no mundo. O derradeiro segmento, com aquela dança um tanto cansada, apesar de intencionalmente orgíaca, não funciona, não possui o elã erótico que a protagonista estimula - já que, afinal, trata-se de uma meta-encenação. Inserir a defesa da maconha via catolicismo e despejar tantas referências suficientemente bem-quistas (de Oswald de Andrade a Betty Dodson, passando por Arthur Rimbaud, imagens antigas filmadas pelo Rogério Sganzerla e Lou Andreas-Salomé, entre tantos outros) pareceram soluções falhas, tornando a segunda metade do filme sem o vigor que a diretora deseja emular: é um filme sobre o cansaço de quem é sobremaneira aplaudido, infelizmente. A ayahuasca azedou antes do orgasmo que não chega, infelizmente! (WPC>)
Já estava preparando o textão arrebatado, prestar a grafar OBRA-PRIMA em letras maiúsculas, mas fiquei muito incomodado com a seqüência final, com a resolução que sabemos não ser definitiva, ainda que, para os propósitos do filme sob o 'star system', o tenha sido. Um defeito menor, entretanto: na prática, creio que quase todos nós faríamos a mesma coisa que os personagens evolvidos. É um dramalhão mui realista, que supera com louvor as limitações de gêneros e convenções narrativas de época. A personagem da mãe, rejeitando o estereótipo da judia usurária, é maravilhosa, bem como as demais personagens femininas. John Garfied está maravilhoso e mui sensível como o protagonista atolado de erros, combinando as vitórias no ringue com derrotas pessoais, mas ele é eclipsado pelas magníficas participações ao seu redor, com destaque para o sensível aproveitamento actancial do ex-boxeador Canada Lee. Não tinha como este filme dar errado, aliás: o fotógrafo é James Wong Howe; o roteiro foi escrito por Abraham Polonsky; Robert Aldrich é o assistente de direção; a montagem mereceu o Oscar que recebeu; e Robert Rossen revela-se muito mais que um artesão, no filme quintessencial sobre boxe. Esplêndido e desolador! (WPC>)
Até um dia desses, eu sequer conhecia o diretor. O descobri num documentário da Netflix sobre a história do cinema negro e fiquei fascinado por esse título, pela agudeza da proposta. Vendo o filme, finamente, percebi que a execução é realmente ambiciosa em seus propósitos: há uma problemática interna, no relacionamento entre os personagens do casal (que se divide em três pares de intérpretes, mais ou menos como FLERTE, do Hal Hartley), sobre as conseqüências dolorosas de um marido que não assume as suas tendências homossexuais. Fala-se sobre sucessivos abortos de maneira corajosa e audaciosa. Não há pudores acerca das intervenções de transeuntes, seja o policial, seja aquele sem-teto lúbrico e intelectualizado. Na trilha musical, Miles Davis. Tinha tudo para ser a obra-prima experimental que estas informações anunciam, mas o excesso de digressões envolvendo comentários demorados sobre a própria feitura do filme dirimem um pouco do espanto e da excelência do projeto (as conversas da equipe sobre a incompreensão dos intentos do diretor, por exemplo). Seja como for, uma descoberta acachapante: filmaço a ser disparado com muito entusiasmo para quem amamos. Uau! (WPC>)
Que o Kiyoshi Kurosawa é um mestre das tensões e um gênio estilístico, não se nega mais. Porém, achei que, aqui, o exercício muito bem realizado se esvai antes que a proposta seja direcionada a um encaminhamento tramático propriamente dito: pareceu-me apenas um 'trailer', uma publicidade estendida que não deixa claro o que está sendo efetivamente vendido: autoralidade per si? Seja como for, é um trabalho muito bem interpretado, com excelente fotografia e desenho de som, momentos assustadores e perturbadores e muitas pistas falsas (o empréstimo solicitado pelo filho e a obsessão da esposa pelas latas de refrigerantes, à frente). Amei e me inspirei na paciência docente do protagonista, sobremaneira indulgente em relação aos pantins de seus alunos culinários. Até certo ponto, entretanto... Tecnicamente irrepreensível, mas enredisticamente pendente. Seria intencional? Talvez eu ame o filme numa revisão ou numa retrospectiva/maratona da carreira do cineasta, mas, neste primeiro contato, o média-metragem não funcionou tanto comigo, infelizmente! (WPC>)
Primeiro questionamento: por que o diretor, responsável por obras tão originais, em oportunidades anteriores, resolveu render-se a um filme tão convencional, formulaico e atravessado pelas piores convenções familiares? Graças aos créditos de encerramento, sabemos que ele é parente de um humorista muito famoso no Ceará, que serviu de inspiração para o protagonista. Porém, isso não é suficiente para justificar o cabedal de equívocos aqui deslanchado: durante a projeção, sento muita vergonha alheia. Fazia tempo que eu não ficava tão incomodado durante uma sessão, por causa das interpretações retraídas, artificiais... Felizmente para o meu relacionamento com o filme, notei que isso tem a ver com a diegese, já que é uma narrativa sobre as tentativas de pertencer em ambientes de aparente repulsa/expelição inicial. O personagem de Démick Lopes comete erros o tempo inteiro e segue equivocado em sua impercepção de alguns deles (o desfecho, em sua forçação de barra melodramática, é vexatório!), mas isso também tem a ver com um subtexto tramático, de maneira que o filme, em seus equívocos, assume os erros dos personagens e, tanto um como os outros merecem novas chances e o nosso apoio espectatorial. Jesuíta Barbosa aparece como mero chamariz de público, mas demora a demonstrar-se orgânico, em relação ao que ocorre ao redor dele. Amei a trilha musical, repleta de artistas alternativos, e, em meu incômodo extremo, flagrei-me pensando em minha própria vida, em minhas escolhas, em meus anseios e frustrações. E, mais uma vez, o filme é sobre tudo isso. Funciona, portanto. Principalmente quando é permitido algum respiro circunstancial, para além das cenas de pretenso impacto, ostensivamente falhas (o que ocorre na discussão da praia e no hospital é lamentável, de tão mal executado. Idem para o surgimento da mãe, em determinado momento). A sessão terminou há algumas horas, mas sigo pensando no filme, com um carinho maior que as minhas irritações. Até deu vontade de revê-lo, devidamente acompanhado. Sigo crente no diretor, ressalto. Mas realmente torço para que ele se afaste dessas narrativas mais tradicionais (nos dois sentidos do termo, incluindo o pior deles). Sigamos! (WPC>)
Estranhamente, eu não conhecia esta dupla genial de realizadores - e, em meu primeiro contato tardio, fui arrebatado, fiquei apaixonado: os números de dança são magníficos, as autocitações são ótimas, a reverência a Jacques Tati, Aki Kaurismäki e Roy Andersson é evidente, e o modo como a trama se desvela é magistral, inclusive no que tange às questões políticas (vide as oportunas menções a greves, por exemplo). Amei a trilha musical (Birds on a Wire, já sou fã de vocês!) e Kaori Ito merece ser aplaudida de pé: que mulher impressionante! Filmaço, gente. Não desperdicem a oportunidade de conferi-lo: quero tirar o atraso quanto aos trabalhos prévios dos realizadores, o quanto antes! (WPC>)
Não sabia direito o que esperar: gostei muito do título e percebi que muitos amigos tinham apreciado, de modo que já tinha o interesse suficientemente despertado. Ainda não vi o longa-metragem anterior da diretora, mas, pelo que percebi aqui, ela domina com profusão as convenções do gênero. Os admiradores de David Cronenberg e Julia Ducournau devem ter ficado muito felizes com os resultados, bem como os fãs de Nicolas Winding Refn, com quem o estilo da diretora é deveras assemelhado. Ed Harris e Jena Malone estão ótimos em papéis intencionalmente caricaturais, mas as grandes interpretações são as das duas protagonistas, tão opostas e complementares como Yin e Yang: que Kristen Stewart é uma ótima atriz, todos nós já sabemos, mas não conhecia Katy O'Brian, fiquei impressionado com a sua ótima presença em cena, com a sutileza de suas transformações (emocionais, não apenas explicitamente corporais). A trilha musical sintetizada de Clint Mansell é ótima, bem como a utilização de múltiplos tons rubros na fotografia. Causa algum estranhamento o fato de quase tudo naquela cidade ter a ver com três ou quatro personagens (neste sentido, o filme possui uma aparência obliquamente teatral similar à de KILLER JOE - MATADOR DE ALUGUEL), mas é um aspecto que não atrapalha os ótimos efeitos cinematográficos: o que ocorre naquele surpreendente e alucinógeno desfecho é acachapante. A-do-rei! (WPC>)
Como estou assistindo aos filmes desta diretora em ordem cronológica invertida, está havendo também a constatação de uma ordem decrescente de qualidade. O que não chega a ser demeritório, visto que seu domínio do roteiro com múltiplas camas e do elenco impressionam a cada novo contato. A envergadura assumidamente cômica desta obra possui um cariz auto-indulgente, o que talvez explique o porquê de ele não ter me fisgado tanto quanto os dois longas-metragens posteriores: é como se, ao explicar que beleza e inteligência são critérios que chamam a atenção do júri, a protagonista me fizesse suspeitar do meu fascínio pelas situações amorais trazidas à tona. A personagem é ótima, as situações são sempre críveis, as aparições animais são magistrais e o desfecho é conciliador, afinal, mas , no saldo geral, senti falta das pontas soltas que tornar-se-ão o grande apanágio do estilo trietiano. Incrível como, numa obra ainda curta, ela já conseguiu se consolidar autoralmente: nasceu pronta! (WPC>)
Há muito nas entrelinhas do roteiro: como a protagonista é uma leitora compulsiva, ela nos treina para que leiamos também. Neste sentido, faz sentido que tantos espectadores tenham notado reverberações de romances famosos, além das próprias discussões internas sobre "Os Irmãos Karamazov". Gostei de como a ambientação político-nacional reflete a pós-adolescência da personagem, mas, depois de certo momento, começou a ficar repetitiva e não mais tão interessante o ciclo de atração e repulsa entre a jovem e o vizinho mais velho de seu namorado. A fotografia perenemente alaranjada fascina, também, pelos subtextos comparativos, já que faz o trigo rimar com o crepúsculo, com os cabelos loiros da protagonista e com o papel de parede do quarto de Henner. Começar com Depeche Mode e terminar com Patti Smith foi uma ótima sacada da diretora. Mas o filme estendeu-se onde talvez nem precisasse e subestimou o potencial reflexivo das conversas familiares, das múltiplas distinções (cidade x campo, RDA X RFA, etc.) que atravessam a trama... Seja como for, possui calor, que eventualmente redunda em febre. É agradável, ajuda-nos a refazer as pazes com memórias de juventude. E estimula-nos a voltar aos clássicos da Literatura mundial! (WPC>)
Que o Murilo Benício é um ótimo e versátil ator, não se nega. Mas, como diretor, infelizmente, está optando pelas execuções mais equivocadas possíveis. Aqui, por exemplo, a indefinição do ritmo cômico faz com que o filme pareça um pasticho mui piorado de MINHA MÃE É UMA PEÇA - O FILME, sem o mesmo talento na composição de personagens: é tudo exageradamente caricato, insuportável de ser acompanhado. A montagem alinear é horrenda, a concepção do álter-ego do dramaturgo é péssima (que atorzinho inexpressivo!) e a pretensa homenagem à maternidade é tolhida no próprio projeto, pela maneira abjeta e oportunista com que a personagem-título trata a mãe, que sequer aparece... É um retrato cômico (mas sem graça) sobre os estereótipos de classe e sobre os apanágios egoístas e egocêntricos dessa conjuntura. Não se consegue entender adequadamente os conflitos de personagens secundários (a traição conjugal perpetrada por uma das tias, por exemplo), de tão mal desenvolvidos que estes são. E o narrador revela-se alguém progressivamente desinteressante e mui desagradável: não conheço a origem teatral desta produção, mas, por este roteiro, é difícil imaginar que ele tenha se convertido num autor tão consagrado. Esforcei-me para gostar de algo no filme, mas é tudo degringolado, histriônico, disfuncional... Uma pena! (WPC>)
Foi o meu primeiro contato com o diretor, e já fiquei sumamente apaixonado: por mais que a sinopse direcione-nos para uma determinada trama, o que se descortina diante de nossos olhos (e, sobretudo, ouvidos) é extremamente radical, múltiplo, polifônico. A montagem de sons desta obra é uma das coisas mais geniais que existem! Vi o filme com minha mãe, que temeu ficar tonta, tamanha a quantidade de 'travellings' circulares, tão longos quanto brilhantes. Confirmando a associação do Cinema Marginal (ou melhor, pós-Novo, como bem dizia o Carlos Reichenbach) às estradas vazias, aqui, elas abundam: a migração ocorre da cidade grande para o interior, num percurso que faz completo sentido, em relação às intenções do diretor, que é mineiro. Não o conhecia: descobri esta obra-prima por conta de seu falecimento, e fiquei alucinado. Pereio está gostosíssimo como personagem maladro. Minha mãe ficou espantada com a quantidade de livros nos cômodos. Tudo aqui é genial: Maria Gladys deve ter ficado felicíssima com a menção nos ótimos e mui coloridos créditos de abertura. Um novo mundo abriu-se para mim, em pleno Brasil. Ôba! (WPC>)
Que filmaço é esse?! Como é que eu pude ficar tanto tempo sem conhecê-lo?! A cada obra do Kiyoshi que eu descubro, fico mais e mais impressionado com a maneira como ele mescla as convenções de diversos gêneros. Porém, o que ele faz aqui é ainda mais acachapante: pense num filme surpreendente, com as reviravoltas mais impensáveis... O elenco é ótimo e a direção entrega-nos seqüências longas e impressionantes (vide o que ocorre no hospital). O mote de invasão alienígena é pretexto para valiosas reflexões sobre relações humanas, incluindo uma crise marital e um contexto empregatício mui abusivo. Os efeitos visuais são magistrais, bem como a maneira esplêndida com que os "possuídos" pronunciam, de maneira intencionalmente inexpressiva, elucubrações existenciais de alto calibre. Magnífica descoberta, fui arrebatado! (WPC>)
Não sou muito aficcionado por gatos, de modo que apreciei de imediato o ponto de partida tramático, afinal dividido em três episódios: é incrível como os felinos estão associados ao terror, né? O segmento que intersecciona os episódios é um tanto exagerado, no que tange à exigência de verossimilhança para os relatos literários trazidos pelo personagem de Peter Cushing, mas é divertido vê-lo interagindo com Ray Milland. O primeiro episódio, mais aterrorizante efetivamente foi o meu favorito. O segundo é um interessante conto de perversão infantil. E o terceiro adere a uma perspectiva mais cômica. Cada um dos três possui o seu charme peculiar. Um passatempo divertido! (WPC>)
Revi com minha mãe, a propósito convidativo de um debate em cineclube, e foi ótimo vê-la torcer pelos mocinhos/bandidos (leia-se: anti-heróis): por mais radicalmente anti-armamentista que minha mãe seja, em diversos momentos ela queria que os personagens matassem seus perseguidores, de tão entusiasmada que ela ficou. Há inúmeras possibilidades de interpretação freudiana para as situações do filme, com destaque para aquela abertura explícita e magistral. A voz de Peggy Cummins é sumamente sedutora: que mulher linda, como não se apaixonar imediatamente por ela? Trata-se de um filme pioneiro e mui subversivo, que aborda as questões fetichistas de maneira originalíssima e enfatizando a complementaridade requerida por determinadas ações, sobremaneira quando de ordem criminosa. A seqüência final - idílica e desoladora, ao mesmo tempo - é excelente. Em minha opinião empolgada, uma obra-prima absoluta! (WPC>)
Ouvi tanta gente falando mal, que adentrei a sessão sem quase nenhuma expectativa. Mas, tanto como ocorreu em ENCANTO, fui logo atraído pelas belas canções com acento hispânico. Havia algo de promissor na narrativa, que atualizava questões tanto do Velho Testamento quanto de MILAGRE EM MILÃO, no que tange a livre-arbítrio e questões afins. Mas, de repente, tudo se perde numa narrativa insossa, sem desejo ou paixão, tão artificial que parece uma mera costura forçada para acrescentar as auto-referências a inúmeros outros longas-metragens clássicos da Disney. Será que o roteiro foi escrito com o auxílio de Inteligência Artificial? É o que parece! Tanto que a reviravolta não convence muito, além de eu ter achado o personagem do bodinho falante (com voz grave) inconveniente e destoante. Os momentos isolados de candura compensam o saldo geral entretanto: minha mãe, por exemplo, adorou! (WPC>)
Este filme marcou a minha pré-adolescência: foi a primeira vez na vida em que ouvi a palavra "orgasmo" e que apresentou-me a uma artista que, naquela época, já era completa, já podai ser considerada imortal. após o show arrebatador do último sábado, no Brasil, resolvi voltar a este documentário seminal, e percebi muitas similaridades cênicas. Os depoimentos são ótimos, bem como a demonstração das vocações maternais da cantora, que tratava a seus dançarinos como filhos. Ela não hesita em se exibir como caprichosa, mimada e um tanto infantil nalguns momentos, mas tudo isso é justificado pelas diversas falas sobre a necessidade de ser amada. As situações envolvendo os seus familiares, no show em Detroit, também explicam muito sobre ele. Idem quanto aos encontros com Kevin Costner, Pedro Almodóvar, Antonio Banderas e o relacionamento com Warren Beatty. A despeito da longa duração, é um filme muito gostoso de ser visto, principalmente quando se é fã da estrela titular. Muito bom perceber quão fiel a si mesma ela permaneceu, trinta e três anos depois que ela própria tinha ainda 33 anos. Adorei! (WPC>)
Em uma nova revisão, com debate, alguns problemas, maiores que as próprias contradições estruturais, se manifestam: o desfecho imposto por David Cardoso, por exemplo, que contradiz a lógica anterior do enfrentamento entre os personagens. No geral, entretanto, a autoralidade candeiasiana e a base teatral validam a narrativa muito forte sobre um período atroz de nossa história. O personagem masculino é bem construído em sua ojeriza e Vera Gimenez consegue se impor como freira descobrindo que amar a Deus requer prática. O uso da trilha musical, a montagem elíptica e a fotografia do próprio Candeias são agrados à parte, bem como a averiguação das obsessões bestiais do realizador, que sempre expõe como as agruras do ambiente tendem a desumanizar os indivíduos. Incômodo e problemático, mas indubitavelmente ótimo! (WPC>)
Vários amigos acham este o melhor da trilogia. Eu, entretanto, sempre tive uma barreira íntima em relação a ele. Na revisão, acho que entendi o porquê, em lógica de psicologia reversa, visto que vermelho é a minha cor favorita, sou extremamente cinófilo e também passo por questões envolvendo a renúncia de compromissos pessoais em razão de problemas familiares. Zbigniew Preisner comparece com um lindo bolero (executado numa passarela de moda, quem diria?) e Iréne Jacob encanta-nos a cada instante, a cada sorriso, a cada emulação profissional de tristeza... A direção e a montagem são sobremaneira joviais e a personificação de Jean-Louis Trintignant faz jus à sua fama enquanto ícone francês. O vermelho fascina, seduz... As indicações ao Oscar que o filme recebeu são merecedíssimas! Imagino o impacto desta obra para o jovem Paul Thomas Anderson, por exemplo. Lindo: na revisão, emocionei-me bastante! (WPC>)
Dentro da Casa
4.1 554 Assista AgoraRevi por acaso, e senti quase a mesma coisa da primeira vez: o incômodo relacionado ao auto-deslumbramento narrativo irrita, mas as interpretações são tão boas, a direção é tão segura e inteligente, o erotismo subjacente é tão profundo, que, neste segundo contato, aderi à curiosidade irrestrita, acompanhei com empolgação o avançar dos capítulos, não obstante lembrar como tudo terminava. O que só confirma o mantra de que "rever é ainda melhor do que ver". Apaixonei-me por Emmanuelle Seigner, mais uma vez, e estabeleci uma identificação torpe com o personagem de Fabrice Luchini. O uso da trilha musical de suspense é de uma sagacidade estupenda. Ozon sabe o que faz: brinca com diversos gênios de maneira inteligentíssima. Mas o chiste narratológico não segura o roteiro até o fim: tem horas que aquelas conversas entre professor e aluno sobre "as motivações dos personagens" forçam a barra ao extremo, aff! (WPC>)
Solitários
3.9 35 Assista AgoraÉ um crime que este filme não seja mais conhecido. Como alguém que trabalhou quatro anos no telemarketing, identifiquei-me de imediato (se bem que, na Coréia do Sul, a fila de ligações parece bem mais pacata do que aqui, ainda que as cobranças sejam as mesmas). Logo na primeira seqüência, um baque: ao fundo, uma operadora chora, porque foi maltratada por um cliente. Em primeiro plano, uma extraordinária atriz, que brilha até a última aparição em cena. Quando surge a garota novata, tem-se a impressão que o filme render-se-á às convenções típicas de encontros intergeracionais, em comédias românticas. Mas não: o registro dramática é pesadíssimo, a despeito da leveza no tratamento. Identificação total. Surpreendente, Amei! (WPC>)
Um Homem Chamado Flor de Outono
3.4 5Como a maior parte das pessoas, conheci este filme por causa das breves participações de um jovem Pedro Almodóvar, mas é um impressionante José Sacristán quem brilha, num papel extremamente bem escrito e motivador. A primeira hora de filme beira a excelência, sendo muito mais contemporâneo em suas questões e reivindicações que uma reconstituição de época, mas, infelizmente, o terço final, ao focalizar as conseqüências problemáticas de uma subtrama de vingança (verossímeis, entretanto), perde um pouco de seu impacto discursivo, não obstante não prejudicar a qualidade extraordinária do filme, que merece ser bem mais conhecido e divulgado. Os números musicais são esplendorosos, bem como os diálogos entre o personagem-título e a sua mãe. Lindo! (WPC>)
A Metade de Nós
3.5 1A voz de Denise Weinberg impressiona desde o primeiro instante, bem como a ternura de Cacá Amaral. Os dois atores estão ótimos em cada aparição na tela, mas o roteiro modesto torna-se um pouco dispersivo quando focaliza nas intenções vingativas da mulher ou nas experiências sexuais do idoso. Nada que atrapalhe a nossa imersão emocional ou o nosso carinho pelos personagens. Torcemos para que eles superem o luto, que eles voltem a morar juntos, que eles conheçam efetivamente o filho falecido... A seqüência final é magnífica! (WPC>)
Corpo Celeste
3.5 12 Assista AgoraQue diretora impressionante: realizar um trabalho tão brilhante logo na estréia! Suas marcas registradas estão evidentes em cada filigrana: a maravilhosa condição de atores não experientes (principalmente, os infantis), a abordagem social, a quebra de expectativas de gêneros... Só melhora a cada instante, culminando num momento epifânico, em seu desfecho de simultânea ode e criticidade ao poder congregador da fé. Expõe as contradições, claro, mas não rejeita as vantagens do gregarismo. As interações familiares são ótimas. Lindo demais! (
impossível não ficar traumatizado com o que ocorre aos gatinhos, infelizmente)
Stefano Junior
4.5 1Trata-se de um filme que, até algumas semanas, eu sequer ouvira falar e, de repente, descubro que é um dos favoritos das novas gerações macmahonianas. É uma evocação tardia do neo-realismo, em chave um tanto televisiva, mas não menos contundente ou discursivamente genial: o garoto protagonista é muito expressivo em sua aparente inexpressivo e as situações que ele vivencia são carregadas de dramaticidade, na condução quase anticlimática da narrativa. Extraordinário: valida o fuzuê crítico e espectatorial através de seus próprios méritos! (WPC>)
A Alegria é a Prova dos Nove
2.5 2Sou apaixonado pela Helena Ignez, claro, e admito que, mesmo quando ela se repete ou resvala em obviedades "marginais", ela contorna as arestas defeituosas de suas obras com uma entrega intensa à temática e numa legítima celebração da amizade e do amor. Aqui, entretanto, parece que ela não se esforça muito: sabe que será elogiada e aplaudida por seus pares e, como tal, despeja uma série de vinhetas - ora engraçadas, ora reflexivas - que trazem à tona temas que ela já abordara em seus longas-metragens anteriores. Gosto do primeiro segmento e do "cemitério de memórias" que explica o trocadilho sobrenominal com a Agnès Varda e achei interessante a entrada em cena do palestino virgem. Mas o terceiro segmento soou-me como uma piada de mau gosto, exacerbando as contradições classistas de sociológicos holísticos que se deliciam tomando champanha em 'resorts' praianos enquanto lamentam haver tanta fome no mundo. O derradeiro segmento, com aquela dança um tanto cansada, apesar de intencionalmente orgíaca, não funciona, não possui o elã erótico que a protagonista estimula - já que, afinal, trata-se de uma meta-encenação. Inserir a defesa da maconha via catolicismo e despejar tantas referências suficientemente bem-quistas (de Oswald de Andrade a Betty Dodson, passando por Arthur Rimbaud, imagens antigas filmadas pelo Rogério Sganzerla e Lou Andreas-Salomé, entre tantos outros) pareceram soluções falhas, tornando a segunda metade do filme sem o vigor que a diretora deseja emular: é um filme sobre o cansaço de quem é sobremaneira aplaudido, infelizmente. A ayahuasca azedou antes do orgasmo que não chega, infelizmente! (WPC>)
Corpo e Alma
3.9 15 Assista AgoraJá estava preparando o textão arrebatado, prestar a grafar OBRA-PRIMA em letras maiúsculas, mas fiquei muito incomodado com a seqüência final, com a resolução que sabemos não ser definitiva, ainda que, para os propósitos do filme sob o 'star system', o tenha sido. Um defeito menor, entretanto: na prática, creio que quase todos nós faríamos a mesma coisa que os personagens evolvidos. É um dramalhão mui realista, que supera com louvor as limitações de gêneros e convenções narrativas de época. A personagem da mãe, rejeitando o estereótipo da judia usurária, é maravilhosa, bem como as demais personagens femininas. John Garfied está maravilhoso e mui sensível como o protagonista atolado de erros, combinando as vitórias no ringue com derrotas pessoais, mas ele é eclipsado pelas magníficas participações ao seu redor, com destaque para o sensível aproveitamento actancial do ex-boxeador Canada Lee. Não tinha como este filme dar errado, aliás: o fotógrafo é James Wong Howe; o roteiro foi escrito por Abraham Polonsky; Robert Aldrich é o assistente de direção; a montagem mereceu o Oscar que recebeu; e Robert Rossen revela-se muito mais que um artesão, no filme quintessencial sobre boxe. Esplêndido e desolador! (WPC>)
Symbiopsychotaxiplasm: Take One
4.6 4Até um dia desses, eu sequer conhecia o diretor. O descobri num documentário da Netflix sobre a história do cinema negro e fiquei fascinado por esse título, pela agudeza da proposta. Vendo o filme, finamente, percebi que a execução é realmente ambiciosa em seus propósitos: há uma problemática interna, no relacionamento entre os personagens do casal (que se divide em três pares de intérpretes, mais ou menos como FLERTE, do Hal Hartley), sobre as conseqüências dolorosas de um marido que não assume as suas tendências homossexuais. Fala-se sobre sucessivos abortos de maneira corajosa e audaciosa. Não há pudores acerca das intervenções de transeuntes, seja o policial, seja aquele sem-teto lúbrico e intelectualizado. Na trilha musical, Miles Davis. Tinha tudo para ser a obra-prima experimental que estas informações anunciam, mas o excesso de digressões envolvendo comentários demorados sobre a própria feitura do filme dirimem um pouco do espanto e da excelência do projeto (as conversas da equipe sobre a incompreensão dos intentos do diretor, por exemplo). Seja como for, uma descoberta acachapante: filmaço a ser disparado com muito entusiasmo para quem amamos. Uau! (WPC>)
Chime
3.7 2Que o Kiyoshi Kurosawa é um mestre das tensões e um gênio estilístico, não se nega mais. Porém, achei que, aqui, o exercício muito bem realizado se esvai antes que a proposta seja direcionada a um encaminhamento tramático propriamente dito: pareceu-me apenas um 'trailer', uma publicidade estendida que não deixa claro o que está sendo efetivamente vendido: autoralidade per si? Seja como for, é um trabalho muito bem interpretado, com excelente fotografia e desenho de som, momentos assustadores e perturbadores e muitas pistas falsas (o empréstimo solicitado pelo filho e a obsessão da esposa pelas latas de refrigerantes, à frente). Amei e me inspirei na paciência docente do protagonista, sobremaneira indulgente em relação aos pantins de seus alunos culinários. Até certo ponto, entretanto... Tecnicamente irrepreensível, mas enredisticamente pendente. Seria intencional? Talvez eu ame o filme numa revisão ou numa retrospectiva/maratona da carreira do cineasta, mas, neste primeiro contato, o média-metragem não funcionou tanto comigo, infelizmente! (WPC>)
A Filha do Palhaço
3.7 2Primeiro questionamento: por que o diretor, responsável por obras tão originais, em oportunidades anteriores, resolveu render-se a um filme tão convencional, formulaico e atravessado pelas piores convenções familiares? Graças aos créditos de encerramento, sabemos que ele é parente de um humorista muito famoso no Ceará, que serviu de inspiração para o protagonista. Porém, isso não é suficiente para justificar o cabedal de equívocos aqui deslanchado: durante a projeção, sento muita vergonha alheia. Fazia tempo que eu não ficava tão incomodado durante uma sessão, por causa das interpretações retraídas, artificiais... Felizmente para o meu relacionamento com o filme, notei que isso tem a ver com a diegese, já que é uma narrativa sobre as tentativas de pertencer em ambientes de aparente repulsa/expelição inicial. O personagem de Démick Lopes comete erros o tempo inteiro e segue equivocado em sua impercepção de alguns deles (o desfecho, em sua forçação de barra melodramática, é vexatório!), mas isso também tem a ver com um subtexto tramático, de maneira que o filme, em seus equívocos, assume os erros dos personagens e, tanto um como os outros merecem novas chances e o nosso apoio espectatorial. Jesuíta Barbosa aparece como mero chamariz de público, mas demora a demonstrar-se orgânico, em relação ao que ocorre ao redor dele. Amei a trilha musical, repleta de artistas alternativos, e, em meu incômodo extremo, flagrei-me pensando em minha própria vida, em minhas escolhas, em meus anseios e frustrações. E, mais uma vez, o filme é sobre tudo isso. Funciona, portanto. Principalmente quando é permitido algum respiro circunstancial, para além das cenas de pretenso impacto, ostensivamente falhas (o que ocorre na discussão da praia e no hospital é lamentável, de tão mal executado. Idem para o surgimento da mãe, em determinado momento). A sessão terminou há algumas horas, mas sigo pensando no filme, com um carinho maior que as minhas irritações. Até deu vontade de revê-lo, devidamente acompanhado. Sigo crente no diretor, ressalto. Mas realmente torço para que ele se afaste dessas narrativas mais tradicionais (nos dois sentidos do termo, incluindo o pior deles). Sigamos! (WPC>)
A Estrela Cadente
2.7 4Estranhamente, eu não conhecia esta dupla genial de realizadores - e, em meu primeiro contato tardio, fui arrebatado, fiquei apaixonado: os números de dança são magníficos, as autocitações são ótimas, a reverência a Jacques Tati, Aki Kaurismäki e Roy Andersson é evidente, e o modo como a trama se desvela é magistral, inclusive no que tange às questões políticas (vide as oportunas menções a greves, por exemplo). Amei a trilha musical (Birds on a Wire, já sou fã de vocês!) e Kaori Ito merece ser aplaudida de pé: que mulher impressionante! Filmaço, gente. Não desperdicem a oportunidade de conferi-lo: quero tirar o atraso quanto aos trabalhos prévios dos realizadores, o quanto antes! (WPC>)
Love Lies Bleeding: O Amor Sangra
3.6 136Não sabia direito o que esperar: gostei muito do título e percebi que muitos amigos tinham apreciado, de modo que já tinha o interesse suficientemente despertado. Ainda não vi o longa-metragem anterior da diretora, mas, pelo que percebi aqui, ela domina com profusão as convenções do gênero. Os admiradores de David Cronenberg e Julia Ducournau devem ter ficado muito felizes com os resultados, bem como os fãs de Nicolas Winding Refn, com quem o estilo da diretora é deveras assemelhado. Ed Harris e Jena Malone estão ótimos em papéis intencionalmente caricaturais, mas as grandes interpretações são as das duas protagonistas, tão opostas e complementares como Yin e Yang: que Kristen Stewart é uma ótima atriz, todos nós já sabemos, mas não conhecia Katy O'Brian, fiquei impressionado com a sua ótima presença em cena, com a sutileza de suas transformações (emocionais, não apenas explicitamente corporais). A trilha musical sintetizada de Clint Mansell é ótima, bem como a utilização de múltiplos tons rubros na fotografia. Causa algum estranhamento o fato de quase tudo naquela cidade ter a ver com três ou quatro personagens (neste sentido, o filme possui uma aparência obliquamente teatral similar à de KILLER JOE - MATADOR DE ALUGUEL), mas é um aspecto que não atrapalha os ótimos efeitos cinematográficos: o que ocorre naquele surpreendente e alucinógeno desfecho é acachapante. A-do-rei! (WPC>)
Na Cama com Victoria
3.0 32 Assista AgoraComo estou assistindo aos filmes desta diretora em ordem cronológica invertida, está havendo também a constatação de uma ordem decrescente de qualidade. O que não chega a ser demeritório, visto que seu domínio do roteiro com múltiplas camas e do elenco impressionam a cada novo contato. A envergadura assumidamente cômica desta obra possui um cariz auto-indulgente, o que talvez explique o porquê de ele não ter me fisgado tanto quanto os dois longas-metragens posteriores: é como se, ao explicar que beleza e inteligência são critérios que chamam a atenção do júri, a protagonista me fizesse suspeitar do meu fascínio pelas situações amorais trazidas à tona. A personagem é ótima, as situações são sempre críveis, as aparições animais são magistrais e o desfecho é conciliador, afinal, mas , no saldo geral, senti falta das pontas soltas que tornar-se-ão o grande apanágio do estilo trietiano. Incrível como, numa obra ainda curta, ela já conseguiu se consolidar autoralmente: nasceu pronta! (WPC>)
Um Dia Nossos Segredos Serão Revelados
3.4 5Há muito nas entrelinhas do roteiro: como a protagonista é uma leitora compulsiva, ela nos treina para que leiamos também. Neste sentido, faz sentido que tantos espectadores tenham notado reverberações de romances famosos, além das próprias discussões internas sobre "Os Irmãos Karamazov". Gostei de como a ambientação político-nacional reflete a pós-adolescência da personagem, mas, depois de certo momento, começou a ficar repetitiva e não mais tão interessante o ciclo de atração e repulsa entre a jovem e o vizinho mais velho de seu namorado. A fotografia perenemente alaranjada fascina, também, pelos subtextos comparativos, já que faz o trigo rimar com o crepúsculo, com os cabelos loiros da protagonista e com o papel de parede do quarto de Henner. Começar com Depeche Mode e terminar com Patti Smith foi uma ótima sacada da diretora. Mas o filme estendeu-se onde talvez nem precisasse e subestimou o potencial reflexivo das conversas familiares, das múltiplas distinções (cidade x campo, RDA X RFA, etc.) que atravessam a trama... Seja como for, possui calor, que eventualmente redunda em febre. É agradável, ajuda-nos a refazer as pazes com memórias de juventude. E estimula-nos a voltar aos clássicos da Literatura mundial! (WPC>)
Pérola
3.5 27Que o Murilo Benício é um ótimo e versátil ator, não se nega. Mas, como diretor, infelizmente, está optando pelas execuções mais equivocadas possíveis. Aqui, por exemplo, a indefinição do ritmo cômico faz com que o filme pareça um pasticho mui piorado de MINHA MÃE É UMA PEÇA - O FILME, sem o mesmo talento na composição de personagens: é tudo exageradamente caricato, insuportável de ser acompanhado. A montagem alinear é horrenda, a concepção do álter-ego do dramaturgo é péssima (que atorzinho inexpressivo!) e a pretensa homenagem à maternidade é tolhida no próprio projeto, pela maneira abjeta e oportunista com que a personagem-título trata a mãe, que sequer aparece... É um retrato cômico (mas sem graça) sobre os estereótipos de classe e sobre os apanágios egoístas e egocêntricos dessa conjuntura. Não se consegue entender adequadamente os conflitos de personagens secundários (a traição conjugal perpetrada por uma das tias, por exemplo), de tão mal desenvolvidos que estes são. E o narrador revela-se alguém progressivamente desinteressante e mui desagradável: não conheço a origem teatral desta produção, mas, por este roteiro, é difícil imaginar que ele tenha se convertido num autor tão consagrado. Esforcei-me para gostar de algo no filme, mas é tudo degringolado, histriônico, disfuncional... Uma pena! (WPC>)
Sagrada Família
3.0 4Foi o meu primeiro contato com o diretor, e já fiquei sumamente apaixonado: por mais que a sinopse direcione-nos para uma determinada trama, o que se descortina diante de nossos olhos (e, sobretudo, ouvidos) é extremamente radical, múltiplo, polifônico. A montagem de sons desta obra é uma das coisas mais geniais que existem! Vi o filme com minha mãe, que temeu ficar tonta, tamanha a quantidade de 'travellings' circulares, tão longos quanto brilhantes. Confirmando a associação do Cinema Marginal (ou melhor, pós-Novo, como bem dizia o Carlos Reichenbach) às estradas vazias, aqui, elas abundam: a migração ocorre da cidade grande para o interior, num percurso que faz completo sentido, em relação às intenções do diretor, que é mineiro. Não o conhecia: descobri esta obra-prima por conta de seu falecimento, e fiquei alucinado. Pereio está gostosíssimo como personagem maladro. Minha mãe ficou espantada com a quantidade de livros nos cômodos. Tudo aqui é genial: Maria Gladys deve ter ficado felicíssima com a menção nos ótimos e mui coloridos créditos de abertura. Um novo mundo abriu-se para mim, em pleno Brasil. Ôba! (WPC>)
Antes Que Tudo Desapareça
3.4 32Que filmaço é esse?! Como é que eu pude ficar tanto tempo sem conhecê-lo?! A cada obra do Kiyoshi que eu descubro, fico mais e mais impressionado com a maneira como ele mescla as convenções de diversos gêneros. Porém, o que ele faz aqui é ainda mais acachapante: pense num filme surpreendente, com as reviravoltas mais impensáveis... O elenco é ótimo e a direção entrega-nos seqüências longas e impressionantes (vide o que ocorre no hospital). O mote de invasão alienígena é pretexto para valiosas reflexões sobre relações humanas, incluindo uma crise marital e um contexto empregatício mui abusivo. Os efeitos visuais são magistrais, bem como a maneira esplêndida com que os "possuídos" pronunciam, de maneira intencionalmente inexpressiva, elucubrações existenciais de alto calibre. Magnífica descoberta, fui arrebatado! (WPC>)
Trama Sinistra
3.5 29Não sou muito aficcionado por gatos, de modo que apreciei de imediato o ponto de partida tramático, afinal dividido em três episódios: é incrível como os felinos estão associados ao terror, né? O segmento que intersecciona os episódios é um tanto exagerado, no que tange à exigência de verossimilhança para os relatos literários trazidos pelo personagem de Peter Cushing, mas é divertido vê-lo interagindo com Ray Milland. O primeiro episódio, mais aterrorizante efetivamente foi o meu favorito. O segundo é um interessante conto de perversão infantil. E o terceiro adere a uma perspectiva mais cômica. Cada um dos três possui o seu charme peculiar. Um passatempo divertido! (WPC>)
Mortalmente Perigosa
4.1 39 Assista AgoraRevi com minha mãe, a propósito convidativo de um debate em cineclube, e foi ótimo vê-la torcer pelos mocinhos/bandidos (leia-se: anti-heróis): por mais radicalmente anti-armamentista que minha mãe seja, em diversos momentos ela queria que os personagens matassem seus perseguidores, de tão entusiasmada que ela ficou. Há inúmeras possibilidades de interpretação freudiana para as situações do filme, com destaque para aquela abertura explícita e magistral. A voz de Peggy Cummins é sumamente sedutora: que mulher linda, como não se apaixonar imediatamente por ela? Trata-se de um filme pioneiro e mui subversivo, que aborda as questões fetichistas de maneira originalíssima e enfatizando a complementaridade requerida por determinadas ações, sobremaneira quando de ordem criminosa. A seqüência final - idílica e desoladora, ao mesmo tempo - é excelente. Em minha opinião empolgada, uma obra-prima absoluta! (WPC>)
Wish: O Poder dos Desejos
3.0 170 Assista AgoraOuvi tanta gente falando mal, que adentrei a sessão sem quase nenhuma expectativa. Mas, tanto como ocorreu em ENCANTO, fui logo atraído pelas belas canções com acento hispânico. Havia algo de promissor na narrativa, que atualizava questões tanto do Velho Testamento quanto de MILAGRE EM MILÃO, no que tange a livre-arbítrio e questões afins. Mas, de repente, tudo se perde numa narrativa insossa, sem desejo ou paixão, tão artificial que parece uma mera costura forçada para acrescentar as auto-referências a inúmeros outros longas-metragens clássicos da Disney. Será que o roteiro foi escrito com o auxílio de Inteligência Artificial? É o que parece! Tanto que a reviravolta não convence muito, além de eu ter achado o personagem do bodinho falante (com voz grave) inconveniente e destoante. Os momentos isolados de candura compensam o saldo geral entretanto: minha mãe, por exemplo, adorou! (WPC>)
Na Cama com Madonna
3.7 152Este filme marcou a minha pré-adolescência: foi a primeira vez na vida em que ouvi a palavra "orgasmo" e que apresentou-me a uma artista que, naquela época, já era completa, já podai ser considerada imortal. após o show arrebatador do último sábado, no Brasil, resolvi voltar a este documentário seminal, e percebi muitas similaridades cênicas. Os depoimentos são ótimos, bem como a demonstração das vocações maternais da cantora, que tratava a seus dançarinos como filhos. Ela não hesita em se exibir como caprichosa, mimada e um tanto infantil nalguns momentos, mas tudo isso é justificado pelas diversas falas sobre a necessidade de ser amada. As situações envolvendo os seus familiares, no show em Detroit, também explicam muito sobre ele. Idem quanto aos encontros com Kevin Costner, Pedro Almodóvar, Antonio Banderas e o relacionamento com Warren Beatty. A despeito da longa duração, é um filme muito gostoso de ser visto, principalmente quando se é fã da estrela titular. Muito bom perceber quão fiel a si mesma ela permaneceu, trinta e três anos depois que ela própria tinha ainda 33 anos. Adorei! (WPC>)
A Freira e a Tortura
3.0 17Em uma nova revisão, com debate, alguns problemas, maiores que as próprias contradições estruturais, se manifestam: o desfecho imposto por David Cardoso, por exemplo, que contradiz a lógica anterior do enfrentamento entre os personagens. No geral, entretanto, a autoralidade candeiasiana e a base teatral validam a narrativa muito forte sobre um período atroz de nossa história. O personagem masculino é bem construído em sua ojeriza e Vera Gimenez consegue se impor como freira descobrindo que amar a Deus requer prática. O uso da trilha musical, a montagem elíptica e a fotografia do próprio Candeias são agrados à parte, bem como a averiguação das obsessões bestiais do realizador, que sempre expõe como as agruras do ambiente tendem a desumanizar os indivíduos. Incômodo e problemático, mas indubitavelmente ótimo! (WPC>)
A Fraternidade é Vermelha
4.2 440 Assista AgoraVários amigos acham este o melhor da trilogia. Eu, entretanto, sempre tive uma barreira íntima em relação a ele. Na revisão, acho que entendi o porquê, em lógica de psicologia reversa, visto que vermelho é a minha cor favorita, sou extremamente cinófilo e também passo por questões envolvendo a renúncia de compromissos pessoais em razão de problemas familiares. Zbigniew Preisner comparece com um lindo bolero (executado numa passarela de moda, quem diria?) e Iréne Jacob encanta-nos a cada instante, a cada sorriso, a cada emulação profissional de tristeza... A direção e a montagem são sobremaneira joviais e a personificação de Jean-Louis Trintignant faz jus à sua fama enquanto ícone francês. O vermelho fascina, seduz... As indicações ao Oscar que o filme recebeu são merecedíssimas! Imagino o impacto desta obra para o jovem Paul Thomas Anderson, por exemplo. Lindo: na revisão, emocionei-me bastante! (WPC>)