As reviravoltas deste filme são tão impressionantes e o roteiro é tão impressionante na demonstração daquilo que está contido em seu título, que, não tem jeito: não importa quantas vezes o revejamos, o impacto é sempre como se fosse a primeira vez. Dá pena do personagem de Tom Neal, tadinho, mas a espiral de azar só tende a crescer. Ann Savage é a vilã de filme 'noir' que todos nós queremos e tememos. Incrível o que o diretor faz com um orçamento reduzido e condições céleres de filmagem. Magnífico em cada detalhe e traumatizante na maneira como surgem os relatos de agressão de violência dos personagens, caramba! (WPC>)
A direção e o roteiro estragam todas as possibilidades que este filme tinha de ser muito interessante, enquanto análise ambivalente das interferências de 'coaches' nas vidas de pessoas deprimidas e/ou exploradas por outrem. Gosto das interações nos grupos de apoio e de como o personagem de Nicholas Hoult lida com as suas inseguranças subservientes. Porém, quando a personagem de Awkwafina entra em cena, extremamente caricatural, a trama desanda, no sentido de que começa a haver muita competição quanto ao mote tramático principal. Ou seja, além do ótimo ponto de partida contido no título brasileiro, há a briga de gangues e a corrupção policial, de um lado, e a abnegação de duas irmãs para vingar a morte injusta do pai policial. Tudo isso em meio a muito sangue e piadas fora de tom. Minha mãe divertiu-se, ao meu lado, e, volta e meia, eu sentia que o filme poderia render bastante, o que continua a ocorrer entre uma ou outra brecha de banalização psicanalítica. Nicolas Cage ao menos se diverte, ainda que a ovação da "crueldade pela crueldade" não faça sentido na caracterização de seu personagem. Gostei das inserções de sua imagem em versões antigas de produções com o personagem Drácula (risos). (WPC>)
Meus contatos anteriores com a diretora não são dos melhores, no sentido de que suas intenções sempre descambam para as festividades e, por extensão, celebração das benesses classistas dos seus personagens. Aqui, de fato, tem-se isso logo no início, no aniversário da mãe das protagonistas. Mas o roteiro é direcionado para a "correção" do relacionamento entre as duas personagens fraternais, o que descamba para uma interessante tônica feminista, do meio para o final, culminando num desfecho positivamente empoderado(r). A química entre as duas atrizes principais é descontínua, mas acertada (até porque isso é abordado internamente): gosto muito da Tatá Werneck (por mais que, às vezes, seja difícil compreender o que ela está falando), enquanto a Ingrid Guimarães realmente se esforça para compor uma mulher com sentimentos tridimensionais. A aparição do personagem de Leandro Lima, neste sentido, é importante enquanto catalisador orgástico. Minha mãe, que viu o filme ao meu lado, riu bastante, o que confirma o sucesso da obra, em termos de alcance de público. E Arlete Salles cumpre com dignidade a sua participação, conferindo toques de reflexões adultas a uma obra que não é tão rasteira quanto a sua divulgação faz parecer: em meio a todos os seus vícios discursivos, há algo de inovador e bem-vindo, ao questionar a fidelidade excessiva das donas-de-casa abnegadas. Quem diria? (WPC>)
Antes da sessão, comentei com um dos co-diretores (que repassou-me o arquivo com o filme) que não um dos maiores admiradores do cinema estrutural, subgênero ao qual ele relacionara o filme. Para além das características elementares deste tipo de filme, a sinopse ora acostuma (em relação à qual não tive acesso antes da sessão) demonstra uma intenção mais explícita, quanto ao viés analítico da obra. Não há nada escrito na tela, contextualizando o título/cenário. Para quem nunca foi a Indaiatuba, por exemplo, a fazenda apresentada poderia ser uma senzala antiga, abandonada, e imaginamos os gritos de muitas pessoas maltratadas e exploradas naqueles ambientes. O filme, porém, joga com uma relação entre espaço físico criado pelo homem e a natureza circundante: as plantas insistem em brotar em meio aos tijolos e linhas de trem. Gostei muitíssimo de como o som direto aproveitou a importância e a beleza do canto dos pássaros e farfalhar das folhas. O céu alvo impressiona, inclusive pelo modo se movimenta. Somos testemunhas do tempo em ação, em curso. Mas algo incomodava-me, no que tange à impressão de que aqueles lugares foram palco de exploração do trabalho alheio. Até que um enorme trem corta a tela, numa seqüência que funciona como clímax. A despeito de um eventual mal-estar concernente ao meu problema com o subgênero (sinto falta de ver pessoas e, aqui, achei o projeto pouco discernível na prática da montagem), é um filme divertido de ser visto, é agradável assistir às nuvens que passam, enquanto marimbondos e pássaros eventualmente são captados pela tela. Não é um trabalho que me cative, como eu suspeitava, mas agrada em suas entrelinhas (exceto pelo que a minha imaginação histórica fez divagar quanto ao passado do lugar que eu não conhecia), de modo que, sim, não apenas eu parabenizo os diretores como agradeço à confiança depositada em nós, espectadores. E viva o cinema super alternativo produzido no Brasil! (WPC>)
Quando vi o 'trailer', pensei que divertir-me-ia: gosto da Sydney Sweeney e achei o seu parceiro de cena muito bonito. Mas a seqüências de abertura já denunciou onde o filme falharia radicalmente: na sua ode à falta de comunicação como algo divertido (não é). Além de a suposta vontade de urinar da protagonista revelar-se inconvincente, o modo como é alimentando o desentendimento entre os dois futuros amantes é vexatório, o que só piora a cada aparição gaiata do estranhamente assexuado personagem Pete, cujas ações estão todas voltadas para os encontros amorosos de outras pessoas. As piadas envolvendo as desavenças entre os protagonistas não repetitivas e, por mais que se mostre os corpos seminus deles, tudo é feito de maneira frígida, sem tesão. É como se o sexo fosse algo destrutivo, tal qual chega a insinuar Pete acerca da geração 'hippie' de seu padrasto, vivido de maneira caricatural por Bryan Brown. Fiquei triste ao perceber Rachel Griffiths e Dermot Mulroney reduzidos a personagens paspalhos e irritantes. A vendabilidade do conforto associado aos benefícios de classe (verdadeiro tema do filme) assume píncaros cada vez mais nojosos à medida que os ensaios para o casamentos são desenrolados. E o que já era muito ruim torna-se pior: o para que o casal adira à previsível reconciliação, é preciso difamar ainda mais as pessoas (e/ou possíveis concorrentes à sua volta). Não vou mentir que gostei de alguns aspectos, como as frases de efeito espalhadas pelo cenário ou o retorno a seqüências-chave da trama, ressiginificadas na cantoria coletiva do desfecho. Mas é tudo muito, muito ruim, de dar medo, tamanho o seu investimento propagandístico acerca do luxo e das referendações institucionais do envolvimento romântico entre as pessoas. Para mim, hediondo. Nem a suposta atualização de uma comédia shakespeareana serviu: péssimo em nível abissal. O diretor é ostensivamente inábil naquilo que pretende: e tome-lhe câmera girando enquanto os protagonistas se beijam mecanicamente, aff! (WPC>)
Ainda não li a novela do Robert Louis Stevenson, mas está aqui, em lugar privilegiado em minha lista. Sou obcecado pela versão do Robert Mamoulian e fiquei impressionado pelo elenco reunido, mas a direção do Victor Fleming não extrai a expressividade prometida a partir das situações descritas: achei o filme seco, impessoal, desenxabido: o protagonista é bem delineado, nos diálogos iniciais, mas, depois, resume-me a uma caracterização burocrática de uma malvadeza direcionada e exclusivista; Lana Turner pareceu-me francamente subaproveitada; e Ingrid Bergman brilha, extrai pujança dramática correspondente à sua personagem, de modo que os melhores momentos do filme são quando ela está em cena. Mas, mesmo assim, é insuficiente para resgatar a maestria do trabalho como um todo, visto que o Fleming age como um realização em linha de produção, dá para perceber na tela a quantidade de vezes em que ele ensaiou, esvaziando a trama daquilo que ela tem de mais intensa. Achei o filme interminável por vezes, queria que acabasse logo. Talvez numa revisão sem tantas expectativas funcione melhor. Nalgum momento, quiçá após a leitura do livro, hei de revê-lo. Por ora, não funcionou muito! :( - WPC>
Que filme belíssimo! Estava precisando muito de uma trama lenta e intensa (em sua carnalidade) como essa, em que os personagens se encontram, se amam e seguem as suas vidas, como ocorre com muitos de nós (ou todos nós) no frenesi contemporâneo, sob a égide do capitalismo urbano. A fotografia é calorosa, acolhedora, e a trilha musical de Lucas Carvalho direciona a cadência da montagem, perpetrada pelo próprio diretor. É um filme permanentemente musicado, que traduz em imagens e sentimentos os versos da canção de Dona Ivone Lara, que a protagonista entoa num momento-chave. Shrilene Paixão está ótima em cena, mas é Welket Bungué que nos apaixona ainda mais a cada aparição: que homem lindo e talentoso, sutil na delicadeza da expressões e falas, olhares e movimentos. Fiquei encantado ao longo do filme inteiro, amei o seu ritmo compassado, a ausência de teleologia no desenrolar da narrativa. Encontra-se, desencontra-se e os ciclos recomeçam: é assim em nossos empregos, é assim na rotina da vida. Belíssimo! (WPC>)
Fiquei muito surpreso com algo que acontece no meio dos créditos finais, uma imagem que justifica muitas das opções estéticas da narrativa (que o cenário seja Curitiba, por exemplo). Não entendo o porquê de esse filme ter sido tão atacado por alguns críticos: o achei muito eficiente enquanto exercício de gênero, trazendo para o Brasil situações comuns em Hollywood, na década de 1990, no mesmo clima de A MÃO QUE BALANÇA O BERÇO, por exemplo. Fico impressionado com a versatilidade do José Eduardo Belmonte, ainda que, sendo tão prolífico, ele ainda não consiga ostentar um estilo próprio. Mas é um artesão hábil, que equivoca-se, aqui, ao optar por iniciar o filme com situações de seu desfecho (afinal, em aberto). Nem precisava: a mudança de perspectiva sobre a suspeição do cônjuge ocorre de maneira interessante na trama, por mais que, no início, pareça-se julgar excessivamente a personagem de Grazi Massafera, tanto quanto os demais personagens também o faziam. Não achei as interpretações do casal central ruins: pelo contrário, são eficientes no jogo de aparências que trazem à tona, o que ganha mais pontos com a verve ostensivamente antibolsonarista do roteiro. Por vezes, senti-me positivamente perturbado. É um filme que merece encontrar o seu público, portanto: de minha parte, recomendo-o com entusiasmo! (WPC>)
Já tinha ouvido falar muito sobre essa dupla de comediantes, mas nunca tive a oportunidade de conferir nenhum de seus filmes. Acho que comecei por um ideal, repleto de 'gags' e trama geral. É o modelo que deu origem às imitações chanchadescas no Brasil, né? Uma ou outra palhaçada (aliás, palhaçadas o tempo inteiro), perseguições frenéticas, um mote romântico entre coadjuvantes e canções afetadas, aqui e acolá. O Abbott é sério demais, pouco engraçado. Mas papouquei-me de rir com o Costello, desde a primeira aparição, e a situação envolvendo o Rags Ragland. Minha mãe estava ao meu lado, e lembrou de quando via estes filmes, em sua pré-adolescência, na década de 1950. O roteiro é mero pretexto para as 'gags' (e canções), mas o filme diverte. Quando entendemos que ele segue à risca uma fórmula bem sucedida, deixamo-nos levar e caímos na gargalhada. A seqüência final, na montanha-russa, é pura ode às aventuras de quem se atrapalha no dia a dia... kkkkkkkkkkkk (WPC>)
Vi o filme por puro acaso, numa exibição na HBO, e achei uma gracinha. 'Pop' e despretensioso, mas não blasfemo, como talvez tenha sido acusado. Tudo bem, não curti os estereótipos trapalhões do Anjo Gabriel e dos Reis Magos, mas as canções são fofinhas, Milo Manheim é apaixonante e Antonio Banderas está divertindo-se à beça, entregando-se à caricatura sem receio e sem medo de ser feliz (ainda que seja o vilão). Foi realmente uma grata surpresa. Sou obcecado por musicais, não tinha como não funcionar comigo! (risos) - WPC>
Ainda que a temática das drogas não apareça aqui, achei este filme muitíssimo parecido com (e/ou influenciado por) TRAINSPOTTING - SEM LIMITES. Não apenas pela relação entre os personagens e pela narração dramático-satírica, mas até mesmo alguns planos e enquadramentos são bastante semelhantes. Como eu vi o primeiro da trilogia de Oslo depois de ter conferido os demais exemplares, decepcionei-me um tantinho: o que é elogiosamente visto e descrito como crueza 'punk' tem também um quinhão mui desagradável de elogio concessivo à masculinidade tóxica. As interpretações são desenvoltas, mas acho na hipertrofia do repentino reconhecimento literário dos personagens incomodou-me: pareceu tão corriqueiro publicar um livro, ser reconhecido por ele, etc. . Por vezes, o vai e vém da narrativa confundiu-me, o que é intencional, mas, no geral, acho que o filme teve mais boas idéias que acertos de execução. É gracioso, mas promete mais do que oferece, enquanto obra imbuída de muito frescor juvenil. Culpa do gélido clima norueguês, talvez. (WPC>)
P.S.: achei o intérprete do Erik muito parecido com o Evan Peters!
A empolgação era extrema: enquanto minha mãe assistia ao filme, na sala, ouvi trechos da fantástica trilha musical, de caráter sinfônico, do Scott Walker e fiquei obcecado para conferir o filme. Com as expectativas nas alturas, fui de fato, arrebatado pela seqüência de abertura e gostei da maneira um tanto distanciada como são retratados as situações políticas e os personagens, não obstante as interpretações intensas de um ótimo elenco. Foi quando a frustração instaurou-se: por mais que a direção me fascinasse, em seu pendor experimental, achei o roteiro óbvio, em seu adlerismo. Reiterativo e redundante, em sua demonstração de que crianças mimadas convertem-se em fascistas, oh! A revelação do desfecho, quanto à origem genética do garoto crescido, pareceu-me igualmente insossa, como a maior parte do que acontece. Tudo bem, concordo que o garotinho Tom Sweet entrega-nos uma potente demonstração do quão irritante um filho único pode ser, mas o filme passa a redundar em círculos, a partir de determinado momento. A empolgação do início fenece, ao final, tudo chafurda numa metáfora previsível sobre um fascismo que é também hodierno. Uma pena. Mas preciso do CD deste filme, uau! (WPC>)
O titulo brasileiro não é infiel à proposta da narrativa, mas é o original que sintetiza melhor as intenções da diretora, ao fazer com que acompanhemos o cotidiano de produção de uma artista que, a princípio, revela-se tão desagradável enquanto pessoa. Foi importante, para isso, o enfeamento da maravilhosa protagonista, uma de minhas atrizes contemporâneas favoritas: não conseguimos sentir simpatia por ela, mas a empatia surge gradualmente, quando compreendemos o porquê de ela ter ficado tão amargurada, convivendo com aqueles familiares tão problemáticos. Hong Chau transforma-se em cada papel que dignifica: ela está maravilhosa aqui, a personificação de diversas amigas formadas em Artes Visuais. Por quase uma hora de projeção, parecia que eu estava desgostando do filme, de seu ritmo lento, do enfoque ostensivo da diretora em anticlímaces (vide quase todas as situações referentes ao cuidado com o pombo), Mas, na seqüência da exposição, tudo se justifica, como objetivo a ser alcançado, como ápice de um processo que, mesmo que continue em aberto ou "em curso produtivo", tanto quanto o filme em si (vide a importância situação dos créditos finais), provoca reações intensas em quem testemunha o percurso de criação, não apenas a obra acabada. É uma trama difícil e, não vou mentir, intencionalmente "chata", mas que cresce bastante em nossa apreciação ao término, quando cozemos interiormente os elementos rigorosamente urdidos pelo roteiro minimalista de uma cineasta caracterizada por este adjetivo. Presumo que, numa revisão, gostarei bem mais: num primeiro contato, ele intimida bastante, assusta-nos pela lentidão, pelo registro da alienação de quem trabalha com arte, mas não consegue administrar adequadamente os prazeres da vida. Uma aula de reeducação espectatorial! (WPC>)
Não sabia o que esperar, exceto uma multiplicação de camadas psicanalíticas e alguma metalinguagem roteirística. a julgar pelo que descobrimos no trabalho mais famoso (e premiado) da diretora. Percebi que ele seria exibido no Telecine Cult e aproveitei a oportunidade. E adorei: no início, demorei um pouco para imergir. Minha mãe, ao meu lado, reclamava que não estava entendendo os vais e véns da narrativa. Mas, de repente, eu estava fascinado, obcecado, apaixonado... Cheguei mesmo a gargalhar, de tão aflitivos que são os ápices dramáticos. Virginie Efira está maravilhosa, mas é eclipsada pelo defsile de talentos: Adéle Exarchopoulos tem o desempenho actancial mais pungente desde AZUL É A COR MAIS QUENTE; Gaspard Ulliel angaria um fascínio repulsivo e crescente, em cada aparição; Niels Schneider encanta pela beleza; e Sandra Hüller está absolutamente soberba. Um exercício de análise, em múltiplas significações para a palavra, trabalho de gênia. Só melhora, quanto mais se complexifica: incrível! (WPC>)
Acho válido o espírito de cooperação que validou a feitura, mas, enquanto discurso, o filme é sobremaneira problemático, no sentido de que, por vezes, parece celebrar aquilo que condena, celebrar a esperteza de quem sobrevive mediante o ludibrio... Percebo que, a despeito de seus evidentes defeitos, o filme seja deveras apreciado, o que talvez tenha a ver com um conhecimento de conjuntura (os espaços destinados às interações juvenis de classe média no Rio de Janeiro), com certa verossimilhança na abordagem e confecção dos personagens. Comigo, nada funcionou: além do mau ritmo e das interpretações forçadas, as reviravoltas à la Tarantino não engrenam, o que só piora pela inserção de uma montagem que reverencia a linguagem televisiva. Repito: que bom que o filme foi feito e distribuído, nas condições possíveis, mas foi difícil chegar até o final, de tão contaminado pela podridão que o roteiro é. Desgostei plenamente, o que lamento. (WPC>)
Ainda não vi O PESO DO TALENTO, mas é evidente que é u filme que pega carona nesta verve superexpositiva do Nicolas Cage. Seu personagem, entretanto, é composto com muita seriedade: apesar de a situação tramática logo se desgastar, e o filme ficar cansativo do meio para o final, em razão de sustentar-se em apenas uma piada, seu personagem é delineado com seriedade dramática, oscilando entre o conscientemente ridículo e o merecedor de piedade. Não chegamos a nos identificar, mas torcemos por ele, no desespero. O clima é de pasticho kaufmaniano, mas a direção não é muito firme, o tom do filme é indefinido, encerrando-se de maneira quase cruel, em sua inevitabilidade melancólica. Funciona melhor depois que a sessão termina, em verdade. A execução de uma canção de Talking Heads, nos créditos finais, ressignifica aquilo que pareceu afoito no decorrer das situações: poderia ser um excelente estudo de personagem, mas o roteiro se desperdiça em piadas neogeracionais, em cacoetes da A24 e no reaproveitamento chistoso de temas que renderam um eficiente filme de suspense no oitentista A MORTE NOS SONHOS. Acho que, numa revisão sem expectativas, funcionará bem melhor... (WPC>)
Assisti aos principais filmes deste realizador supostamente 'trash' em ordem invertida, e fiquei positivamente chocado com o teor psicanalítico dos mesmos. Adentrei a sessão enquanto lidava com uma grava situação familiar, envolvendo um irmão mais novo, de modo que o arrebatamento foi intenso: será que o Frank Henenlotter teve acesso aos meus diários?! Brincadeiras à parte, é maravilhoso como ele consegue tornar tão crível um personagem de látex, fazer-nos experimentar legítimas, que vão do medo ou horror inicial a uma piedade sincera, a uma necessidade de compreensão e entendimento da situação trazida à tona: é um filme sobremaneira triste e melancólico, sobre diversos tipos de solidões, não sendo casual que tenha sido locado em Nova York, numa região consagrada aos artistas "alternativos". De fato, antecipa o mote geral de MALIGNO, do James Wan, mas pensei ainda mais na ambientação scorseseana, que se irmana ao que o cineasta fez em DEPOIS DE HORAS ou em seu episódio de CONTOS DE NOVA YORK. 'Exploitation' é algo premonitório, em âmbito social, afinal. Fui pessoalmente tocado por este filmaço, amei! (WPC>)
Ainda não vi a estréia mui elogiada e cultuada deste diretor, mas, depois deste filmaço aqui, fiquei mais do que curioso! O vi por acidente e fiquei impressionado e apaixonado: além de ser muito divertido e sensual, aborda a questão do vício em substâncias alucinógenas de maneira honesta e até mesmo séria. Os efeitos especiais são ótimos e, mesmo quando adere ao 'trash' assumido, não abonadona a verve reflexiva. Há algo de muito 'camp' nas atuações (minha mãe riu, ao ouvir tantos gritos, desde o início) e o diretor não foi nada econômico na adoção do homoerotismo: a beleza do protagonista Rick Hearst é acachapante e muito bem explorada pelo enredo. Fascinante e aterrorizante, ao mesmo tempo, naquilo que propõe e expõe. Adorei! (WPC>)
Não conhecia nem o romance original nem o filme dele derivado. Ganhei o primeiro de um amigo olavista e demorei bastante na leitura, dada a densidade digressiva da obra. A adaptação ficou famosa pela adoção de muitos 'flashbacks', direcionadas à apreciação num tribunal. Sei que o Duvivier foi atacado enquanto representante do "cinéma de papá", mas demonstrou enorme habilidade na interpretação/adaptação da obra, que ficou sintética e bastante fiel aos propósitos originais: houve apenas a supressão de uma personagem e uma leve (porém capital) alteração no desfecho. Temi que as menções homossexuais fossem abortadas, mas até que elas foram eficientemente transcritas. Há muito mais por detrás da mera abordagem advocatícia, um conflito geracional de proporções violentas que, no romance, deu origem a mais dois livros. Interessante descoberta! (WPC>)
Continuo achando a versão de 1937 a minha favorita, mas compreendo o favoritismo, por parte de vários críticos, sobre esta produção aqui: a extensão da duração é justificada pela intensidade dos envolvidos, pela entrega de Judy Garland a uma condição que ser-lhe-ia muito pessoal. Como tal, enquanto espectador, foi muito pessoal para mim também. A relação entre os dois protagonistas é muito intensa e a intepretação dela é arrebatadora. Tenho um pantim quanto à categorização da obra enquanto musical, já que as canções são excessivamente diegetizadas, enquanto espetáculos efetivados pelos intérpretes, no universo em que eles atuam. Mas como ficar incólume perante o impacto de "The Man That Got Away"? Como sofro de alcoolismo passivo (cuido de alguém que sofre deste mal), o roteiro acerta-me em cheio. E, a cada revisão, refaço as pazes com o estilo cukoriano, cuja afetação demorei para compreender: precisei envelhecer/amadurecer para isso. A lentidão do processo não é casual, há todo um percurso emocional em jogo! Fiquei surpreso ao descobrir que o estratagema das fotos em tom sépia foi uma compensação "póstuma" à retaliação do filme, quando originalmente lançado. Foi algo que impressionou-me bastante no primeiro contato, pensei que fôra intencional (risos). Insisto que não é nem a minha versão favorita nem meu preferido do diretor, mas é um filme que nos afeta intimamente, que marca-nos a partir da identificação proposta! (WPC>)
A direção é um horror: descrente que é em suas próprias imagens, Rodrigo van Der Put tenta desviar-se delas, muitas vezes, o que é hipertrofiado no momento em que os personagens assistem a um programa de TV, em que a tela do aparelho é quase um tabu, nas suas breves aparições. Dá pena perceber Eduardo Sterbitch tão desperdiçado, depois de demonstrar que, sim, é um ótimo ator, e não apenas um comediante obrigado a repetir os mesmos papéis exagerados. Gosto da Polly Marinho (mostrada muito pouco) e achei o garoto Pedro Burgarelli simpaticíssimo, mas a composição "redentora" do pai é atroz, ainda mais vilanaz que a paspalhice do personagem de Daniel Furlan. Quando eu cria que o filme não poderia ficar mais ridículo (como o próprio Cacá comenta), ele vai lá e desce mais alguns níveis, em mau gosto lingüístico (emulando a montagem de Tik Tok e afins) e no puxa-saquismo de classe. Não sei se tinha nojo ou pena daqueles personagens, mas esforcei-me por simpatizar ao menos com as lições morais advindas da convivência forçada entre João e o garoto. Nada se aproveita, entretanto: os clichês convertem-se em estereótipos piorados e trama parece figurante em meio às filmagens de atores e equipe divertindo-se no parque. Trata-se de uma peça publicitária disfarçada de filme infantil. Indefensável, infelizmente! (WPC>)
É estranho que este filme seja tão rejeitado por público e crítico: eu o achei tão oportuno, em termos de ambientação pré-denuncista. Tudo bem, admito que a personagem central é tão narcisista quanto apática e que a sua transformação profissional/publicitária seja um tanto repentina, mas, para quem trabalhou nas mesmas áreas que ela, é algo sobremaneira verossímil. Tom Hanks aparece pouco, bem como John Boyega e Ella Coltrane, e, cada qual a seu modo, estes coadjuvantes possuem aparições marcantes, no fascínio que desencadeiam na protagonista. Mas foi Karen Gillan quem realmente em deixou apaixonado: que mulher linda e carismática! Eu trabalho como atendente num setor de TI há dois anos, e identifiquei-me com diversas situações apresentadas. Concordo que, sim, há algo da estética que se convencionou chamar de "Black Mirror", no desenvolvimento do enredo (afinal, lacunar e suspeitoso), mas acho que ele atualiza de maneira inteligente os cacoetes de MATRIX para a era facebookiana. Particularmente, apesar de decepcionar-me sobremaneira com o desfecho repentino e inconvincente, eu curti este filme. Demais, até! (WPC>)
Temendo que este filme fosse mais um conjunto de clichês em prol do identitarismo, evitei-o por algum tempo, por mais que todos os meus amigos dissessem que era ótimo. Estava sendo exibido num canal pago de TV e resolvi conferi-lo ao lado de minha mãe: adoramos. Ela pulava da cadeira, empolgada, torcendo pela maravilhosa protagonista, esplendidamente vivida pela excelente Viola Davis. De fato, há, sim, muitos clcihês, mas estes são validados pela História, pelas atrocidades do colonialismo. Diferentemente de PANTERA NEGRA - que é um filme que não funcionou comigo, a despeito de suas alegadas "boas intenções" - aqui, temos a aplicação orgânica das questões de classe, gênero e raça, sendo o filme muito efetivo na inserção representativa dessas questões, convertendo-se numa diversão sumamente empoderada. A direção é tão eficiente que consegue tornar atrativas mesmo as barrigadas, as cenas "banais" entre os clímaces. A duração é aproveitada em cada um de seus minutos: conhecemos bem os personagens, deslumbramo-nos perante a reconstituição artística do Reino de Daomé, captamos a magia da trilha musical de Terence Blanchard... Lasanna Lynch é uma fascinante coadjuvante e John Boyega está lindo! Se, de fato, algumas seqüências são extremamente violentas, não se pode negar que isso foi necessário aos propósitos reivindicativos da trama, de maneira que incomodei-me menos com as comemorações bélicas aqui do que em BACURAU, por exemplo. Em sua adesão às convenções de filmes de heróis, o roteiro realmente faz jus à organicidade supramencionada, de maneira que o filme é merecedor dos elogios que recebeu e merece ser ainda mais visto e divulgado, sobretudo em sua potência motivadora, no que tanga à identificação com a galhardia das mulheres negras, guerreiras e emocionais, humanas e intensas, no enfrentamento das dores e compreensão do valor de suas cicatrizes. Impressionante, neste sentido! (WPC>)
Gosto muito da diretora e, vendo este filme - pelo qual esperava há tempos! -, percebi que ela complexifica, em chave feminina, aquilo que o Ang Lee faz internacionalmente, no que tange à abordagem traumatizante da autoridade familiar. Ao invés de uma perspectiva biográfica, ela adere à imersão psicanalítica: o Pedro, além de ser um canalha, é frágil, suscetível, impotente em diversos âmbitos, em contraponto à fama heróica, conservada em diversas estátuas e relatos institucionais. Não lembrava que ele tinha falecido tão jovem (menos de 36 anos) e gostei bastante de como o Cauã Reymond compõe o personagem: não força sotaque, não evita os anacronismos. Parece que ele está ensaiando e esperando o personagem chegar, entrar em seu corpo, o possuir... Isso até ocorre, mas pelo viés da culpa. Adorei a maneira como os vários idiomas (alemão, francês, inglês e iorubá, além do português) surgem no filme e apreciei a preocupação do roteiro quanto aos pequenos atos (comer a sobremesa na cozinha de um navio, por exemplo). O quartel final adere aos 'flashbacks' excessivos e não é tão interessante quanto o começo e o meio, mas imergi no filme, senti-me invadido por aquelas situações, por aquela aflição culposa. O que estranhei é que a perspectiva do relato não fosse necessariamente a de Pedro, o que se percebe em seqüências mais objetivas, como os embates entre o protagonista e seu irmão português ou o desembarque dos escravos, mas, mesmo assim, adorei o conjunto. Como tal, aplaudo a coragem da diretora em levar a cabo um projeto tão arriscado e autoral: que bom que ela ousou. Tem muito a ver com JOAQUIM, outro filme que eu também amo. (WPC>)
A Curva do Destino
3.8 49 Assista AgoraAs reviravoltas deste filme são tão impressionantes e o roteiro é tão impressionante na demonstração daquilo que está contido em seu título, que, não tem jeito: não importa quantas vezes o revejamos, o impacto é sempre como se fosse a primeira vez. Dá pena do personagem de Tom Neal, tadinho, mas a espiral de azar só tende a crescer. Ann Savage é a vilã de filme 'noir' que todos nós queremos e tememos. Incrível o que o diretor faz com um orçamento reduzido e condições céleres de filmagem. Magnífico em cada detalhe e traumatizante na maneira como surgem os relatos de agressão de violência dos personagens, caramba! (WPC>)
Renfield - Dando o Sangue Pelo Chefe
3.2 251 Assista AgoraA direção e o roteiro estragam todas as possibilidades que este filme tinha de ser muito interessante, enquanto análise ambivalente das interferências de 'coaches' nas vidas de pessoas deprimidas e/ou exploradas por outrem. Gosto das interações nos grupos de apoio e de como o personagem de Nicholas Hoult lida com as suas inseguranças subservientes. Porém, quando a personagem de Awkwafina entra em cena, extremamente caricatural, a trama desanda, no sentido de que começa a haver muita competição quanto ao mote tramático principal. Ou seja, além do ótimo ponto de partida contido no título brasileiro, há a briga de gangues e a corrupção policial, de um lado, e a abnegação de duas irmãs para vingar a morte injusta do pai policial. Tudo isso em meio a muito sangue e piadas fora de tom. Minha mãe divertiu-se, ao meu lado, e, volta e meia, eu sentia que o filme poderia render bastante, o que continua a ocorrer entre uma ou outra brecha de banalização psicanalítica. Nicolas Cage ao menos se diverte, ainda que a ovação da "crueldade pela crueldade" não faça sentido na caracterização de seu personagem. Gostei das inserções de sua imagem em versões antigas de produções com o personagem Drácula (risos). (WPC>)
Minha Irmã e Eu
3.1 139 Assista AgoraMeus contatos anteriores com a diretora não são dos melhores, no sentido de que suas intenções sempre descambam para as festividades e, por extensão, celebração das benesses classistas dos seus personagens. Aqui, de fato, tem-se isso logo no início, no aniversário da mãe das protagonistas. Mas o roteiro é direcionado para a "correção" do relacionamento entre as duas personagens fraternais, o que descamba para uma interessante tônica feminista, do meio para o final, culminando num desfecho positivamente empoderado(r). A química entre as duas atrizes principais é descontínua, mas acertada (até porque isso é abordado internamente): gosto muito da Tatá Werneck (por mais que, às vezes, seja difícil compreender o que ela está falando), enquanto a Ingrid Guimarães realmente se esforça para compor uma mulher com sentimentos tridimensionais. A aparição do personagem de Leandro Lima, neste sentido, é importante enquanto catalisador orgástico. Minha mãe, que viu o filme ao meu lado, riu bastante, o que confirma o sucesso da obra, em termos de alcance de público. E Arlete Salles cumpre com dignidade a sua participação, conferindo toques de reflexões adultas a uma obra que não é tão rasteira quanto a sua divulgação faz parecer: em meio a todos os seus vícios discursivos, há algo de inovador e bem-vindo, ao questionar a fidelidade excessiva das donas-de-casa abnegadas. Quem diria? (WPC>)
Pimenta Landscape
2.5 1Antes da sessão, comentei com um dos co-diretores (que repassou-me o arquivo com o filme) que não um dos maiores admiradores do cinema estrutural, subgênero ao qual ele relacionara o filme. Para além das características elementares deste tipo de filme, a sinopse ora acostuma (em relação à qual não tive acesso antes da sessão) demonstra uma intenção mais explícita, quanto ao viés analítico da obra. Não há nada escrito na tela, contextualizando o título/cenário. Para quem nunca foi a Indaiatuba, por exemplo, a fazenda apresentada poderia ser uma senzala antiga, abandonada, e imaginamos os gritos de muitas pessoas maltratadas e exploradas naqueles ambientes. O filme, porém, joga com uma relação entre espaço físico criado pelo homem e a natureza circundante: as plantas insistem em brotar em meio aos tijolos e linhas de trem. Gostei muitíssimo de como o som direto aproveitou a importância e a beleza do canto dos pássaros e farfalhar das folhas. O céu alvo impressiona, inclusive pelo modo se movimenta. Somos testemunhas do tempo em ação, em curso. Mas algo incomodava-me, no que tange à impressão de que aqueles lugares foram palco de exploração do trabalho alheio. Até que um enorme trem corta a tela, numa seqüência que funciona como clímax. A despeito de um eventual mal-estar concernente ao meu problema com o subgênero (sinto falta de ver pessoas e, aqui, achei o projeto pouco discernível na prática da montagem), é um filme divertido de ser visto, é agradável assistir às nuvens que passam, enquanto marimbondos e pássaros eventualmente são captados pela tela. Não é um trabalho que me cative, como eu suspeitava, mas agrada em suas entrelinhas (exceto pelo que a minha imaginação histórica fez divagar quanto ao passado do lugar que eu não conhecia), de modo que, sim, não apenas eu parabenizo os diretores como agradeço à confiança depositada em nós, espectadores. E viva o cinema super alternativo produzido no Brasil! (WPC>)
Todos Menos Você
3.1 368 Assista AgoraQuando vi o 'trailer', pensei que divertir-me-ia: gosto da Sydney Sweeney e achei o seu parceiro de cena muito bonito. Mas a seqüências de abertura já denunciou onde o filme falharia radicalmente: na sua ode à falta de comunicação como algo divertido (não é). Além de a suposta vontade de urinar da protagonista revelar-se inconvincente, o modo como é alimentando o desentendimento entre os dois futuros amantes é vexatório, o que só piora a cada aparição gaiata do estranhamente assexuado personagem Pete, cujas ações estão todas voltadas para os encontros amorosos de outras pessoas. As piadas envolvendo as desavenças entre os protagonistas não repetitivas e, por mais que se mostre os corpos seminus deles, tudo é feito de maneira frígida, sem tesão. É como se o sexo fosse algo destrutivo, tal qual chega a insinuar Pete acerca da geração 'hippie' de seu padrasto, vivido de maneira caricatural por Bryan Brown. Fiquei triste ao perceber Rachel Griffiths e Dermot Mulroney reduzidos a personagens paspalhos e irritantes. A vendabilidade do conforto associado aos benefícios de classe (verdadeiro tema do filme) assume píncaros cada vez mais nojosos à medida que os ensaios para o casamentos são desenrolados. E o que já era muito ruim torna-se pior: o para que o casal adira à previsível reconciliação, é preciso difamar ainda mais as pessoas (e/ou possíveis concorrentes à sua volta). Não vou mentir que gostei de alguns aspectos, como as frases de efeito espalhadas pelo cenário ou o retorno a seqüências-chave da trama, ressiginificadas na cantoria coletiva do desfecho. Mas é tudo muito, muito ruim, de dar medo, tamanho o seu investimento propagandístico acerca do luxo e das referendações institucionais do envolvimento romântico entre as pessoas. Para mim, hediondo. Nem a suposta atualização de uma comédia shakespeareana serviu: péssimo em nível abissal. O diretor é ostensivamente inábil naquilo que pretende: e tome-lhe câmera girando enquanto os protagonistas se beijam mecanicamente, aff! (WPC>)
O Médico e o Monstro
3.6 32 Assista AgoraAinda não li a novela do Robert Louis Stevenson, mas está aqui, em lugar privilegiado em minha lista. Sou obcecado pela versão do Robert Mamoulian e fiquei impressionado pelo elenco reunido, mas a direção do Victor Fleming não extrai a expressividade prometida a partir das situações descritas: achei o filme seco, impessoal, desenxabido: o protagonista é bem delineado, nos diálogos iniciais, mas, depois, resume-me a uma caracterização burocrática de uma malvadeza direcionada e exclusivista; Lana Turner pareceu-me francamente subaproveitada; e Ingrid Bergman brilha, extrai pujança dramática correspondente à sua personagem, de modo que os melhores momentos do filme são quando ela está em cena. Mas, mesmo assim, é insuficiente para resgatar a maestria do trabalho como um todo, visto que o Fleming age como um realização em linha de produção, dá para perceber na tela a quantidade de vezes em que ele ensaiou, esvaziando a trama daquilo que ela tem de mais intensa. Achei o filme interminável por vezes, queria que acabasse logo. Talvez numa revisão sem tantas expectativas funcione melhor. Nalgum momento, quiçá após a leitura do livro, hei de revê-lo. Por ora, não funcionou muito! :( - WPC>
A Matéria Noturna
2.7 2Que filme belíssimo! Estava precisando muito de uma trama lenta e intensa (em sua carnalidade) como essa, em que os personagens se encontram, se amam e seguem as suas vidas, como ocorre com muitos de nós (ou todos nós) no frenesi contemporâneo, sob a égide do capitalismo urbano. A fotografia é calorosa, acolhedora, e a trilha musical de Lucas Carvalho direciona a cadência da montagem, perpetrada pelo próprio diretor. É um filme permanentemente musicado, que traduz em imagens e sentimentos os versos da canção de Dona Ivone Lara, que a protagonista entoa num momento-chave. Shrilene Paixão está ótima em cena, mas é Welket Bungué que nos apaixona ainda mais a cada aparição: que homem lindo e talentoso, sutil na delicadeza da expressões e falas, olhares e movimentos. Fiquei encantado ao longo do filme inteiro, amei o seu ritmo compassado, a ausência de teleologia no desenrolar da narrativa. Encontra-se, desencontra-se e os ciclos recomeçam: é assim em nossos empregos, é assim na rotina da vida. Belíssimo! (WPC>)
Uma Família Feliz
3.4 22Fiquei muito surpreso com algo que acontece no meio dos créditos finais, uma imagem que justifica muitas das opções estéticas da narrativa (que o cenário seja Curitiba, por exemplo). Não entendo o porquê de esse filme ter sido tão atacado por alguns críticos: o achei muito eficiente enquanto exercício de gênero, trazendo para o Brasil situações comuns em Hollywood, na década de 1990, no mesmo clima de A MÃO QUE BALANÇA O BERÇO, por exemplo. Fico impressionado com a versatilidade do José Eduardo Belmonte, ainda que, sendo tão prolífico, ele ainda não consiga ostentar um estilo próprio. Mas é um artesão hábil, que equivoca-se, aqui, ao optar por iniciar o filme com situações de seu desfecho (afinal, em aberto). Nem precisava: a mudança de perspectiva sobre a suspeição do cônjuge ocorre de maneira interessante na trama, por mais que, no início, pareça-se julgar excessivamente a personagem de Grazi Massafera, tanto quanto os demais personagens também o faziam. Não achei as interpretações do casal central ruins: pelo contrário, são eficientes no jogo de aparências que trazem à tona, o que ganha mais pontos com a verve ostensivamente antibolsonarista do roteiro. Por vezes, senti-me positivamente perturbado. É um filme que merece encontrar o seu público, portanto: de minha parte, recomendo-o com entusiasmo! (WPC>)
Abbott e Costello em Hollywood
3.2 1Já tinha ouvido falar muito sobre essa dupla de comediantes, mas nunca tive a oportunidade de conferir nenhum de seus filmes. Acho que comecei por um ideal, repleto de 'gags' e trama geral. É o modelo que deu origem às imitações chanchadescas no Brasil, né? Uma ou outra palhaçada (aliás, palhaçadas o tempo inteiro), perseguições frenéticas, um mote romântico entre coadjuvantes e canções afetadas, aqui e acolá. O Abbott é sério demais, pouco engraçado. Mas papouquei-me de rir com o Costello, desde a primeira aparição, e a situação envolvendo o Rags Ragland. Minha mãe estava ao meu lado, e lembrou de quando via estes filmes, em sua pré-adolescência, na década de 1950. O roteiro é mero pretexto para as 'gags' (e canções), mas o filme diverte. Quando entendemos que ele segue à risca uma fórmula bem sucedida, deixamo-nos levar e caímos na gargalhada. A seqüência final, na montanha-russa, é pura ode às aventuras de quem se atrapalha no dia a dia... kkkkkkkkkkkk (WPC>)
Jornada para Belém
3.3 6 Assista AgoraVi o filme por puro acaso, numa exibição na HBO, e achei uma gracinha. 'Pop' e despretensioso, mas não blasfemo, como talvez tenha sido acusado. Tudo bem, não curti os estereótipos trapalhões do Anjo Gabriel e dos Reis Magos, mas as canções são fofinhas, Milo Manheim é apaixonante e Antonio Banderas está divertindo-se à beça, entregando-se à caricatura sem receio e sem medo de ser feliz (ainda que seja o vilão). Foi realmente uma grata surpresa. Sou obcecado por musicais, não tinha como não funcionar comigo! (risos) - WPC>
Começar de Novo
3.6 54Ainda que a temática das drogas não apareça aqui, achei este filme muitíssimo parecido com (e/ou influenciado por) TRAINSPOTTING - SEM LIMITES. Não apenas pela relação entre os personagens e pela narração dramático-satírica, mas até mesmo alguns planos e enquadramentos são bastante semelhantes. Como eu vi o primeiro da trilogia de Oslo depois de ter conferido os demais exemplares, decepcionei-me um tantinho: o que é elogiosamente visto e descrito como crueza 'punk' tem também um quinhão mui desagradável de elogio concessivo à masculinidade tóxica. As interpretações são desenvoltas, mas acho na hipertrofia do repentino reconhecimento literário dos personagens incomodou-me: pareceu tão corriqueiro publicar um livro, ser reconhecido por ele, etc. . Por vezes, o vai e vém da narrativa confundiu-me, o que é intencional, mas, no geral, acho que o filme teve mais boas idéias que acertos de execução. É gracioso, mas promete mais do que oferece, enquanto obra imbuída de muito frescor juvenil. Culpa do gélido clima norueguês, talvez. (WPC>)
P.S.: achei o intérprete do Erik muito parecido com o Evan Peters!
A Infância de Um Líder
3.1 59 Assista AgoraA empolgação era extrema: enquanto minha mãe assistia ao filme, na sala, ouvi trechos da fantástica trilha musical, de caráter sinfônico, do Scott Walker e fiquei obcecado para conferir o filme. Com as expectativas nas alturas, fui de fato, arrebatado pela seqüência de abertura e gostei da maneira um tanto distanciada como são retratados as situações políticas e os personagens, não obstante as interpretações intensas de um ótimo elenco. Foi quando a frustração instaurou-se: por mais que a direção me fascinasse, em seu pendor experimental, achei o roteiro óbvio, em seu adlerismo. Reiterativo e redundante, em sua demonstração de que crianças mimadas convertem-se em fascistas, oh! A revelação do desfecho, quanto à origem genética do garoto crescido, pareceu-me igualmente insossa, como a maior parte do que acontece. Tudo bem, concordo que o garotinho Tom Sweet entrega-nos uma potente demonstração do quão irritante um filho único pode ser, mas o filme passa a redundar em círculos, a partir de determinado momento. A empolgação do início fenece, ao final, tudo chafurda numa metáfora previsível sobre um fascismo que é também hodierno. Uma pena. Mas preciso do CD deste filme, uau! (WPC>)
Esculturas da Vida
3.3 17 Assista AgoraO titulo brasileiro não é infiel à proposta da narrativa, mas é o original que sintetiza melhor as intenções da diretora, ao fazer com que acompanhemos o cotidiano de produção de uma artista que, a princípio, revela-se tão desagradável enquanto pessoa. Foi importante, para isso, o enfeamento da maravilhosa protagonista, uma de minhas atrizes contemporâneas favoritas: não conseguimos sentir simpatia por ela, mas a empatia surge gradualmente, quando compreendemos o porquê de ela ter ficado tão amargurada, convivendo com aqueles familiares tão problemáticos. Hong Chau transforma-se em cada papel que dignifica: ela está maravilhosa aqui, a personificação de diversas amigas formadas em Artes Visuais. Por quase uma hora de projeção, parecia que eu estava desgostando do filme, de seu ritmo lento, do enfoque ostensivo da diretora em anticlímaces (vide quase todas as situações referentes ao cuidado com o pombo), Mas, na seqüência da exposição, tudo se justifica, como objetivo a ser alcançado, como ápice de um processo que, mesmo que continue em aberto ou "em curso produtivo", tanto quanto o filme em si (vide a importância situação dos créditos finais), provoca reações intensas em quem testemunha o percurso de criação, não apenas a obra acabada. É uma trama difícil e, não vou mentir, intencionalmente "chata", mas que cresce bastante em nossa apreciação ao término, quando cozemos interiormente os elementos rigorosamente urdidos pelo roteiro minimalista de uma cineasta caracterizada por este adjetivo. Presumo que, numa revisão, gostarei bem mais: num primeiro contato, ele intimida bastante, assusta-nos pela lentidão, pelo registro da alienação de quem trabalha com arte, mas não consegue administrar adequadamente os prazeres da vida. Uma aula de reeducação espectatorial! (WPC>)
Sibyl
3.2 31 Assista AgoraNão sabia o que esperar, exceto uma multiplicação de camadas psicanalíticas e alguma metalinguagem roteirística. a julgar pelo que descobrimos no trabalho mais famoso (e premiado) da diretora. Percebi que ele seria exibido no Telecine Cult e aproveitei a oportunidade. E adorei: no início, demorei um pouco para imergir. Minha mãe, ao meu lado, reclamava que não estava entendendo os vais e véns da narrativa. Mas, de repente, eu estava fascinado, obcecado, apaixonado... Cheguei mesmo a gargalhar, de tão aflitivos que são os ápices dramáticos. Virginie Efira está maravilhosa, mas é eclipsada pelo defsile de talentos: Adéle Exarchopoulos tem o desempenho actancial mais pungente desde AZUL É A COR MAIS QUENTE; Gaspard Ulliel angaria um fascínio repulsivo e crescente, em cada aparição; Niels Schneider encanta pela beleza; e Sandra Hüller está absolutamente soberba. Um exercício de análise, em múltiplas significações para a palavra, trabalho de gênia. Só melhora, quanto mais se complexifica: incrível! (WPC>)
O Abajour
2.6 7 Assista AgoraAcho válido o espírito de cooperação que validou a feitura, mas, enquanto discurso, o filme é sobremaneira problemático, no sentido de que, por vezes, parece celebrar aquilo que condena, celebrar a esperteza de quem sobrevive mediante o ludibrio... Percebo que, a despeito de seus evidentes defeitos, o filme seja deveras apreciado, o que talvez tenha a ver com um conhecimento de conjuntura (os espaços destinados às interações juvenis de classe média no Rio de Janeiro), com certa verossimilhança na abordagem e confecção dos personagens. Comigo, nada funcionou: além do mau ritmo e das interpretações forçadas, as reviravoltas à la Tarantino não engrenam, o que só piora pela inserção de uma montagem que reverencia a linguagem televisiva. Repito: que bom que o filme foi feito e distribuído, nas condições possíveis, mas foi difícil chegar até o final, de tão contaminado pela podridão que o roteiro é. Desgostei plenamente, o que lamento. (WPC>)
O Homem dos Sonhos
3.5 146Ainda não vi O PESO DO TALENTO, mas é evidente que é u filme que pega carona nesta verve superexpositiva do Nicolas Cage. Seu personagem, entretanto, é composto com muita seriedade: apesar de a situação tramática logo se desgastar, e o filme ficar cansativo do meio para o final, em razão de sustentar-se em apenas uma piada, seu personagem é delineado com seriedade dramática, oscilando entre o conscientemente ridículo e o merecedor de piedade. Não chegamos a nos identificar, mas torcemos por ele, no desespero. O clima é de pasticho kaufmaniano, mas a direção não é muito firme, o tom do filme é indefinido, encerrando-se de maneira quase cruel, em sua inevitabilidade melancólica. Funciona melhor depois que a sessão termina, em verdade. A execução de uma canção de Talking Heads, nos créditos finais, ressignifica aquilo que pareceu afoito no decorrer das situações: poderia ser um excelente estudo de personagem, mas o roteiro se desperdiça em piadas neogeracionais, em cacoetes da A24 e no reaproveitamento chistoso de temas que renderam um eficiente filme de suspense no oitentista A MORTE NOS SONHOS. Acho que, numa revisão sem expectativas, funcionará bem melhor... (WPC>)
O Mistério do Cesto
3.5 146Assisti aos principais filmes deste realizador supostamente 'trash' em ordem invertida, e fiquei positivamente chocado com o teor psicanalítico dos mesmos. Adentrei a sessão enquanto lidava com uma grava situação familiar, envolvendo um irmão mais novo, de modo que o arrebatamento foi intenso: será que o Frank Henenlotter teve acesso aos meus diários?! Brincadeiras à parte, é maravilhoso como ele consegue tornar tão crível um personagem de látex, fazer-nos experimentar legítimas, que vão do medo ou horror inicial a uma piedade sincera, a uma necessidade de compreensão e entendimento da situação trazida à tona: é um filme sobremaneira triste e melancólico, sobre diversos tipos de solidões, não sendo casual que tenha sido locado em Nova York, numa região consagrada aos artistas "alternativos". De fato, antecipa o mote geral de MALIGNO, do James Wan, mas pensei ainda mais na ambientação scorseseana, que se irmana ao que o cineasta fez em DEPOIS DE HORAS ou em seu episódio de CONTOS DE NOVA YORK. 'Exploitation' é algo premonitório, em âmbito social, afinal. Fui pessoalmente tocado por este filmaço, amei! (WPC>)
O Soro do Mal
3.6 81 Assista AgoraAinda não vi a estréia mui elogiada e cultuada deste diretor, mas, depois deste filmaço aqui, fiquei mais do que curioso! O vi por acidente e fiquei impressionado e apaixonado: além de ser muito divertido e sensual, aborda a questão do vício em substâncias alucinógenas de maneira honesta e até mesmo séria. Os efeitos especiais são ótimos e, mesmo quando adere ao 'trash' assumido, não abonadona a verve reflexiva. Há algo de muito 'camp' nas atuações (minha mãe riu, ao ouvir tantos gritos, desde o início) e o diretor não foi nada econômico na adoção do homoerotismo: a beleza do protagonista Rick Hearst é acachapante e muito bem explorada pelo enredo. Fascinante e aterrorizante, ao mesmo tempo, naquilo que propõe e expõe. Adorei! (WPC>)
O Caso Maurizius
3.5 2Não conhecia nem o romance original nem o filme dele derivado. Ganhei o primeiro de um amigo olavista e demorei bastante na leitura, dada a densidade digressiva da obra. A adaptação ficou famosa pela adoção de muitos 'flashbacks', direcionadas à apreciação num tribunal. Sei que o Duvivier foi atacado enquanto representante do "cinéma de papá", mas demonstrou enorme habilidade na interpretação/adaptação da obra, que ficou sintética e bastante fiel aos propósitos originais: houve apenas a supressão de uma personagem e uma leve (porém capital) alteração no desfecho. Temi que as menções homossexuais fossem abortadas, mas até que elas foram eficientemente transcritas. Há muito mais por detrás da mera abordagem advocatícia, um conflito geracional de proporções violentas que, no romance, deu origem a mais dois livros. Interessante descoberta! (WPC>)
Nasce Uma Estrela
4.0 113 Assista AgoraContinuo achando a versão de 1937 a minha favorita, mas compreendo o favoritismo, por parte de vários críticos, sobre esta produção aqui: a extensão da duração é justificada pela intensidade dos envolvidos, pela entrega de Judy Garland a uma condição que ser-lhe-ia muito pessoal. Como tal, enquanto espectador, foi muito pessoal para mim também. A relação entre os dois protagonistas é muito intensa e a intepretação dela é arrebatadora. Tenho um pantim quanto à categorização da obra enquanto musical, já que as canções são excessivamente diegetizadas, enquanto espetáculos efetivados pelos intérpretes, no universo em que eles atuam. Mas como ficar incólume perante o impacto de "The Man That Got Away"? Como sofro de alcoolismo passivo (cuido de alguém que sofre deste mal), o roteiro acerta-me em cheio. E, a cada revisão, refaço as pazes com o estilo cukoriano, cuja afetação demorei para compreender: precisei envelhecer/amadurecer para isso. A lentidão do processo não é casual, há todo um percurso emocional em jogo! Fiquei surpreso ao descobrir que o estratagema das fotos em tom sépia foi uma compensação "póstuma" à retaliação do filme, quando originalmente lançado. Foi algo que impressionou-me bastante no primeiro contato, pensei que fôra intencional (risos). Insisto que não é nem a minha versão favorita nem meu preferido do diretor, mas é um filme que nos afeta intimamente, que marca-nos a partir da identificação proposta! (WPC>)
Dois é Demais em Orlando
2.2 5 Assista AgoraA direção é um horror: descrente que é em suas próprias imagens, Rodrigo van Der Put tenta desviar-se delas, muitas vezes, o que é hipertrofiado no momento em que os personagens assistem a um programa de TV, em que a tela do aparelho é quase um tabu, nas suas breves aparições. Dá pena perceber Eduardo Sterbitch tão desperdiçado, depois de demonstrar que, sim, é um ótimo ator, e não apenas um comediante obrigado a repetir os mesmos papéis exagerados. Gosto da Polly Marinho (mostrada muito pouco) e achei o garoto Pedro Burgarelli simpaticíssimo, mas a composição "redentora" do pai é atroz, ainda mais vilanaz que a paspalhice do personagem de Daniel Furlan. Quando eu cria que o filme não poderia ficar mais ridículo (como o próprio Cacá comenta), ele vai lá e desce mais alguns níveis, em mau gosto lingüístico (emulando a montagem de Tik Tok e afins) e no puxa-saquismo de classe. Não sei se tinha nojo ou pena daqueles personagens, mas esforcei-me por simpatizar ao menos com as lições morais advindas da convivência forçada entre João e o garoto. Nada se aproveita, entretanto: os clichês convertem-se em estereótipos piorados e trama parece figurante em meio às filmagens de atores e equipe divertindo-se no parque. Trata-se de uma peça publicitária disfarçada de filme infantil. Indefensável, infelizmente! (WPC>)
O Círculo
2.6 587 Assista AgoraÉ estranho que este filme seja tão rejeitado por público e crítico: eu o achei tão oportuno, em termos de ambientação pré-denuncista. Tudo bem, admito que a personagem central é tão narcisista quanto apática e que a sua transformação profissional/publicitária seja um tanto repentina, mas, para quem trabalhou nas mesmas áreas que ela, é algo sobremaneira verossímil. Tom Hanks aparece pouco, bem como John Boyega e Ella Coltrane, e, cada qual a seu modo, estes coadjuvantes possuem aparições marcantes, no fascínio que desencadeiam na protagonista. Mas foi Karen Gillan quem realmente em deixou apaixonado: que mulher linda e carismática! Eu trabalho como atendente num setor de TI há dois anos, e identifiquei-me com diversas situações apresentadas. Concordo que, sim, há algo da estética que se convencionou chamar de "Black Mirror", no desenvolvimento do enredo (afinal, lacunar e suspeitoso), mas acho que ele atualiza de maneira inteligente os cacoetes de MATRIX para a era facebookiana. Particularmente, apesar de decepcionar-me sobremaneira com o desfecho repentino e inconvincente, eu curti este filme. Demais, até! (WPC>)
A Mulher Rei
4.1 488 Assista AgoraTemendo que este filme fosse mais um conjunto de clichês em prol do identitarismo, evitei-o por algum tempo, por mais que todos os meus amigos dissessem que era ótimo. Estava sendo exibido num canal pago de TV e resolvi conferi-lo ao lado de minha mãe: adoramos. Ela pulava da cadeira, empolgada, torcendo pela maravilhosa protagonista, esplendidamente vivida pela excelente Viola Davis. De fato, há, sim, muitos clcihês, mas estes são validados pela História, pelas atrocidades do colonialismo. Diferentemente de PANTERA NEGRA - que é um filme que não funcionou comigo, a despeito de suas alegadas "boas intenções" - aqui, temos a aplicação orgânica das questões de classe, gênero e raça, sendo o filme muito efetivo na inserção representativa dessas questões, convertendo-se numa diversão sumamente empoderada. A direção é tão eficiente que consegue tornar atrativas mesmo as barrigadas, as cenas "banais" entre os clímaces. A duração é aproveitada em cada um de seus minutos: conhecemos bem os personagens, deslumbramo-nos perante a reconstituição artística do Reino de Daomé, captamos a magia da trilha musical de Terence Blanchard... Lasanna Lynch é uma fascinante coadjuvante e John Boyega está lindo! Se, de fato, algumas seqüências são extremamente violentas, não se pode negar que isso foi necessário aos propósitos reivindicativos da trama, de maneira que incomodei-me menos com as comemorações bélicas aqui do que em BACURAU, por exemplo. Em sua adesão às convenções de filmes de heróis, o roteiro realmente faz jus à organicidade supramencionada, de maneira que o filme é merecedor dos elogios que recebeu e merece ser ainda mais visto e divulgado, sobretudo em sua potência motivadora, no que tanga à identificação com a galhardia das mulheres negras, guerreiras e emocionais, humanas e intensas, no enfrentamento das dores e compreensão do valor de suas cicatrizes. Impressionante, neste sentido! (WPC>)
A Viagem de Pedro
3.2 24 Assista AgoraGosto muito da diretora e, vendo este filme - pelo qual esperava há tempos! -, percebi que ela complexifica, em chave feminina, aquilo que o Ang Lee faz internacionalmente, no que tange à abordagem traumatizante da autoridade familiar. Ao invés de uma perspectiva biográfica, ela adere à imersão psicanalítica: o Pedro, além de ser um canalha, é frágil, suscetível, impotente em diversos âmbitos, em contraponto à fama heróica, conservada em diversas estátuas e relatos institucionais. Não lembrava que ele tinha falecido tão jovem (menos de 36 anos) e gostei bastante de como o Cauã Reymond compõe o personagem: não força sotaque, não evita os anacronismos. Parece que ele está ensaiando e esperando o personagem chegar, entrar em seu corpo, o possuir... Isso até ocorre, mas pelo viés da culpa. Adorei a maneira como os vários idiomas (alemão, francês, inglês e iorubá, além do português) surgem no filme e apreciei a preocupação do roteiro quanto aos pequenos atos (comer a sobremesa na cozinha de um navio, por exemplo). O quartel final adere aos 'flashbacks' excessivos e não é tão interessante quanto o começo e o meio, mas imergi no filme, senti-me invadido por aquelas situações, por aquela aflição culposa. O que estranhei é que a perspectiva do relato não fosse necessariamente a de Pedro, o que se percebe em seqüências mais objetivas, como os embates entre o protagonista e seu irmão português ou o desembarque dos escravos, mas, mesmo assim, adorei o conjunto. Como tal, aplaudo a coragem da diretora em levar a cabo um projeto tão arriscado e autoral: que bom que ela ousou. Tem muito a ver com JOAQUIM, outro filme que eu também amo. (WPC>)