Quanta sensibilidade Haigh tem para com seus personagens. Não importa a história, suas lentes sempre se movem, param, aproximam-se e afastam-se com o cuidado e respeito de um amigo e nós, que assistimos essa relação na tela, somos capturados juntos nesse turbilhão tão singelo e emocionante de sentimentos. A trajetória de se descobrir, aceitar, perder e crescer é representada aqui com parcimônia e segurança por parte de todos os elementos do filme, construindo uma crescente arrebatadora para os olhos certos e fazendo de cada cena uma manifestação genuína de entrega por parte da obra e um convite a quem à assiste. Delicado, discreto e emocionante, Weekend é mais um filme inesquecível que assisto deste incrível diretor.
Temos aqui duas faces de um filme: por um lado Alicia Vikander nos emociona e atrai com sua interpretação sutil e entregue, que merece todo o clamor que vêm recebendo e é sem duvida alguma o ponto alto e fascinante do filme; Por outro, Eddie Redmayne nos afasta de qualquer simpatia genuína pela personagem que dá título ao filme, fazendo hipérboles de sentimentos que necessitavam sensibilidade para serem representados e estereotipando sua personagem com uma limitação surpreendente, de quem tem o talento para fazer o papel de um doente em gráfica convalescença, mas é pateticamente incapaz de encarar um ser humano de sentimentos mundanos e dotados de nuances. Nesse quase embate entre o brilho que é Vikander versus a âncora Redmayne, o filme se envereda numa direção - não surpreendentemente - genérica de Tom Hooper, que enfim contêm seu fetiche por enquadramentos bizarros e injustificados (há um ou outro), uma trilha de Desplat que, mesmo não sendo muito digna de nota, é um tanto subaproveitada em suas inserções, e por fim um roteiro, ah esse roteiro, que é uma bagunça completa - talvez para refletir o estado constante da protagonista? - repleto de cenas equivocadas entre si e incrivelmente raso em sua duas horas de projeção por atirar, numa mira bastante míope e com balas de festim (ou melhor, seda), para todos os lados, fazendo-me repetidamente indagar se o que estava assistindo era uma mera representação, um discurso ou um estudo deturbado de personagem ou época. Prefiro pensar, quase como o clássico exercício do esquecimento de um filme tenebroso, que é um filme sobre Gerda Wegener, personagem de Vikander e esposa da protagonista, pois é onde a obra mais funciona e ganha contornos. Uma pena, porém, haver tanto de todo o resto junto a eles.
Um filme certamente competente, primeiramente por assumir certas especifidades em detrimento de um panorama raso e, em segundo, devido ao roteiro frenético e condizente de Aaron Sorkin, que ao tratar de uma persona tão fria e calculista socialmente, tem em Jobs um ápice do arquétipo inventivo, mas robótico, que são seus roteiros. Uma pena, porém, que a direção preguiçosa de Embuste Boyle não acompanhe o nível do roteiro e também, claro, das atuações, ancorando o filme em momentos chave e deixando-nos aquela sensação de que o que vimos poderia ter sido muito, em muitas maneiras, mais gratificante do que foi. Uma sensação ingrata certamente, mas inevitavelmente crescente.
Justin Kurzek, em seu SEGUNDO longa mds, chuta digníssimas bundas em Macbeth. Quanta maturidade em tratar do ardoroso e denso texto de Shakespeare! Ele nos entrega um espetáculo em escala dramática e épica que a obra clama por nos apresentar em fúria, miséria e frio, mas sem nunca chegar a perder o foco de seus dois colossos, forças que regem o mundo escatológico da ambição shakesperiana - os Macbeth. E se Cotillard, não surpreendentemente, nos envenena pouco a pouco com seu vil mas humano olhar, Fassbender vai do Olimpo ao Tártaro numa fusão fluída e catastrófica, sensivelmente visível ao olhar, e formadora de uma terrível teia de primitividades tão duais em minha mente. É tudo tão bem encaixado - a trilha discreta e tormentosa, a fotografia apoteótica, a câmera bipolar - que cada vez que Lady Macbeth indagava "Are you a man?" o peso dessa pergunta me possuía junto com o protagonista nos diferentes - ah, o tempo - momentos em que essa pergunta era lançada, verbalmente ou não. E por tal, Macbeth, adaptação cinematográfica em pleno 2015, carrega e perpetua seus significados, num invólucro que não poderia ser mais passional, adequado e deleitoso. Um dos melhores filmes de 2015, sem dúvida alguma.
Do que se trata, afinal, crescer? Sofrer de primitivas mutações mesmo quando já se fez tanto na vida, ou quando parece não haver mais nada desconhecido no caminho do horizonte cotidiano. Renascer, libertar, despir-se de peles há muito carcomidas e opacas ao assumir um risco de expositória fragilidade, formada pela aposta com o passado e seus fantasmas - naufragantes portos seguros - uma vez vivos, mas agora rastejantes nos cômodos acomodantes de uma consciência que é, invariavelmente, nunca uma. Esse é um verdadeiro e intenso processo, repletos de elementos essencialmente humanos, e é nele que Carol assume sua busca em representar - o evento da mudança e suas agridoces nuances. Estão ali os fantasmas, nebulosos e esquivos, mas onipresentes, na vida de Therese e Carol; Também o cotidiano achatante, em que a cidade acaba transpassando as personagens como que num transbordamento das banalidades mundanas a que se expõem inexoravelmente, e por fim emerge a exaltação de si mesmas, de suas próprias pífias e dissipantes existências, ao compartilharem algo que, composto por tantos fragmentos de uma e outra, se completa uno e modificador, algo que nenhuma poderia dizer de si. A câmera de Todd Haynes, com sua fotografia contrastante no uso de granulação - "nebulando" e enfocando seus quadros de acordo com o interior de suas personagens - e filtros opacos que remetem ao passado, o já existente e o eternamente em construção, faz questão de registrar isso tudo na tela, sobrepondo qualquer discurso de época (e que é ainda, infelizmente, atual) ou mesmo a própria cartilha romântica à que acaba por vezes - e deleitosamente - se rendendo, em prol de destacar, acima de tudo, os sentimentos envolvidos nesse processo. E em sequências como na em que uma câmera quase trêmula - palpavelmente hesitante - captura Therese assimilando e lamentando toda a sua jovial impotência diante de um mundo borrado, se torna inegável o sucesso do diretor não só em representá-los, como também em transmitir esses sentimentos através da sutileza que os mesmos requerem, e com uma empatia que se apresenta alguma pretensão, é a de se calcar na simples e crua honestidade. Assim, nesse esmero sensível, onde a fragilidade humana é exposta a gotas e quem tem como ponto de partida nada mais nada menos do que as performances espetaculares de Mara e Blanchett, o filme edifica sua elegante singularidade; Pois tratando-se do amor há muito a se dizer e há muito que já foi dito, mas sobre o que é de fato crescer - pergunta cuja resposta Carol dá forma em ardor, agonia e singeleza - só nossa vulnerabilidade interior, casa de demônios e anjos, Carol's e Therese's, poderá se relacionar, ligando-se - e quem sabe até mudando - com os implosivos sentimentos e realidades que dois indivíduos podem gerar. Duas pessoas. Duas mulheres. Na tela. Vivendo um micro, de nossos micros diários.
Ao mesmo tempo que seu formato e conteúdo - me refiro às perguntas principalmente - são propositalmente redundantes, este modelo cumpre seu objetivo certeiro que é desnudar as idiossincrasias e parte da real personalidade da diretora. O resultado é interessante, irreverente e até mesmo emocionante, como a diretora, mas limitado por seus próprios princípios.
O que dizer?! Boi Neon é a antítese do que poderíamos chamar de "explosão narrativa", fundamentado em sutilezas, esse filme de Mascaro é para aqueles que apreciam uma narrativa orgânica, identificável, sem grandes plots ou discursos óbvios mesmo ao tratar de situações tão intensas. E é por esse caminhoa que o filme alcança sua grandeza, ao contrário de se construir do macro ao micro, de seu tema tão forte para o personagem de Cazarré e seus outros achados, Boi Neon vai na contramão ao focar numa especifidade tão agridocemente desenvolvida, que quando os créditos aparecem de súbito a proximidade com que nos aliamos aos pequenos dilemas na tela não nos foge, mas se intensifica.
Hateful 8 é um filme curioso de Quentin Tarantino, pois por um lado é uma mudança bem vinda de ares em relação ao seu último filme e também traz consigo um dos roteiros mais interessantes de sua carreira, mas por outro a obra é, de longe, a mais frágil que o diretor já fez, em muito por essa própria ambiciosidade que permeia toda a obra.
Pois bem, dito isso é importante destacar e louvar os sempre adequadíssimos enquadramentos do diretor, que fazem das poucas locações do filme um mundo à parte, interessante e surpreendente, bem como o panorama que o diretor constrói, com toda parcimônia, sobre um EUA que existe até hoje. É gratificante perceber como cada aspecto do roteiro, seus diálogos - tão diferentes de seus outros filmes - em sua maioria, são sempre úteis à algo maior, um conjunto que Tarantino propõe e tentar conceber. E de certa forma ele consegue, como fica claro no espetacular 3º ato - que sem o 1º não existiria da forma que acontece - em que temos uma explosão, por vezes literal como é típico do diretor, de conceitos que se perpetuam ali com cada desfecho dado aos 8 odiáveis, sendo a predominância final e marcante a de uma hipocrisia palpável, até revoltante e - aqui está o ponto mais forte deste filme do diretor - tremendamente atual. Esse sutileza no roteiro, que por contraste é surpreendente em relação ao estilo do diretor, agrada e traz pertinência ao filme. Entretanto, Tarantino, o diretor pop, invariavelmente estilizado e enraizado no cinema espetáculo em uma vertente que o próprio edificou, acaba se chocando com tal sutileza a medida que o filme adentra cada vez mais o mundo de violência que o roteiro constrói também, mas que o diretor tem como marca registrada, em sua forma, glorificar. Dessa maneira, o filme fica a deriva, por vezes perdido em diálogos que tentam resgatar o humor negro de filmes menos pretensiosos do diretor, por outras produzindo cenas de extremo mau gosto, em que algo que o roteiro claramente propõe como lamentável e a ser criticado é estilizado e "higienizado" (à maneira de Tarantino para nos desvencilhar de um violência realmente engajada, claro) por toda a forma do diretor, fazendo da obra pertinente e interessante, sim, mas também demasiadamente longa e repleta de sequências que auto-sabotam as novas ambições de Tarantino em prol de seu estilo habitual e já acomodado.
Que todos amamos, é claro, mas que não é imune a falhas e críticas.
Fui tentar escrever algo ontem... e agora hoje, e simplesmente não consigo, nada parece adequado ou a altura para descrever o que essa síntese de alguém, de passado, de sentimentos tão próximos, me passaram. Vai para a lista dos que não sei o que dizer, apenas sentir. Ou melhor, sei dizer pelo menos uma coisa: Ingrid Bergman foi um ser humano incrível e sua vida, esta biografia inclusa, será para sempre uma inspiração para sorrisos e sonhos.
Uma obra pontual e sufocante, que começa como um intrigante contraste ao sublinhar a frieza de sua execução - fotografia, desenho de som e movimento de câmera - com o calor de seus personagens, mas que vai, pouco a pouco e de maneira cortante, pondo todas as ilusões, nossas e dos personagens, abaixo. Assim, do contraste inicial temos instituída uma adequação crescente entre o estado dos personagens, a fria narrativa e nossos próprios sentimentos em relação a isso tudo, tornando a obra uma reflexão excruciante sobre o passado, em que o ato de amar é deveras reavaliado e repensado para não se tornar uma dor inevitável e agridoce, que cura e fere a relação tão palpável do casal de personagens. 45 Anos nos diz, até impõe, que o instinto de sobrevivência também prevalece em relação aos sentimentos, e é nessa imensidão gelada deles que o filme nos mergulha, sem dar - quando os créditos descem ao som surpreendentemente melancólico de Smoke Get In Your Eyes - a oportunidade de voltarmos a superfície.
Pertinente e cativante, o Taxi de Panahi é eficientemente objetivo em seus discursos, mas não deixa de brincar e surpreender com o caminho que traça para representá-los. Funcionando como um mockumentário divertidamente autoconsciente, a obra - e Panahi com seu travesso sorriso - deixa clara que tudo ali é, às vezes mais outras menos, roteirizado. Entretanto, ao construir um panorama tão despojado e sincero mesmo em seus momentos tão caricatos - e isso se deve a delicadeza com que o diretor constrói sua narrativa - o filme, em seu desfecho tão alarmantemente natural, nos deixa a certeza de que mesmo que nenhuma das situações e diálogos tenham ocorrido ali, naquele dia e naquele táxi, sem dúvidas aconteceram, acontecem e - ai está um lamento do cineasta - acontecerão por toda Teerã sem se manifestarem propriamente, tomando lugar discretamente no sufoco de uma ampla repressão. Ao inserir a gotas essa dura realidade no decorrer do filme, esta também acaba se travestindo de ficção e um intrigante vice-versa também ocorre, prejudicando o filme em algumas poucas cenas em que nossa percepção fica a deriva, mas também construindo sequências e pequenos detalhes louváveis pelo mesmo motivo. Panahi entrega-se à seu deleite de enfrentar a realidade através da ficção, ao mesmo tempo que permite, com compreensível e honesto pesar, a interferência da cruel realidade no seus objetos de criação e no próprio ato de criar em Teerã, seu agridoce lar. Deixando a metalinguagem invadir a obra , divertindo-nos como um Woody Allen neorrealista e emocionando com este mesmo teor de crueza do movimento italiano, Taxi Teerã estabelece um panorama da sociedade atual do Irã e seus melancólicos desdobramentos sem a distância habitual de um documentário, mas sim com uma acolhedora mas deverás incômoda imersão. Um diálogo que vai de Panahi para a câmera, da câmera para seus "personagens" e dos personagens para nós. Uma verdadeira cacofonia fictícia sobre questões urgentes e reais.
Malick segue aqui com o caminho - temático, estético e narrativo, - que começou a traçar em A Árvore da Vida, dessa vez se mirando nas particularidades, ou como é dito no filme "fragmentos", do homem moderno e sua insatisfação, incompletude, diante de seus atos. Literalmente fragmentando o filme em vários segmentos, Malick insere suas ideias e imagens espirituais trazendo seu deleite sensorial e reflexão típicos mas que, a partir de certo momento, começam a sofrer desse aprofundamento crescente do diretor em sua mais nova etapa estética, ocasionando a repetição de planos e plots, inclusive dentro do próprio filme, e fazendo do terceiro ato minutos um tanto difíceis de se encarar. Ainda assim, para quem admira o mestre que Malick é e as ideias que o mesmo sempre reverencia, Knight of Cups é plenamente satisfatório, e sempre pertinente, mesmo que a crítica de que o diretor acabou se acomodando comece a soar um pouco válida a partir daqui.
PS: A ser revisitado, pela minha experiência, só realmente assisto um filme do diretor quando vejo-o pelo menos duas vezes.
Minimalista até o talo mas ainda sim explosivo, lento porém meticulosamente amplo e belíssimo - o deleite visual do ano, desculpa Jauja e Mad Max - mesmo retratando os mais odiosos sentimentos. Hsien fez aqui um filme único, memorável e que eu hei de revisitar com uma legenda melhor rs
Belíssimo e honesto, Girlhood não é apenas uma excelente representação do que significa ser mulher atualmente, mas também um manifesto contundente de força e indignação contra a sociedade que a limita, enquadra e perverte. E não é que é "bacana" ver um filme só com mulheres, negras, que não se encaixam em nenhum estereótipo e não dependem de homem algum para desenvolver seus plots? Garotas é uma obra que cresce bastante em seu decorrer e é mais uma que vai para os meus favoritos do ano.
Certamente não é O melhor filme desse ano, apesar de estar entre eles, pois possui algumas pequenas falhas em seu roteiro, mas Phoenix é de longe o filme que mais me conquistou até agora no ano. De uma intensidade, uma tamanha carga de sentimentos, arrebatadora, o filme se molda através da poderosa atuação de Nina Hoss - também a melhor atuação feminina do ano para mim até que Blanchett talvez tome este posto - e de um cuidado louvável do diretor ao instituir sua narrativa de maneira a se adequar a tal personagem, que Hoss encarna tão organicamente. Quando gosto tanto de um filme como gostei desse fico um pouco sem palavras para descrevê-lo, até mesmo para elogiá-lo... rs Basta dizer então que Phoenix foi puro deleite, e que é meu filme favorito de 2015 até o momento.
Uma experiência extremamente singular é o cinema de Roy Andersson, e no caso desta sua última obra chega-se a conclusão de que, para ele, a humanidade nunca foi tão patética, frágil e - assim como seus personagens, extremamente pálida. Por esse motivo, apesar do bizarro humor sempre presente, Pombo tende a ser um filme bastante deprimente de se testemunhar, pois apresenta uma constatação tão verdadeira que se torna impossível negá-la quando os créditos aparecem. Entretanto, e aí está uma beleza agridoce desta dramédia do absurdo, pelo mesmo motivo a obra e todo o pensamento de Andersson também se tornam estranhamente acolhedores, aproximando-nos como que num segredo ao ligarem-se à algo tão inerente quanto ignorado por nós todos os dias: a consciência de viver, e o fato deste viver ser regido por um consciente demasiado e constrangedoramente humano.
Um dos maiores deleites visuais que tive esse ano com o cinema, Jauja é um filme difícil, que me afastou com sua lentidão ao mesmo tempo que me intrigava crescentemente através de sua narrativa e universo misteriosos e audaciosamente livres, que navegam por entre seus temas, personagens e locações sem fazer questão de se impor ou construir um discurso e assim fazendo da obra uma viagem a ser pouco a pouco moldada em quem a experiência e, é claro, certamente revisitada. Eu com certeza o farei.
Os filmes do Judd Apatow são e sempre foram uma presença bem-vinda, discretamente hilária e previsível, para se assistir numa quinta a noite com a galeris. Mas com a presença da deusa, da louca, da feiticeira, Amy Schumer, no roteiro e como personagem, Trainwreck se torna fácil o melhor filme que assisti do homem. Só pela própria personagem de Amy, tão hiláriamente escrita e crível ao ser personificada na própria, o filme já se tornaria memorável, mas o conjunto é todo muito consciente e autosatírico de sua própria estrutura e disso nascem tantas situações louváveis que foi impossível pra mim não me entregar ao filme. Pois o que temos aqui uma comédia romântica, todos os elementos são inseridos e desenvolvidos exatamente como uma, mas as referências e principalmente as subversões e metalinguagens que permeiam estas velhas estruturas elevam o filme a um patamar acima, denotando um deboche inteligente e com que podemos nos relacionar se estivermos dispostos e formos aptos a isso. E ainda pode-se destacar como duas maravilhosas cerejas no bolo a atuação de Bill Hader e, novamente, de Amy Schumer, que é sem dúvida nenhuma a dona do filme e mostra que atua tão maravilhosamente bem na comédia quanto nas poucas, mas sinceras, cenas dramáticas do filme. Assim, mesmo que limitado pelas situações que o subgênero impõe, Descompensada se torna uma das minha comédias favoritas e um dos filmes mais instigantes, seja na comédia ou no drama, que tive contato esse ano. Vou rever pra sempre <3
Uma visão singela e dolorosa, profundamente feminina, de uma situação mas também de um estado que acredito que se estende nos mais variados graus e contextos pelo mundo afora - o do aprisionamento. E é mérito do filme juntar seu incrível elenco, trilha e direção à este conceito de maneira simples e direta, sem tentar sobrepor qualquer discurso à realidade que ali é mostrada, mantendo-se fiel à sua visão e construindo uma das representações mais competentes, acredito eu (afinal quem sou pra afirmar isso com certeza né?) da sinestesia feminina. Filmaço!
Um dos documentários biográficos mais competentes que já vi. Longe de ser amplo, o filme foca nas gravações deixadas por Brando durante toda a sua vida, e daí o filme constrói um documento mais que apenas intimista ou psicológico, mas também espiritual, de uma figura enigmática, controversa e fascinante, que tem algumas de sua camadas expostas aqui mas que deixa claro, a partir de sua própria profunda e calejada voz, que sua complexidade é indesvendável e, por tal, invariavelmente impressionante.
Temos aqui um sonho molhado de Guillermo Del Toro, que investe profundamente no visual desse seu último filme e torna cada quadro deslumbrante em suas minúcias e atmosfera, mas que vão perdendo seu fascínio e interesse a medida que adentramos o universo que todas estas cores e detalhes tentam compor, mas que falham miseravelmente. Com tanto esmero e bons atores era preciso - e esperado - ao menos um fiapo de roteiro, uma "desculpa" plausível", para impedir as cenas de se tornarem puro fetiche, justificáveis, mas o filme afunda completamente ao seguir o caminho oposto, apresentando não só um enredo bobo, algo que seria até aceitável, mas também tremendamente mal escrito, que redireciona o foco da catarse visual para suas grotescas situações e faz do andamento da obra um entediante arrastar, composto por pura masturbação visual e atuações tragicamente opacas, considerando a presença de Hiddleston e Chastain no elenco e seus respectivos potenciais desperdiçados.
Assim, Del Toro decepciona como diretor, mas cumpre parte de minhas expectativas com um visual estonteante apesar de injustificado e repleto de maneirismos. De Crimson Peak, uma das decepções do ano para mim, resta destacar apenas a atuação da cada vez mais incrível Mia Wasikowska e o fato de que nem sempre um filme "bonito" é de fato um filme bonito.
E aqui podemos observar um cineasta talentoso e interessante filmando um pedaço de lixo que ele próprio escreveu, produziu e editou.
Tem quadros interessantes? Tem. Tem sequências interessantes? Tem. Tem até um conceito interessante? Também tem. Mas é tudo executado de maneira preguiçosa - beirando ao amador - e superficial. A pretensão de filmar uma história de amor através do sexo não é inventar a roda, esse mérito não podemos dar ao diretor, mas é uma abordagem que poderia render algo interessante nas mãos de um artista ousado como Noé e até mesmo pela suposta presença(?) do 3D. Entretanto o que nos é entregue são mais de duas horas de alguém que aparentemente não tinha muito o que dizer sobre seu objeto de construção e mais sobre a sua própria fragilidade ideológica e, aí está o grotesco erro, artística. O diretor aparentemente teve um surto megalomaníaco enquanto escrevia o roteiro de Love, inserindo referências prolixas e infantis à sua própria pessoa, seus filmes e à 7ª arte. E eu diria que isso prejudica o filme até certo ponto, mas o fato é que não há muito o que se prejudicar at all. Quando a obra decide se levar a sério é extremamente melosa, ingênua e covarde ao fazer seus personagens - insuportáveis - transitarem sentimental e sexualmente através de estados redundantes e limitados, levando em consideração o próprio título do filme e a clara intenção de Noé de se "render" à uma ideia sincera e batida de amor. Uma ideia batida que ele tenta travestir como própria e - pior - pertinente, tornando o filme insuportavelmente autoindulgente e ainda por cima deixando essa "sinceridade" toda (acho que ele consideraria mais como "pureza", mas me recuso a definir como tal tamanha a canastrice de algumas situações) se tornar completamente destoante, ficando ainda mais exposta do que sua superficialidade tola já deixava ao contrastá-la com o cinismo inerente de seu trabalho de direção. Assim, Love entrega um material pueril e irrelevante e mesmo com ele não consegue cumprir seus objetivos, filmando, roteirizando e representando (Eu diria que as atuações são a âncora-mor do filme, dentre tantas) sentimentos como uma transa de esquina e fazendo do tão presente sexo um exagero melodramático, repetitivo e enjoativo, que contribui em fiapos para a narrativa e se torna destoante ao deixar essa separação entre sexo e sentimento que estou fazendo ser possível numa descrição da obra.
A câmera parou, mas mais uma vez eu terminei um filme de Gaspar Noé nauseado, contudo pelos motivos errados. Love é o pior filme que assisti esse ano, fácil.
Final de Semana
3.9 518 Assista AgoraQuanta sensibilidade Haigh tem para com seus personagens. Não importa a história, suas lentes sempre se movem, param, aproximam-se e afastam-se com o cuidado e respeito de um amigo e nós, que assistimos essa relação na tela, somos capturados juntos nesse turbilhão tão singelo e emocionante de sentimentos. A trajetória de se descobrir, aceitar, perder e crescer é representada aqui com parcimônia e segurança por parte de todos os elementos do filme, construindo uma crescente arrebatadora para os olhos certos e fazendo de cada cena uma manifestação genuína de entrega por parte da obra e um convite a quem à assiste. Delicado, discreto e emocionante, Weekend é mais um filme inesquecível que assisto deste incrível diretor.
A Garota Dinamarquesa
4.0 2,2K Assista AgoraTemos aqui duas faces de um filme: por um lado Alicia Vikander nos emociona e atrai com sua interpretação sutil e entregue, que merece todo o clamor que vêm recebendo e é sem duvida alguma o ponto alto e fascinante do filme; Por outro, Eddie Redmayne nos afasta de qualquer simpatia genuína pela personagem que dá título ao filme, fazendo hipérboles de sentimentos que necessitavam sensibilidade para serem representados e estereotipando sua personagem com uma limitação surpreendente, de quem tem o talento para fazer o papel de um doente em gráfica convalescença, mas é pateticamente incapaz de encarar um ser humano de sentimentos mundanos e dotados de nuances.
Nesse quase embate entre o brilho que é Vikander versus a âncora Redmayne, o filme se envereda numa direção - não surpreendentemente - genérica de Tom Hooper, que enfim contêm seu fetiche por enquadramentos bizarros e injustificados (há um ou outro), uma trilha de Desplat que, mesmo não sendo muito digna de nota, é um tanto subaproveitada em suas inserções, e por fim um roteiro, ah esse roteiro, que é uma bagunça completa - talvez para refletir o estado constante da protagonista? - repleto de cenas equivocadas entre si e incrivelmente raso em sua duas horas de projeção por atirar, numa mira bastante míope e com balas de festim (ou melhor, seda), para todos os lados, fazendo-me repetidamente indagar se o que estava assistindo era uma mera representação, um discurso ou um estudo deturbado de personagem ou época.
Prefiro pensar, quase como o clássico exercício do esquecimento de um filme tenebroso, que é um filme sobre Gerda Wegener, personagem de Vikander e esposa da protagonista, pois é onde a obra mais funciona e ganha contornos. Uma pena, porém, haver tanto de todo o resto junto a eles.
Steve Jobs
3.5 591 Assista AgoraUm filme certamente competente, primeiramente por assumir certas especifidades em detrimento de um panorama raso e, em segundo, devido ao roteiro frenético e condizente de Aaron Sorkin, que ao tratar de uma persona tão fria e calculista socialmente, tem em Jobs um ápice do arquétipo inventivo, mas robótico, que são seus roteiros. Uma pena, porém, que a direção preguiçosa de Embuste Boyle não acompanhe o nível do roteiro e também, claro, das atuações, ancorando o filme em momentos chave e deixando-nos aquela sensação de que o que vimos poderia ter sido muito, em muitas maneiras, mais gratificante do que foi. Uma sensação ingrata certamente, mas inevitavelmente crescente.
Macbeth: Ambição e Guerra
3.5 383 Assista AgoraJustin Kurzek, em seu SEGUNDO longa mds, chuta digníssimas bundas em Macbeth. Quanta maturidade em tratar do ardoroso e denso texto de Shakespeare! Ele nos entrega um espetáculo em escala dramática e épica que a obra clama por nos apresentar em fúria, miséria e frio, mas sem nunca chegar a perder o foco de seus dois colossos, forças que regem o mundo escatológico da ambição shakesperiana - os Macbeth. E se Cotillard, não surpreendentemente, nos envenena pouco a pouco com seu vil mas humano olhar, Fassbender vai do Olimpo ao Tártaro numa fusão fluída e catastrófica, sensivelmente visível ao olhar, e formadora de uma terrível teia de primitividades tão duais em minha mente.
É tudo tão bem encaixado - a trilha discreta e tormentosa, a fotografia apoteótica, a câmera bipolar - que cada vez que Lady Macbeth indagava "Are you a man?" o peso dessa pergunta me possuía junto com o protagonista nos diferentes - ah, o tempo - momentos em que essa pergunta era lançada, verbalmente ou não. E por tal, Macbeth, adaptação cinematográfica em pleno 2015, carrega e perpetua seus significados, num invólucro que não poderia ser mais passional, adequado e deleitoso. Um dos melhores filmes de 2015, sem dúvida alguma.
Carol
3.9 1,5K Assista AgoraDo que se trata, afinal, crescer? Sofrer de primitivas mutações mesmo quando já se fez tanto na vida, ou quando parece não haver mais nada desconhecido no caminho do horizonte cotidiano. Renascer, libertar, despir-se de peles há muito carcomidas e opacas ao assumir um risco de expositória fragilidade, formada pela aposta com o passado e seus fantasmas - naufragantes portos seguros - uma vez vivos, mas agora rastejantes nos cômodos acomodantes de uma consciência que é, invariavelmente, nunca uma. Esse é um verdadeiro e intenso processo, repletos de elementos essencialmente humanos, e é nele que Carol assume sua busca em representar - o evento da mudança e suas agridoces nuances.
Estão ali os fantasmas, nebulosos e esquivos, mas onipresentes, na vida de Therese e Carol; Também o cotidiano achatante, em que a cidade acaba transpassando as personagens como que num transbordamento das banalidades mundanas a que se expõem inexoravelmente, e por fim emerge a exaltação de si mesmas, de suas próprias pífias e dissipantes existências, ao compartilharem algo que, composto por tantos fragmentos de uma e outra, se completa uno e modificador, algo que nenhuma poderia dizer de si. A câmera de Todd Haynes, com sua fotografia contrastante no uso de granulação - "nebulando" e enfocando seus quadros de acordo com o interior de suas personagens - e filtros opacos que remetem ao passado, o já existente e o eternamente em construção, faz questão de registrar isso tudo na tela, sobrepondo qualquer discurso de época (e que é ainda, infelizmente, atual) ou mesmo a própria cartilha romântica à que acaba por vezes - e deleitosamente - se rendendo, em prol de destacar, acima de tudo, os sentimentos envolvidos nesse processo. E em sequências como na em que uma câmera quase trêmula - palpavelmente hesitante - captura Therese assimilando e lamentando toda a sua jovial impotência diante de um mundo borrado, se torna inegável o sucesso do diretor não só em representá-los, como também em transmitir esses sentimentos através da sutileza que os mesmos requerem, e com uma empatia que se apresenta alguma pretensão, é a de se calcar na simples e crua honestidade.
Assim, nesse esmero sensível, onde a fragilidade humana é exposta a gotas e quem tem como ponto de partida nada mais nada menos do que as performances espetaculares de Mara e Blanchett, o filme edifica sua elegante singularidade; Pois tratando-se do amor há muito a se dizer e há muito que já foi dito, mas sobre o que é de fato crescer - pergunta cuja resposta Carol dá forma em ardor, agonia e singeleza - só nossa vulnerabilidade interior, casa de demônios e anjos, Carol's e Therese's, poderá se relacionar, ligando-se - e quem sabe até mudando - com os implosivos sentimentos e realidades que dois indivíduos podem gerar.
Duas pessoas. Duas mulheres. Na tela. Vivendo um micro, de nossos micros diários.
Chantal Akerman, De Cá
3.6 6Ao mesmo tempo que seu formato e conteúdo - me refiro às perguntas principalmente - são propositalmente redundantes, este modelo cumpre seu objetivo certeiro que é desnudar as idiossincrasias e parte da real personalidade da diretora. O resultado é interessante, irreverente e até mesmo emocionante, como a diretora, mas limitado por seus próprios princípios.
Boi Neon
3.6 461O que dizer?! Boi Neon é a antítese do que poderíamos chamar de "explosão narrativa", fundamentado em sutilezas, esse filme de Mascaro é para aqueles que apreciam uma narrativa orgânica, identificável, sem grandes plots ou discursos óbvios mesmo ao tratar de situações tão intensas. E é por esse caminhoa que o filme alcança sua grandeza, ao contrário de se construir do macro ao micro, de seu tema tão forte para o personagem de Cazarré e seus outros achados, Boi Neon vai na contramão ao focar numa especifidade tão agridocemente desenvolvida, que quando os créditos aparecem de súbito a proximidade com que nos aliamos aos pequenos dilemas na tela não nos foge, mas se intensifica.
Os Oito Odiados
4.1 2,4K Assista AgoraHateful 8 é um filme curioso de Quentin Tarantino, pois por um lado é uma mudança bem vinda de ares em relação ao seu último filme e também traz consigo um dos roteiros mais interessantes de sua carreira, mas por outro a obra é, de longe, a mais frágil que o diretor já fez, em muito por essa própria ambiciosidade que permeia toda a obra.
Pois bem, dito isso é importante destacar e louvar os sempre adequadíssimos enquadramentos do diretor, que fazem das poucas locações do filme um mundo à parte, interessante e surpreendente, bem como o panorama que o diretor constrói, com toda parcimônia, sobre um EUA que existe até hoje. É gratificante perceber como cada aspecto do roteiro, seus diálogos - tão diferentes de seus outros filmes - em sua maioria, são sempre úteis à algo maior, um conjunto que Tarantino propõe e tentar conceber. E de certa forma ele consegue, como fica claro no espetacular 3º ato - que sem o 1º não existiria da forma que acontece - em que temos uma explosão, por vezes literal como é típico do diretor, de conceitos que se perpetuam ali com cada desfecho dado aos 8 odiáveis, sendo a predominância final e marcante a de uma hipocrisia palpável, até revoltante e - aqui está o ponto mais forte deste filme do diretor - tremendamente atual.
Esse sutileza no roteiro, que por contraste é surpreendente em relação ao estilo do diretor, agrada e traz pertinência ao filme. Entretanto, Tarantino, o diretor pop, invariavelmente estilizado e enraizado no cinema espetáculo em uma vertente que o próprio edificou, acaba se chocando com tal sutileza a medida que o filme adentra cada vez mais o mundo de violência que o roteiro constrói também, mas que o diretor tem como marca registrada, em sua forma, glorificar. Dessa maneira, o filme fica a deriva, por vezes perdido em diálogos que tentam resgatar o humor negro de filmes menos pretensiosos do diretor, por outras produzindo cenas de extremo mau gosto, em que algo que o roteiro claramente propõe como lamentável e a ser criticado é estilizado e "higienizado" (à maneira de Tarantino para nos desvencilhar de um violência realmente engajada, claro) por toda a forma do diretor, fazendo da obra pertinente e interessante, sim, mas também demasiadamente longa e repleta de sequências que auto-sabotam as novas ambições de Tarantino em prol de seu estilo habitual e já acomodado.
Que todos amamos, é claro, mas que não é imune a falhas e críticas.
Spotlight - Segredos Revelados
4.1 1,7K Assista AgoraPontual, pertinente e intenso, não há nada que "sobre" em Spotlight. Um filme condizente e louvável pela maturidade de seus edificadores.
Eu Sou Ingrid Bergman
4.2 27Fui tentar escrever algo ontem... e agora hoje, e simplesmente não consigo, nada parece adequado ou a altura para descrever o que essa síntese de alguém, de passado, de sentimentos tão próximos, me passaram.
Vai para a lista dos que não sei o que dizer, apenas sentir. Ou melhor, sei dizer pelo menos uma coisa: Ingrid Bergman foi um ser humano incrível e sua vida, esta biografia inclusa, será para sempre uma inspiração para sorrisos e sonhos.
45 Anos
3.7 254 Assista AgoraUma obra pontual e sufocante, que começa como um intrigante contraste ao sublinhar a frieza de sua execução - fotografia, desenho de som e movimento de câmera - com o calor de seus personagens, mas que vai, pouco a pouco e de maneira cortante, pondo todas as ilusões, nossas e dos personagens, abaixo. Assim, do contraste inicial temos instituída uma adequação crescente entre o estado dos personagens, a fria narrativa e nossos próprios sentimentos em relação a isso tudo, tornando a obra uma reflexão excruciante sobre o passado, em que o ato de amar é deveras reavaliado e repensado para não se tornar uma dor inevitável e agridoce, que cura e fere a relação tão palpável do casal de personagens.
45 Anos nos diz, até impõe, que o instinto de sobrevivência também prevalece em relação aos sentimentos, e é nessa imensidão gelada deles que o filme nos mergulha, sem dar - quando os créditos descem ao som surpreendentemente melancólico de Smoke Get In Your Eyes - a oportunidade de voltarmos a superfície.
Táxi Teerã
4.0 80 Assista AgoraPertinente e cativante, o Taxi de Panahi é eficientemente objetivo em seus discursos, mas não deixa de brincar e surpreender com o caminho que traça para representá-los. Funcionando como um mockumentário divertidamente autoconsciente, a obra - e Panahi com seu travesso sorriso - deixa clara que tudo ali é, às vezes mais outras menos, roteirizado. Entretanto, ao construir um panorama tão despojado e sincero mesmo em seus momentos tão caricatos - e isso se deve a delicadeza com que o diretor constrói sua narrativa - o filme, em seu desfecho tão alarmantemente natural, nos deixa a certeza de que mesmo que nenhuma das situações e diálogos tenham ocorrido ali, naquele dia e naquele táxi, sem dúvidas aconteceram, acontecem e - ai está um lamento do cineasta - acontecerão por toda Teerã sem se manifestarem propriamente, tomando lugar discretamente no sufoco de uma ampla repressão.
Ao inserir a gotas essa dura realidade no decorrer do filme, esta também acaba se travestindo de ficção e um intrigante vice-versa também ocorre, prejudicando o filme em algumas poucas cenas em que nossa percepção fica a deriva, mas também construindo sequências e pequenos detalhes louváveis pelo mesmo motivo. Panahi entrega-se à seu deleite de enfrentar a realidade através da ficção, ao mesmo tempo que permite, com compreensível e honesto pesar, a interferência da cruel realidade no seus objetos de criação e no próprio ato de criar em Teerã, seu agridoce lar.
Deixando a metalinguagem invadir a obra , divertindo-nos como um Woody Allen neorrealista e emocionando com este mesmo teor de crueza do movimento italiano, Taxi Teerã estabelece um panorama da sociedade atual do Irã e seus melancólicos desdobramentos sem a distância habitual de um documentário, mas sim com uma acolhedora mas deverás incômoda imersão. Um diálogo que vai de Panahi para a câmera, da câmera para seus "personagens" e dos personagens para nós. Uma verdadeira cacofonia fictícia sobre questões urgentes e reais.
Cavaleiro de Copas
3.2 412 Assista AgoraMalick segue aqui com o caminho - temático, estético e narrativo, - que começou a traçar em A Árvore da Vida, dessa vez se mirando nas particularidades, ou como é dito no filme "fragmentos", do homem moderno e sua insatisfação, incompletude, diante de seus atos.
Literalmente fragmentando o filme em vários segmentos, Malick insere suas ideias e imagens espirituais trazendo seu deleite sensorial e reflexão típicos mas que, a partir de certo momento, começam a sofrer desse aprofundamento crescente do diretor em sua mais nova etapa estética, ocasionando a repetição de planos e plots, inclusive dentro do próprio filme, e fazendo do terceiro ato minutos um tanto difíceis de se encarar.
Ainda assim, para quem admira o mestre que Malick é e as ideias que o mesmo sempre reverencia, Knight of Cups é plenamente satisfatório, e sempre pertinente, mesmo que a crítica de que o diretor acabou se acomodando comece a soar um pouco válida a partir daqui.
PS: A ser revisitado, pela minha experiência, só realmente assisto um filme do diretor quando vejo-o pelo menos duas vezes.
O Duque de Burgundy
3.3 80Instigante,intenso e extremamente bem executado, um dos filmes mais intrigantes do ano passado.
A Assassina
3.3 94 Assista AgoraMinimalista até o talo mas ainda sim explosivo, lento porém meticulosamente amplo e belíssimo - o deleite visual do ano, desculpa Jauja e Mad Max - mesmo retratando os mais odiosos sentimentos. Hsien fez aqui um filme único, memorável e que eu hei de revisitar com uma legenda melhor rs
Garotas
3.9 66 Assista AgoraBelíssimo e honesto, Girlhood não é apenas uma excelente representação do que significa ser mulher atualmente, mas também um manifesto contundente de força e indignação contra a sociedade que a limita, enquadra e perverte. E não é que é "bacana" ver um filme só com mulheres, negras, que não se encaixam em nenhum estereótipo e não dependem de homem algum para desenvolver seus plots?
Garotas é uma obra que cresce bastante em seu decorrer e é mais uma que vai para os meus favoritos do ano.
Phoenix
3.8 104 Assista AgoraCertamente não é O melhor filme desse ano, apesar de estar entre eles, pois possui algumas pequenas falhas em seu roteiro, mas Phoenix é de longe o filme que mais me conquistou até agora no ano. De uma intensidade, uma tamanha carga de sentimentos, arrebatadora, o filme se molda através da poderosa atuação de Nina Hoss - também a melhor atuação feminina do ano para mim até que Blanchett talvez tome este posto - e de um cuidado louvável do diretor ao instituir sua narrativa de maneira a se adequar a tal personagem, que Hoss encarna tão organicamente.
Quando gosto tanto de um filme como gostei desse fico um pouco sem palavras para descrevê-lo, até mesmo para elogiá-lo... rs Basta dizer então que Phoenix foi puro deleite, e que é meu filme favorito de 2015 até o momento.
Um Pombo Pousou Num Galho Refletindo Sobre a Existência
3.6 267 Assista AgoraUma experiência extremamente singular é o cinema de Roy Andersson, e no caso desta sua última obra chega-se a conclusão de que, para ele, a humanidade nunca foi tão patética, frágil e - assim como seus personagens, extremamente pálida. Por esse motivo, apesar do bizarro humor sempre presente, Pombo tende a ser um filme bastante deprimente de se testemunhar, pois apresenta uma constatação tão verdadeira que se torna impossível negá-la quando os créditos aparecem. Entretanto, e aí está uma beleza agridoce desta dramédia do absurdo, pelo mesmo motivo a obra e todo o pensamento de Andersson também se tornam estranhamente acolhedores, aproximando-nos como que num segredo ao ligarem-se à algo tão inerente quanto ignorado por nós todos os dias: a consciência de viver, e o fato deste viver ser regido por um consciente demasiado e constrangedoramente humano.
Jauja
3.5 40Um dos maiores deleites visuais que tive esse ano com o cinema, Jauja é um filme difícil, que me afastou com sua lentidão ao mesmo tempo que me intrigava crescentemente através de sua narrativa e universo misteriosos e audaciosamente livres, que navegam por entre seus temas, personagens e locações sem fazer questão de se impor ou construir um discurso e assim fazendo da obra uma viagem a ser pouco a pouco moldada em quem a experiência e, é claro, certamente revisitada. Eu com certeza o farei.
Descompensada
2.9 347 Assista AgoraOs filmes do Judd Apatow são e sempre foram uma presença bem-vinda, discretamente hilária e previsível, para se assistir numa quinta a noite com a galeris. Mas com a presença da deusa, da louca, da feiticeira, Amy Schumer, no roteiro e como personagem, Trainwreck se torna fácil o melhor filme que assisti do homem.
Só pela própria personagem de Amy, tão hiláriamente escrita e crível ao ser personificada na própria, o filme já se tornaria memorável, mas o conjunto é todo muito consciente e autosatírico de sua própria estrutura e disso nascem tantas situações louváveis que foi impossível pra mim não me entregar ao filme. Pois o que temos aqui uma comédia romântica, todos os elementos são inseridos e desenvolvidos exatamente como uma, mas as referências e principalmente as subversões e metalinguagens que permeiam estas velhas estruturas elevam o filme a um patamar acima, denotando um deboche inteligente e com que podemos nos relacionar se estivermos dispostos e formos aptos a isso.
E ainda pode-se destacar como duas maravilhosas cerejas no bolo a atuação de Bill Hader e, novamente, de Amy Schumer, que é sem dúvida nenhuma a dona do filme e mostra que atua tão maravilhosamente bem na comédia quanto nas poucas, mas sinceras, cenas dramáticas do filme. Assim, mesmo que limitado pelas situações que o subgênero impõe, Descompensada se torna uma das minha comédias favoritas e um dos filmes mais instigantes, seja na comédia ou no drama, que tive contato esse ano. Vou rever pra sempre <3
Abstract: AMY SCHUMER RAYNHA DO UNIVERSO
Cinco Graças
4.3 329 Assista AgoraUma visão singela e dolorosa, profundamente feminina, de uma situação mas também de um estado que acredito que se estende nos mais variados graus e contextos pelo mundo afora - o do aprisionamento. E é mérito do filme juntar seu incrível elenco, trilha e direção à este conceito de maneira simples e direta, sem tentar sobrepor qualquer discurso à realidade que ali é mostrada, mantendo-se fiel à sua visão e construindo uma das representações mais competentes, acredito eu (afinal quem sou pra afirmar isso com certeza né?) da sinestesia feminina. Filmaço!
A Verdade sobre Marlon Brando
4.4 71 Assista AgoraUm dos documentários biográficos mais competentes que já vi. Longe de ser amplo, o filme foca nas gravações deixadas por Brando durante toda a sua vida, e daí o filme constrói um documento mais que apenas intimista ou psicológico, mas também espiritual, de uma figura enigmática, controversa e fascinante, que tem algumas de sua camadas expostas aqui mas que deixa claro, a partir de sua própria profunda e calejada voz, que sua complexidade é indesvendável e, por tal, invariavelmente impressionante.
A Colina Escarlate
3.3 1,3K Assista AgoraTemos aqui um sonho molhado de Guillermo Del Toro, que investe profundamente no visual desse seu último filme e torna cada quadro deslumbrante em suas minúcias e atmosfera, mas que vão perdendo seu fascínio e interesse a medida que adentramos o universo que todas estas cores e detalhes tentam compor, mas que falham miseravelmente.
Com tanto esmero e bons atores era preciso - e esperado - ao menos um fiapo de roteiro, uma "desculpa" plausível", para impedir as cenas de se tornarem puro fetiche, justificáveis, mas o filme afunda completamente ao seguir o caminho oposto, apresentando não só um enredo bobo, algo que seria até aceitável, mas também tremendamente mal escrito, que redireciona o foco da catarse visual para suas grotescas situações e faz do andamento da obra um entediante arrastar, composto por pura masturbação visual e atuações tragicamente opacas, considerando a presença de Hiddleston e Chastain no elenco e seus respectivos potenciais desperdiçados.
Assim, Del Toro decepciona como diretor, mas cumpre parte de minhas expectativas com um visual estonteante apesar de injustificado e repleto de maneirismos. De Crimson Peak, uma das decepções do ano para mim, resta destacar apenas a atuação da cada vez mais incrível Mia Wasikowska e o fato de que nem sempre um filme "bonito" é de fato um filme bonito.
Love
3.5 883 Assista AgoraE aqui podemos observar um cineasta talentoso e interessante filmando um pedaço de lixo que ele próprio escreveu, produziu e editou.
Tem quadros interessantes? Tem. Tem sequências interessantes? Tem. Tem até um conceito interessante? Também tem. Mas é tudo executado de maneira preguiçosa - beirando ao amador - e superficial. A pretensão de filmar uma história de amor através do sexo não é inventar a roda, esse mérito não podemos dar ao diretor, mas é uma abordagem que poderia render algo interessante nas mãos de um artista ousado como Noé e até mesmo pela suposta presença(?) do 3D. Entretanto o que nos é entregue são mais de duas horas de alguém que aparentemente não tinha muito o que dizer sobre seu objeto de construção e mais sobre a sua própria fragilidade ideológica e, aí está o grotesco erro, artística.
O diretor aparentemente teve um surto megalomaníaco enquanto escrevia o roteiro de Love, inserindo referências prolixas e infantis à sua própria pessoa, seus filmes e à 7ª arte. E eu diria que isso prejudica o filme até certo ponto, mas o fato é que não há muito o que se prejudicar at all. Quando a obra decide se levar a sério é extremamente melosa, ingênua e covarde ao fazer seus personagens - insuportáveis - transitarem sentimental e sexualmente através de estados redundantes e limitados, levando em consideração o próprio título do filme e a clara intenção de Noé de se "render" à uma ideia sincera e batida de amor. Uma ideia batida que ele tenta travestir como própria e - pior - pertinente, tornando o filme insuportavelmente autoindulgente e ainda por cima deixando essa "sinceridade" toda (acho que ele consideraria mais como "pureza", mas me recuso a definir como tal tamanha a canastrice de algumas situações) se tornar completamente destoante, ficando ainda mais exposta do que sua superficialidade tola já deixava ao contrastá-la com o cinismo inerente de seu trabalho de direção.
Assim, Love entrega um material pueril e irrelevante e mesmo com ele não consegue cumprir seus objetivos, filmando, roteirizando e representando (Eu diria que as atuações são a âncora-mor do filme, dentre tantas) sentimentos como uma transa de esquina e fazendo do tão presente sexo um exagero melodramático, repetitivo e enjoativo, que contribui em fiapos para a narrativa e se torna destoante ao deixar essa separação entre sexo e sentimento que estou fazendo ser possível numa descrição da obra.
A câmera parou, mas mais uma vez eu terminei um filme de Gaspar Noé nauseado, contudo pelos motivos errados. Love é o pior filme que assisti esse ano, fácil.