Meteora é o típico filme que poderia ter sido mas não foi. O desenvolvimento da narrativa se dá, principalmente, através da animação de uma série de ícones, fortemente geométricos e sugestivos, enquanto as sequências puramente cinematográficas são reservadas ao aprofundamento de tais imagens, tanto no que se refere à descrição da vida no campo, quanto da vida monástica ou do encontro entre os dois protagonistas. Nesse sistema, certamente bastante interessante, o filme não encontra uma representação fluida do erotismo e opta por uma terceira via através de imagens de forte conteúdo pictórico, mas que justapostas às precedentes, perdem totalmente a coerência rítmica. Quanto mais eloquentes se mostram as animações dos ícones em seu silêncio, mais o restante se mostra vazio e descoordenado, desperdiçando um grande esforço criativo a serviço de uma variação banal e realista do tema da tentação carnal.
Um dramático emaranhado (extremamente complicado e mórbido) de sentimentos e relações entre os componentes de uma família nada convencional descrita pelos próprios membros como uma caravana de ciganos. Cocteau enfatiza sua estrutura teatral e seu caráter claustrofóbico "a portas fechadas" nesta transposição cinematográfica que mistura uma trama de vaudeville com uma dose maciça de psicologia dramática.
Difícil medir o quão genuinamente suíço é o cinema de Alain Tanner, mas diante de uma parábola política tão bem construída que oscila entre o pessimismo e o otimismo, o sonho (desejo) e a realidade, o protesto e a utopia, a conclusão é que esse tipo de cinema não poderia ser mais universal. "Jonas Qui Aura 25 Ans en l'an 2000" é um filme revigorante pois através de seus personagens quase palpáveis combina ironia, ternura, inteligência e generosidade em doses exatas.
A demolição material, os entulhos e as ruínas como metáfora de uma existência que se deteriora dia após dia. As situações, destiladas quase em tempo real, se mostram com uma veracidade impressionante através da repetição diária, enquanto as expressões, os rostos e as silhuetas emergem da escuridão, banhados pela piedade de uma luz branda, quase escassa. Com sua duração dilatada e atmosfera deprimente, o espetáculo da vida é impressionante: quase como se a morte iminente não pudesse extinguir aqueles lampejos de vida, fracos, mas resistentes como as velas que perduram na escuridão. Difícil, quase impossível distinguir a realidade da ficção, o que foi registrado no dia a dia e o que foi sugerido. Mas o que realmente conta é o resultado terrivelmente significante e simbólico. Escondida em sua própria discrição e suposta simplicidade, a verdade é que no filme não há nada deixado ao acaso: a iluminação é esplêndida como em um filme de Tarkovsky, as cores lembram Sokurov e a qualidade dos enquadramentos, próximas ao universo de Zurbarán, fazem de cada imagem um testemunho eterno e piedoso da condição humana. No quarto da Vanda não entra luz... nem esperança.
Vergonhosamente o filme foi censurado no Senegal até 1984, pelo então presidente Léopold Sédar Senghor, sob o pretexto de "erro de ortografia" pois, segundo Senghor, a grafia correta deveria ser Cedo com apenas um "d" e não Ceddo...
Completamente desvalorizado na época do lançamento, após restaurado e redistribuído na França em 2002, adquiriu um valor profético como sátira à globalização em todos os seus níveis: Tati colocou em imagens a crise de um século inteiro. O tempo fala por si.
Além de um manifesto contra o racismo, White Dog é uma grande metáfora sobre o comportamento humano. E dessa linha emerge toda a rejeição do Fuller contra o protótipo da sociedade norte-americana, na qual ele cresceu e teve que se confrontar desde sempre.
Acho triste que um dos motivos alegados pela Paramount ao se recusar a distribuir o filme nos EUA na época tenha sido a "blasfêmia politicamente incorreta" da cena da igreja. Quanta hipocrisia…
Obra repleta de ironia e sarcasmo que alimentam, passo a passo, o objetivo da polêmica: a indústria do entretenimento na Alemanha e a função que exerce no cinema, a mercantilização do sexo, o fascismo congênito da classe média alemã. Não é um filme pornográfico "d'auteur" nem um filme anti-pornográfico que visa denunciar a obscenidade com as mesmas armas, mas uma análise muito interessante da Alemanha Ocidental do início dos anos 70 na visão do diretor.
Herzog em sua contínua procura pelo gênio, pelo anômalo e pelo diferente dessa vez vai até a Itália para mostrar os lugares que serviram como pano de fundo para as obras musicais (criminosas) compostas por Carlo Gesualdo, o príncipe de Venosa, nobre que se dedicou ao prazer da composição, conhecido por seu temperamento explosivo e violento na vida privada e famoso no âmbito musical por suas ousadias harmônicas "indecentes" para a época: cromatismos melódicos sinuosos, dolorosos e insinuantes. Declamações de puro sentimento, quase expressionistas, que levaram ao extremo o gênero Madrigal e seguiram rítmica, melódica e harmoniosamente o real significado do texto poético.
Fulci não teve uma vida muito feliz e embora sempre tenha negado não é difícil encontrar reflexos autobiográficos do luto e das tragédias que marcaram sua existência em seus filmes. Aqui sua recusa em estabelecer uma correspondência psicanalítica entre sua vida e sua obra lhe custou a separação com a namorada psicanalista. Sua opinião sobre a psicanálise é notória: "Uma invenção de Freud para conseguir dinheiro para a cocaína". Fulci era muito inteligente e, segundo os que o conheceram bem, muito generoso, mas sempre foi um diretor anárquico demais para qualquer ideologia: basta pensar no ódio ele suscitou com a sátira política e a crítica social em tantos filmes…
Choque entre o velho e o novo trazendo à luz suas contradições, hipocrisias e explorações. Melancolia russa cuja história que pode muito bem ser transportada para a realidade de qualquer país. Amargo, exatamente como uma despedida.
Um dos grandes da Nouvelle Vague francesa e um dos mais íntegros e lúcidos sobre a condição da juventude. Ótimo equilíbrio entre humor e contestação e uma trilha sonora que impõe o próprio ritmo à montagem.
O estudo psicológico profundo e até excessivo dos personagens, a fotografia em preto e branco e paisagem de neve e gelo do norte do Japão constituem o espelho metafórico da simplicidade espiritual e da solidão do protagonista. Adaptação simplesmente maravilhosa, Kurosawa conseguiu enxergar e transmitir a essência da obra como poucos.
Menos conhecido, mas não considero uma obra menor do Murnau, principalmente devido à riqueza psicológica do personagem principal, sua caracterização e a forma com que enxerga a realidade que o circunda (que seus olhos transformam na imagem do caos). Na verdade é em Fantasma que Murnau deu inicio ao estilo que, um pouco mais tarde, daria vida à obra prima "A Última Gargalhada".
Além da história da Janet Frame, que por si já é fascinante, o que realmente me conquistou foi a visão psicológica adotada pela Jane Campion, sem concessões ao psicologismo, e a fuga do binômio romântico gênio/loucura.
Reflexão bem interessante sobre a relação entre realidade e ficção em seu esplendor figurativo, rendendo ainda uma homenagem à "Commedia dell'Arte". Um dos grandes filmes do Renoir, mas acredito que teria ficado melhor se dirigido pelo Luchino Visconti.
Visconti retoma aqui, com grande inspiração em Shakespeare Macbeth, Os demônios Dostoiévski, Götterdämmerung de Wagner e Thomas Mann, sua vocação em registrar a queda, profanando o romantismo e substituindo-o pela desilusão.
Parábola irônica e ácida sobre a vida de um falso profeta na onda da proliferação de seitas cristãs em uma África profundamente dividida entre religião, tradição e modernidade.
Metéora
3.3 22Meteora é o típico filme que poderia ter sido mas não foi. O desenvolvimento da narrativa se dá, principalmente, através da animação de uma série de ícones, fortemente geométricos e sugestivos, enquanto as sequências puramente cinematográficas são reservadas ao aprofundamento de tais imagens, tanto no que se refere à descrição da vida no campo, quanto da vida monástica ou do encontro entre os dois protagonistas. Nesse sistema, certamente bastante interessante, o filme não encontra uma representação fluida do erotismo e opta por uma terceira via através de imagens de forte conteúdo pictórico, mas que justapostas às precedentes, perdem totalmente a coerência rítmica. Quanto mais eloquentes se mostram as animações dos ícones em seu silêncio, mais o restante se mostra vazio e descoordenado, desperdiçando um grande esforço criativo a serviço de uma variação banal e realista do tema da tentação carnal.
Totalmente desnecessária, apelativa e cruel a cena da cabra sendo abatida.
O Pecado Original
3.6 6Um dramático emaranhado (extremamente complicado e mórbido) de sentimentos e relações entre os componentes de uma família nada convencional descrita pelos próprios membros como uma caravana de ciganos. Cocteau enfatiza sua estrutura teatral e seu caráter claustrofóbico "a portas fechadas" nesta transposição cinematográfica que mistura uma trama de vaudeville com uma dose maciça de psicologia dramática.
Jonas Que Terá Vinte e Cinco Anos no Ano 2000
4.0 4Difícil medir o quão genuinamente suíço é o cinema de Alain Tanner, mas diante de uma parábola política tão bem construída que oscila entre o pessimismo e o otimismo, o sonho (desejo) e a realidade, o protesto e a utopia, a conclusão é que esse tipo de cinema não poderia ser mais universal. "Jonas Qui Aura 25 Ans en l'an 2000" é um filme revigorante pois através de seus personagens quase palpáveis combina ironia, ternura, inteligência e generosidade em doses exatas.
No Quarto da Vanda
4.0 15A demolição material, os entulhos e as ruínas como metáfora de uma existência que se deteriora dia após dia. As situações, destiladas quase em tempo real, se mostram com uma veracidade impressionante através da repetição diária, enquanto as expressões, os rostos e as silhuetas emergem da escuridão, banhados pela piedade de uma luz branda, quase escassa. Com sua duração dilatada e atmosfera deprimente, o espetáculo da vida é impressionante: quase como se a morte iminente não pudesse extinguir aqueles lampejos de vida, fracos, mas resistentes como as velas que perduram na escuridão. Difícil, quase impossível distinguir a realidade da ficção, o que foi registrado no dia a dia e o que foi sugerido. Mas o que realmente conta é o resultado terrivelmente significante e simbólico. Escondida em sua própria discrição e suposta simplicidade, a verdade é que no filme não há nada deixado ao acaso: a iluminação é esplêndida como em um filme de Tarkovsky, as cores lembram Sokurov e a qualidade dos enquadramentos, próximas ao universo de Zurbarán, fazem de cada imagem um testemunho eterno e piedoso da condição humana. No quarto da Vanda não entra luz... nem esperança.
Ceddo
3.8 22Vergonhosamente o filme foi censurado no Senegal até 1984, pelo então presidente Léopold Sédar Senghor, sob o pretexto de "erro de ortografia" pois, segundo Senghor, a grafia correta deveria ser Cedo com apenas um "d" e não Ceddo...
Playtime - Tempo de Diversão
4.0 54Completamente desvalorizado na época do lançamento, após restaurado e redistribuído na França em 2002, adquiriu um valor profético como sátira à globalização em todos os seus níveis: Tati colocou em imagens a crise de um século inteiro. O tempo fala por si.
A queda de Berlim
3.8 5Lixo propagandista de melhor qualidade.
http://www.youtube.com/watch?v=wlvYGqi3Dbc
O Apocalipse Segundo Cioran
4.3 2"Mal saio na rua, exclamo: que paródia perfeita do inferno!"
Dia de Outono
4.3 13Ozu sempre coerente consigo mesmo na simplicidade magistral de sua linguagem.
Cão Branco
3.7 181Além de um manifesto contra o racismo, White Dog é uma grande metáfora sobre o comportamento humano. E dessa linha emerge toda a rejeição do Fuller contra o protótipo da sociedade norte-americana, na qual ele cresceu e teve que se confrontar desde sempre.
Acho triste que um dos motivos alegados pela Paramount ao se recusar a distribuir o filme nos EUA na época tenha sido a "blasfêmia politicamente incorreta" da cena da igreja. Quanta hipocrisia…
A Vingança de Dorothea
3.5 12Obra repleta de ironia e sarcasmo que alimentam, passo a passo, o objetivo da polêmica: a indústria do entretenimento na Alemanha e a função que exerce no cinema, a mercantilização do sexo, o fascismo congênito da classe média alemã. Não é um filme pornográfico "d'auteur" nem um filme anti-pornográfico que visa denunciar a obscenidade com as mesmas armas, mas uma análise muito interessante da Alemanha Ocidental do início dos anos 70 na visão do diretor.
Gesualdo - Morte para Cinco Vozes
3.9 3Herzog em sua contínua procura pelo gênio, pelo anômalo e pelo diferente dessa vez vai até a Itália para mostrar os lugares que serviram como pano de fundo para as obras musicais (criminosas) compostas por Carlo Gesualdo, o príncipe de Venosa, nobre que se dedicou ao prazer da composição, conhecido por seu temperamento explosivo e violento na vida privada e famoso no âmbito musical por suas ousadias harmônicas "indecentes" para a época: cromatismos melódicos sinuosos, dolorosos e insinuantes. Declamações de puro sentimento, quase expressionistas, que levaram ao extremo o gênero Madrigal e seguiram rítmica, melódica e harmoniosamente o real significado do texto poético.
Reality - A Grande Ilusão
3.6 44 Assista AgoraReality - A Grande Ilusão (?) Alguém avisa que esse filme já é do Renoir.
Um gato no Cérebro
3.5 37Fulci não teve uma vida muito feliz e embora sempre tenha negado não é difícil encontrar reflexos autobiográficos do luto e das tragédias que marcaram sua existência em seus filmes. Aqui sua recusa em estabelecer uma correspondência psicanalítica entre sua vida e sua obra lhe custou a separação com a namorada psicanalista. Sua opinião sobre a psicanálise é notória: "Uma invenção de Freud para conseguir dinheiro para a cocaína". Fulci era muito inteligente e, segundo os que o conheceram bem, muito generoso, mas sempre foi um diretor anárquico demais para qualquer ideologia: basta pensar no ódio ele suscitou com a sátira política e a crítica social em tantos filmes…
A Despedida
4.3 16Choque entre o velho e o novo trazendo à luz suas contradições, hipocrisias e explorações. Melancolia russa cuja história que pode muito bem ser transportada para a realidade de qualquer país. Amargo, exatamente como uma despedida.
A última cena, filmada pela Larisa é de arrepiar.
Adeus, Philippine
3.7 3Um dos grandes da Nouvelle Vague francesa e um dos mais íntegros e lúcidos sobre a condição da juventude. Ótimo equilíbrio entre humor e contestação e uma trilha sonora que impõe o próprio ritmo à montagem.
O Idiota
4.2 31 Assista AgoraO estudo psicológico profundo e até excessivo dos personagens, a fotografia em preto e branco e paisagem de neve e gelo do norte do Japão constituem o espelho metafórico da simplicidade espiritual e da solidão do protagonista. Adaptação simplesmente maravilhosa, Kurosawa conseguiu enxergar e transmitir a essência da obra como poucos.
Onde Fica a Casa do Meu Amigo?
4.2 145 Assista AgoraA simplicidade é fascinante.
Fantasma
3.8 17Menos conhecido, mas não considero uma obra menor do Murnau, principalmente devido à riqueza psicológica do personagem principal, sua caracterização e a forma com que enxerga a realidade que o circunda (que seus olhos transformam na imagem do caos). Na verdade é em Fantasma que Murnau deu inicio ao estilo que, um pouco mais tarde, daria vida à obra prima "A Última Gargalhada".
Um Anjo em Minha Mesa
4.0 26Além da história da Janet Frame, que por si já é fascinante, o que realmente me conquistou foi a visão psicológica adotada pela Jane Campion, sem concessões ao psicologismo, e a fuga do binômio romântico gênio/loucura.
A Carruagem de Ouro
3.8 17Reflexão bem interessante sobre a relação entre realidade e ficção em seu esplendor figurativo, rendendo ainda uma homenagem à "Commedia dell'Arte". Um dos grandes filmes do Renoir, mas acredito que teria ficado melhor se dirigido pelo Luchino Visconti.
Os Deuses Malditos
4.2 33Visconti retoma aqui, com grande inspiração em Shakespeare Macbeth, Os demônios Dostoiévski, Götterdämmerung de Wagner e Thomas Mann, sua vocação em registrar a queda, profanando o romantismo e substituindo-o pela desilusão.
Em Nome de Cristo
3.7 3Parábola irônica e ácida sobre a vida de um falso profeta na onda da proliferação de seitas cristãs em uma África profundamente dividida entre religião, tradição e modernidade.
Mogambo
3.6 27 Assista AgoraFilme com menos elementos fordianos que já assisti. Uma espécie de Hatari do Ford, mas ironicamente, com Gable no lugar do Wayne.