Interessantíssimo essa experiência do Andrés Wood com "Machuca". O cotidiano do Estado de exceção experimentado no Chile - à força e motivado por "terceiros" (vulgo EUA), o que é sempre bom ressaltar - é algo que já vinha sendo retratado no cine: "Missing", de Costa Gavras e feito na década de 1980, e "No", do Pablo Larraín de 2012, são exemplos do quanto a temática vem sendo abordada mais e mais e de maneira crítica pelos cineastas (crítica é até pouco para o que o Gavras faz - se você não viu, veja). A questão do "Machuca" é justamente trazer uma perspectiva um tanto quanto cliché ultimamente nas produções que partem deste objetivo, mas não menos tocante obviamente: o ponto de vista infantil; o Vitor, comentando um pouco mais abaixo, já deu um pouco da tônica do quanto é forte no espectador se colocar num ponto de vista infanto-juvenil em um cenário como este. Não tem como pensar não pensar no nacional "O ano em que meus pais saíram de férias", do Cao Hamburguer e feito em 2012. E bem, como a ampla maioria dos filmes que optam por este caminho, o impacto é enorme. Em "Machuca", é uma pedrada com um soco inglês direto no saco. Algumas cenas me chamaram muito a atenção;
o "esnobe" Gonzalo têm uma vida de luxo mas não menos problemática: a crise familiar, o sentimento de não encontrar aquela base que muitos não mais conseguem ter na família (é o que notei, na minha opinião, com a questão da mãe), foi incômodo para mim. Nunca é fácil passar por situações como essa, ainda mais quando crianças. A escola, ao invés de um fator de socialização, funciona no sentido oposto: Gonzalo simplesmente não tem amizades, por "x" motivos. Neste sentido, o início da aproximação com Pedro acho sensacional: a cena do moleque engomado entrando numa versão mais acabada de uma Rural versão chilena, literalmente esmagado por causa do aperto no carro e sendo zoado por um tiozão é fantástico; o amparo veio de onde menos se esperava.
missa do padre McEnroe. Duvido muito que uma discussão em uma igreja seja tão "ordeira" da maneira que foi retratado, mas achei uma sacada sensacional do Andrés inserir a cena: "momíos" e "marxistas" discutindo, cada qual expondo sua opinião (de merda, em alguns casos) e pré-conceitos (igualmente de merda, também em alguns casos), com aquele semi-final do relato da garota da fazenda é realmente de se fazer pensar.
Por fim e não menos importante: em certos pontos de "Machuca" nota-se a influência de outros filmes que o Andrés com certeza fez de referência para o que faria: é impossível não se lembrar do "Au revoir les enfants" ("Adeus meninos", aqui no Brasil) na
pixações: "No a la guerra civil", de início; "a la guerra civil", no mesmo muro, porém com o "No" riscado e com um "pico" entre "guerra" e "civil"; e, por último, o muro cinza, silenciado, morto, signo da vitória armada de Pinochet.
se você não se emocionar com a morte de Silvana, nem com a comunidade sendo destroçada pelos militares sem absolutamente motivo algum ou com a literal substituição dessa por um campinho de futebol, desculpe dizer mas você certamente tem probleminhas neste lado esquerdo do peito.
E quem não viu, veja. Certamente tem clichés, como todo filme que parte de uma perspectiva de guris em ditaduras acaba tendo; mas o mais divertido é sempre como as diferenças de cada um destes - e até mesmo os clichés, porque não - nos impactam num arremedo duríssimo.
"O medo do comunismo só existe na mente, na estupidez e na cegueira da elite brasileira que não quer ver que não podemos manter os privilégios de uma minoria em um país tão grande quanto o Brasil; o governo deve dar ao povo a garantia de suas necessidades básicas."
Uma das falas mais sensatas ditas há 53 anos, e uma das que - infelizmente ainda - se fazem muito atuais. Incrível como que, mesmo com a jorrada de fontes utilizadas aqui (seja de documentos oficiais estadunidenses, brasileiros, entrevistas de diplomatas de ambos os países, de militares pró e contra esse maldito golpe), uns animais ainda tentem colocar em descrédito o trabalho produzido e que insistem nas ações militares/empresariais do 1° de abril como uma "revolução pela pátria, por Deus e contra o trapo vermelho que sufocava o país".
E nem criatividade esses reacionários anti-comunistas/socialistas de hoje têm: ainda batem nos velhos estereótipos ridículos de mais de 50 anos atrás. Só melhorem, por favor; melhorem pra vocês, pro que vocês supostamente defendem e pro resto da sociedade que tem de aturar a baboseira que vocês falam. Talvez com isso ganhem alguma credibilidade realmente digna.
Ótimo ver a cara de todo mundo exposta, até porque isso é uma democracia. Interessante ver certas opiniões de certas pessoas sobre o período ditatorial (não é, senhores militares reformados?). Ulstra, tão patético que teve de escrever um papelzinho pra ler durante a entrevista (talvez por temerosidade de falar demais o que não devesse - e o que realmente devia).
"Quando chegou no Chile (em janeiro de 1971) [...] tinha aquela gente que queria fazer o golpe de Estado, promover o golpe de Estado. As madame da alta sociedade dos ricos chileno, pegava as empregada doméstica dentro de casa, punha com as panela e punha pra desfilar na rua. Não era elas que desfilava não, eram as empregada doméstica delas, elas iam atrás ou na frente com as bandeira."
Mais explicativo e simbólico que isso, pro nosso cenário político atual, impossível.
História interessante, mas de péssima execução. Johnny Depp não convence como Bulger, e o combo maquiagem + lentes de contato feitos para o personagem parece mais com uma caracterização ridícula, risível, que uma semelhança com o mafioso real em si. Esperava ver aqui algo como "Inimigos Públicos", estrelado pelo mesmo Depp há um tempo atrás, em que a tensão e o jogo de cenas entre FBI/máfia reduz o maniqueísmo bem-mal com que geralmente tratamos estes dois lados (além de, obviamente, segurar a atenção do espectador com a expectativa do que vem à seguir), mas "Aliança do Crime" é beeem esquecível no conjunto. Nem o carregamento de astros que o filme oferece (além do Depp, temos o xerife de "Stranger Things", David Harbour, o delegado policial da série "The Night Of", Bill Camp, Kevin Bacon, Benedict Cumberbatch e o político Peter Russo do "House of Cards", Peter Stoll) salva. No mais, se o verem no catálogo da HBO ou do MAX (como está já há um bom tempo), fica a dica pra procurar qualquer outra coisa pra se ocupar e não desperdiçar atenção com isto.
Bom entretenimento mas, a meu ver, acaba pecando em alguns objetivos que o filme mesmo se propôs a abordar. Por isso acaba sendo, pra mim, um tanto racista na essência. Por quê? Bem, pra quem tiver interesse, segue abaixo uma listinha que propus tanto como explicação deste meu ponto de vista quanto para debate, caso alguém venha a se interessar:
1. Notaram como, apesar de toda a luta e resistência de Kath, Dorothy e Mary ao longo do filme para exercer seu trabalho, seu direito enquanto ser humano e sua inserção numa sociedade racista como a estadunidense, o parecer das decisões sempre cabe ao personagem do nosso querido e eterno guarda-costas, Al Harrison (Kevin Costner)? Alguém pode até argumentar: porém ele é o chefe, cara; verdade, entretanto chegarei nisso mais na frente. 2. Chegamos em alguns pontos do filme, e para tal vamos comparar com parte do material do livro, com o que ocorreu na realidade e com o que foi posto no filme. Vemos em Hidden que é o Harrison que arranca, a picaretadas, a placa de "colored bathrooms" correto? Bem, na realidade uma moça chamada Miriam Mann, do time das matemáticas negras do projeto, retirou de um dos computadores uma fachada em que estava escrito "COLORED COMPUTERS"! Por que então, ao invés de colocar esta situação, real e muito ilustrativa com os objetivos do filme, escolheram pela picaretada fake do personagem do Costner? 3. Na situação dos banheiros, vemos que Kath é que sofre mais de um excesso de nervosismo, e cruza toda a instalação da NASA para utilizar o "colored bathroom". Aqui tem um ponto interessante: no livro, se diz que quem mais sofria do problema era Mary; até aqui, tudo bem. O ponto que queria levantar é que na obra vemos que Mary, ao ir trabalhar por lá, não sabia bem como eram as instalações e pedindo ajuda a funcionários do local (brancos), estes "riram e não ofereceram ajuda" a ela (obviamente deixando-a furiosa). Kath, segundo o livro, pouco notou a questão dos banheiros e, sabendo finalmente onde ficavam os banheiros de brancos e negros na instalação onde trabalhava, tocou o foda-se e sim, usava os banheiros dos brancos mesmo assim! Não seria uma cena/situação maravilhosa para se colocar no filme? 4. Chegamos no ponto-chave: sabe o Al Harrison? Então, é um personagem inventado. A luta de Kath e das demais meninas foi muito maior do que o filme se propõe a expor com o Costner e seu personagem. 5. Por fim, não menos importante: Theodore Melfi, o diretor. Branco.
Ressalto, mais uma vez: foi minha perspectiva do filme.
Comentar isso aqui é chover no molhado. Isso é simplesmente a história dos Estados Unidos, apesar de ainda idealizar o tal do "self-made man" que venceu na vida a partir do garimpo (caso existisse na vida real, Daniel Plainview seria a exceção da exceção); no mais, tá tudo aqui. Uma nação forjada pela violência, pelo capitalismo selvagem (ou como uns loucos aqui em terras brasilis hoje em dia ainda defendem, um tipo de mercado sem a mínima "regularização" ou "vigilância" por parte do Estado ou quem quer que seja), pelo fanatismo religioso e, olhem só, pela corrupção em cima de corrupção. Filmaço. Descobri depois que perdeu o Oscar de 2007 pra No Country for Old Men: páreo duríssimo, mas acho que esse épico do Paul Thomas Anderson deveria ter carregado a estatueta pra casa.
"Quero ajudar você a entender que 'O Nome da Rosa' é só uma exceção numa carreira de declínio ininterrupto." E o último filme do Sean Connery foi "A Liga Extraordinária". Quem diria: Sick Boy estava certo desde 1996.
Caralho, que filme pesado. Um gancho de direita no nariz, com soco inglês, é mais suave que isso. É um filme que traz uma perspectiva não exclusivamente inglesa, nestes períodos de crise trabalhista/social na ilha da rainha pré-Brexit (e que ainda se faz persistente mesmo após o referendo, para desespero dos que votaram a seu favor), mas mundial; quantas pessoas, na minha cidade, na minha rua (e na sua), não estão vivenciando esse "roteiro" que é a vida do Daniel Blake e da Katie na própria vida real? Imagino que muitos aqui que assistiram se identificaram com o drama do Daniel, seja porque presenciaram pessoas próximas passando situações semelhantes, seja porque viveram por si mesmas: o drama do desemprego, do desamparo, do drama financeiro, da maldita máquina burocrática que,
como o China diz pro Daniel, insiste em te querer fazer desistir e no fim quer passar por cima do cadáver que uma hora atrás estava na porta dele, em vida, pedindo uma ajuda (ou clemência, ou implorando de joelhos, como Daniel diz que NÃO ficará nunca pra senhora na agência do governo).
Ajuda não, justiça, porque isso é direito assegurado. Pra quem já viu pessoas próximas vivendo por cenários semelhantes, ou passaram por si mesmas, é um filme MUITO forte. Porém, acho que no fim a mensagem é aquela que fica implícita ao longo dele, a de
nunca desistir, não importa o grau da dificuldade. Daniel, mesmo com todos os problemas (cardíaco, não conhecimento básico da informática, falta de dinheiro), não se abate nunca; o Estado foi vitorioso, no fim? Não creio. O exemplo ficou, como podemos ver no momento da pixação que dá nome ao filme ou naquela magnífica cena final da leitura da carta por Katie no velório do Daniel. Romantismo da minha parte em ter esta visão? Talvez, mas quero acreditar nisso. Por experiência própria.
Nunca devemos nos abater no fim das contas, porque como Daniel diz pra Katie,
A sequência de imagens apresentadas pela Parallax, no meio do filme, como parte da "entrevista" de Joe é sensacional. "A Trama", junto com "Todos os Homens do Presidente" (ambos dirigidos por Alan Pakula), retrata bem o clima de paranoia que envolveu Hollywood e todo os Estados Unidos no fim dos anos 60 e 70: assassinato dos Kennedy, crise dos mísseis, "os inimigos" (os comunistas, sejam soviéticos, cubanos ou chineses) e a defesa dos "valores tradicionais" norte-americanos, ditados pelos "pais fundadores", geralmente compõem boa parte do cenário no qual os filmes do Pakula se passam.
Mais um filme bem nacionalista do Mel Gibson, lembrando muito o "Fomos Heróis" no qual ele atuou; mais um filme "cristão", na pegada que ele mesmo admite em que embarcou atualmente. É um bom filme, por fim, porém é importante ficar atento às mensagens implícitas nele, e ter no mínimo um senso crítico de discernir sua "mensagem" de seu produto "técnico" enquanto filme em si (se isso for possível, claro). Aqui se tem muito uma ode ao "way of life" norte-americano do século XX:
com exceção (e que exceção) do pai, família unida, religiosa, bucólica, quase pueril; inocente até. Um relacionamento pautado nos mesmos modelos: clássica história do aspirante à moça que vai ao hospital e conquista o coração dela; aqui, lembrei muito de "Pearl Harbor", aquele com Ben Affleck.
Como já dito antes, o discurso nacionalista permeia o filme: mesmo que de maneira mais subjetiva; não aquele nacionalismo "clássico", tão comum no cinema americano anteriormente, do soldado que quer matar os japoneses pra manter seus valores. Aqui, a manutenção dos "valores", da nação, está incluso na crença de Doss, e não mais no discurso da violência guerreira com o qual o Hollywood estava acostumando e, depois de muito tempo, aprendeu a críticar
, e do qual Mel Gibson não foge disso aqui (apesar da verdadeira tara em mostrar japonês pegando fogo): a vivência do pai na 1° Guerra Mundial e que bate na mulher, que também vai ao cemitério desafogar suas mágoas do passado e rever os amigos que perdeu. As próprias cenas de Doss na guerra retratam a crueza do conflito, porém imbuídos, subjetivamente, na manutenção daqueles valores religiosos/americanos no qual falamos mais em cima, o que fica completamente explícito na cena derradeira do filme.
Dois caras sentados numa redação de jornal datilografando, fazendo ligações e discutindo entre si ou com seus superiores não parece certamente a melhor opção que um roteirista ou diretor tem à disposição para prender o espectador de seu filme. Neste caso aqui, porém, esta é a tônica; e todo o mérito vai pro diretor que consegue criar tensão ao colocar quem assiste no papel de um "acompanhante" de dois repórteres investigativos cuja rotina (ir atrás da pista, quebrar a cara, ser ameaçado, fazer pergunta, ter insônia e descobrir que se está na cola de algo muito maior) faz parte. Para quem gosta de História (ou história mesmo, se você não for acadêmico) terá um prato cheio pra curtir o filme: a verdadeira batalha mental de se conseguir fontes em arquivos num tempo onde não existia internet e de dialogar com suas fontes/testemunhas (e ao mesmo tempo ser objetivo para, melhor ainda, conseguir sua matéria) sem celular ou qualquer parafernalha moderna dá uma tônica do que era o trabalho do repórter até pouco mais de 20 anos atrás; o próprio apelido do informante de Woodward, dado por seu superior, faz referência à um filme pornográfico do período: Garganta Profunda (o que dá um pouco da ideia do que era tal tipo de cinema na época e de seu alcance, caso você queira comparar com Taxi Driver por exemplo). Procurando na internet e lendo matérias sobre o filme, descobri até que a redação do Post foi reproduzida enquanto tal para o filme (até a cor das escrivaninhas são as mesmas da redação original!). E, aqui, duas cenas são mágicas:
A parte em que Garganta Profunda avisa que a vida dos dois repórteres estão em perigo. Sensacional. A cena de Robert Redford entrando no apartamento e colocando o volume do som na puta-que-pariu pra que alguma escuta não captasse o menor barulho que os dois fizessem é magnífica.
A cena final: Nixon fazendo seu tradicional juramento para presidente, enquanto Woodward e Bernstein aparecem em segundo plano na matéria que vai derrubá-lo alguns anos depois. E o tec-tec maldito da máquina de escrever no fim, retratando o que houve na sequência do caso. Fuderosamente genial.
Curioso: Jason Robards, que faz o papel de Bradlee, rouba pra mim todo o protagonismo do filme, em detrimento de Robert Redford e Dustin Hoffman.
"Um polonês aluga um apartamento em um estranho edifício francês, onde passa a ser visto com desconfiança pelos seus vizinhos." M-mas ele pode provar que é francês, ele tem cidadania local.
Reflexivo sobre a questão de empatia para com/das máquinas (como comentaram já, primo distante do Blade Runner justamente nessa questão), e muito bom quanto a isso, mas muito "inocente" em algumas partes/questões que o envolvem. Se
o Nathan tinha tudo nas mãos, sério que ele não chegou a prever a jogada de Caleb e Ava? O próprio fato do Caleb sair do quarto dele já não levantaria suspeitas? Em nenhum momento o "criador" notou que a queda de energia vinha do próprio autômato que criou? Ele não tinha noção do poderio técnico da própria máquina que criou?
De todo modo, é um bom filme de ficção científica, quase que um alento pra um mercado que por tanto tempo penou pra ter filmes bons mas que, nesta nova safra do cinema, vem se salvando e ganhando certo destaque.
"Estou escrevendo pra você pois hoje, pela segunda vez na minha vida, estou com medo. A primeira vez foi quando encarei seu filho. Seu filho abriu meus olhos sobre quanto odioso este mundo pode ser. E isto me marcou eternamente. Ele está morto, eu viva. Ele está livre, eu não."
Em tempos de chacinas como a de Campinas e nas cidades argentinas,e de ódio voltado às mulheres no dia-a-dia, com todo o despejo da misoginia e preconceito abertamente e explícito nas redes sociais e no cotidiano, este filme é, infelizmente, atual. A homenagem de Villeneuve, no fim, às vítimas (com a exibição de cada uma daquelas que morreram no massacre) é tocante. É um filme difícil de ser digerido: o assassino (que, enquanto ser humano, é tão medíocre que não tem seu nome mencionado uma única vez) mostra-se, ao contrário do que muitos podem esperar, super racional. Pior: embasa seu preconceito e, lembro, não é nada diferente daquilo que vemos no Facebook e no nosso cotidiano no que se refere àquelas pessoas que vomitam sua misoginia e "anti-feminismo" abertamente, muitas vezes sendo acolhidas por meio de curtidas, compartilhamentos e piadas.
Me tocou muito Jeff cometendo suicídio no final; indo rever sua mãe, ajudando-a e, desalentado, matando-se no carro. Outra cena igualmente reflexiva é a de quando o assassino encontra-se morto: seu sangue encontra o sangue daquelas que ele mais odiava e, imagino que, para seu desespero, combina-se, tocam-se, se juntam; nada diferem, não existe reação, não existe motivo para tanto ódio, não existe racionalidade.
Mais um filme corajoso do Costa Gavras, desta vez batendo de frente com o golpe de Estado chileno orquestrado por Pinochet, EUA e demais empresas norte-americanas no 11 de setembro de 1973. Assistir é mais do que recomendado; para quem já viu filmes do mesmo diretor, "Desaparecido" segue na mesma trilha de "Z" e demais: é a crítica, pura, no cinema. Não há espaço para ficção nem alívio. O letreiro que abre o filme já joga na cara do telespectador tudo o que irá ocorrer dali pra frente: "A história é real, documentada e testemunhada. Nomes foram trocados para não expor ao risco os envolvidos e permitirem a publicação do filme." Não há muito mais o que falar, senão que dá uma certa temeridade em
ver aquela cena no início na qual Charlie vê, da janela do hotel em que está hospedado, uma grande festa num apartamento de frente com todos os figurões de Santiago que, ao ouvirem tropas passando pela rua em seus carros militares, saem à varanda do apartamento em que estão para aplaudir os soldados e demonstrar simpatia por eles, sendo correspondidos cordialmente..
Infelizmente, lembra muito, mais do que deveria, a sociedade brasileira atual, em todos os seus pré-conceitos, preconceitos e hipocrisia.
que a ciência moderna continua a cometer: buscar um resultado conclusivo, pautado na análise e na maldita "conclusão". Achei bem simbólico (não é a palavra correta para isso, mas a que consigo pensar que mais se encaixa agora) o número e a relação com a Torá judaica; no fim, não devemos crer que a ciência e todos os seus métodos pautem a sociedade ou, no caso da paranoia de Max, tudo o que nos envolve ao redor (como as humanas pensaram até meados do século XX, e erraram, e muito das exatas continuam pensando hoje, e errando), mas que nos ajude a compreender e não sendo o "fim" em si.
Filme com personagens que não sabem dialogar entre si (por preconceito,problemas do passado,falta de tempo devido ao trabalho etc)? É justamente esse aqui. Minha interpretação do final é de que
Ambos (Pierrot e o filho de Majid), que aparecem conversando de maneira completamente natural na última cena,na escadaria da escola,estavam fazendo os vídeos. Como? O filho do argelino repassava à Pierrot as histórias que o pai "sofreu" na infância (fica óbvio pra mim que Majid se ressente muito do que a família de Georges fez com ele,como percebemos no diálogo de ambos e na cena de seu filho no banheiro do trabalho de Georges); no mais, os flashbacks apresentados batem com os desenhos enviados juntos com a fita, retratando o que Georges pedia pra Majid fazer quando ambos eram crianças. E Pierrot? Ora, era Pierrot quem gravava as fitas de vídeo que focavam a casa, e não é difícil imaginar o filho de Majid filmando a casa em que Georges nasceu por ter a informação obtida com Pierrot. E por quê de tudo isso? Aí realmente não consigo formular resposta. Pra mim, o filme apresenta a falta de diálogo que mencionei um pouco mais acima: ninguém sabe conversar um com o outro, vide as discussões familiares, Georges com Majid, o próprio Pierrot com os pais etc. Pode ser que as fitas sejam um tipo de piada ou tiração de onda do filho de Majid e Pierrot para com os pais? Pode até ser, mas quero acreditar com esta teoria que mesmo etnicamente diferentes (e isto tem papel fundamental face as tensões que se apresentam no filme, do ciclista negro com Georges, as notícias na TV, a própria relação Georges/Majid na infância, a crueza policial chegando ao apartamento de Majid e na própria cena do elevador, quando um tiozinho entra e encara, brevemente, o filho de Majid), Pierrot e o filho de Majid mostram, com seu diálogo tranquilo no fim do filme, que com a conversa e a simples troca de ideias tudo pode se chegar ao entendimento, mesmo que seja pra fazer uma piada tão grotesca com fitas de vídeo.
Obviamente, não preciso lembrar que é uma teoria pessoal; o final completamente aberto leva a se pensar "n" situações e respostas.
William S Burroughs: Um Retrato Íntimo
4.1 17"Love? What is it?
Most natural painkiller what there is.
LOVE."
Machuca
4.3 281Interessantíssimo essa experiência do Andrés Wood com "Machuca".
O cotidiano do Estado de exceção experimentado no Chile - à força e motivado por "terceiros" (vulgo EUA), o que é sempre bom ressaltar - é algo que já vinha sendo retratado no cine: "Missing", de Costa Gavras e feito na década de 1980, e "No", do Pablo Larraín de 2012, são exemplos do quanto a temática vem sendo abordada mais e mais e de maneira crítica pelos cineastas (crítica é até pouco para o que o Gavras faz - se você não viu, veja).
A questão do "Machuca" é justamente trazer uma perspectiva um tanto quanto cliché ultimamente nas produções que partem deste objetivo, mas não menos tocante obviamente: o ponto de vista infantil; o Vitor, comentando um pouco mais abaixo, já deu um pouco da tônica do quanto é forte no espectador se colocar num ponto de vista infanto-juvenil em um cenário como este. Não tem como pensar não pensar no nacional "O ano em que meus pais saíram de férias", do Cao Hamburguer e feito em 2012. E bem, como a ampla maioria dos filmes que optam por este caminho, o impacto é enorme. Em "Machuca", é uma pedrada com um soco inglês direto no saco.
Algumas cenas me chamaram muito a atenção;
o "esnobe" Gonzalo têm uma vida de luxo mas não menos problemática: a crise familiar, o sentimento de não encontrar aquela base que muitos não mais conseguem ter na família (é o que notei, na minha opinião, com a questão da mãe), foi incômodo para mim. Nunca é fácil passar por situações como essa, ainda mais quando crianças. A escola, ao invés de um fator de socialização, funciona no sentido oposto: Gonzalo simplesmente não tem amizades, por "x" motivos. Neste sentido, o início da aproximação com Pedro acho sensacional: a cena do moleque engomado entrando numa versão mais acabada de uma Rural versão chilena, literalmente esmagado por causa do aperto no carro e sendo zoado por um tiozão é fantástico; o amparo veio de onde menos se esperava.
Outra cena bastante chamativa pra mim foi a da
missa do padre McEnroe. Duvido muito que uma discussão em uma igreja seja tão "ordeira" da maneira que foi retratado, mas achei uma sacada sensacional do Andrés inserir a cena: "momíos" e "marxistas" discutindo, cada qual expondo sua opinião (de merda, em alguns casos) e pré-conceitos (igualmente de merda, também em alguns casos), com aquele semi-final do relato da garota da fazenda é realmente de se fazer pensar.
Por fim e não menos importante: em certos pontos de "Machuca" nota-se a influência de outros filmes que o Andrés com certeza fez de referência para o que faria: é impossível não se lembrar do "Au revoir les enfants" ("Adeus meninos", aqui no Brasil) na
intromissão de McEnroe na missa acompanhada pelos militares já depois do golpe militar.
pixações: "No a la guerra civil", de início; "a la guerra civil", no mesmo muro, porém com o "No" riscado e com um "pico" entre "guerra" e "civil"; e, por último, o muro cinza, silenciado, morto, signo da vitória armada de Pinochet.
E sobre a cena derradeira, bem:
se você não se emocionar com a morte de Silvana, nem com a comunidade sendo destroçada pelos militares sem absolutamente motivo algum ou com a literal substituição dessa por um campinho de futebol, desculpe dizer mas você certamente tem probleminhas neste lado esquerdo do peito.
E quem não viu, veja. Certamente tem clichés, como todo filme que parte de uma perspectiva de guris em ditaduras acaba tendo; mas o mais divertido é sempre como as diferenças de cada um destes - e até mesmo os clichés, porque não - nos impactam num arremedo duríssimo.
O Dia que Durou 21 Anos
4.3 226"O medo do comunismo só existe na mente, na estupidez e na cegueira da elite brasileira que não quer ver que não podemos manter os privilégios de uma minoria em um país tão grande quanto o Brasil; o governo deve dar ao povo a garantia de suas necessidades básicas."
Uma das falas mais sensatas ditas há 53 anos, e uma das que - infelizmente ainda - se fazem muito atuais.
Incrível como que, mesmo com a jorrada de fontes utilizadas aqui (seja de documentos oficiais estadunidenses, brasileiros, entrevistas de diplomatas de ambos os países, de militares pró e contra esse maldito golpe), uns animais ainda tentem colocar em descrédito o trabalho produzido e que insistem nas ações militares/empresariais do 1° de abril como uma "revolução pela pátria, por Deus e contra o trapo vermelho que sufocava o país".
E nem criatividade esses reacionários anti-comunistas/socialistas de hoje têm: ainda batem nos velhos estereótipos ridículos de mais de 50 anos atrás.
Só melhorem, por favor; melhorem pra vocês, pro que vocês supostamente defendem e pro resto da sociedade que tem de aturar a baboseira que vocês falam. Talvez com isso ganhem alguma credibilidade realmente digna.
Cidadão Boilesen
4.1 52Ótimo ver a cara de todo mundo exposta, até porque isso é uma democracia.
Interessante ver certas opiniões de certas pessoas sobre o período ditatorial (não é, senhores militares reformados?).
Ulstra, tão patético que teve de escrever um papelzinho pra ler durante a entrevista (talvez por temerosidade de falar demais o que não devesse - e o que realmente devia).
25 tiros na cabeça do Boilesen? Foi pouco.
Repare Bem
3.8 14"Quando chegou no Chile (em janeiro de 1971) [...] tinha aquela gente que queria fazer o golpe de Estado, promover o golpe de Estado. As madame da alta sociedade dos ricos chileno, pegava as empregada doméstica dentro de casa, punha com as panela e punha pra desfilar na rua. Não era elas que desfilava não, eram as empregada doméstica delas, elas iam atrás ou na frente com as bandeira."
Mais explicativo e simbólico que isso, pro nosso cenário político atual, impossível.
T2: Trainspotting
4.0 695 Assista Agora"Você é um turista da sua própria juventude"
Sick Boy nunca perdoa.
Aliança do Crime
3.4 408 Assista AgoraHistória interessante, mas de péssima execução.
Johnny Depp não convence como Bulger, e o combo maquiagem + lentes de contato feitos para o personagem parece mais com uma caracterização ridícula, risível, que uma semelhança com o mafioso real em si. Esperava ver aqui algo como "Inimigos Públicos", estrelado pelo mesmo Depp há um tempo atrás, em que a tensão e o jogo de cenas entre FBI/máfia reduz o maniqueísmo bem-mal com que geralmente tratamos estes dois lados (além de, obviamente, segurar a atenção do espectador com a expectativa do que vem à seguir), mas "Aliança do Crime" é beeem esquecível no conjunto.
Nem o carregamento de astros que o filme oferece (além do Depp, temos o xerife de "Stranger Things", David Harbour, o delegado policial da série "The Night Of", Bill Camp, Kevin Bacon, Benedict Cumberbatch e o político Peter Russo do "House of Cards", Peter Stoll) salva.
No mais, se o verem no catálogo da HBO ou do MAX (como está já há um bom tempo), fica a dica pra procurar qualquer outra coisa pra se ocupar e não desperdiçar atenção com isto.
Estrelas Além do Tempo
4.3 1,5K Assista AgoraBom entretenimento mas, a meu ver, acaba pecando em alguns objetivos que o filme mesmo se propôs a abordar. Por isso acaba sendo, pra mim, um tanto racista na essência.
Por quê? Bem, pra quem tiver interesse, segue abaixo uma listinha que propus tanto como explicação deste meu ponto de vista quanto para debate, caso alguém venha a se interessar:
1. Notaram como, apesar de toda a luta e resistência de Kath, Dorothy e Mary ao longo do filme para exercer seu trabalho, seu direito enquanto ser humano e sua inserção numa sociedade racista como a estadunidense, o parecer das decisões sempre cabe ao personagem do nosso querido e eterno guarda-costas, Al Harrison (Kevin Costner)? Alguém pode até argumentar: porém ele é o chefe, cara; verdade, entretanto chegarei nisso mais na frente.
2. Chegamos em alguns pontos do filme, e para tal vamos comparar com parte do material do livro, com o que ocorreu na realidade e com o que foi posto no filme. Vemos em Hidden que é o Harrison que arranca, a picaretadas, a placa de "colored bathrooms" correto? Bem, na realidade uma moça chamada Miriam Mann, do time das matemáticas negras do projeto, retirou de um dos computadores uma fachada em que estava escrito "COLORED COMPUTERS"! Por que então, ao invés de colocar esta situação, real e muito ilustrativa com os objetivos do filme, escolheram pela picaretada fake do personagem do Costner?
3. Na situação dos banheiros, vemos que Kath é que sofre mais de um excesso de nervosismo, e cruza toda a instalação da NASA para utilizar o "colored bathroom". Aqui tem um ponto interessante: no livro, se diz que quem mais sofria do problema era Mary; até aqui, tudo bem. O ponto que queria levantar é que na obra vemos que Mary, ao ir trabalhar por lá, não sabia bem como eram as instalações e pedindo ajuda a funcionários do local (brancos), estes "riram e não ofereceram ajuda" a ela (obviamente deixando-a furiosa). Kath, segundo o livro, pouco notou a questão dos banheiros e, sabendo finalmente onde ficavam os banheiros de brancos e negros na instalação onde trabalhava, tocou o foda-se e sim, usava os banheiros dos brancos mesmo assim! Não seria uma cena/situação maravilhosa para se colocar no filme?
4. Chegamos no ponto-chave: sabe o Al Harrison? Então, é um personagem inventado. A luta de Kath e das demais meninas foi muito maior do que o filme se propõe a expor com o Costner e seu personagem.
5. Por fim, não menos importante: Theodore Melfi, o diretor. Branco.
Ressalto, mais uma vez: foi minha perspectiva do filme.
Sangue Negro
4.3 1,2K Assista AgoraComentar isso aqui é chover no molhado.
Isso é simplesmente a história dos Estados Unidos, apesar de ainda idealizar o tal do "self-made man" que venceu na vida a partir do garimpo (caso existisse na vida real, Daniel Plainview seria a exceção da exceção); no mais, tá tudo aqui.
Uma nação forjada pela violência, pelo capitalismo selvagem (ou como uns loucos aqui em terras brasilis hoje em dia ainda defendem, um tipo de mercado sem a mínima "regularização" ou "vigilância" por parte do Estado ou quem quer que seja), pelo fanatismo religioso e, olhem só, pela corrupção em cima de corrupção.
Filmaço. Descobri depois que perdeu o Oscar de 2007 pra No Country for Old Men: páreo duríssimo, mas acho que esse épico do Paul Thomas Anderson deveria ter carregado a estatueta pra casa.
Festim Diabólico
4.3 883 Assista AgoraBrandon é o nazismo;
Rupert é o mundo ocidental.
Reflitam.
Trainspotting: Sem Limites
4.2 1,9K Assista Agora"Quero ajudar você a entender que 'O Nome da Rosa' é só uma exceção numa carreira de declínio ininterrupto."
E o último filme do Sean Connery foi "A Liga Extraordinária".
Quem diria: Sick Boy estava certo desde 1996.
Eu, Daniel Blake
4.3 533 Assista AgoraCaralho, que filme pesado.
Um gancho de direita no nariz, com soco inglês, é mais suave que isso.
É um filme que traz uma perspectiva não exclusivamente inglesa, nestes períodos de crise trabalhista/social na ilha da rainha pré-Brexit (e que ainda se faz persistente mesmo após o referendo, para desespero dos que votaram a seu favor), mas mundial; quantas pessoas, na minha cidade, na minha rua (e na sua), não estão vivenciando esse "roteiro" que é a vida do Daniel Blake e da Katie na própria vida real?
Imagino que muitos aqui que assistiram se identificaram com o drama do Daniel, seja porque presenciaram pessoas próximas passando situações semelhantes, seja porque viveram por si mesmas: o drama do desemprego, do desamparo, do drama financeiro, da maldita máquina burocrática que,
como o China diz pro Daniel, insiste em te querer fazer desistir e no fim quer passar por cima do cadáver que uma hora atrás estava na porta dele, em vida, pedindo uma ajuda (ou clemência, ou implorando de joelhos, como Daniel diz que NÃO ficará nunca pra senhora na agência do governo).
Ajuda não, justiça, porque isso é direito assegurado.
Pra quem já viu pessoas próximas vivendo por cenários semelhantes, ou passaram por si mesmas, é um filme MUITO forte. Porém, acho que no fim a mensagem é aquela que fica implícita ao longo dele, a de
nunca desistir, não importa o grau da dificuldade. Daniel, mesmo com todos os problemas (cardíaco, não conhecimento básico da informática, falta de dinheiro), não se abate nunca; o Estado foi vitorioso, no fim?
Não creio. O exemplo ficou, como podemos ver no momento da pixação que dá nome ao filme ou naquela magnífica cena final da leitura da carta por Katie no velório do Daniel.
Romantismo da minha parte em ter esta visão? Talvez, mas quero acreditar nisso. Por experiência própria.
Nunca devemos nos abater no fim das contas, porque como Daniel diz pra Katie,
temos uma "vida inteira pela frente".
No mais,
"mantenha-se forte", porque "todos nós precisamos do vento nas costas."
;)
A Trama
3.3 26A sequência de imagens apresentadas pela Parallax, no meio do filme, como parte da "entrevista" de Joe é sensacional.
"A Trama", junto com "Todos os Homens do Presidente" (ambos dirigidos por Alan Pakula), retrata bem o clima de paranoia que envolveu Hollywood e todo os Estados Unidos no fim dos anos 60 e 70: assassinato dos Kennedy, crise dos mísseis, "os inimigos" (os comunistas, sejam soviéticos, cubanos ou chineses) e a defesa dos "valores tradicionais" norte-americanos, ditados pelos "pais fundadores", geralmente compõem boa parte do cenário no qual os filmes do Pakula se passam.
Até o Último Homem
4.2 2,0K Assista AgoraHacksaw Ridge ou:
O soldado da morfina infinita.
Mais um filme bem nacionalista do Mel Gibson, lembrando muito o "Fomos Heróis" no qual ele atuou; mais um filme "cristão", na pegada que ele mesmo admite em que embarcou atualmente.
É um bom filme, por fim, porém é importante ficar atento às mensagens implícitas nele, e ter no mínimo um senso crítico de discernir sua "mensagem" de seu produto "técnico" enquanto filme em si (se isso for possível, claro).
Aqui se tem muito uma ode ao "way of life" norte-americano do século XX:
com exceção (e que exceção) do pai, família unida, religiosa, bucólica, quase pueril; inocente até. Um relacionamento pautado nos mesmos modelos: clássica história do aspirante à moça que vai ao hospital e conquista o coração dela; aqui, lembrei muito de "Pearl Harbor", aquele com Ben Affleck.
Como já dito antes, o discurso nacionalista permeia o filme: mesmo que de maneira mais subjetiva; não aquele nacionalismo "clássico", tão comum no cinema americano anteriormente, do soldado que quer matar os japoneses pra manter seus valores. Aqui, a manutenção dos "valores", da nação, está incluso na crença de Doss, e não mais no discurso da violência guerreira com o qual o Hollywood estava acostumando e, depois de muito tempo, aprendeu a críticar
, e do qual Mel Gibson não foge disso aqui (apesar da verdadeira tara em mostrar japonês pegando fogo): a vivência do pai na 1° Guerra Mundial e que bate na mulher, que também vai ao cemitério desafogar suas mágoas do passado e rever os amigos que perdeu. As próprias cenas de Doss na guerra retratam a crueza do conflito, porém imbuídos, subjetivamente, na manutenção daqueles valores religiosos/americanos no qual falamos mais em cima, o que fica completamente explícito na cena derradeira do filme.
É um bom filme, mas pra gostar com cuidado.
Todos os Homens do Presidente
4.1 206 Assista AgoraDois caras sentados numa redação de jornal datilografando, fazendo ligações e discutindo entre si ou com seus superiores não parece certamente a melhor opção que um roteirista ou diretor tem à disposição para prender o espectador de seu filme.
Neste caso aqui, porém, esta é a tônica; e todo o mérito vai pro diretor que consegue criar tensão ao colocar quem assiste no papel de um "acompanhante" de dois repórteres investigativos cuja rotina (ir atrás da pista, quebrar a cara, ser ameaçado, fazer pergunta, ter insônia e descobrir que se está na cola de algo muito maior) faz parte.
Para quem gosta de História (ou história mesmo, se você não for acadêmico) terá um prato cheio pra curtir o filme: a verdadeira batalha mental de se conseguir fontes em arquivos num tempo onde não existia internet e de dialogar com suas fontes/testemunhas (e ao mesmo tempo ser objetivo para, melhor ainda, conseguir sua matéria) sem celular ou qualquer parafernalha moderna dá uma tônica do que era o trabalho do repórter até pouco mais de 20 anos atrás; o próprio apelido do informante de Woodward, dado por seu superior, faz referência à um filme pornográfico do período: Garganta Profunda (o que dá um pouco da ideia do que era tal tipo de cinema na época e de seu alcance, caso você queira comparar com Taxi Driver por exemplo).
Procurando na internet e lendo matérias sobre o filme, descobri até que a redação do Post foi reproduzida enquanto tal para o filme (até a cor das escrivaninhas são as mesmas da redação original!).
E, aqui, duas cenas são mágicas:
A parte em que Garganta Profunda avisa que a vida dos dois repórteres estão em perigo. Sensacional. A cena de Robert Redford entrando no apartamento e colocando o volume do som na puta-que-pariu pra que alguma escuta não captasse o menor barulho que os dois fizessem é magnífica.
e
A cena final: Nixon fazendo seu tradicional juramento para presidente, enquanto Woodward e Bernstein aparecem em segundo plano na matéria que vai derrubá-lo alguns anos depois. E o tec-tec maldito da máquina de escrever no fim, retratando o que houve na sequência do caso. Fuderosamente genial.
Curioso: Jason Robards, que faz o papel de Bradlee, rouba pra mim todo o protagonismo do filme, em detrimento de Robert Redford e Dustin Hoffman.
O Inquilino
4.0 292"Um polonês aluga um apartamento em um estranho edifício francês, onde passa a ser visto com desconfiança pelos seus vizinhos."
M-mas ele pode provar que é francês, ele tem cidadania local.
Ex Machina: Instinto Artificial
3.9 2,0K Assista AgoraReflexivo sobre a questão de empatia para com/das máquinas (como comentaram já, primo distante do Blade Runner justamente nessa questão), e muito bom quanto a isso, mas muito "inocente" em algumas partes/questões que o envolvem.
Se
o Nathan tinha tudo nas mãos, sério que ele não chegou a prever a jogada de Caleb e Ava? O próprio fato do Caleb sair do quarto dele já não levantaria suspeitas? Em nenhum momento o "criador" notou que a queda de energia vinha do próprio autômato que criou? Ele não tinha noção do poderio técnico da própria máquina que criou?
De todo modo, é um bom filme de ficção científica, quase que um alento pra um mercado que por tanto tempo penou pra ter filmes bons mas que, nesta nova safra do cinema, vem se salvando e ganhando certo destaque.
Politécnica
4.0 197"Estou escrevendo pra você pois hoje, pela segunda vez na minha vida, estou com medo.
A primeira vez foi quando encarei seu filho. Seu filho abriu meus olhos sobre quanto odioso este mundo pode ser. E isto me marcou eternamente.
Ele está morto, eu viva. Ele está livre, eu não."
Em tempos de chacinas como a de Campinas e nas cidades argentinas,e de ódio voltado às mulheres no dia-a-dia, com todo o despejo da misoginia e preconceito abertamente e explícito nas redes sociais e no cotidiano, este filme é, infelizmente, atual.
A homenagem de Villeneuve, no fim, às vítimas (com a exibição de cada uma daquelas que morreram no massacre) é tocante.
É um filme difícil de ser digerido: o assassino (que, enquanto ser humano, é tão medíocre que não tem seu nome mencionado uma única vez) mostra-se, ao contrário do que muitos podem esperar, super racional. Pior: embasa seu preconceito e, lembro, não é nada diferente daquilo que vemos no Facebook e no nosso cotidiano no que se refere àquelas pessoas que vomitam sua misoginia e "anti-feminismo" abertamente, muitas vezes sendo acolhidas por meio de curtidas, compartilhamentos e piadas.
Me tocou muito Jeff cometendo suicídio no final; indo rever sua mãe, ajudando-a e, desalentado, matando-se no carro.
Outra cena igualmente reflexiva é a de quando o assassino encontra-se morto: seu sangue encontra o sangue daquelas que ele mais odiava e, imagino que, para seu desespero, combina-se, tocam-se, se juntam; nada diferem, não existe reação, não existe motivo para tanto ódio, não existe racionalidade.
Desaparecido - Um Grande Mistério
4.1 84Mais um filme corajoso do Costa Gavras, desta vez batendo de frente com o golpe de Estado chileno orquestrado por Pinochet, EUA e demais empresas norte-americanas no 11 de setembro de 1973.
Assistir é mais do que recomendado; para quem já viu filmes do mesmo diretor, "Desaparecido" segue na mesma trilha de "Z" e demais: é a crítica, pura, no cinema. Não há espaço para ficção nem alívio. O letreiro que abre o filme já joga na cara do telespectador tudo o que irá ocorrer dali pra frente: "A história é real, documentada e testemunhada. Nomes foram trocados para não expor ao risco os envolvidos e permitirem a publicação do filme."
Não há muito mais o que falar, senão que dá uma certa temeridade em
ver aquela cena no início na qual Charlie vê, da janela do hotel em que está hospedado, uma grande festa num apartamento de frente com todos os figurões de Santiago que, ao ouvirem tropas passando pela rua em seus carros militares, saem à varanda do apartamento em que estão para aplaudir os soldados e demonstrar simpatia por eles, sendo correspondidos cordialmente..
Infelizmente, lembra muito, mais do que deveria, a sociedade brasileira atual, em todos os seus pré-conceitos, preconceitos e hipocrisia.
Silêncio
4.0 11"Neste mundo, já não existe Deus nem Buda.
Já não há a necessidade disso por aqui."
Pi
3.8 769 Assista AgoraMax cometendo o mesmo erro
que a ciência moderna continua a cometer: buscar um resultado conclusivo, pautado na análise e na maldita "conclusão". Achei bem simbólico (não é a palavra correta para isso, mas a que consigo pensar que mais se encaixa agora) o número e a relação com a Torá judaica; no fim, não devemos crer que a ciência e todos os seus métodos pautem a sociedade ou, no caso da paranoia de Max, tudo o que nos envolve ao redor (como as humanas pensaram até meados do século XX, e erraram, e muito das exatas continuam pensando hoje, e errando), mas que nos ajude a compreender e não sendo o "fim" em si.
Creio que a cena final do filme explicite isso.
Caché
3.8 384 Assista AgoraFilme com personagens que não sabem dialogar entre si (por preconceito,problemas do passado,falta de tempo devido ao trabalho etc)? É justamente esse aqui.
Minha interpretação do final é de que
Ambos (Pierrot e o filho de Majid), que aparecem conversando de maneira completamente natural na última cena,na escadaria da escola,estavam fazendo os vídeos. Como? O filho do argelino repassava à Pierrot as histórias que o pai "sofreu" na infância (fica óbvio pra mim que Majid se ressente muito do que a família de Georges fez com ele,como percebemos no diálogo de ambos e na cena de seu filho no banheiro do trabalho de Georges); no mais, os flashbacks apresentados batem com os desenhos enviados juntos com a fita, retratando o que Georges pedia pra Majid fazer quando ambos eram crianças. E Pierrot? Ora, era Pierrot quem gravava as fitas de vídeo que focavam a casa, e não é difícil imaginar o filho de Majid filmando a casa em que Georges nasceu por ter a informação obtida com Pierrot. E por quê de tudo isso?
Aí realmente não consigo formular resposta. Pra mim, o filme apresenta a falta de diálogo que mencionei um pouco mais acima: ninguém sabe conversar um com o outro, vide as discussões familiares, Georges com Majid, o próprio Pierrot com os pais etc. Pode ser que as fitas sejam um tipo de piada ou tiração de onda do filho de Majid e Pierrot para com os pais? Pode até ser, mas quero acreditar com esta teoria que mesmo etnicamente diferentes (e isto tem papel fundamental face as tensões que se apresentam no filme, do ciclista negro com Georges, as notícias na TV, a própria relação Georges/Majid na infância, a crueza policial chegando ao apartamento de Majid e na própria cena do elevador, quando um tiozinho entra e encara, brevemente, o filho de Majid), Pierrot e o filho de Majid mostram, com seu diálogo tranquilo no fim do filme, que com a conversa e a simples troca de ideias tudo pode se chegar ao entendimento, mesmo que seja pra fazer uma piada tão grotesca com fitas de vídeo.
Obviamente, não preciso lembrar que é uma teoria pessoal; o final completamente aberto leva a se pensar "n" situações e respostas.
De Olhos Bem Fechados
3.9 1,5K Assista AgoraFoda quando a última fala do último filme do melhor diretor de todos os tempos é ''foder''.
Relatos Selvagens
4.4 2,9K Assista AgoraQuem é Black Mirror perto disso?